Rota de Valor (9789896931957)

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ISBN edição impressa: 978-989-693-195-7 1.ª edição impressa: agosto de 2025

Paginação: Carlos Mendes

Impressão e acabamento: Tipografia Lousanense, Lda. – Lousã

Depósito Legal n.º 552366/25

Capa: José M. Ferrão – Look-Ahead

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3.1. Origens do conceito de “centralidade no cliente” .............................................

3.2. Marketing relacional e personalização da experiência do cliente (CX)

3.3. Importância dos dados e da experiência do cliente (CX)

3.4.

3.5. Estado da arte da construção de uma cultura centrada no cliente

3.6. Inspiração e fundamentos para a exploração da centralidade no cliente

3.7. Faróis na rota para a cultura de centralidade no cliente

4.1. Denominadores comuns às empresas com cultura de centralidade no

4.2. Empresas de referência na construção de cultura de centralidade no cliente

5.2.

5.3.

6.1.

6.2.

6.3.

09

PROPOSTA DE VALOR 360°: COMO INOVAR NA ERA DA DIFERENCIAÇÃO PELA EXPERIÊNCIA?

9.1. Marca e valor da marca: Pilar da proposta de valor

9.2. Inovação na proposta de valor: Estratégias e ferramentas

9.3. Modelo Canvas Value Proposition

9.4. O CC Loop® e a inovação da proposta de valor ..................................................

9.5. Estratégias para ligar a inovação da proposta de valor com os objetivos de negócio

9.6. A experiência do cliente (CX): O motor da diferenciação

9.7.

9.8.

......................................................................................

9.9. Sustentabilidade: Elemento nuclear da proposta de valor

DE CASO 4 – NESPRESSO: Uma marca que reinventou a experiência

9.10. Proposta de valor: Inovação, compromisso e experiência ...............................

DE CASO 5 – DECATHLON: Inovação no retalho de desporto com foco

10 COMPROMISSO DOS PROFISSIONAIS E CULTURA DE CENTRALIDADE NO CLIENTE: A RELEVÂNCIA DA

10.1. A nova Era da Experiência

10.2. Experiência do colaborador (EX) e experiência do cliente (CX): Uma interdependência estratégica ...............................................................................

10.3. Processos que fortalecem a experiência do colaborador (EX) e geram diferenciação através da experiência do cliente (CX) 268

10.4. Dimensões de uma experiência do colaborador (EX) transformadora 270

10.5. Estratégias para a construção de uma cultura de centralidade no cliente.... 275

ESTUDO DE CASO 6 – IKEA: Cultura de compromisso e a interdependência entre experiência do colaborador e experiência do cliente

10.6. Pessoas, propósito e performance: O verdadeiro diferencial da experiência 284

..............................................................................................................................

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11.1. Estratégia de dados: Conhecer as necessidades e os desejos dos clientes ..

11.2. Confiança e permissão: A base para o uso de dados

11.3. Chegar ao cliente certo, no canal adequado e no momento ideal

11.4. Inteligência artificial (IA) generativa: Conteúdo relevante e personalizado

11.5. Experiência do colaborador (EX) e experiência do cliente (CX): Uma nova

11.6. Dos dados à ação: Segmentação, insights e fidelização

ESTUDO DE CASO 7 – MC SONAE/CONTINENTE: Como fidelizar 4,5 milhões de famílias?

11.7. Dos dados ao conhecimento do cliente: Rota de valor para as pequenas e médias empresas (PME) .........................................................................................

13.1. Inteligência artificial (IA) e automação: Motores de eficiência ........................

13.2 Soluções digitais e personalização da experiência do cliente (CX)

13.3. Dados, analítica e tomada de decisões mais informadas

13.4. Oportunidades e desafios na revolução tecnológica empresarial ..................

14.1. Quem é o cliente do futuro? ..................................................................................

14.2. Centralidade no cliente e experiência do cliente (CX) na Era Digital

14.3. E agora: O

Peter Drucker first articulated the concept of customer centricity in his landmark book, The Practice of Management, in 1954. “Business defines its goal as the satisfaction of customer needs”, he wrote, and from this basic premise Drucker proposed the concept we now describe as customer centricity: “Marketing is so basic that it cannot be considered a separate function. It is the whole business seen from the customer’s point of view. Concern and responsibility for marketing must, therefore, permeate all areas of the enterprise.” In the years since, firms embraced Drucker’s idea, and academic research demonstrated its financial consequences. For example, in one study, companies with more satisfied customers earned higher returns on their equity with lower risk, compared to companies with less satisfied buyers.

