Há Vida no Meu Bairro

Page 1


Lisboa Há Vida no Meu Bairro

FICHA TÉCNICA

Edição: Câmara Municipal de Lisboa

Título: Lisboa, Há Vida no Meu Bairro

- Encontro de Urbanismo 2024

Presidente: Carlos Moedas

Coordenação geral: Joana Almeida, Vereadora do Urbanismo

Coordenação executiva: Ana Marçal, Henrique Galado, Joana Almeida, Paulo Diogo, Pedro Pinto, Rita Seruya, Sandra Balau

Textos1: Helena Palma, Joana Almeida, Paulo Diogo, Paulo Pardelha, Pedro Dinis, Pedro Pinto

Créditos fotográficos: Câmara Municipal de Lisboa e imagens gentilmente cedidas para este fim, com autorização dos autores e direitos reservados

Design gráfico2: Manuela Gonçalves

Impressão: Imprensa Municipal

ISBN: 978-972-8877-20-0

Outubro 2025

1. Inclui também textos elaborados a partir das gravações do ciclo de conferências Encontro de Urbanismo – Há Vida no Meu Bairro (2024).

2. Conceito gráfico: Have a Nice Day, para o Município de Lisboa. Reedição 2025, baseada na publicação “5 Vales” Todos os direitos patrimoniais cedidos ao Município de Lisboa

CREDITS

Publisher: Lisbon City Council

Title: Lisbon, There Is Life in My Neighbourhood - Urban Planning Meeting 2024

President: Carlos Moedas

General Coordination: Joana Almeida, Councillor for Urbanism

Executive Coordination: Ana Marçal, Henrique Galado, Joana Almeida, Paulo Diogo, Pedro Pinto, Rita Seruya, Sandra Balau

Texts1: Helena Palma, Joana Almeida, Paulo Diogo, Paulo Pardelha, Pedro Dinis, Pedro Pinto

Photographic Credits: Lisbon City Council and images kindly provided for this purpose, with the authors’ permission and all rights reserved

Graphic Design2: Manuela Gonçalves

Printing: Municipal Press

ISBN: 978-972-8877-20-0

October 2025

1. It also includes texts prepared from recordings of the Urban Planning Meeting conference cycle – There is Life in My Neighbourhood (2024)

2. Graphic concept by Have a Nice Day, for the Municipality of Lisbon. 2025 re-edition, based on the publication 5 Valleys

All copyright and related rights assigned to the Municipality of Lisbon.

índice contents

P. 04

Estratégia

Strategy

P. 16

Lisboa, “Há Vida no Meu Bairro”!

Lisbon, There is Life in My Neighbourhood!

P. 48 Como implementar a Cidade dos 15 Minutos?

How to implement the 15-Minute City?

P. 72

Que mobilidade queremos no Bairro?

What kind of mobility do we want in the Neighbourhood?

P. 98

Cuidar do espaço público e dos espaços verdes do Bairro

Caring for public space and Neighbourhood green areas

P. 120

A importância do comércio e dos equipamentos de Bairro

The importance of local commerce and Neighbourhood facilities

P. 144

O que é uma cidade saudável? E um Bairro saudável?

What is a healthy city? And a healthy Neighbourhood?

A vida de Lisboa está no seus Bairros

The Life of Lisbon is in its Neighbourhoods

Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

Mayor of the city of Lisbon

A alma de Lisboa está nos seus bairros. Se procurarmos algo distintivo, único, na identidade de Lisboa, o que temos é aquele bairrismo tão autêntico e genuíno. Um bairrismo que vai desde os bairros históricos, carregados de tradições seculares, até aos bairros modernos, que a cidade viu nascer e constituírem-se como comunidades. Todos eles têm a sua vida, todos eles têm a sua própria dinâmica. Por isso é que Lisboa é uma grande capital europeia feita à escala humana.

The soul of Lisbon lies in its neighbourhoods. If we look for something distinctive – something truly unique in the city’s identity – it is that authentic and genuine community spirit, that deep sense of neighbourhood belonging. It stretches from the historic quarters, steeped in centuries of tradition, to the modern neighbourhoods that have emerged and grown into thriving communities. Each has its own life, its own rhythm. That is why Lisbon is a great European capital built on a human scale.

O programa “Há Vida no Meu Bairro” nasce exatamente desta essência de Lisboa. É uma parte fundamental da nossa estratégia municipal para devolver centralidade aos bairros, lado-a-lado com o investimento que estamos a fazer na reabilitação dos nossos bairros municipais, no desenvolvimento de um Estado Social Local com clínicas de proximidade, com os programas de habitação jovem que já estamos a concretizar nos nossos bairros históricos. É uma estratégia que, através do “Há Vida no meu Bairro”, passa por apostar na mobilidade, nos equipamentos de proximidade, no comércio local e na melhoria do espaço público. É uma estratégia que diz, claramente, que Lisboa se faz com a vitalidade dos seus bairros.

Faz-se da vitalidade dos seus bairros porque é precisamente nos pequenos detalhes que se constroem os grandes sonhos. Não podemos ser uma grande capital da inovação ou uma grande capital da cultura sem antes cuidar daquilo que parece mais pequeno e mais elementar: o dia-a-dia das pessoas e os seus vários problemas, que têm de ser resolvidos; problemas esses que tantas vezes se encontram nas ruas e nas praças do seu bairro. É precisamente essa a lógica deste projeto: resolver os problemas do dia-a-dia das pessoas.

Para isso é preciso ouvir e pensar. Este ciclo de conferências que publicamos aqui, reunindo académicos, técnicos, profissionais e cidadãos, é precisamente esse exercício de ouvir e pensar –porque a cidade faz-se nos seus pequenos detalhes com os contributos de todos. Afinal, os bairros têm vida pelas suas pessoas, e quem melhor para construir uma Lisboa de escala humana senão as suas pessoas? São também elas que nos falam aqui.

É com este espírito que apresento esta publicação, certo de que o futuro de Lisboa se escreve nas suas ruas, nas suas praças e nos seus bairros.

The “Há Vida no Meu Bairro” (There is Life in My Neighbourhood) programme was born precisely from this essence of Lisbon. It forms a fundamental part of our municipal strategy to restore centrality to neighbourhoods, alongside major investments in the rehabilitation of municipal housing areas, the development of a Local Social State with proximity health clinics, and the youth housing programmes we are already implementing in our historic districts. Through “Há Vida no Meu Bairro”, we are investing in mobility, local facilities, neighbourhood commerce, and the enhancement of public space. It is a strategy that clearly affirms that Lisbon’s vitality comes from the vitality of its neighbourhoods.

Lisbon is made from the life of its neighbourhoods because it is in the small details that the greatest dreams are built. We cannot be a great capital of innovation or a great capital of culture without first taking care of what seems smaller and more basic: people’s daily lives and the problems that must be solved – problems that are often found in the streets and squares of their own neighbourhood. This is precisely the logic of this project: to address people’s everyday challenges.

To do so, it is necessary to listen and to think. This cycle of conferences that we present here, uniting academics, professionals, technicians and citizens, is exactly that exercise – listening and thinking together, because the city is shaped through its details and through everyone’s contribution. After all, neighbourhoods have life because of their people –and who better to build a human-scale Lisbon than its citizens? It is their voices we hear in these pages.

It is in this spirit that I present this publication, certain that Lisbon’s future is written in its streets, its squares and its neighbourhoods.

A melhoria da qualidade de vida começa

no Bairro Improving quality of life begins in the Neighbourhood

Joana Almeida

Vereadora com o pelouro do Urbanismo

na Câmara Municipal de Lisboa

Councillor for Urban Planning at the Lisbon City Council

O programa “Há Vida no Meu Bairro” aplica à realidade de Lisboa o modelo da Cidade dos 15 Minutos, que defende uma cidade onde tudo o que é essencial – trabalhar, aprender, cuidar da saúde, praticar desporto, ter tempos de lazer e cultura e comprar bens essenciais – está ao alcance de uma curta caminhada ou deslocação em bicicleta. Com base neste conceito, o programa municipal identifica carências na oferta destes serviços de proximidade, planeia soluções e concretiza intervenções que tornem cada bairro mais completo e equilibrado, promovendo proximidade e bem-estar na vida quotidiana dos lisboetas.

Mais do que um exercício académico ou uma política setorial, “Há Vida no Meu Bairro” é um instrumento operativo de urbanismo de proximidade, que articula planeamento, espaço público, mobilidade, comércio local e participação cidadã. É um programa transversal, coordenado entre diferentes departamentos municipais e desenvolvido em diálogo com as Juntas de Freguesia e com a comunidade local. A sua implementação faz-se em duas escalas:

- Na escala da cidade (escala macro) é desenvolvida uma avaliação da oferta dos serviços de proximidade, necessária para a concretização de uma “Cidade dos 15 Minutos”;

- Na escala local (escala micro) são desenvolvidos projetos de intervenção no espaço público que promovem a melhoria das condições de circulação pedonal e a criação de espaços públicos mais confortáveis e seguros.

O objetivo é simples, mas transformador: garantir que os lisboetas possam viver melhor no lugar onde vivem, reduzindo deslocações desnecessárias e reforçando o sentido de comunidade, identidade e pertença.

The programme “Há Vida no Meu Bairro” (There is Life in My Neighbourhood) applies the 15-Minute City model to Lisbon’s reality, promoting a city where everything essential – work, education, healthcare, sport, leisure, culture, and everyday shopping – is within a short walk or cycle ride from home. Based on this concept, the municipal programme identifies gaps in the availability of these local services, plans solutions, and implements interventions to make each neighbourhood more complete and balanced, fostering proximity and well-being in the daily lives of Lisbon’s residents.

More than an academic exercise or a sectoral policy, “Há Vida no Meu Bairro” is an operational tool of proximity urbanism, interlinking planning, public space, mobility, local commerce, and civic participation. It is a cross-departmental initiative, coordinated among different municipal services and developed in dialogue with Parish Councils and local communities. Implementation takes place at two scales:

- At the city scale (macro scale), an assessment of the supply of proximity services is developed, which is necessary for the realization of a “15-Minute City”;

- At the local scale (micro scale), public space intervention projects are developed that promote the improvement of pedestrian circulation conditions and the creation of more comfortable and safer public spaces.

The aim is simple yet transformative: to enable Lisbon’s residents to live better where they already live, reducing unnecessary travel and strengthening the sense of community, identity, and belonging.

Para criar um espaço aberto de diálogo, sobre a Cidade dos 15 Minutos, os seus desafios e as suas oportunidades, a Câmara Municipal de Lisboa já tinha dedicado um Conselho de Cidadãos a este tema, onde dezenas de participantes discutiram durante dois fins-de-semana o que significava, para si, viver numa cidade de proximidade. Do processo resultaram propostas concretas em cinco áreas – educação, saúde, comércio e serviços, lazer (cultura, desporto, espaços verdes) e mobilidade – que estão agora a ser integradas no desenvolvimento do Programa “Há Vida no Meu Bairro”.

Agora neste Encontro de Urbanismo 2024, a Câmara Municipal de Lisboa promove um ciclo de seis sessões públicas, concebido como um percurso progressivo de pensamento e de construção coletiva. Cada sessão representa uma dimensão complementar desta visão da cidade à escala humana – da conceptualização à ação, da mobilidade à saúde urbana.

1. Lisboa, Há Vida no Meu Bairro!

To create an open space for dialogue on the 15-Minute City, its challenges and its opportunities, the Lisbon City Council had already dedicated one of its Citizens’ Councils on this topic, during which dozens of participants spent two weekends discussing what it means, for them, to live in a city of proximity. The process resulted in concrete proposals across five key areas – education, health, commerce and services, leisure (culture, sport, and green spaces), and mobility – which are now being integrated into the development of the “Há Vida no Meu Bairro” programme.

Now, through the Encontro de Urbanismo (Urban Planning Meeting) 2024, the City Council promotes a cycle of six public sessions, conceived as a progressive journey of collective thought and construction. Each session represents a complementary dimension of this vision of a human-scale city – from conceptualisation to action, from mobility to urban health.

1. Lisbon, There is Life in My Neighbourhood!

A sessão inaugural “Lisboa, Há Vida no Meu Bairro!” apresenta o programa e o contexto que o sustenta. É o momento de enquadrar o modelo da Cidade dos 15 Minutos e de mostrar como Lisboa reúne condições singulares para a sua aplicação: uma cidade de bairros com forte identidade, uma escala humana e uma cultura de proximidade enraizada no quotidiano. Esta primeira sessão marca o ponto de partida conceptual do ciclo e convida o público a pensar Lisboa como uma cidade de vizinhança e de escala humana.

The inaugural session, “Lisbon, There’s Life in My Neighbourhood!”, introduces the programme and the context that underpins it. It serves to frame the 15-Minute City model and to demonstrate how Lisbon possesses unique conditions for its implementation: a city of neighbourhoods with strong identity, a human scale, and a deeply rooted culture of proximity in everyday life.

This first session establishes the conceptual starting point of the cycle, inviting the public to reflect on Lisbon as a city of neighbourhoods and human scale.

