30 | Dossier sobre cuidados paliativos
“As sequelas desta imobilização são, assim, muitas vezes irreversíveis, tal como algumas das sequelas pelo Covid-19, nomeadamente as pulmonares e as cardíacas.”
um indivíduo. Envolve também o bem estar dos cuidadores que pelas mesmas razões cada vez mais são necessários porém, infelizmente, começam a escassear para tanta necessidade. O bem-estar destes últimos reflete-se no cuidar do doente com doença crónica. Em 2010 a European Association for Palliative Care (EAPC) acrescentou a esta definição a necessidade de envolver a comunidade no cuidar chamando a atenção de que estes cuidados devem ocorrer em vários contextos, isto é, não só no domicilio, mas também em instituições. Perante a evolução de uma doença cuja cura é cada vez mais longínqua ou mesmo inatingível, o sofrimento humano e a sua fragilidade podem assumir contornos maléficos para a saúde, quer no doente, quer na sua rede social que só podem ser mitigados com a ajuda de uma equipa multidisciplinar, com formação específica. Esta formação exige a aquisição de competências não só na área clínica, mas também no campo relacional, em que a humanização é essencial. Só assim é que os efeitos deletérios de qualquer doença ou ação podem ser minimizados. Abrem-se por isso, importantes desafios aos serviços de saúde e sociais, nomeadamente nos cuidados de saúde primários e cuidados paliativos que, devido à pandemia por Covid-19 se tornaram numa constante adaptação à medida que os conhecimentos sobre a situação vão surgindo. Assim três novos desafios foram acrescentados aos já existentes: mundo desconhecido, insegurança e necessidade de uma constante adaptação, para além do medo que é transversal a todo este processo. O doente com uma doença crónica incurável é um doente fragilizado, na maior parte das vezes idoso ou grande idoso, mais suscetível que outros a ser infetado com Covid-19, complicando a sua já precária situação. É um doente de risco, não só pela sua fragilidade física, mas também psíquica e social, agora agravada com a pandemia que o obriga a um isolamento social, e a menor mobilidade. Esta situação provoca angústia e medo, não só ao doente, mas também aos familiares cuidadores, causando insegu-
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rança e mal-estar que deve ser objeto de atenção das equipas de cuidados de saúde primária e de cuidados paliativos. Com as sucessivas surpresas que desde há cerca de um ano esta pandemia nos traz e com a limitação de respostas que os serviços de saúde podem ter, face ao surto epidémico/pandémico em que os doentes permanecem por longos períodos quer nos cuidados intensivos (ligados a ventilado- “(...) sabe-se que a maior res) quer em internamentos nas enfermarias, bem percentagem de doentes como a rápida acumulação de doentes nos hospi- internados nos cuidados tais, os cuidados de saúde primários começaram a intensivos por Covid-19 ser a alternativa/ complementaridade dos hospitais ou que morrem com este mantendo tanto quanto o possível os doentes Co- diagnóstico são idosos vid-19 no seu domicílio, em prejuízo da assistência portadores de várias ao doente crónico que assim se viu negligenciado e morbilidades.” angustiado, por, em caso de necessidade por outra razão que não o Covid-19, não saber exatamente a quem recorrer. Por outro lado, sabe-se que a maior percentagem de doentes internados nos cuidados intensivos por Covid-19 ou que morrem com este diagnóstico são idosos portadores de várias morbilidades. A imobilidade a que os doentes estão sujeitos e por tão longa duração podem causar um síndrome geriátrico conhecido como o síndrome de imobilidade que frequentemente conduz a outras doenças crónico-degenerativas e até à institucionalização do doente. As sequelas desta imobilização são, assim, muitas vezes irreversíveis, tal como algumas das sequelas pelo Covid-19, nomeadamente as pulmonares e as cardíacas. Estes doentes deverão assim, ser acompanhados por uma equipa multidisciplinar de cuidados paliativos cujo desafio passa agora também por uma formação relacionada com o Covid-19 e com a Síndrome pós Covid-19, hoje já reconhecido como existente. O internamento por Covid-19 é por si só, um acontecimento difícil de superar, que interrompe o quotidiano do doente, tendo este consciência (se estiver cognitivamente bem) da gravidade da doen-