Even so, the biggest companies achieved great success without embracing Drucker’s concept. In 2006, for instance, the six most valuable companies in the world – Microsoft, Citi, Bank of America, ExxonMobil, AT&T and General Electric – were largely finance driven. Marketing was isolated to advertising or sales and lacked influence in the boardroom. For example, at General Electric, the world’s most valuable company for 10 years, CEO Jeff Immelt remarked that, in the past, “marketing was the place where washed-up salespeople went.”1 As the digital revolution began to gain momentum, however, the concept of customer centricity began to reveal its power. Amazon, Google, Zappos and others embraced the concept of customer centricity. Jeff Bezos articulated his approach at Amazon by reportedly saying that “The most important single thing is to focus obsessively on the customer. Our goal is to be earth’s most customer-centric company.” By 2025, the vast majority of the six most valuable companies in the world – Amazon, Microsoft, Apple, Nvidia, Google and Saudi Aramco – have embraced and exemplify customer centricity. With the stunning success of these companies, the power of customer centricity is undeniable.

The concept of customer centricity has become so central to the success of so many organizations because of the rising power of consumers. As a result of the digital revolution, individuals now have access to information and a platform to reach billions of consumers. With more information and a global platform, consumers have shifted the balance of power to their favor and set the stage for Drucker’s concept of customer centricity to play a leading role. Although Amazon and others have demonstrated the power of customer centricity to produce stunning financial success, the concept of customer centricity remains less well understood. In Rota de Valor – O Poder da Centralidade no Cliente, João Torneiro provides an important and most useful guide to understand and employ the concept of customer centricity. Based on solid theory, Rota de Valor goes further to offer the lessons of experience and the outcomes of vigorous debate.

The organization of the book reflects the transformation of marketing since the digital revolution. The book opens by exploring the transformation of marketing and the field’s evolution. For many people, marketing remains equated with advertising, which was largely

true for decades. But Rota de Valor reveals that the concept of customer centricity is much more. Customers are central to the success of the enterprise. Understanding, attracting and retaining customers is essential for a firm’s survival. Within the customer-centric organization, the heart is collaboration. In the past, functional differences created friction, slowed responses to buyers and left firms vulnerable to competitors and innovation. With a customer-centric approach, cooperation emerges, which enables firms to be responsive and meet customer needs better, faster and at lower cost.

If customers are essential to the firm’s survival and its success, the value proposition is essential to attract and retain customers. Rota de Valor describes the essential role of the value proposition to the customer-centric firm. Creating and delivering a compelling value proposition is, to paraphrase Drucker, the responsibility of everyone in the organization. More than just the alignment of different functions, doing so requires, as Rota de Valor articulates so well, embedding this responsibility in the culture of the company. Although company culture is often overlooked, it is among the most powerful sources of competitive advantage for customer-centric companies. In a world where firms can easily access customers and understand their needs, what makes one firm more successful with consumers than another? As Rota de Valor recognizes, differences in firm culture enable firms to craft unique and more compelling offers to attract and retain buyers. A source of a unique value proposition is company culture. Customer centric companies understand how to link their culture with the needs of buyers to create competitive advantage.

Although customer centricity shifts the focus to outside of the firm to buyers, successful customer centricity is reflected inside the firm, too, in terms of organizational structure, performance metrics, and analytics. If collaboration remains the internal heart of customer centricity, the question is how should the company support that effort as an organization? Beyond the valuable principles Rota de Valor identifies, this is a very challenging area for customer centricity. Every organization develops a unique culture based on its history of successes and failures. Those lessons become encoded in people’s shared beliefs and values, and those shared beliefs and values shape the organizational structure, norms, and the firm’s culture. Successful customer-centric companies understand how to structure the organization to meet buyer needs and foster collaboration in a way that reflects the culture of the company and its shared values and beliefs. It is a challenging but essential task.

If Amazon and others have demonstrated the power of customer centricity, what does the future hold? If the past provides any insight into the future, the power shift towards customers will continue, aided by AI and customers’ desire for greater personalization. Buyers’ expectations will continue to rise, competition will continue to intensify, and technological change will continue to disrupt markets. In such a future, customer power will continue to rise, making Rota de Valor – O Poder da Centralidade no Cliente even more valuable.