2. Como implementar a Cidade dos 15 Minutos?

2. How to implement the 15-Minute City?

A segunda sessão coloca a questão central: como transformar um modelo teórico num instrumento concreto de planeamento e de gestão urbana? A Cidade dos 15 Minutos inspira cidades em todo o mundo, mas também suscita debates e críticas sobre a sua aplicabilidade, os riscos de uniformização e a necessidade de adaptação às especificidades locais.

Esta sessão funciona como um espaço de confronto de ideias – entre especialistas, decisores e cidadãos – em torno dos caminhos possíveis para transformar o conceito em ação.

The second session addresses the central question: how can a theoretical model be transformed into a practical tool for urban planning and management?

The 15-Minute City has inspired cities worldwide, yet it also sparks debate and criticism regarding its applicability, the risks of homogenisation, and the need for adaptation to local specificities.

This session serves as a space for the exchange of ideas – bringing together experts, policymakers, and citizens – to explore the possible paths for turning the concept into action.

de proximidade:

Funções urbanas
Programa Há Vida no Meu Bairro | © CML, Manuela Gonçalves Proximity Urban Functions: The “There is Life in My Neighbourhood” Programme | © CML, Manuela Gonçalves

3. Que mobilidade queremos no Bairro?

What kind of mobility do we want in the Neighbourhood?

A terceira sessão aborda a mobilidade de proximidade, um dos pilares fundamentais deste modelo. Caminhar, pedalar ou circular de forma segura são gestos que estruturam a vida urbana quotidiana e dependem de um espaço público bem desenhado, acessível e convidativo.

Nesta sessão discutem-se soluções concretas para promover modos ativos e sustentáveis de deslocação, reduzir a dependência do automóvel e garantir conforto e segurança a todos, incluindo crianças, idosos e pessoas com mobilidade reduzida. É também um momento de reflexão sobre a integração entre transporte público, redes pedonais e ciclovias, e sobre o papel da mobilidade na descarbonização e na transição energética.

Resumindo, trata-se de responder à pergunta: como nos podemos deslocar melhor dentro do nosso próprio bairro?

The third session explores neighbourhood-scale mobility, one of the core pillars of the model. Walking, cycling, or moving safely are everyday gestures that shape urban life and depend on a well-designed, accessible, and inviting public space.

This session focuses on practical solutions to promote active and sustainable modes of travel, reduce car dependency, and ensure comfort and safety for all, including children, older adults, and people with reduced mobility. It is also a moment to reflect on the integration between public transport, pedestrian networks, and cycle paths, and on the role of mobility in decarbonisation and the energy transition.

In short, it seeks to answer the question: How can we move better within our own neighbourhood?

4. Cuidar do espaço público e dos espaços verdes do Bairro

Caring for the Neighbourhood’s public and green spaces

A quarta sessão traz o debate para o palco da convivência urbana: o espaço público e os espaços verdes. Estes lugares são o suporte da vida comunitária e o reflexo do cuidado da cidade com os seus habitantes.

Pretende-se debater estratégias de requalificação e manutenção do espaço público, abordagens de desenho urbano e arborização, e formas de integrar a natureza no tecido construído. Falar de conforto térmico, de resiliência climática, de acessibilidade e de bem-estar.

Cuidar do espaço público é cuidar da saúde, da vivência coletiva no Bairro e da imagem da Cidade.

The fourth session brings the discussion to the heart of urban coexistence: public space and green areas. These places are the foundation of community life and reflect how the city cares for its inhabitants.

The aim is to discuss strategies for public space requalification and maintenance, approaches to urban design and tree planting, and ways of integrating nature into the built fabric. The session will also address thermal comfort, climate resilience, accessibility, and well-being.

To care for public space is to care for health, collective life in the neighbourhood, and the city’s image.

Vista do futuro jardim central, Martim Moniz (Lisboa) | © FC Arquitectura Paisagista
View of the future central garden, Martim Moniz (Lisbon) | © FC Arquitectura Paisagista

5. A importância do comércio de Bairro e dos equipamentos do Bairro

The importance of Neighbourhood commerce and facilities

A quinta sessão centra o olhar na vitalidade económica e social dos bairros. O comércio de proximidade e os equipamentos públicos – escolas, centros de saúde, bibliotecas, pavilhões, espaços culturais – são as âncoras da vida urbana. Garantem uma presença constante de pessoas nas ruas, gerando segurança, diversidade e identidade.

Pretende-se debater o papel do comércio local como estrutura de suporte à vida quotidiana e a importância de políticas municipais que o protejam face à pressão turística e à desertificação comercial.

Discutem-se também formas de valorizar os equipamentos públicos enquanto plataformas de encontro e coesão social, prolongando o seu uso para além das funções tradicionais.

The fifth session focuses on the economic and social vitality of neighbourhoods. Local commerce and public facilities – schools, health centres, libraries, sports halls, and cultural venues – are the anchors of urban life. They ensure a constant presence of people on the streets, generating safety, diversity, and a sense of identity.

The discussion aims to explore the role of local commerce as the backbone of everyday life and the importance of municipal policies that protect it from tourism pressure and commercial desertification.

It also examines ways to enhance public facilities as platforms for social interaction and cohesion, extending their use beyond traditional functions.

6.

O que é uma cidade saudável? E um Bairro saudável?

What is a healthy city? And a healthy Neighbourhood?

A sexta e última sessão encerra este ciclo com uma reflexão integradora sobre a saúde urbana. Parte da premissa de que a saúde é indissociável do ambiente físico e social em que vivemos, e que uma cidade saudável depende de ar limpo, mobilidade ativa, espaços verdes, habitação digna e laços de vizinhança sólidos.

Nesta sessão, o conceito de saúde urbana é abordado de forma abrangente, ligando sustentabilidade ambiental, inclusão social e bemestar coletivo. Discutem-se formas de medir a qualidade de vida urbana e de reforçar o papel das políticas públicas na promoção da saúde, entendida como uma dimensão essencial do planeamento urbano contemporâneo.

The sixth and final session concludes the series with an integrated reflection on urban health. It begins from the premise that health is inseparable from the physical and social environments in which we live, and that a healthy city depends on clean air, active mobility, green spaces, decent housing, and strong community bonds.

In this session, the concept of urban health is explored in a comprehensive and interconnected way, linking environmental sustainability, social inclusion, and collective well-being. The discussion addresses how to measure the quality of urban life and how public policy can strengthen health promotion as a core dimension of contemporary urban planning.

Áreas Urbanas Desfavorecidas e os ODS

Disadvantaged Urban Areas and the SDGs

Relações entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e os desafios nas áreas urbanas desfavorecidas.

Fonte: UN-Habitat, Relatório Mundial das Cidades 2020.

Links between specific Sustainable Development Goals and challenges in disadvantaged urban areas.

Source: UN-Habitat, World Cities Report 2020.

No seu conjunto, as seis sessões do Encontro de Urbanismo 2024 – “Lisboa, Há Vida no Meu Bairro” traçam um percurso coerente e inspirador: do conceito global da Cidade dos 15 Minutos à experiência concreta dos bairros de Lisboa; da reflexão estratégica à ação no terreno. Este ciclo de debates afirma-se como um verdadeiro laboratório de ideias e de práticas urbanas, onde académicos, técnicos, decisores e cidadãos partilham visões sobre o futuro da cidade.

A qualidade dos oradores e a profundidade das intervenções mostram que Lisboa tem uma comunidade técnica e científica capaz de pensar a cidade com rigor, sensibilidade e ambição.

Mais do que um encontro, é um processo coletivo de aprendizagem e partilha, onde se cruzam experiências locais e internacionais, boas práticas e desafios comuns. O Encontro de Urbanismo 2024 reforça a importância do debate público informado, do trabalho colaborativo e da construção de políticas urbanas integradas.

Deste ciclo, fica uma convicção clara: o futuro da cidade constrói-se através do diálogo e da proximidade. Discutir Lisboa a partir dos seus bairros é compreender que a qualidade de vida urbana depende da soma das vivências locais e da capacidade de transformar conhecimento em ação. O Encontro de 2024 deixa, assim, um legado de reflexão e inspiração para a cidade que queremos continuar a construir – mais próxima, humana e sustentável.

Taken as a whole, the six sessions of the Urbanism Conference 2024 – “Lisbon, There’s Life in My Neighbourhood” trace a coherent and inspiring path: from the global concept of the 15-Minute City to the concrete experience of Lisbon’s neighbourhoods; from strategic reflection to action on the ground. This cycle of debates stands out as a true laboratory of urban ideas and practices, where academics, professionals, decision-makers and citizens share their visions for the city’s future.

The quality of the speakers and the depth of the discussions demonstrate that Lisbon has a technical and scientific community capable of thinking about the city with rigour, sensitivity and ambition.

More than just a conference, it is a collective process of learning and exchange, bringing together local and international experiences, good practices and shared challenges. The Urbanism Conference 2024 reinforces the importance of informed public debate, collaborative work and the development of integrated urban policies.

From this cycle emerges a clear conviction: the city’s future is built through dialogue and proximity. To discuss Lisbon from the perspective of its neighbourhoods is to understand that urban quality of life depends on the sum of local experiences and the capacity to turn knowledge into action. The 2024 Conference thus leaves a legacy of reflection and inspiration for the city we wish to continue building – more connected, humane and sustainable.

Lisboa, Há Vida no Meu Bairro!

Lisbon, There is Life in My Neighbourhood!

09 de abril de 2024 09 April 2024

Moderador Moderator

Paulo Pardelha

Departamento de Planeamento Urbano, CML

Urban Planning Department, CML

Oradores Speakers

Joana Almeida

Vereadora de Urbanismo, CML

Councillour for Urban Planning, CML

Alfonso Vegara

Fundación Metropoli (Espanha)

Metropoli Foundation (Spain)

João Ferrão

Instituto de Ciências Sociais - Universidade de Lisboa Institute of Social Sciences – University of Lisbon

Coreto de Carnide (Lisboa) | © CML, Manuel Levita Bandstand in Carnide (Lisbon) | © CML, Manuel Levita

A cidade à escala do Bairro

The city at the Neighbourhood scale

Foi com o tema “Há vida no Meu Bairro” que o Centro de Informação Urbana de Lisboa deu início a um importante ciclo de conferências, cuja primeira sessão nos convidou a uma reflexão profunda sobre a alma da nossa cidade: os seus bairros.

Este debate é encarado, não como uma mera discussão teórica, mas como o cerne da nossa missão: construir uma Lisboa equilibrada e sustentável, feita de pessoas e para pessoas. E é nos bairros, onde a vida pulsa, que as comunidades se constroem e que a cidade verdadeiramente se revela.

Ao olharmos para a génese e evolução dos bairros de Lisboa, e das cidades em geral, percebemos um espelho da nossa própria história social. Inicialmente, as cidades eram aglomerados compactos, onde a vida, o trabalho e o comércio coexistiam num raio curto. Com a Revolução Industrial, assistimos ao nascimento de bairros que se organizavam em torno das fábricas, uma geografia urbana ditada pela chaminé e pelo relógio de ponto. A vida do bairro era, em muitos casos, uma extensão da vida laboral.

It was under the theme “There is Life in My Neighbourhood” that the Lisbon Urban Information Centre launched an important cycle of conferences, the first of which invited us to a profound reflection on the soul of our city – its neighbourhoods.

I cannot view this debate as a merely theoretical discussion, but rather as the core of our mission: to build a balanced and sustainable Lisbon, made of people and for people. It is in the neighbourhoods, where life truly pulses, that communities are built and that the city most authentically reveals itself.

When we look at the genesis and evolution of Lisbon’s neighbourhoods, and of cities in general, we see a mirror of our social history. In the beginning, cities were compact settlements, where life, work, and commerce coexisted within a short distance. With the Industrial Revolution, we witnessed the rise of neighbourhoods organised around factories – an urban geography shaped by chimneys and time clocks. In many cases, neighbourhood life was simply an extension of working life.

O século XX trouxe consigo uma nova revolução: a da mobilidade. O comboio, o elétrico e, posteriormente, o automóvel, permitiram um fenómeno então inédito – a dissociação entre o local de residência e o local de trabalho. Nasceram assim os bairros eminentemente residenciais, concebidos como refúgios tranquilos longe do bulício do centro, para onde se regressava após um dia de labor. Esta foi uma conquista de conforto, mas que, em muitos casos, esvaziou os bairros de vida diurna e criou cidades-dormitório, fragmentadas e dependentes de longos e cansativos movimentos pendulares.

The 20th century brought with it a new revolution – that of mobility. The arrival of the train, the tram, and later the automobile enabled a previously unseen phenomenon: the separation between home and workplace. Thus emerged the predominantly residential neighbourhoods, conceived as quiet refuges away from the bustle of the city centre, to which people would return after a day’s work. This was, in many ways, a conquest of comfort, yet in numerous cases it emptied neighbourhoods of daytime life, creating dormitory cities – fragmented urban fabrics, increasingly dependent on long and exhausting daily commutes.