NOTA PRÉVIA DO AUTOR

Antes de mais: os clientes estão mesmo no centro do seu negócio? Se, por hipótese, admitir retirá-los da equação, o que sobra na proposta de valor, na faturação e para os colaboradores? Se a resposta é “pouco ou nada”, então a centralidade no cliente é relevante para a sua organização e deve ser critério de gestão.

Na gestão de diferentes áreas de empresas, das vendas, ao marketing, às operações, à logística, à manutenção, à gestão de projetos, à tecnologia, ao planeamento e controlo, e à fabricação e outras, apliquei recorrentemente três perguntas simples: esta solução resolve um problema real do cliente? Reduz esforço? Aumenta confiança? Se não, estamos seguramente apenas a criar custo e risco. Foi com este filtro que escrevi este livro: perspetivar o entendimento e a responsabilização de toda a organização por um objetivo comum – gerar valor para o cliente de forma mensurável e recorrente!

Este livro nasce dessa prática. Da definição e implementação de uma estratégia de centralidade no cliente numa das maiores empresas portuguesas, de projetos de consultoria que me puseram lado a lado com equipas de setores distintos e de muitas horas de formação. O objetivo foi sempre o mesmo: ajudar as organizações a desenhar uma rota de valor sustentada num maior foco no cliente.

A abordagem não fica por modelos. Parte do que vivi no terreno, das lições retiradas dos casos e de debates francos com profissionais que testaram métodos e desafiaram pressupostos. O CC Loop®, o referencial que exploro ao longo do livro, condensa essas aprendizagens num ciclo prático para diagnosticar, priorizar, executar e medir impacto na experiência do cliente e nos resultados do negócio.

Cabe um agradecimento antecipado às centenas de participantes de programas para executivos, mestrados e licenciaturas com quem tive o privilégio de trabalhar. Muitos lideram hoje grandes corporações e PME de diferentes setores: banca, energia, seguros, retalho, turismo, imobiliário, cortiça, e outras indústrias. Na essência, foram as análises às realidades das suas empresas, a recetividade às metodologias e os resultados alcançados ao aplicarem o CC Loop® que me deram a confiança para trazer a público esta obra.

“Rota de Valor” significa o caminho disciplinado que liga o insight de cliente a resultados, alinhando estratégia, cultura, processos, dados e tecnologia, com métricas, validação e momentos de recalibração. É isso que encontrará nestas páginas: referenciais práticos, mapas de decisão, questões de diagnóstico, casos reais e guias de ação para que possa empreender na centralidade no cliente, e evoluir de forma sustentada.

Desejo, acima de tudo, que este livro espolete novas rotas de valor para líderes e equipas, inspirando decisões claras, prioridades difíceis e movimentos coordenados que liguem a missão aos processos, a promessa ao serviço prestado, a estratégia à operação, e a marca à experiência do dia a dia.

A relevância do tema está em crescimento. A digitalização e a inteligência artificial (IA), da analítica aumentada aos modelos generativos, estão a redefinir possibilidades e a elevar a fasquia das expectativas. O cliente do futuro será ainda mais exigente: quererá experiências simples, rápidas, personalizadas, éticas e consistentes em todos os canais. Dados e IA são meios, não o fim em si. A “bússola” continua a estar no cliente. Este livro mostra como integrar essas capacidades sem perder o essencial: confiança, propósito e valor percebido.

Este é um livro para usar. Sublinhe, anote, discuta com a sua equipa, adapte os modelos à sua realidade, e partilhe o que funcionar e as barreiras que possa encontrar no caminho. Quanto mais estas ideias forem experimentadas, mais depressa ganharemos todos: empresas, colaboradores, parceiros e, sobretudo, clientes.

Quero continuar esta conversa. Sendo consultor, orador e formador, aprendo diariamente novas formas de gerar valor e criar clientes mais satisfeitos.

Poderá sempre contactar-me através do e-mail: rotadevalor@filipetorneiro.pt

INTRODUÇÃO

Podemos dizer que os clientes não nascem todos iguais, uma vez que têm necessidades e expectativas diferentes. As empresas que mais rapidamente conseguirem perceber tal facto, que inovam e encontram as respostas adequadas a essas diferentes necessidades e às expectativas dos seus clientes, irão diferenciar-se e criar mais valor.

Com este livro, pretende-se registar o que se faz de melhor nesta Era do Cliente, com exemplos concretos e casos reais de empresas que se distinguem e se afirmam através de implementações bem-sucedidas baseadas na centralidade no cliente.