Estação do Rossio, 1949 (Lisboa) | © Arquivo Fotográfico Municipal, A12556, Estúdio Mário Novais Rossio Station, 1949 (Lisbon) | © Lisbon Municipal Archive, A12556, Estúdio Mário Novais

Hoje, confrontamo-nos com os limites desse modelo. A crise climática, a pressão sobre os recursos e a perceção de que o bem-estar urbano passa pela qualidade de vida no quotidiano, exigem de nós uma nova visão. E é aqui que redescobrimos a sabedoria do passado, agora à luz dos desafios do futuro.

O que ambicionamos? Simples e profundamente transformador: que cada lisboeta possa encontrar no raio de um pequeno passeio, a pé ou de bicicleta, a partir da sua casa, tudo o que é essencial para a sua vida. O trabalho, o comércio local e os mercados frescos, a escola, o centro de saúde, a farmácia, o café, o restaurante, o cinema e, fundamentalmente, o jardim, o parque, o espaço de lazer e de convívio.

Esta não é uma visão utópica. É um caminho estratégico e concretizável. Continuar a promover nos instrumentos de ordenamento os usos mistos, requalificar o espaço público para privilegiar os modos suaves, fortalecer o comércio de proximidade, descentralizar equipamentos e serviços e concretizar habitação acessível. Significa, em última análise, “em cada bairro, uma cidade”. Uma cidade completa em escala humana, onde a diversidade de funções garante vitalidade, segurança e um sentido de comunidade.

A primeira conferência deste ciclo, que convidamos todos a (re)ver, lançou precisamente estas sementes de debate. Ouvimos especialistas, associações e cidadãos partilharem visões sobre como tornar os nossos bairros mais coesos, vibrantes e resilientes. Este é apenas o início de uma conversa que precisa de ser abraçada por todos – poder local, urbanistas, investidores e, acima de tudo, os moradores.

Today, we are confronted with the limits of that model. The climate crisis, the pressure on resources, and the growing awareness that urban well-being depends on everyday quality of life all demand a new vision from us. And it is here that we rediscover the wisdom of the past, now reinterpreted through the challenges of the future.

What do we aspire to? Something simple yet profoundly transformative: that every Lisbon resident may find, within the radius of a short walk or bike ride from home, everything essential to daily life – work, local shops and fresh markets, the school, health centre, pharmacy, café, restaurant, cinema, and, most importantly, the garden, park, and places for leisure and social life.

This is not a utopian vision – it is a strategic and achievable path. It means continuing to promote mixed uses in urban planning instruments, requalifying public space to prioritise active modes of mobility, strengthening local commerce, decentralising facilities and services, and ensuring the delivery of affordable housing. Ultimately, it means “a city within each neighbourhood” – a complete, human-scale city, where the diversity of functions ensures vitality, safety, and a sense of community.

The first conference of this cycle, which we invite everyone to (re)watch, sowed precisely these seeds of debate. We heard experts, associations, and citizens share their visions on how to make our neighbourhoods more cohesive, vibrant, and resilient. This is only the beginning of a conversation that must be embraced by all – local government, urban planners, investors, and, above all, residents.

Saberemos ser capazes? A história dos bairros de Lisboa, com a sua incrível capacidade de adaptação e reinvenção, dá-nos a resposta: sim.

Are we capable of achieving it? The history of Lisbon’s neighbourhoods, with their remarkable capacity for adaptation and reinvention, gives us the answer: yes.

Cabe-nos agora a tarefa de, com inteligência, sensibilidade e determinação, escrever o próximo capítulo. Um capítulo em que a vida no bairro seja, de facto, a verdadeira medida do sucesso de uma Lisboa equilibrada, sustentável e, acima de tudo, com alma.

It is now our task – with intelligence, sensitivity, and determination – to write the next chapter: a chapter in which life in the neighbourhood becomes the true measure of success for a balanced, sustainable, and, above all, soulful Lisbon.

Departamento de Planeamento Urbano, CML

Santos Populares, Alfama (Lisboa) | © CML, Ana Luísa Alvim Popular Saints Festivities, Alfama (Lisbon) | © CML, Ana Luísa Alvim

Lisboa, cidade de Bairros

Lisbon, city of Neighbourhoods

Joana Almeida inicia esta sessão introdutória, com a apresentação do programa “Há Vida no Meu Bairro”.

Este programa municipal nasce da vontade de devolver centralidade à escala humana e quotidiana da cidade – o bairro – enquanto espaço onde se vive, trabalha, estuda, pratica desporto, convive e faz compras a uma distância acessível a pé ou de bicicleta. É uma aplicação prática do conceito da “Cidade dos 15 Minutos”, adaptada à realidade de Lisboa, e representa um foco do planeamento urbano centrado na proximidade, na diversidade e na qualidade de vida.

A reflexão sobre o urbanismo de proximidade tem raízes profundas. No início do século XX, as primeiras preocupações urbanísticas centravam-se na segurança, salubridade e oferta de serviços públicos, num momento em que a introdução do automóvel alterou radicalmente a escala das cidades. Nos Estados Unidos, emergem as unidades de vizinhança de Clarence Perry, organizadas em torno de escolas e equipamentos, com redes viárias hierarquizadas e percursos pedonais.

Joana Almeida starts this introductory session, presenting the programme “Há Vida no Meu Bairro” (“There is Life in My Neighbourhood”).

This municipal programme is born out of the desire to restore centrality to the human and everyday scale of the city – the neighbourhood – as the space where people live, work, study, exercise, socialise, and shop within walking or cycling distance. It is a practical application of the “15-Minute City” concept, adapted to the reality of Lisbon, and represents an approach to urban planning centred on proximity, diversity, and quality of life.

The reflection on proximity-based urbanism has deep roots. At the beginning of the 20th century, the first urban planning concerns focused on safety, public health, and access to public services, at a time when the introduction of the automobile radically altered the scale of cities. In the United States, Clarence Perry’s neighbourhood units emerged, organised around schools and community facilities, with hierarchical road networks and pedestrian routes.

Em Lisboa, o Plano de Urbanização de Alvalade (Faria da Costa, 1945) materializou de forma exemplar essa lógica, estruturando o bairro em células habitacionais completas – com habitação, escola, comércio, serviços e espaços verdes – que permitiam uma vida quotidiana à escala do bairro.

In Lisbon, the Alvalade Urbanisation Plan (Faria da Costa, 1945) embodied this logic exemplarily, structuring the neighbourhood into complete residential units – with housing, schools, shops, services, and green spaces – that enabled everyday life to take place at the scale of the neighbourhood.

As 8 células urbanas do Plano de Urbanização de Alvalade

Fonte: António Carvalho, 2013, after Faria da Costa, 1945

The 8 neighbourhood units in the Alvalade Urbanisation Plan

neighbourhood Source: António Carvalho, 2013, after Faria da Costa, 1945

Décadas mais tarde, urbanistas como Jane Jacobs, Lewis Mumford, Patrick Geddes, Christopher Alexander ou Jan Gehl reforçaram a importância da vitalidade urbana, da mistura de usos e da caminhabilidade, como condições para cidades vivas e seguras.

Decades later, urban thinkers such as Jane Jacobs, Lewis Mumford, Patrick Geddes, Christopher Alexander, and Jan Gehl reinforced the importance of urban vitality, mixed uses, and walkability as essential conditions for vibrant and safe cities.

Jane Jacobs, The Death and Life of Great American Cities: The Failure of Town Planning, 1961 | © Pelican Books

Nos anos 1960 surge o conceito de crono-urbanismo (Hägerstrand), que introduz a dimensão do tempo nas deslocações urbanas, enquanto na Ásia dos anos 1970 se desenvolve a noção de “círculo de vida local”, antecipando a ideia de bairro como território completo.

Em 2016, Carlos Moreno sintetiza este percurso no conceito da “Ville du quart d’heure” – a “Cidade dos 15 Minutos” – hoje reconhecido internacionalmente como modelo de sustentabilidade urbana e coesão social: trazer atividades aos bairros, e não levar pessoas às atividades.

Lisboa, cidade historicamente feita de bairros, tem assim uma base sólida para implementar um modelo de proximidade urbana que assegure o acesso fácil às funções essenciais da vida quotidiana. É dessa ambição que nasce o programa “Há Vida no Meu Bairro”.

In the 1960s, the concept of chrono-urbanism (Hägerstrand) emerged, introducing the dimension of time into urban mobility, while in 1970s Asia the notion of the “local life circle” developed, anticipating the idea of the neighbourhood as a complete living territory.

In 2016, Carlos Moreno synthesised this evolution through the concept of the “Ville du quart d’heure” –the “15-Minute City” – now internationally recognised as a model of urban sustainability and social cohesion, promoting the idea of bringing activities to neighbourhoods rather than taking people to activities.

Lisbon, a city historically shaped by its neighbourhoods, therefore has a solid foundation on which to implement a model of urban proximity that ensures easy access to the essential functions of daily life. It is from this ambition that the “Há Vida no Meu Bairro” programme was born.

Comércio tradicional em Lisboa | © CML, Manuel Levita \ Street commerce in Lisbon | © CML, Manuel Levita

O programa assenta em três princípios estruturantes: Proximidade, Diversidade e Equilíbrio.

Lisboa é, por natureza, uma cidade de proximidade. Cada bairro tem uma identidade própria, marcada pela forma urbana, pela densidade, pelo comércio de rua e pela presença de equipamentos públicos.

A Proximidade é o primeiro princípio orientador: garantir que cada habitante encontra no seu bairro as funções urbanas essenciais – comércio e serviços, ensino, saúde, desporto, cultura e espaços verdes – a uma distância de uma caminhada confortável ou de uma curta deslocação em bicicleta.

Os princípios da Diversidade e Equilíbrio visam promover uma oferta equilibrada de habitação (social, acessível e livre), serviços e lazer, evitando tanto os bairros exclusivamente residenciais sem comércio como as zonas dominadas pelo turismo ou pela monofuncionalidade. A mistura de usos e a convivência intergeracional são condições para bairros vivos e sustentáveis.

Os Principais Objetivos são:

• Garantir a acessibilidade a pé de forma segura a equipamentos e serviços de proximidade;

• Melhorar a conexão entre as diferentes atividades e espaços urbanos, privilegiando as deslocações a pé;

• Promover acalmia de tráfego;

• Criar conforto térmico;

• Requalificar o espaço público;

• Promover o convívio entre moradores, aumentando o espaço de estar e encontro.

The programme is based on three core principles: Proximity, Diversity, and Balance.

Lisbon is, by nature, a city of proximity. Each neighbourhood has its own distinct identity, defined by its urban form, density, street commerce, and the presence of public facilities.

Proximity is the first guiding principle: ensuring that every resident can find the essential urban functions –commerce and services, education, healthcare, sport, culture, and green spaces – within a comfortable walking distance or a short bicycle ride.

The principles of Diversity and Balance aim to promote a well-distributed mix of housing (social, affordable, and market-rate), services, and leisure opportunities, avoiding both exclusively residential neighbourhoods without local commerce and areas dominated by tourism or single-use functions. The mix of uses and intergenerational coexistence are essential conditions for lively and sustainable neighbourhoods.

The Main Objectives are:

• To ensure safe pedestrian access to local facilities and services;

• To improve connections between different urban activities and spaces, prioritising walking;

• To promote traffic calming;

• To enhance thermal comfort;

• To requalify public space;

• To encourage social interaction among residents, expanding spaces for leisure and community gathering.

O programa atua em duas escalas:

ESCALA

MACRO – Diagnosticar e Planear.

Na escala da Cidade, o objetivo é conhecer e mapear o grau de cobertura das funções de proximidade, bem como a qualidade da rede pedonal e ciclável. Esta componente combina análise espacial, base de dados e investigação aplicada:

- Em colaboração com a Nova IMS (Information Management School), é desenvolvido um Dashboard interativo que permite visualizar, por freguesia e para cada função urbana, a percentagem de edifícios servidos a 5, 10 ou 15 minutos a pé ou de bicicleta.

The programme operates on two levels:

MACRO SCALE – Diagnosing and Planning

At the City scale, the objective is to understand and map the level of coverage of proximity functions, as well as the quality of the pedestrian and cycling network. This component combines spatial analysis, databases, and applied research:

In collaboration with Nova IMS (Information Management School), an interactive dashboard is developed to visualise, by parish and for each urban function, the percentage of buildings served within 5, 10 or 15 minutes on foot or by bicycle.

Funções urbanas de proximidade | © CML, David Vale \ Proximity urban functions | © CML, David Vale

Mapa da acessibilidade pedonal de Lisboa | David Vale - Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa / CML

Map of pedestrian accessibility to proximity urban functions | David Vale – Faculty of Architecture, University of Lisbon / CML

Acessível em \ Accessible at: https://www.lisboa.pt/temas/urbanismo/estudos-planos-e-programas/ programas/ha-vida-no-meu-bairro/diagnostico-da-cidade/ acessibilidade-pedonal

Avaliação das condições de acessibilidade pedonal de Lisboa - exemplos de fichas do diagnóstico de acesso pedonal às funções de proximidade nas freguesias de Marvila (mau desempenho) e Misericórdia (bom desempenho) | David Vale - Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa / CML

Assessment of pedestrian accessibility conditions in Lisbon – examples of diagnostic sheets on pedestrian access to proximity functions in the parishes of Marvila (poor performance) and Misericórdia (good performance) | David Vale – Faculty of Architecture, University of Lisbon / CML

- Em parceria com o CIAUD – Centro de Investigação em Arquitetura, Urbanismo e Design (Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa), desenvolve-se o mapeamento da rede pedonal de Lisboa, identificando descontinuidades e barreiras (passeios estreitos, desníveis, cruzamentos perigosos, ausência de continuidade).

Este trabalho permite definir bairros de intervenção prioritária para melhorar: as condições de circulação pedonal e ciclável; a oferta de equipamentos e serviços de proximidade; a qualidade e conforto do espaço público; e o apoio ao comércio local.

Trata-se, pela primeira vez, de dotar a Câmara Municipal de uma base técnica robusta para orientar políticas públicas de urbanismo de proximidade com base em dados e evidência espacial.

In partnership with CIAUD – Research Centre for Architecture, Urbanism and Design (Faculty of Architecture, University of Lisbon), a comprehensive mapping of Lisbon’s pedestrian network is carried out, identifying discontinuities and barriers (such as narrow pavements, level changes, dangerous crossings, and lack of continuity).

This work makes it possible to identify priority neighbourhoods for intervention in order to improve: pedestrian and cycling circulation conditions; the availability of local facilities and services; the quality and comfort of public space; and, support for local commerce.

For the first time, this approach equips Lisbon City Council with a robust technical foundation to guide public policies for proximity-based urbanism, grounded in data and spatial evidence.

Aplicativo “Lisboa dos 15 minutos”

Dashboard

“Lisboa dos 15 minutos” (15-minute Lisbon)

Acessível em \ Accessible at: https://www.lisboa.pt/temas/urbanismo/estudos-planos-e-programas/programas/ha-vida-no-meu-bairro/diagnostico-da-cidade/lisboa-dos-15-minutos

Aplicativo “Lisboa dos 15 minutos” \ Dashboard “Lisboa dos 15 minutos” (15-minute Lisbon)

ESCALA MICRO - Intervir no espaço público

À escala local, o programa concretiza-se em projetos-piloto de intervenção no espaço público, um em cada uma das 24 freguesias de Lisboa. Estes projetos resultam de coprodução com as Juntas de Freguesia, a partir de critérios claros de seleção:

- Valorização de largos e praças como espaços de convívio comunitário;

- Requalificação da envolvente de escolas e equipamentos públicos, criando zonas seguras de chegada e saída;

- Melhoria da envolvente do comércio de rua, reforçando a vivência urbana;

- Transformação de ruas centrais desconfortáveis ou perigosas, com prioridade ao peão e à mobilidade ativa.

Por fim, Joana Almeida volta à pergunta-chave: Como elevar a qualidade de vida nos nossos bairros? É este o desafio lançado nestas sessões do Encontro de Urbanismo 2024.

MICRO SCALE – Intervening in public space

At the local scale, the programme is implemented through pilot public space interventions, one in each of Lisbon’s 24 parishes. These projects are the result of co-production with the Parish Councils, based on clear selection criteria:

- Enhancement of squares and plazas as spaces for community interaction;

- Requalification of areas surrounding schools and public facilities, creating safe zones for arrival and departure;

- Improvement of the surroundings of local high street commerce, reinforcing urban life and neighbourhood vitality;

- Transformation of central streets that are uncomfortable or unsafe, giving priority to pedestrians and active mobility.

Finally, Joana Almeida returns to the guiding question: How can we enhance the quality of life in our neighbourhoods? This is the challenge driving the Encontro de Urbanismo 2024 (Urban Planning Meeting 2024).

“Há Vida no Meu Bairro” é, acima de tudo, um compromisso: transformar ideias em percursos seguros, tempos poupados e lugares de encontro que devolvam a Lisboa a sua melhor escala – a humana.

“Há Vida no Meu Bairro” (“There is Life in My Neighbourhood”) is, above all, a commitment – to transform ideas into safe routes, saved time, and shared spaces that restore Lisbon to its truest scale: the human scale.

Praça das Novas Nações (Lisboa) - Situação atual e resultado final | © CML, Departamento de Espaço Público

Praça das Novas Nações (Lisbon) – Current situation and final result | © CML, Department of Public Space

Da cidade metropolitana à cidade de proximidade

From the metropolitan city to the city of proximity

A valorização do bairro como célula vital da cidade encontra eco na perspetiva internacional trazida por Alfonso Vegara, que mostra como a regeneração local pode ganhar força quando articulada com corredores de inovação e com processos de transformação metropolitana.

The appreciation of the neighbourhood as the city’s vital cell find resonance in the international perspective brought by Alfonso Vegara, who demonstrates how local regeneration gains strength when connected to innovation corridors and metropolitan transformation processes.

MadridLife: as “Portas de Madrid”. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade”

© Metropoli, Alfonso Vegara

MadridLife: the “Gateways of Madrid”. Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity”

© Metropoli, Alfonso Vegara

O orador destaca a complexa estrutura territorial de Madrid, marcada por fortes desequilíbrios Norte–Sul. Com base em análises de isócronas – mapas que medem tempos de deslocação – demonstra como, em apenas 15 minutos, o centro da cidade conecta 3,4 milhões de pessoas, e em 45 minutos, cerca de 7 milhões. Essa acessibilidade é decisiva para o desenvolvimento económico e social. A articulação entre aeroporto, estações ferroviárias e rede metropolitana transforma Madrid num dos maiores laboratórios europeus de mobilidade. A cidade está agora a investir na integração das estações de alta velocidade com novos polos urbanos e tecnológicos, capazes de gerar vida e diversidade.

The speaker highlights the complex territorial structure of Madrid, marked by strong North–South imbalances. Based on isochrone analyses – maps that measure travel times – he demonstrates how, in just 15 minutes, Madrid’s city center connects 3.4 million people, and in 45 minutes, about 7 million. This level of accessibility is crucial for both economic and social development. The interconnection between the airport, railway stations, and metro network turns Madrid into one of Europe’s largest mobility laboratories. The city is now investing in the integration of high-speed train stations with new urban and technological hubs, designed to generate vitality and diversity.

MadridLife: BM30, o “grande anel urbano”. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade” | © Metropoli, Alfonso Vegara

MadridLife: BM30, the “Great Urban Ring”. Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity” | © Metropoli, Alfonso Vegara

Um dos eixos mais inspiradores da intervenção é a transformação das grandes vias urbanas. A M-30 e a M-40 – outrora vias rápidas que fragmentavam o território – estão a ser convertidas em boulevards verdes, devolvendo o espaço público aos cidadãos. Este processo de descarbonização e reconversão das infraestruturas lembra exemplos internacionais, como Boston ou São Francisco, que transformaram antigas autoestradas em corredores urbanos vivos.

Em Madrid, estas “Portas da Cidade” funcionam como novas centralidades, onde se combinam mobilidade sustentável, espaços verdes e vitalidade urbana.

MadridLife: Ecobulevar M-30. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade” | © Metropoli, Alfonso Vegara

Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity” | © Metropoli, Alfonso Vegara

One of the most inspiring aspects of his presentation was the transformation of major urban roads. The M-30 and M-40 – once high-speed ring roads that fragmented the territory – are being converted into green boulevards, returning public space to citizens. This process of decarbonization and infrastructure reconversion echoes international examples such as Boston and San Francisco, where former highways were turned into vibrant urban corridors.

In Madrid, these “City Gates” act as new centralities, combining sustainable mobility, green spaces, and urban vitality.

MadridLife: BM30, o “grande anel urbano”. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade” | © Metropoli, Alfonso Vegara

MadridLife: BM30, the “Great Urban Ring”. Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity” | © AMetropoli, lfonso Vegara

Da visão metropolitana para a cidade de proximidade, e seguindo o conceito da “Cidade dos 15 Minutos”, o orador apresenta os “corações de bairro” como núcleos de proximidade.

A regeneração de distritos com arquitetura homogénea dos anos 60 e 70, a introdução de espaços públicos de qualidade, a mistura de usos e a presença de verde urbano são elementos centrais desta nova abordagem. Mesmo as antigas zonas industriais estão a ser reinventadas, acolhendo habitação, cultura e novas formas de trabalho. Assim, Madrid caminha para uma cidade mais policêntrica, equilibrada e saudável – uma cidade de bairros ativos e interligados.

From the metropolitan vision to the city of proximity, and following the concept of the “15-Minute City,” the speaker presents the idea of “neighbourhood hearts” as cores of proximity.

The regeneration of districts with the homogeneous architecture of the 1960s and 1970s, the introduction of high-quality public spaces, the mix of uses, and the presence of urban greenery are central elements of this new approach. Even former industrial areas are being reinvented, now hosting housing, culture, and new forms of work. In this way, Madrid is evolving into a more polycentric, balanced, and healthy city – a city of active and interconnected neighbourhoods.

MadridLife: Células de Vida Urbana. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade”

© Metropoli, Alfonso Vegara

MadridLife: Urban Life Cells. Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity”

© Metropoli, Alfonso Vegara

Na parte final, o orador reforça a importância de integrar esta visão à escala metropolitana, estabelecendo pontes entre Madrid e Lisboa. Reconhece na capital portuguesa um exemplo europeu de sensibilidade urbana, capaz de conjugar paisagem, tecnologia e qualidade de vida. Propõe que ambas as cidades aprofundem o diálogo e a cooperação – partilhando estratégias de descarbonização, regeneração urbana e mobilidade sustentável. Essa colaboração, conclui, é o caminho para construir uma nova geração de cidades mediterrânicas: humanas, resilientes e abertas ao futuro.

In the final part, the speaker emphasises the importance of integrating this vision at the metropolitan scale, establishing bridges between Madrid and Lisbon. He recognizes in the Portuguese capital a European example of urban sensitivity, capable of combining landscape, technology, and quality of life. He proposes that both cities deepen their dialogue and cooperation, sharing strategies for decarbonization, urban regeneration, and sustainable mobility. Such collaboration, he concludes, represents the path toward building a new generation of Mediterranean cities – human, resilient, and open to the future.

MadridLife: Células de Vida Urbana: exemplos internacionais. Imagens cedidas pelo orador no âmbito da apresentação: “Da cidade metropolitana à cidade de proximidade” | © Metropoli, Alfonso Vegara
MadridLife: Urban Life Cells: international examples. Images provided by the speaker as part of the presentation: “From the Metropolitan City to the City of Proximity” | © Metropoli, Alfonso Vegara

Cidade com Bairros: proximidade circulação

convivialidade City of Neighbourhoods: proximity circulation conviviality

Da escala internacional apresentada por Alfonso Vegara, seguimos caminho para a reflexão crítica de João Ferrão, que sublinha a necessidade de articular a cidade da proximidade com a cidade da circulação, lembrando que Lisboa é feita de bairros vivos mas também de fluxos que os interligam. Para esse efeito, o orador estrutura a sua reflexão em 7 pontos:

From the international scale presented by Alfonso Vegara, the session moves toward the critical reflection of João Ferrão, who emphasises the need to connect the city of proximity with the city of circulation, reminding that Lisbon is made up not only of living neighbourhoods but also of the flows that interlink them.

To that end, the speaker structures his reflection into seven key points:

1. Visão sistémica – articular proximidade e circulação

A história do urbanismo oscila entre “cidade da circulação” e “cidade da proximidade”. Hoje, a novidade é combinar ambas. Não há proximidade sem circulação: a primeira qualifica o quotidiano; a segunda liga bairros, pessoas, ecossistemas e funções de hierarquia superior. Essa combinação, hoje, é a novidade estratégica que permite imaginar outro funcionamento urbano, coeso, eficiente e humano, onde cada bairro se liga ao todo.

João Ferrão prefere a “cidade com bairros” à “cidade de bairros”: evita o paroquialismo e assume uma malha plural integrada.

1. A systemic vision – connecting proximity and circulation

The history of urbanism has long oscillated between the “city of circulation” and the “city of proximity.” Today’s innovation lies in combining the two. There is no proximity without circulation: proximity defines everyday life; circulation connects neighbourhoods, people, ecosystems, and higher-order functions. This combination is the new strategic paradigm, enabling us to imagine a different kind of urban system – cohesive, efficient, and human – where each neighbourhood is part of an interconnected whole.

João Ferrão favors the idea of a “city with neighbourhoods” rather than a “city of neighbourhoods”: it avoids parochialism and embraces an integrated, plural fabric.