As empresas citadas ao longo do livro são algumas das que mais consensualmente se têm destacado por colocarem os clientes no centro das suas estratégias e operações, com resultados no que concerne aos níveis de satisfação dos seus clientes, de fidelização e de sucesso comercial. Esta amostra de boas práticas não pretende ser exaustiva e, como a paisagem empresarial é bastante dinâmica e está em constante mudança, admite-se que outras empresas podem estar a emergir como líderes na centralidade no cliente.

Para essa diferenciação, e para que se possam destacar nesta abordagem, mais do que comunicações e intenções perpetradas pelos responsáveis dessas empresas, considerou-se importante verificar as fontes e obter informações recentes, essencialmente quanto às concretizações, ao feedback dos clientes e aos resultados que essas empresas têm efetivamente obtido no mercado.

O objetivo central deste livro passa por conseguir que o leitor, independentemente da sua experiência e ligação direta a mercados ou a negócios, possa extrair uma maior consciência relativamente a ações que poderão ser aplicadas, baseadas num maior foco no cliente, e que resultem em novas fontes de criação de valor numa determinada organização. Para isso, é necessário estimular, ou até induzir, a transformação dessa organização para outro patamar de centralidade no cliente, através de melhores níveis de satisfação e de fidelização do cliente, tornando-o embaixador da marca. Para alcançar este objetivo, considera-se importante:

• Reforçar a consciência sobre o comportamento do cliente e as principais tendências;

• Perceber o novo papel do marketing na transformação das organizações;

• Desenvolver o conceito de “centralidade no cliente”, explorando em detalhe como se constrói este tipo de cultura, e fazer benchmarking com casos de referência mundial;

• Introduzir um referencial estratégico para um significado mais holístico da centralidade no cliente (CC Loop®);

• Refletir mais aprofundadamente sobre cada um dos pilares do CC Loop® e identificar boas práticas em Portugal, ao nível de cada um desses mesmos eixos de atuação.

Estes objetivos incentivam líderes e equipas a refletir sobre o seu papel em moldar estratégias verdadeiramente centradas no cliente, alinhadas com as transformações constantes no mercado.

Por esta razão, e por ser um manual abrangente que fornece os princípios e os alicerces estratégicos para as empresas se adaptarem às mudanças do mercado, desenvolverem relacionamentos duradouros com os clientes e garantirem um futuro mais próspero, espera-se que este livro possa interessar e ser uma leitura essencial para líderes e profissionais de negócios que se pretendam destacar na Era da Experiência do Cliente.

NOVOS COMPORTAMENTOS DE CONSUMIDORES E EMPRESAS

NUM MUNDO DE EXPECTATIVAS LÍQUIDAS

INTRODUÇÃO

As empresas que desejam criar estratégias de marketing eficazes e relevantes devem começar por compreender o comportamento do consumidor. Este é o ponto de partida para todas as ações orientadas para o cliente, desde a pesquisa de mercado até à criação de estratégias de comunicação e distribuição. Saber como os consumidores pensam, sentem e agem em relação aos produtos e serviços que utilizam permite não apenas atender às necessidades existentes mas também antecipar desejos futuros e criar propostas de valor mais significativas.

Considera-se, assim, que entender e antecipar o comportamento do consumidor é uma competência essencial para a competitividade das empresas, na medida em que esta compreensão pode aportar vários insights às organizações, nomeadamente sobre:

• Identificação de necessidades – ao observarem padrões de comportamento, as empresas podem mapear lacunas e identificar oportunidades para atender a necessidades não atendidas;

• Previsão de reações – conhecer os comportamentos e as preferências dos consumidores permite prever como irão responder a estratégias de marketing, ajustando as abordagens com maior probabilidade de sucesso;

• Segmentação de mercado – a análise comportamental possibilita a divisão do mercado em segmentos com base em características específicas, como atitudes, valores e hábitos de consumo, tornando as estratégias de marketing mais eficazes;

• Desenvolvimento de produtos e serviços – o conhecimento profundo sobre o consumidor facilita a criação de soluções mais alinhadas com as suas expectativas, aumentando a probabilidade de adoção;

• Decisões de preço e promoção – a perceção de valor dos consumidores, obtida a partir de análises comportamentais, permite definir preços e campanhas promocionais mais atrativos.

Num mundo em rápida transformação, esta abordagem baseia-se na necessidade tendencialmente mais relevante de as empresas estarem em sintonia com os consumidores, que têm vindo a evidenciar expectativas mais elevadas e uma cada vez menor tolerância a falhas.

1.1. AS TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS NO MERCADO

Desde o início do século xx, as dinâmicas do mercado evoluíram de forma significativa. Cada Era trouxe mudanças estruturais que moldaram as prioridades das empresas e os comportamentos dos consumidores:

• Era da Produção (1900-1960) – marcada pela produção em massa, a inovação estava centrada em processos de fabrico eficientes e produtos acessíveis. As empresas como a Ford revolucionaram o mercado com linhas de montagem e produtos, como o icónico Ford T;

• Era da Distribuição (1960-1990) – focada em cadeias logísticas e transporte global, permitiu que empresas como a Walmart se tornassem líderes ao garantir a eficiência na entrega de produtos;

• Era da Informação (1990-2010) – a digitalização e o domínio da informação deram poder às empresas que conseguiam processar grandes volumes de dados. Surgiram gigantes, como a Google e a Amazon, que redefiniram os modelos de negócio com base em dados e conectividade;

• Era do Cliente (2010-presente) – os consumidores, armados com informação e voz amplificada pelas redes sociais, tornaram-se os protagonistas do mercado. Exigem atenção personalizada, experiências memoráveis e soluções ágeis.

Nesta Era do Cliente, os consumidores são mais informados, exigentes e voláteis do que nunca. Este novo perfil apresenta desafios e oportunidades sem precedentes para as empresas, tais como:

MODELO CC LOOP®:

REFERENCIAL ESTRATÉGICO PARA

MAIOR COMPETITIVIDADE ATRAVÉS DA

CENTRALIDADE NO CLIENTE

INTRODUÇÃO

O cenário empresarial revela que, muitas vezes, a centralidade no cliente não é um compromisso coletivo. Em ações de formação de executivos, ao questionar quem nas empresas tem responsabilidade por vendas, marketing e cliente, as respostas que recebo nem sempre são claras e indicadoras de que todos os profissionais assumem a sua importância e responsabilidade pela dimensão de cliente. Surpreendentemente, muitos departamentos de pessoas (ou de recursos humanos) também não veem a responsabilidade pelo cliente como parte das suas responsabilidades. Por exemplo, nos processos de admissão e formação de pessoal de vendas, as habilidades técnicas podem, por vezes, ser mais enfatizadas em detrimento das competências de atendimento ao cliente. Essa desconexão evidencia a necessidade de uma mudança cultural que permeie todos os setores, destacando a centralidade no cliente como uma prioridade unificadora em toda a organização. Assim, é fundamental estabelecer um consenso quanto à responsabilidade partilhada, garantindo que cada colaborador entenda o seu papel no fortalecimento dos laços com o cliente e na procura contínua da sua satisfação.

A centralidade no cliente torna-se um compromisso coletivo e duradouro, refletindo-se na fidelização dos clientes e em resultados positivos para a empresa.

A concretização de uma cultura de centralidade no cliente é um processo desafiador que requer estratégia, vontade e determinação da liderança. A administração da empresa deve estabelecer uma visão clara e comunicá-la

Tabela 5.1 Comparação entre abordagens de centralidade no produto versus centralidade no cliente

Centralidade no produto

Centralidade no cliente

Filosofia

Orientação de negócio

Posicionamento (produto)

Estrutura organizacional

Vender produtos (vende-se para quem queira comprar)

Servir clientes (todas as decisões começam no cliente)

Orientação para a transação Orientação para a relação

Destacar as propriedades do produto e as suas vantagens

• Centros de resultados por produto

• Gestores e vendedores de produto

Destacar as vantagens do produto para satisfazer as necessidades do cliente

• Centros de resultados por segmentos de clientes

• Gestores de relação e vendedores por segmentos de clientes

Foco da organização

Métricas (de performance)

• Foco interno, desenvolvimento de novos produtos, novas contas, crescimento da quota de mercado

• Relações com cliente são tratadas pelo marketing

Número de novos produtos, rentabilidade por produto, quota de mercado por produto/submarcas

Critérios de gestão Portefólio de produtos

Abordagem comercial

A quantos clientes se consegue vender cada produto?

Conhecimento do cliente Os dados do cliente são um mecanismo de controlo

Adaptado de Shah et al. (2006).

• Foco externo, desenvolvimento de relações com clientes, rentabilidade através da fidelização dos clientes

• Colaboradores são promotores da marca

Share of wallet ou captura de valor dos clientes, satisfação dos clientes (por exemplo, NPS e CLV)

Portefólio de clientes

Quantos produtos se conseguem vender a cada cliente?