Cidade da Circulação: mobilidade à escala metropolitana City of Circulation: Mobility at the Metropolitan Scale
Cidade da Proximidade: a qualidade de vida em cada bairro. Parque Ribeirinho Oriental (Lisboa) | © CML, Américo Simas City of Proximity: Quality of Life in Every Neighbourhood. Riverside Park (Lisbon) | © CML, Américo Simas

2. O que é cidade hoje – sistemas de vida humanos e não humanos

A cidade, hoje, deve ser entendida como um sistema de sistemas de vida, humanos e não humanos. É necessário articular o sistema azul (a água), o sistema verde (a natureza), o sistema cinzento (construído) e a mobilidade suave. Se desenhássemos de raiz, começaríamos por articular estes sistemas, e só depois as redes viárias.

Mais do que “cidade saudável”, João Ferrão propõe a cidade convivial, capaz de criar condições de coexistência entre pessoas e ecossistemas, promovendo o equilíbrio, a diversidade e a convivência ativa.

2. What a city is today – systems of human and non-human life

Today, the city must be understood as a system of systems of life, both human and non-human. It is essential to interconnect the blue system (water), the green system (nature), the grey system (built environment), and active mobility networks. If we were to design a city from scratch, we would begin by articulating these systems – only later would we draw the road network.

More than a “healthy city”, João Ferrão proposes the idea of a convivial city – one that creates conditions for the coexistence of people and ecosystems, fostering balance, diversity, and active coexistence.

3. Novo conceito de acesso – físico + digital Durante décadas, acesso significava deslocação física: ir à escola, ao trabalho, ao comércio. Hoje, essa ideia evoluiu. Vivemos num mundo simultaneamente físico e digital, onde o acesso também ocorre através da conetividade. Surge o desafio da “figitalização” (termo feio, mas real): comércio, serviços e cultura combinam fruição física e digital. A proximidade passa a trabalhar uma tríade: mobilidade, proximidade e conetividade digital. Programas como os “bairros comerciais digitais” mostram esse caminho, potenciando o tecido local.

3. A new concept of access – physical + digital

For decades, access meant physical movement: going to school, to work, to the shops. Today, that meaning has evolved. We live in a simultaneously physical and digital world, where access also takes place through connectivity. This brings the challenge of “phygitalisation” (an ugly word, but a real phenomenon): commerce, services, and culture now combine physical presence with digital experience. Proximity, therefore, operates through a triad of mobility, physical closeness, and digital connectivity. Initiatives such as digital commercial districts illustrate this path, strengthening local economies while linking them to wider networks.

Campos de Street Basket, Parque das Nações (Lisboa) | © CML, Manuel Levita Street basketball courts, Parque das Nações (Lisbon) | © CML, Manuel Levita

4. Novo conceito de proximidade

Durante muito tempo, a proximidade mediu-se em metros ou minutos. Hoje, percebemos que é mais do que isso: é também proximidade social e cultural.

As cidades, e Lisboa em particular, tornaram-se mais diversas, com múltiplas nacionalidades e modos de vida. Estar “perto” não é apenas fisicamente, é também reduzir distâncias simbólicas entre grupos socioeconómicos, etários e nacionais. Os bairros devem ser espaços conviviais, onde gerações, culturas e até sistemas humanos e não humanos se cruzam, partilham e aprendem a viver juntos num quotidiano urbano inclusivo.

4. A new concept of proximity

For a long time, proximity was measured in metres or minutes. Today, we understand it is much more than that – it also means social and cultural proximity. Cities – and Lisbon in particular – have become increasingly diverse, shaped by multiple nationalities and ways of life. Being “close” is not only physical; it is also about bridging symbolic distances between different socioeconomic, generational, and cultural groups. Neighbourhoods must therefore become convivial spaces, where generations, cultures, and even human and non-human systems intersect, share, and learn to live together within an inclusive urban everyday life.

5. Finalidade do acesso

A quinta diferença diz respeito à finalidade do acesso. Durante muito tempo, pensámos o acesso como deslocação até um destino: a escola, o centro de saúde, o jardim. Hoje, precisamos ampliá-lo – não se trata apenas de chegar, mas de aceder a oportunidades. A proximidade não é apenas conveniência, é um motor de inclusão, saúde e coesão social.

Exemplos como as hortas urbanas mostram esse potencial – espaços que unem produção, aprendizagem e convivência, criando novas possibilidades de vida individual, familiar e coletiva dentro do tecido urbano.

5. The purpose of access

The fifth shift concerns the purpose of access. For a long time, access was understood simply as movement toward a destination – the school, the health centre, the park. Today, the concept must expand: it is not only about reaching a place but about reaching opportunities.

Proximity, therefore, is not mere convenience – it is a driver of inclusion, health, and social cohesion. Examples such as urban gardens reveal this potential: spaces that combine production, learning, and community interaction, creating new opportunities for individual, family, and collective life within the urban fabric.

Parque Hortícola do Casal Vistoso (Lisboa) | © CML, Carlos Morais Silva \ Casal Vistoso Horticultural Park (Lisbon) | © CML, Carlos Morais Silva

6. Diversidade de bairros – universais, específicos e multifuncionais.

Não existe uma cidade homogénea, mas várias “Lisboas” com realidades distintas.

As funções de proximidade devem, por isso, ser adaptadas a cada contexto. Num bairro envelhecido, uma universidade sénior é essencial; noutro, com 60% de população estrangeira, são prioritários os serviços de mediação, tradução e apoio social.

Planear a cidade implica reconhecer estas diferenças e criar equipamentos específicos e multifuncionais que promovam convivialidade, otimizem recursos, respondam às necessidades reais e acompanhem os ciclos de vida de cada território.

6. Diversity of neighbourhoods – universal, specific, and multifunctional

There is no single, homogeneous city, but rather many “Lisbon(s)”, each with its own realities.

Functions of proximity must therefore be adapted to context. In an ageing neighbourhood, a senior university may be essential; in another, where 60% of residents are foreign, mediation, translation, and social support services become priorities.

Planning the city means acknowledging these differences and creating specific yet multifunctional facilities that foster conviviality, optimise resources, respond to real needs, and accompany the life cycles of each territory.

7. A “armadilha do bairro”

A ideia de bairro é inspiradora, mas não pode ser tomada de forma rígida. Os bairros não têm fronteiras fixas nem identidades únicas – definem-se pela convivialidade, não pelo mito da homogeneidade.

Há “bairros” e “não-bairros”, zonas de transição e polos de vida que ultrapassam qualquer mapa administrativo. Planeá-los exige prudência e visão sistémica.

O segredo está em começar bem: com ações locais exemplares, colaborativas e de curto prazo, capazes de gerar confiança e transformar boas ideias em realidade urbana.

7. The “neighbourhood trap”

The idea of the neighbourhood is inspiring, but it cannot be taken too rigidly. Neighbourhoods have no fixed borders or single identities – they are defined by conviviality, not by the myth of homogeneity. There are neighbourhoods and non-neighbourhoods, transitional areas and hubs of life that transcend administrative maps. Planning them requires prudence and a systemic outlook.

The key, João Ferrão argues, is to start well: with exemplary, collaborative, short-term local actions that build trust and turn good ideas into tangible urban reality.

Por fim, João Ferrão conclui a sua intervenção, realçando que o programa “Há Vida no Meu Bairro” começa bem: prudente, colaborativo e focado no tangível.

O desafio é não perder a visão sistémica – aproximar pessoas, natureza e funções urbanas; unir proximidade, circulação e conetividade; e transformar o acesso em oportunidade. Assim, construiremos, de facto, uma cidade com bairros, escapando à “armadilha dos bairros” e reforçando a convivialidade que dá futuro a Lisboa.

Finally, João Ferrão concludes his intervention by emphasising that the “Há Vida no Meu Bairro” programme starts in the right way: prudent, collaborative, and focused on the tangible.

The challenge now is to preserve a systemic vision – to bring people, nature, and urban functions closer together; to unite proximity, circulation, and connectivity; and to transform access into opportunity. In doing so, he argued, we can truly build a city with neighbourhoods, avoid the “neighbourhood trap”, and strengthen the conviviality that gives Lisbon its future.

Ruas pedonais em Alfama; Esplanada em Arroios; Ciclovia em Entrecampos; Jardim da Parada em Campo de Ourique | © CML Pedestrian streets in Alfama; outdoor café in Arroios; cycle lane in Entrecampos; Jardim da Parada in Campo de Ourique | © CML

Como implementar a Cidade dos 15 Minutos?

How to implement the 15-Minute City?

09 de abril de 2024 09 April 2024

Moderador Moderator

Pedro Pinto

Assessor na CML

Advisor, Lisbon City Council

Oradores Speakers

Elisabete Tomaz

Dinamia CET, ISCTE

José Carlos Mota

Universidade de Aveiro

University of Aveiro

João Rodrigues Pena

Participante no 20 Conselho de Cidadãos de Lisboa

Participant in the 2nd Lisbon Citizens’ Council

Jardim Dom Luís junto ao Mercado da Ribeira (Lisboa) | © CML, Manuel Levita Dom Luís Square next to the Ribeira Market (Lisbon) | © CML, Manuel Levita

A Cidade dos 15 Minutos: da teoria à prática The 15-Minute City: from theory to practice

O conceito de cidade da proximidade, tantas vezes associado à expressão “Cidade dos 15 Minutos”, tornou-se uma referência incontornável no debate internacional sobre urbanismo. É difícil encontrar hoje quem não reconheça a sua pertinência: garantir que cada habitante dispõe, a curta distância da sua residência, de serviços, equipamentos, comércio, espaços verdes e oportunidades de trabalho é, sem dúvida, um objetivo mobilizador e um ideal de qualidade de vida.

A proximidade devolve tempo às pessoas, promove saúde, estimula o convívio comunitário, fortalece a economia local e reduz a dependência do automóvel.

No entanto, se o conceito parece quase universalmente aceite como desejável, a sua implementação no terreno revela-se um desafio de enorme complexidade. A Cidade dos 15 Minutos não é um modelo fechado mas sim uma orientação que exige tradução concreta em contextos muito diversos. Cada bairro, cada freguesia, cada cidade possui características históricas, sociais e espaciais próprias que condicionam as possibilidades e os limites da aplicação prática deste paradigma.

The concept of the city of proximity, so often associated with the idea of the “15-Minute City”, has become an essential reference point in international urban planning debates. It is difficult nowadays to find anyone who does not recognise its relevance: ensuring that every resident has access, within a short distance of their home, to services, facilities, shops, green spaces and job opportunities is undoubtedly a compelling goal and a genuine ideal of quality of life.

Proximity gives people back their time, promotes health, encourages community interaction, strengthens the local economy and reduces car dependency.

Yet while the concept seems almost universally accepted as desirable, its implementation on the ground proves to be highly complex. The 15-Minute City is not a fixed model but rather a guiding framework that must be translated into practical measures within widely differing contexts. Each neighbourhood, parish and city has its own historical, social and spatial characteristics that shape both the possibilities and the limitations of putting this paradigm into practice.

Em Lisboa, este debate cruza-se inevitavelmente com a nossa história urbana. Somos uma cidade de bairros, com forte identidade e dinâmicas locais próprias, mas também uma metrópole que integra fluxos regionais, nacionais e internacionais. O que funciona num bairro histórico da Baixa pode não ter correspondência imediata num território de expansão recente na Alta de Lisboa. O que é válido para zonas densas, com comércio de rua consolidado, não se aplica da mesma forma a áreas marcadas por urbanizações dispersas ou por fortes descontinuidades urbanas.

In Lisbon, this debate inevitably intersects with the city’s urban history. Ours is a city of neighbourhoods, each with a strong identity and distinctive local dynamics, but also a metropolis that connects to wider regional, national and international flows. What works in a historic neighbourhood in the Baixa may not translate directly to a more recently developed area in Alta de Lisboa. What holds true for dense districts with well-established street commerce does not apply in the same way to areas characterised by scattered housing developments or sharp urban discontinuities.

Vale de Santo António (Lisboa) - Situação atual e simulação de ocupação final | © Lisboa SRU 18|25
Vale de Santo António (Lisbon) – Current situation and simulated final layout | © Lisboa SRU 18|25

É neste cruzamento entre ideal e realidade que surgem os maiores desafios de implementação.

O primeiro é de natureza espacial: como reorganizar uma cidade que cresceu, durante décadas, assente na lógica da distância e no domínio do automóvel? As ciclovias, os super quarteirões ou as ruas escolares são passos importantes, mas ainda insuficientes para inverter um modelo sedimentado na vida quotidiana de milhares de famílias.

O segundo desafio é de governação. A Cidade dos 15 Minutos não se constrói apenas com decisões centralizadas. Requer a colaboração entre Câmara Municipal, juntas de freguesia, associações locais, escolas, empresas e cidadãos. Implica processos participativos exigentes, onde a proximidade não é apenas espacial, mas também democrática.

O terceiro desafio é de equidade. Se não for acompanhada de políticas de habitação acessível e de combate à gentrificação, a proximidade pode tornar-se um privilégio para alguns, em vez de um direito para todos. Há o risco real de se criarem bairros altamente qualificados, com todos os serviços a curta distância, enquanto outros permanecem desprovidos, perpetuando desigualdades.