O conhecimento do cliente é um ativo valioso

5.3. DESAFIOS PARA ADOTAR UMA ABORDAGEM CENTRADA NO CLIENTE

De acordo com Shah et al. (2006), as organizações que desejam adotar uma abordagem centrada no cliente enfrentam, essencialmente, quatro desafios interligados: cultura organizacional; estrutura da organização; processos; e métricas de performance financeira. Analisemos cada um dos desafios per se.

estratégico e outro predominantemente operacional – que guiam a empresa num processo contínuo de evolução e maturidade em centralidade no cliente:

• Um ciclo estratégico, focado na avaliação da maturidade da organização, na definição da ambição e no compromisso para o futuro;

• Um ciclo operacional, que implementa ações práticas para transformar a CX e aumentar a fidelização.

Ambos são dinâmicos e recorrentes, promovendo um processo contínuo de adaptação e evolução. O CC Loop® é ajustável ao modelo de governo adotado pela organização e às equipas alocadas para o propósito de centralidade no cliente. Implica a permanente comunicação transversal na organização e uma partilha fluida da informação de cliente. É um modelo que induz e promove a ascendência para estágios de maturidade de centralidade no cliente progressivamente mais reforçados, num desígnio sucessivamente atualizado e realimentado.

Como a Figura 5.3 reflete, o modelo CC Loop® implica uma dinâmica permanente, baseando-se no conhecimento de cliente que gera e assentando em oito fases estruturadas, que orientam desde a definição estratégica até à operacionalização, promovendo uma visão integrada e prática. Cada fase desempenha um papel essencial, tal como seguidamente se descreve.

CC Loop®

Ambição estratégica & compromisso

Métricas & KPI

Analítica e conhecimento de cliente

Assessment & realimentação

Voz do cliente

Compromisso dos profissionais Proposta de valor (360º)

Jornadas do cliente

Figura 5.3 Referencial estratégico para a centralidade no cliente – Modelo CC Loop® Adaptado de Torneiro (2020).

A popularidade do NPS reflete a sua capacidade de alinhar organizações em torno de um objetivo claro: aumentar a lealdade e transformar clientes em embaixadores da marca, impulsionando o crescimento sustentável. Por isso, o NPS continua a ser amplamente adotado por empresas em todo o mundo como uma métrica essencial na centralidade no cliente.

O NPS reflete não só a satisfação mas também a lealdade e o potencial de crescimento de uma base de clientes. Conforme Patel (s.d.), um NPS elevado poderá ser correlacionado com maiores taxas de retenção e maior capacidade de atrair novos clientes através de recomendações.

Por exemplo, uma marca de tecnologia com um NPS elevado pode projetar um aumento no seu volume de vendas pelo facto de os clientes promotores recomendarem os seus produtos a amigos e familiares.

As empresas bem-sucedidas utilizam o NPS para identificar áreas de melhoria e desenvolver estratégias direcionadas.

A segmentação dos clientes com base no NPS permite, além da essencial identificação dos promotores e dos detratores da marca, desencadear outras ações mais específicas, do tipo: como converter detratores em promotores? Como reforçar a lealdade dos clientes passivos?

Um exemplo da aplicação estratégica do NPS pode ser encontrado no setor da restauração.

Exemplo prático

Consideremos que uma cadeia de restaurantes identifica, através de pesquisas regulares de NPS, que detratores mencionam frequentemente a lentidão no atendimento como a principal causa de insatisfação. A análise revela que o problema ocorre em horários de pico e em locais específicos, permitindo à empresa localizar os pontos críticos de melhoria.

Com base nesses insights, a empresa pode partir para o ajustamento dos recursos operacionais, reforçando as equipas nos horários mais movimentados e implementando quiosques digitais para pedidos, reduzindo filas e agilizando o atendimento. Além disso, comunica proativamente as mudanças aos clientes que deram feedback negativo, demonstrando o seu compromisso com a melhoria.

Após a implementação, a empresa continua a monitorizar o NPS para avaliar o impacto das mudanças. Os resultados poderão vir a evidenciar não apenas uma melhoria na satisfação mas também um aumento na frequência de visitas e no volume de recomendações por parte dos promotores. Este exemplo destaca como o NPS pode ser utilizado de forma estratégica para alinhar operações, melhorar a CX e impulsionar o desempenho financeiro.

O NPS pode ser utilizado em diferentes dimensões para oferecer insights mais abrangentes sobre a satisfação e lealdade dos clientes. Estas dimensões são:

• NPS transacional – mede a satisfação do cliente logo após uma interação ou transação específica, como uma compra, um atendimento ou uma entrega. Esta abordagem ajuda a identificar problemas imediatos e a agir rapidamente para os corrigir;

• NPS relacional – avalia a perceção global do cliente em relação à empresa, independentemente de interações recentes. Este tipo de NPS fornece uma visão geral da lealdade ao longo do tempo e é usado para monitorizar tendências de longo prazo;

• NPS benchmark – compara o desempenho da empresa com o de concorrentes ou com a média do setor. Este tipo de NPS é útil para posicionar a empresa no mercado e identificar áreas em que precisa de melhorar para superar os concorrentes.

Exemplo

Uma empresa de telecomunicações utiliza as três dimensões do NPS para obter uma visão completa da CX:

• NPS transacional – após cada contacto com o suporte técnico, os clientes recebem uma pesquisa para avaliar a sua satisfação com o atendimento. Um baixo NPS neste contexto pode revelar problemas como tempos de espera longos ou falta de resolução;

• NPS relacional – periodicamente, a empresa realiza pesquisas com os clientes para avaliar a sua perceção geral sobre a marca, independentemente de interações recentes. Este NPS reflete o nível de lealdade e satisfação global, permitindo identificar tendências e padrões no relacionamento;

Considera-se, assim, que a VoC só alcança o seu potencial máximo quando está integrada numa cultura organizacional que valoriza a escuta ativa. Para isso, é essencial investir em equipas dedicadas, promover lideranças comprometidas e alinhar a experiência dos colaboradores (EX) com a dos clientes. Quando bem implementada, esta integração melhora a CX, fortalece a cultura organizacional e impulsiona o sucesso da empresa no longo prazo.

ESTUDO DE CASO 1

SANTANDER: Elevar a voz do cliente para um novo patamar

A CX é, hoje, um dos fatores mais críticos para a competitividade no setor bancário, no qual a fidelização se tornou um desafio acrescido devido ao aumento da digitalização, ao crescimento das fintechs e às expectativas cada vez mais líquidas dos consumidores. O Santander Portugal tem sido um dos pioneiros na integração da VoC em tempo real, transformando feedback disperso em ações concretas que melhoram continuamente a experiência dos seus clientes.

Desde 2019, o banco vem investindo numa abordagem estruturalmente integrada de VoC, não apenas recolhendo dados mas garantindo que a informação é transformada em mudanças tangíveis na CX e na própria cultura organizacional. A sua estratégia centra-se na recolha sistemática e em tempo real de feedback em todos os canais, na análise aprofundada e na ativação interna das equipas para responder de forma ágil às necessidades dos clientes. Este compromisso com a VoC tem gerado resultados significativos, melhorando métricas como o NPS, reduzindo o churn e reforçando a lealdade do cliente.

A transformação da voz do cliente no Santander Portugal

A evolução do programa de VoC no Santander foi marcada por três fases distintas, refletindo uma maturidade crescente na forma como o feedback dos clientes é recolhido, analisado e utilizado para transformar a experiência.

1. Estruturação e medição inicial (de 2019 a 2020)

O primeiro grande desafio do Santander foi garantir que o feedback dos clientes era capturado de forma estruturada e centralizada. Para isso, implementou:

• NPS como métrica transversal, permitindo medir não apenas interações isoladas mas a relação geral do cliente com o banco;

• Automação da recolha de feedback, associando questionários de VoC a momentos-chave da jornada do cliente, como abertura de conta, pedidos de crédito ou interações em balcão;

• Expansão da medição da experiência para múltiplos pontos de contacto, eliminando a fragmentação da análise;

• Integração do NPS na cultura organizacional, incorporando-o como um Key Performance Indicator (KPI) relevante nas avaliações de desempenho e incentivos comerciais.

Esta primeira fase foi crucial para criar uma visão unificada da CX, permitindo identificar padrões e áreas prioritárias para intervenção.

2. Melhoria qualitativa e análise profunda (de 2021 a 2022)

Com uma base sólida de medição implementada, o banco avançou para uma análise mais detalhada e qualitativa do feedback dos clientes, destacando-se:

• Aprofundamento das análises NPS, utilizando verbatim para compreender melhor o que leva os clientes a promover ou a criticar o banco;

• Sessões periódicas com equipas de diferentes áreas, criando um fórum de trabalho conjunto para interpretar feedback e propor melhorias concretas;

• Identificação e atuação sobre pontos críticos, como tempos de espera nos balcões e necessidade de um atendimento mais personalizado em determinados serviços.