Por fim, há o desafio da adaptação cultural. A Cidade dos 15 Minutos implica mudanças de hábitos quotidianos: deixar o carro em casa, privilegiar a deslocação a pé ou de bicicleta, valorizar o comércio local, utilizar o espaço público de forma mais intensa. Nenhum destes comportamentos se impõe por decreto. Exigem tempo, sensibilização e resultados visíveis que convençam os cidadãos de que a proximidade melhora efetivamente a sua vida.

It is at this intersection between ideal and reality that the greatest implementation challenges arise.

The first is spatial: how can we reorganise a city that, for decades, developed around the logic of distance and car dominance? Cycle lanes, superblocks and school streets are important steps forward, but they are still not enough to overturn a model that has become embedded in the daily lives of thousands of families.

The second challenge is one of governance. The 15-Minute City cannot be built through top-down decisions alone. It requires collaboration between the City Council, parish councils, local associations, schools, businesses and citizens. It involves demanding participatory processes, where proximity is not only spatial but also democratic.

The third challenge is equity. Without accompanying policies for affordable housing and measures to combat gentrification, proximity may become a privilege for some rather than a right for all. There is a real risk of creating highly serviced, well-equipped neighbourhoods for the few, while others remain underserved, perpetuating existing inequalities.

Finally, there is the challenge of cultural adaptation. The 15-Minute City calls for changes in everyday habits: leaving the car at home, prioritising walking or cycling, valuing local commerce, and making more active use of public space. None of these behaviours can be imposed by decree. They require time, awareness-raising and tangible results that convince citizens that proximity genuinely improves their lives.

É, portanto, neste equilíbrio entre um conceito amplamente reconhecido como virtuoso e a dificuldade da sua aplicação concreta que esta sessão se situa. Queremos aqui refletir sobre o caminho a seguir: como transformar um ideal inspirador numa política urbana efetiva, capaz de chegar a todos os bairros de Lisboa e de responder às expectativas legítimas dos seus habitantes.

It is within this balance – between a concept widely acknowledged as virtuous and the difficulty of its practical application – that this session takes place. Our aim is to reflect on the path ahead: how to turn an inspiring ideal into an effective urban policy, capable of reaching every neighbourhood in Lisbon and meeting the legitimate expectations of its residents.

Vista panorâmica de Lisboa | © CML, Américo Simas \ Panoramic view of Lisbon | © CML, Américo Simas

Várias perspetivas, contextos únicos Multiple perspectives, unique contexts

Elisabete Tomaz, investigadora e docente, traz ao Encontro de Urbanismo 2024 uma perspetiva crítica e histórica sobre a evolução dos modelos de cidade e sobre o atual entusiasmo em torno da “Cidade dos 15 Minutos”. A sua intervenção percorre mais de um século de reflexão urbanística, da cidade-jardim de Ebenezer Howard (1898) às propostas de Clarence Perry sobre a unidade de vizinhança (1929), passando pela Ville Radieuse de Le Corbusier (1935), até à crítica incisiva de Jane Jacobs (1961), defensora dos usos mistos e da diversidade.

Elisabete Tomaz, researcher and lecturer, brings to the 2024 Urban Planning Meeting a critical and historical perspective on the evolution of urban models and on the current enthusiasm surrounding the “15-Minute City.” Her contribution traces more than a century of urban thought – from Ebenezer Howard’s Garden City (1898) to Clarence Perry’s neighbourhood unit (1929), from Le Corbusier’s Ville Radieuse (1935) to Jane Jacobs’ incisive critique (1961), in which she championed mixed uses and urban diversity.

“Os modelos urbanos revelam-nos tanto pelas suas propostas como pelas suas fragilidades. É na tensão entre teoria e prática que a cidade se constrói.”

“Urban models reveal as much through their proposals as through their weaknesses. It is in the tension between theory and practice that the city takes shape.”

Os Três Ímanes – Garden Cities of Tomorrow, 1902 | © Ebenezer Howard
The Three Magnets - Garden City of Tomorrow, 1902 | © Ebenezer Howard
As “Unidades de Bairro”, 1929 | © Clarence Perry The Neighbourhood Unit, 1929 | © Clarence Perry

A oradora sublinha a importância de integrar a dimensão temporal no planeamento. Inspirando-se em Hägerstrand, Ascher e Moreno, fala do cronourbanismo, conceito que associa os ritmos de vida quotidianos às formas urbanas. A Cidade dos 15 Minutos, defendida por Carlos Moreno desde 2016, resulta desta linha de pensamento: proximidade, diversidade, densidade e ubiquidade são os quatro princípios-base.

Contudo, Elisabete Tomaz alerta para o risco de transformar a Cidade dos 15 Minutos num slogan vazio. Sem adaptação aos contextos locais, sem participação comunitária efetiva e sem atenção aos grupos mais vulneráveis, o conceito pode tornar-se uma imposição tecnocrática, de cima para baixo.

“A proximidade não pode ser apenas uma palavra bonita em relatórios estratégicos. Precisa de ser praticada no quotidiano dos bairros.”

The speaker highlights the importance of integrating the temporal dimension into urban planning. Drawing inspiration from Hägerstrand, Ascher and Moreno, she speaks about chrono-urbanism – a concept that links everyday life rhythms to urban form. The 15-Minute City, advocated by Carlos Moreno since 2016, stems from this line of thought: proximity, diversity, density and ubiquity are its four guiding principles.

However, Elisabete Tomaz warns of the risk of turning the 15-Minute City into an empty slogan. Without adaptation to local contexts, genuine community participation and attention to the most vulnerable groups, the concept can become a top-down technocratic imposition.

“Proximity cannot remain just a pretty word in strategic reports. It needs to be put into practice in the everyday life of neighbourhoods.”

Cidade dos 15 Minutos | © Micaël Dessin / Câmara Municipal de Paris
The 15-Minute City | © Micaël Dessin / City of Paris
Diagrama conceptual da Cidade dos 15 Minutos, 2016 | © Carlos Moreno
Conceptual diagram of the 15-Minute City, 2016 | © Carlos Moreno

A oradora traz também para o debate o papel dos bens comuns urbanos (urban commons). Espaços públicos, jardins, praças e equipamentos coletivos devem ser entendidos como recursos partilhados, cuja gestão deve envolver os cidadãos de forma direta. Este princípio da co-gestão comunitária é, no seu entender, essencial para que os bairros não sejam apenas unidades funcionais, mas comunidades vivas.

Outro eixo da sua intervenção é o papel dos espaços de coworking (CWS) no contexto da Cidade dos 15 Minutos. Analisando Lisboa, mostra como estes espaços podem contribuir para reduzir deslocações, aproximar trabalho e residência e dinamizar economias locais. No entanto, adverte para o risco de desigualdades territoriais: bairros com maior concentração de CWS atraem investimento e talento, enquanto outros ficam à margem.

Exemplos de políticas municipais são evocados: Uma Praça em Cada Bairro, Lisboa Cidade de Bairros e Há Vida no Meu Bairro. Estes programas demonstram como a cidade tem procurado, de forma progressiva, revalorizar o espaço público e aproximar serviços dos cidadãos. Mas a oradora insiste que a eficácia destas medidas depende sempre do grau de participação da comunidade.

The speaker also brings into the discussion the role of urban commons. Public spaces, gardens, squares and community facilities should be understood as shared resources, whose management must directly involve citizens. In her view, this principle of community co-management is essential if neighbourhoods are to be more than just functional units – they must be living communities.

Another key focus of her contribution is the role of coworking spaces (CWS) in the context of the 15-Minute City. Looking at Lisbon, she shows how these spaces can help reduce commuting, bring work and home closer together, and stimulate local economies. However, she warns of the risk of territorial inequalities: neighbourhoods with a higher concentration of CWS tend to attract investment and talent, while others are left behind.

She refers to several municipal policies – Uma Praça em Cada Bairro (A Square in Every Neighbourhood), Lisboa Cidade de Bairros (Lisbon, a City of Neighbourhoods) and Há Vida no Meu Bairro (There is Life in My Neighbourhood) – which illustrate how the city has been progressively working to revalue public space and bring services closer to residents. Yet she stresses that the effectiveness of these measures always depends on the degree of community participation.

“O bairro é a unidade-chave de análise e intervenção. É no bairro que se experimenta a cidadania.”

A intervenção termina com um apelo à reflexão crítica:

“a Cidade dos 15 Minutos deve ser vista não como uma fórmula universal, mas como um roteiro flexível, capaz de incorporar diversidade cultural, económica e social. Só assim poderá responder às reais necessidades dos habitantes e evitar o risco de exclusão.”

“The neighbourhood is the key unit of analysis and intervention. It is in the neighbourhood that citizenship is experienced.”

The intervention ends with a call for critical reflection:

“The 15-Minute City should not be seen as a universal formula, but as a flexible roadmap, capable of embracing cultural, economic and social diversity. Only in this way can it respond to the real needs of residents and avoid the risk of exclusion.”

Jardim da Parada, Campo de Ourique (Lisboa) | © CML, Manuel Levita
Jardim da Parada Square in Campo de Ourique (Lisbon) | © CML, Manuel Levita

Proximidade Participação Prática Proximity Participation Practice

Da leitura histórica e crítica apresentada por Elisabete Tomaz, segue-se a intervenção de José Carlos Mota, que traduz o ideal da proximidade num roteiro de ação prática.

A sua intervenção destaca os riscos do modelo urbano atual e aponta caminhos concretos para reorganizar o espaço público a partir da escala do bairro, numa reflexão sobre a transição da chamada “cidade da distância” para a “cidade de proximidade”.

“Proximidade é o novo zeitgeist das cidades.”

O orador começa por lembrar que cerca de 70% do espaço público urbano é ainda dominado pelo automóvel – estacionamento e circulação. Esta realidade não só limita as possibilidades de convivência e lazer, como contribui para elevados níveis de sinistralidade: 62,7% dos acidentes rodoviários ocorrem em cidades e vilas, sendo que todos os anos morrem cerca de 40 crianças em incidentes rodoviários em Portugal, a principal causa de mortalidade jovem.

The historical and critical perspective presented by Elisabete Tomaz paves the way for the contribution of José Carlos Mota, who translates the ideal of proximity into a practical roadmap for action.

His intervention highlights the risks of the current urban model and points to concrete ways of reorganising public space at the neighbourhood scale, reflecting on the transition from the so-called “city of distance” to the “city of proximity.”

“Proximity is the new zeitgeist of cities.”

The speaker begins by reminding the audience that around 70% of urban public space is still dominated by cars – through parking and traffic. This reality not only restricts opportunities for social interaction and leisure, but also contributes to high levels of road accidents: 62.7% of traffic accidents occur in towns and cities, and every year around 40 children die in road incidents in Portugal, the leading cause of death among young people.

Associado a estes riscos está o impacto ambiental. Portugal enfrenta já um processo no Tribunal de Justiça da União Europeia por incumprimento dos valores-limite de qualidade do ar, com zonas como Lisboa Norte e Porto Litoral a ultrapassarem regularmente os 40 µg/m3 de dióxido de azoto. Segundo a Organização Mundial da Saúde, mais de 5000 mortes por ano em Portugal estão relacionadas com poluição atmosférica.

Linked to these risks is the environmental impact. Portugal is already facing legal action before the European Court of Justice for failing to comply with air quality limit values, with areas such as Lisbon North and Porto Coastal regularly exceeding 40 µg/m3 of nitrogen dioxide. According to the World Health Organization, more than 5,000 deaths per year in Portugal are related to air pollution.

Rua Pascoal de Melo (Lisboa) | Imagem cedida pelo orador no âmbito da sessão do Encontro de Urbanismo
Rua Pascoal de Melo (Lisbon) | Image provided by the speaker as part of the Urban Planning Meeting session
“O espaço público é demasiado valioso para continuar a ser desperdiçado com carros.”

Para José Carlos Mota, a cidade da distância – centrada no automóvel e em usos urbanos segregados – gera estilos de vida sedentários, aumento da obesidade infantil (36% das crianças do 1.0 ciclo têm excesso de peso, 15% obesidade) e enfraquecimento da vida comunitária. A resposta está em revalorizar o bairro como unidade de planeamento e devolver espaço às pessoas.

“Public

space is far too valuable to keep being wasted on cars.”

For José Carlos Mota, the city of distance – centred on the car and on segregated urban uses – fosters sedentary lifestyles, rising levels of childhood obesity (36% of primary school children are overweight and 15% are obese) and a weakening of community life. The answer lies in revaluing the neighbourhood as the key unit of planning and giving space back to people.

Espaços verdes móveis (Estugarda) | © Wanderbaumallee Stuttgart
Mobile green spaces (Stuttgart) | © Wanderbaumallee Stuttgart
Piazze Aperte - Urbanismo tático (Milão) | © Comune di Milano
Piazze Aperte - Tactical urbanism (Milan) | © Comune di Milano

O orador destaca práticas de urbanismo tático que têm ganho expressão no pós-pandemia: ruas escolares, parklets, ruas temporariamente pedonais para restauração ou eventos culturais. Estas experiências, de Londres a Bruxelas, de Milão a Barcelona, permitem testar soluções rápidas e visíveis, que podem depois tornar-se permanentes.

Inspirando-se em Clarence Perry, José Carlos Mota recorda a centralidade histórica da escola na vida do bairro. Hoje, defende, é necessário recuperar essa lógica comunitária, colocando as crianças como referência no desenho urbano.

He highlights examples of tactical urbanism that have gained momentum in the post-pandemic period: school streets, parklets, and temporary pedestrianisation of streets for restaurants or cultural events. From London to Brussels, from Milan to Barcelona, these experiences make it possible to test quick, visible solutions that can later become permanent.

Drawing inspiration from Clarence Perry, José Carlos Mota recalls the historical centrality of the school in neighbourhood life. Today, he argues, it is necessary to revive this sense of community, placing children at the heart of urban design.

Superilla de Sant Antoni | © Ajuntament de Barcelona
Sant Antoni Superblock | © Ajuntament de Barcelona

“As cidades que são boas para as crianças são boas para todos nós.”

“Um roteiro para a cidade de proximidade:

• Valorizar atividades e serviços de curta distância.

• Reforçar relações de vizinhança e solidariedade.

• Potenciar usos mistos em edifícios e equipamentos.

• Aproveitar edifícios devolutos para novas funções sociais.

• Integrar processos de participação cidadã e financiamento comunitário.”

O orador alerta, contudo, para os riscos da proximidade: fenómenos de gentrificação, hiperqualificação das zonas centrais e agravamento das assimetrias territoriais. O desafio é, portanto, equilibrar políticas de proximidade com atenção às periferias e aos contextos sociais mais vulneráveis.

A intervenção conclui com uma nota de esperança: a cidade de proximidade não é apenas uma utopia académica, mas uma realidade já em construção. Para isso, é necessário conjugar planeamento estratégico, participação comunitária e experimentação prática.

“Cities that are good for children are good for all of us.” “A roadmap for the city of proximity:

• Valuing short-distance activities and services.

• Strengthening neighbourly relations and solidarity.

• Encouraging mixed uses in buildings and facilities.

• Making use of vacant buildings for new social functions.

• Integrating participatory processes and community financing.”

The speaker also warns of the risks of proximity: gentrification, overinvestment in central areas, and deepening territorial inequalities. The challenge, therefore, is to balance proximity policies with a focus on peripheral areas and vulnerable social contexts.

The intervention concludes on a hopeful note: the city of proximity is not merely an academic utopia but a reality already in the making. Achieving this requires a combination of strategic planning, community participation and practical experimentation.

Cidade de proximidade

City of proximity

Parklet em Hammersmith (Londres) | © Cyclehoop \ Parklet in Hammersmith (London) | © Cyclehoop

Soluções ajustadas a Lisboa

Ações visíveis

Solutions tailored to Lisbon Visible actions

Das orientações estratégicas propostas por José Carlos Mota, a sessão avança para a experiência prática de João Rodrigues Pena, que mostra como a Cidade dos 15 Minutos está a ser testada em Lisboa através de medidas visíveis no quotidiano.

Tendo integrado o 2.0 Conselho de Cidadãos da Câmara Municipal de Lisboa (março 2023), dedicado ao tema “A Cidade dos 15 Minutos”, João Rodrigues Pena traz ao Encontro de Urbanismo 2024 a perspetiva prática sobre a implementação do conceito da Cidade dos 15 Minutos na capital portuguesa. A sua intervenção combina referências internacionais, propostas locais e os primeiros passos concretos já realizados em Lisboa.

Building on the strategic guidelines proposed by José Carlos Mota, the session moves on to the practical experience of João Rodrigues Pena, who shows how the 15-Minute City is being tested in Lisbon through measures that are already visible in daily life.

Having taken part in the 2nd Citizens’ Council of Lisbon City Council (March 2023), dedicated to the theme “The 15-Minute City”, João Rodrigues Pena brings to the 2024 Urban Planning Meeting a hands-on perspective on the implementation of this concept in the Portuguese capital. His presentation combines international references, local proposals and the first concrete steps already taken in Lisbon.

“O conceito da Cidade dos 15 Minutos é uma trajetória. Não precisamos de um modelo único, mas de assegurar serviços essenciais, usos mistos e espaços resilientes.”

“The 15-Minute City is a journey. We don’t need a single model, but we do need to ensure essential services, mixed uses and resilient spaces.”

20 Conselho de Cidadãos: “Cidade dos 15 Minutos” (2023) | © CML, Carlos Morais Silva 2nd Lisbon Citizens’ Council: “15-Minute City” (2023) | © CML, Carlos Morais Silva

O orador começa por recordar a definição de Carlos Moreno: uma cidade em que cada cidadão encontra, a curta distância, tudo o que precisa para viver –habitação, trabalho, comércio, saúde, lazer e cultura. Trata-se de um modelo que valoriza a proximidade, a diversidade de usos e a sustentabilidade, reduzindo as deslocações motorizadas e as emissões associadas.

Referindo experiências internacionais em Paris, Medellín, Barcelona ou Hamilton (Nova Zelândia), destaca como o conceito foi sendo adaptado a diferentes contextos, demonstrando a sua flexibilidade. Contudo, alerta que o desafio não está apenas em importar boas práticas, mas em encontrar soluções ajustadas à realidade lisboeta.

Nesse sentido, sublinha o papel do Conselho de Cidadãos de Lisboa, que tem funcionado como laboratório de propostas e experiências. Recorda, por exemplo, as campanhas de sensibilização ambiental e de higiene urbana, incluindo a iniciativa “Lisboa Limpa com Todos”, em parceria com a AHRESPAssociação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal, ou o projeto “Um Jardim em Cada Esquina”, que já começou a transformar o Bairro das Colónias com a plantação de árvores e o redesenho de passadeiras para mitigar os efeitos das ondas de calor.

Refere também a experiência dos superquarteirões, testada na Praça da Alegria e no Jardim da Parada, onde ruas foram temporariamente fechadas ao trânsito para dar lugar a feiras, comércio local e atividades culturais. A criação de um Conselho Local de Saúde Mental, envolvendo hospitais, juntas de freguesia e associações de utentes, foi outro exemplo de medida que nasceu naquele processo participativo.

The speaker begins by recalling Carlos Moreno’s definition: a city in which every citizen can find, within a short distance, everything they need to live –housing, work, shops, healthcare, leisure and culture. It is a model that values proximity, diversity of uses and sustainability, reducing motorised travel and associated emissions.

Referring to international experiences in Paris, Medellín, Barcelona and Hamilton (New Zealand), he highlights how the concept has been adapted to different contexts, demonstrating its flexibility. However, he warns that the challenge does not lie in simply importing best practices, but in finding solutions tailored to Lisbon’s reality.

In this regard, he underlines the role of the Lisbon Citizens’ Council, which has been acting as a laboratory for proposals and experiments. He recalls, for example, environmental awareness and urban hygiene campaigns, including the “Lisboa Limpa com Todos” (Lisbon Clean with Everyone) initiative, developed in partnership with AHRESP –the Portuguese Association for Hotels, Restaurants and Similar Establishments, as well as the “A Garden on Every Corner” project, which has already started transforming the Bairro das Colónias through tree planting and redesigned pedestrian crossings to mitigate the effects of heatwaves.

He also mentions the superblock experiments, tested in Praça da Alegria and Jardim da Parada, where streets were temporarily closed to traffic to make way for markets, local commerce and cultural activities. Another example was the creation of a Local Mental Health Council, involving hospitals, parish councils and user associations – an initiative that also emerged from this participatory process.

Ciclovia pop-up (Lisboa) | © CML / Corredores Verdes, Medellin (Colômbia) © | ACI Medellin / Simulação de ocupação - Entrecampos (Lisboa) | © Fidelidade Property Pop-up cycle lane (Lisbon) | © CML / Green Corridors, Medellín (Colombia) | © ACI Medellín / Final design simulation – Entrecampos (Lisbon) | © Fidelidade Property

No campo económico, destaca ainda o mapeamento do comércio local, em execução pela Direção Municipal de Economia e Inovação, que servirá de base a uma nova estratégia para reforçar este setor vital da vida de bairro. Por fim, lembra o alargamento da rede noturna da Carris, com novas carreiras que passaram a ligar o Restelo a Xabregas durante a madrugada, garantindo maior coesão e acessibilidade urbana.

“Não basta falar em proximidade. É preciso traduzir o conceito em ações visíveis, que façam a diferença na vida diária dos lisboetas.”

In the economic sphere, he also highlights the mapping of local commerce, currently being carried out by the Municipal Directorate for Economy and Innovation, which will serve as the basis for a new strategy to strengthen this vital sector of neighbourhood life. Finally, he recalls the extension of Carris’s night network, with new routes now linking Restelo to Xabregas during the early hours, ensuring greater urban cohesion and accessibility.

“It’s

not enough to talk about proximity. The concept must be translated into visible actions that make a real difference in the daily lives of Lisbon’s residents.”

Ribeira das Naus (Lisboa): Requalificação que transformou o antigo estaleiro de construção naval num espaço público que liga o Cais do Sodré à Praça do Comércio | © CML, Ana Luísa Alvim
Ribeira das Naus (Lisbon): Redevelopment that transformed the former shipyard into a public space connecting Cais do Sodré to Praça do Comércio © CML, Ana Luísa Alvim

Apesar destes avanços, João Rodrigues Pena identifica desafios estruturais: a disparidade entre freguesias, a dificuldade em priorizar investimentos, a sustentabilidade económica de novos equipamentos e a ainda insuficiente adesão da população, visível em fenómenos como ciclovias desertas ou a persistência do automóvel nas rotinas escolares. Na sua perspetiva, Lisboa tem vantagens claras –uma rede de ciclovias em expansão, uma boa oferta de transportes públicos e serviços distribuídos pela cidade – mas carece de um plano de médio e longo prazo capaz de transformar um conceito mobilizador em políticas públicas estáveis e consistentes.

“O futuro da cidade depende de transformar slogans em políticas públicas estáveis, co-construídas com os cidadãos.”

A intervenção conclui reforçando que:

“a Cidade dos 15 Minutos em Lisboa não é apenas um ideal académico, mas um processo em curso, que exige pragmatismo, participação e coragem política para ganhar escala.”

Despite these advances, João Rodrigues Pena identifies several structural challenges: disparities between parishes, difficulties in prioritising investments, the economic sustainability of new facilities, and the still limited public uptake – visible in phenomena such as empty cycle lanes or the persistence of car use in school routines. In his view, Lisbon has clear advantages – an expanding cycle network, good public transport provision and services spread across the city – but it lacks a medium- and long-term plan capable of turning a mobilising concept into stable and consistent public policies.

“The future of the city depends on turning slogans into stable public policies, co-created with citizens.”

The intervention concludes by stressing that:

“The 15-Minute City in Lisbon is not just an academic ideal, but an ongoing process that demands pragmatism, participation and political courage to reach scale.”

Que mobilidade queremos no Bairro?

What kind of mobility do we want in the Neighbourhood?

02 de maio de 2024 02 May 2024

Moderador Moderator Pedro Dinis

Direção Municipal de Mobilidade, CML

Director of Mobility, CML

Oradores Speakers

David Vale

Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa

- Centro de Investigação em Arquitetura, Urbanismo e Design

Faculty of Architecture, University of Lisbon

– Research Centre for Architecture, Urban Planning and Design

João Vieira

Estratégia, Inovação e Ambiente, Carris

Strategy, Innovation and Environment, Carris Paula Teles

Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade

Institute for Cities and Towns with Mobility

Cais do Sodré (Lisboa) | © CML, Armindo Ribeiro

A mobilidade na vida da cidade Mobility in the Life of the city

A mobilidade é um dos temas mais importantes na vida da cidade.

Na verdade, mobilidade é vida: o movimento é aquilo que nos distingue do não estar vivos, a capacidade de nos deslocarmos, de irmos de um ponto X a um ponto Y.

Do ponto de vista do urbanismo, a mobilidade tem sido o motor do nascimento, crescimento e desenvolvimento das cidades.

A própria Lisboa, enquanto cidade, deve o seu nome, em fenício “porto seguro”, e o seu crescimento às suas características naturais enquanto encosta segura sobre o Rio Tejo, a principal “infraestrutura” natural de mobilidade que proporcionava o transporte marítimo seguro pelo rio, e Lisboa como o porto natural que potenciou a sua centralidade.

Mobility is one of the most important themes in urban life.

In fact, mobility is life: movement is what distinguishes us from not being alive – it is the ability to move, to go from point X to point Y.

From an urban planning perspective, mobility has been the driving force behind the birth, growth and development of cities.

Lisbon itself owes both its name – from the Phoenician “safe harbour” – and its growth to its natural features: a secure hillside overlooking the River Tagus, the city’s main natural “infrastructure” for mobility, which provided safe river transport and established Lisbon as the natural port that shaped its centrality.

Ao longo da história, as cidades foram evoluindo em torno das suas infraestruturas: com a Revolução Industrial, a ferrovia assumiu enorme importância e, posteriormente, as redes viárias consolidaram um modelo em que o automóvel foi o meio de transporte dominante, sobretudo no século XX.