Este período reforçou a capacidade de traduzir insights em ações estratégicas, indo além das métricas para compreender verdadeiramente a perceção do cliente e promover melhorias estruturais.

3. Integração de feedback não estruturado e modelos preditivos (de 2023 a 2026)

O mais recente avanço do Santander passa pela integração de tecnologias avançadas para enriquecer a análise da VoC, a qual impacta diretamente nas seguintes dimensões:

os gestores a repensarem estratégias, ajustarem modelos de negócio e reinventarem a forma como interagem com os clientes.

O CC Loop® constitui uma ferramenta relevante para as empresas que pretendem acelerar a sua maturidade na centralidade no cliente. No entanto, à medida que o mundo evolui, novas abordagens e frameworks irão surgir, complementando as ferramentas atuais. O que sabemos hoje pode não ser suficiente amanhã. A CX continuará a ser um fator de diferenciação crítica. Mas, neste novo contexto, será que a tecnologia conseguirá substituir por completo o fator humano? Até que ponto as marcas conseguirão equilibrar automação e personalização sem perder a autenticidade? O futuro pertence às empresas que souberem colocar o cliente no centro da sua estratégia, integrando inovação, tecnologia e propósito. Aquelas que entenderem que a centralidade no cliente não é um destino mas uma jornada contínua.

O desafio está lançado. Quem estará preparado para sustentar uma rota de valor no futuro?

QUESTÕES PARA REFLEXÃO

• Quão relevante será para a sua organização fazer o exercício de procurar antecipar o futuro e projetar as exigências dos clientes nesse horizonte?

• Muitas questões se poderão perspetivar relativamente à evolução da centralidade no cliente. De que modos poderá a sua organização pensar o futuro para ganhar vantagem competitiva sustentável?

Duas breves questões (entre uma infinidade de outras) que o exercício de pensar o cliente do futuro pode induzir. O desafio está lançado. Saibamos colocar as questões mais relevantes que nos guiem pela rota de valor.

O cliente, esse fantasma que nos observa

De tempos a tempos, emerge um livro que não quer apenas ser lido, mas sim confrontado. Rota de Valor é um desses livros. Longe do habitual manual de gestão, recheado de lugares-comuns e gráficos que se esquecem antes da última página, este texto tem o desplante de propor que a centralidade no cliente seja mais do que uma frase emoldurada na parede da sala do Chief Executive Officer (CEO).

É preciso dizer: o cliente é um conceito perigoso. Tal como Deus ou o Mercado, é evocado a toda a hora, mas raramente compreendido. Há quem o adore, quem o tema e, mais frequentemente, quem o cite permanentemente para o ignorar logo se seguida. O livro de João Filipe Torneiro traz o cliente para o centro com um rigor que incomoda e com uma lucidez que desafia o leitor a pensar duas vezes antes de repetir os mantras empresariais.

Lembrei-me, ao longo da leitura deste livro, de Fernando Pessoa, não o poeta dos heterónimos, mas o autor de O Comércio e a Publicidade, esse pequeno tesouro onde se escreve: “O homem não compra coisas: compra as sensações que espera que elas lhe dão”. Torneiro, ainda que com outra linguagem e outro tempo, caminha por essa mesma vereda. Os seis pilares do CC Loop® não são apenas processos: são traduções organizacionais desse desejo de transformar sensações em valor.

Talvez não haja nada mais revolucionário do que exigir a uma empresa que cumpra aquilo que apregoa. Daí a importância deste livro: ele é, ao mesmo tempo, cartografia e espelho. Um mapa para os que ainda querem chegar a um destino relevante, e um reflexo para os que, no fundo, se limitam a girar em torno de si mesmos.

O que mais surpreende é a sua lucidez operativa: Torneiro conhece o terreno, fala da Amazon e do Continente com a mesma naturalidade, e mostra que o marketing pode ser mais do que sedução e vaidade. Pode ser sistema, disciplina e cultura. Pode, finalmente, deixar de ser o departamento das cores, das luzes e dos brilhos. O departamento em que o movimento é apenas a ilusão da ação.

Num tempo em que os consumidores mudam de humor mais rápido do que um tweet viraliza, esta Rota de Valor oferece um raro horizonte de coerência. E isso, no mundo da gestão, é quase literatura.

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