Esse paradigma marcou a forma como as cidades passaram a ser planeadas: deixámos de projetar os espaços urbanos centrados nas pessoas e começámos a desenhá-los em função do carro.

Throughout history, cities have evolved around their infrastructures. With the Industrial Revolution, the railway gained enormous importance and, later, road networks consolidated a model in which the car became the dominant mode of transport, especially during the twentieth century.

This paradigm shaped the way cities began to be planned: we stopped designing urban spaces around people and started designing them around cars.

Alfama e a doca do Terreiro do Trigo vista do Tejo, 1949 (Lisboa) | © Arquivo Municipal de Lisboa, A9155, Eduardo Portugal Alfama and the Terreiro do Trigo dock seen from the Tagus, 1949 (Lisbon) | © Arquivo Municipal de Lisboa, A9155, Eduardo Portugal

Contudo, no último quarto de século começou a emergir uma inversão desta tendência. Atualmente, em todo o mundo, reflete-se cada vez mais sobre a necessidade de recentrar a cidade nas pessoas, não só para responder aos compromissos de descarbonização, mas também para melhorar a qualidade de vida urbana.

Hoje falamos da humanização das cidades, da valorização dos modos ativos – a mobilidade pedonal e ciclável – e da criação de novas centralidades assentes em transportes públicos eficientes e sustentáveis.

However, in the last quarter of a century, this trend has begun to reverse. Across the world, there is increasing reflection on the need to re-centre the city around people – not only to meet decarbonisation commitments, but also to improve urban quality of life.

Today we speak of the humanisation of cities, of valuing active modes of mobility – walking and cycling – and of creating new urban centres based on efficient and sustainable public transport.

A cidade da circulação | © Fertagus
The city of circulation | © Fertagus

A mobilidade contemporânea é já multimodal, com vários meios disponíveis para atingir o mesmo destino, e pretende-se que se torne cada vez mais intermodal e interoperável, permitindo combinar diferentes modos num único percurso. Esta transformação permitirá viver cidades mais saudáveis e funcionais, sobretudo nas deslocações de curta distância, que representam a maioria dos movimentos urbanos, em Lisboa e na área metropolitana.

Lisboa enfrenta, assim, um duplo desafio: por um lado, a gestão das deslocações pendulares de grande escala, próprias de uma capital e de um polo metropolitano central; por outro, a organização da mobilidade local, ao nível dos bairros e distritos, onde se concentram os trajetos mais frequentes e de pequena dimensão.

É este o contexto da sessão “Que mobilidade queremos no Bairro?”. Foi debatido com especialistas, como a Eng.a Paula Teles, o Arq. David Vale e o Eng. João Vieira, como podemos fomentar nos Bairros de Lisboa a mobilidade ativa, ou seja, como podemos dotar os bairros de melhores condições de mobilidade pedonal e ciclável e de uso do transporte público.

São abordadas inúmeras temáticas ligadas à mobilidade das cidades, como a Estratégia para a Mobilidade Pedonal, e de como várias cidades portuguesas estão a dotar os seus territórios de condições, diretas e indiretas, para que andar a pé seja possível a todo o tempo, em espaço seguro e de forma universal.

Contemporary mobility is already multimodal, with several means available to reach the same destination, and the aim is for it to become increasingly intermodal and interoperable, allowing different modes to be combined within a single journey. This transformation will enable healthier and more functional cities, particularly in short-distance travel, which represents the majority of urban movements –both in Lisbon and across the metropolitan area.

Lisbon therefore faces a dual challenge: on the one hand, managing large-scale commuting flows, typical of a capital city and a central metropolitan hub; and on the other, organising local mobility at the level of neighbourhoods and districts, where the most frequent and small-scale trips take place.

This is the context for the session “What kind of mobility do we want in the Neighbourhood?”. The discussion, featuring experts such as Engineer Paula Teles, Architect David Vale and Engineer João Vieira, explored how active mobility can be fostered in Lisbon’s neighbourhoods – that is, how we can provide them with better pedestrian, cycling and public transport conditions.

Numerous topics related to urban mobility are addressed, including the Pedestrian Mobility Strategy, and how several Portuguese cities are equipping their territories with both direct and indirect conditions that make walking possible at all times, in safe and universally accessible environments.

Os intervenientes apresentam as suas experiências de como tornar este modo de mobilidade como preferencial nas deslocações diárias e articulando-o, sobretudo, com o modo ciclável e o transporte público, como contributo decisivo para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, como o objetivo de alterar os padrões de mobilidade, aumentando a quota modal das deslocações pedonais para 35% em 2030.

É com foco no peão, aliás, que a Direção Municipal da Mobilidade tem vindo a pensar e planear a mobilidade à escala da cidade, das unidades de intervenção territorial e dos Bairros de Lisboa, dotando-os de uma melhor rede pedonal que tem como objetivo criar, otimizar e dar consistência a um sistema pedonal contínuo, articulado e potenciado com todos os outros sistemas de mobilidade, e em particular com o transporte público e a rede ciclável.

A execução destas intervenções nas infraestruturas de mobilidade de forma contínua, conjuntamente com a implementação do programa Bairros 30, dotará os bairros de uma rede pedonal com acessibilidade universal, infraestrutura ciclável segura, e permitirá criar nos bairros de Lisboa uma maior e melhor mobilidade, com elevados níveis de segurança rodoviária, para todos os que vivem e frequentam os Bairros da nossa cidade.

The speakers shared their experiences on how to make this mode of mobility the preferred option for daily journeys, integrating it above all with cycling and public transport, as a decisive contribution to improving citizens’ quality of life. The goal is to change mobility patterns, raising the modal share of pedestrian trips to 35% by 2030.

Indeed, the focus is on the pedestrian. At the Municipal Directorate for Mobility, we have been thinking and planning mobility at multiple scales –the city as a whole, the territorial intervention units, and the neighbourhoods of Lisbon – providing them with a better pedestrian network. The aim is to create, optimise and consolidate a continuous, articulated pedestrian system, fully integrated and enhanced by all other modes of mobility, in particular public transport and the cycling network.

The continuous implementation of these mobility infrastructure projects, together with the rollout of the “Neighbourhoods 30” programme, will equip neighbourhoods with a pedestrian network offering universal accessibility and a safe cycling infrastructure. This will help create greater and better mobility within Lisbon’s neighbourhoods, ensuring high levels of road safety for everyone who lives in or visits our city’s communities.

Pretendemos transformar os nossos Bairros em verdadeiras “salas de estar coletivas”, disponíveis, acessíveis e seguras para todos, independentemente do modo de mobilidade utilizado.

Temos propostas formalizadas para as diversas redes de mobilidade da cidade, entre elas a rede pedonal, a rede ciclável, a rede de corredores BUS, a rede viária e a rede ferroviária, que foram pensadas de forma articulada e complementar, com vista à sua implementação faseada até 2030, integradas no Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Lisboa.

We aim to transform our neighbourhoods into true “collective living rooms” – spaces that are welcoming, accessible and safe for all, regardless of the mode of mobility used.

We have formal proposals for the city’s various mobility networks – including the pedestrian, cycling, bus corridor, road and rail networks – all conceived in an integrated and complementary way. Their phased implementation by 2030 is framed within Lisbon’s Sustainable Urban Mobility Plan (SUMP).

Belém (Lisboa): mobilidade suave | © CML, Ana Sofia Serra \ Belém (Lisbon): soft mobility | © CML, Ana Sofia Serra

Desigualdades de acessibilidade pedonal na Europa

Pedestrian

accessibility inequalities in Europe

Andar a pé é o termómetro da qualidade de vida numa cidade. David Vale traz para a sessão os resultados de um estudo ambicioso que olhou para 864 cidades europeias com mais de 100 mil habitantes. A questão de partida era simples: Quão acessível é a Europa a pé? E de que forma essa acessibilidade se relaciona com as desigualdades urbanas?

O estudo, que usou apenas dados abertos e replicáveis, mediu a distância a milhões de destinos – escolas, hospitais, espaços verdes, comércio, entre outros característicos da Cidade dos 15 Minutos. No entanto, não se limitou a contar.

Walking is the true barometer of urban quality of life. David Vale brings to the session the results of an ambitious study that examined 864 European cities with over 100,000 inhabitants. The guiding question was simple yet revealing: How walkable is Europe? And how does pedestrian accessibility relate to urban inequality?

The study, based entirely on open and replicable data, measured the distance to millions of destinations – schools, hospitals, green spaces, shops, among others typically associated with the 15-Minute City concept. Yet, it went well beyond mere counting.

1.

O Segredo da Qualidade Urbana: Variedade, Não

Quantidade

A chave da investigação residiu em dois indicadores centrais. O primeiro, mais clássico, contabilizava o número total de destinos acessíveis em 15 minutos a pé. Mas o segundo, e verdadeiramente inovador, media a variedade de funções. É que não basta ter muitos cafés ou muitas lojas; o essencial é poder aceder, em pouco tempo, a uma mistura equilibrada de serviços e equipamentos diferentes. É esta diversidade que, na prática, espelha a qualidade de vida.

1. The Secret of Urban Quality: Variety, Not Quantity

The research centred on two key indicators. The first, a more traditional one, calculated the total number of destinations accessible within 15 minutes on foot.

But the second – truly innovative – measured the variety of functions. It’s not enough to have many cafés or shops; what matters is being able to reach, in a short walk, a balanced mix of different services and amenities. It is this diversity that, in practice, reflects the real quality of urban life.

Tipologia destinos – Ciclo de conferências “Encontro de Urbanismo” – Apresentação “Que mobilidade queremos no Bairro?” | © David Vale Destination typology – “Urban Planning Meeting” Conference cycle – Presentation “What kind of mobility do we want in the neighbourhood?” | © David Vale

Educação Saúde
Desporto e recreio
Cultura e lazer
Espaços verdes
Restauração Alimentação Comércio
Religião
Serviços públicos

2. Contrastes Europeus e o Brilho de Lisboa

Os resultados mostram uma Europa de fortes contrastes. Longe da ideia de que o continente tem uma boa acessibilidade pedonal em geral, o estudo revela que algumas cidades oferecem condições excelentes, enquanto outras apresentam situações muito frágeis. Portugal aparece num patamar intermédio, mas com diferenças importantes entre as cidades.

Lisboa, em particular, trouxe uma surpresa. Embora a capital portuguesa mostre dois centros principais no indicador de total de destinos (o histórico e a zona das Avenidas Novas), é na variedade que se destaca: Lisboa surge como uma das melhores cidades da amostra europeia. Isto significa que, a partir de quase qualquer ponto, é possível aceder a dez tipos diferentes de destinos em apenas 15 minutos.

2. European Contrasts and Lisbon’s Bright Spot

The results reveal a Europe of striking contrasts. Far from the common perception that the continent enjoys uniformly high walkability, the study shows that while some cities offer excellent pedestrian accessibility, others remain significantly deficient. Portugal ranks in an intermediate position, though with marked differences between its cities.

Lisbon, in particular, produced a pleasant surprise. Although the Portuguese capital shows two main centres in the indicator measuring the total number of destinations – the historic core and the Avenidas Novas area – it is in the diversity indicator that it truly stands out. Lisbon emerges as one of the best-performing cities in the European sample. This means that, from almost any point in the city, residents can reach ten different types of destinations within just 15 minutes on foot.

3. Densidade Urbana: Onde Fica o Limite?

O estudo analisou a complexa relação entre o número de residentes e a acessibilidade. Observouse que até um certo limiar (cerca de 75 habitantes por hectare), a densidade está positivamente correlacionada com uma maior diversidade de destinos – bairros mais densos tendem a ser bairros mais bem servidos. Contudo, acima desse valor, os ganhos tornam-se marginais; simplesmente mais densidade já não se traduz em melhor acessibilidade.

Por outro lado, as desigualdades territoriais mostraram ser maiores do que as populacionais. Os territórios com pior acessibilidade tendem a ter menos residentes, ao passo que os mais acessíveis concentram mais população. O estudo estabelece uma clara correlação entre a procura por viver em áreas com melhores condições de mobilidade pedonal e a concentração de pessoas.

3. Urban Density: Where Is the Limit?

The study examined the complex relationship between population density and accessibility. It found that up to a certain threshold – around 75 residents per hectare – density correlates positively with a greater diversity of destinations: denser neighbourhoods tend to be better served. However, beyond that point, the benefits plateau; simply adding more people no longer results in better accessibility.

At the same time, the research revealed that territorial inequalities outweigh demographic ones. Areas with poorer accessibility generally have fewer residents, while the most accessible areas attract higher population concentrations. The study thus establishes a clear link between the desire to live in walkable neighbourhoods and the clustering of residents in such areas.

Acessibilidade pedonal dentro das

cidades: Total de destinos a menos de 15 minutos a pé

Destinos = comércio, espaços verdes, ensino, saúde, desporto, apoio social, cultura

Pedestrian Accessibility Within Cities:

Total destinations within a 15-minute walk

Destinations = retail, green spaces, education, healthcare, sports, social support, and cultural facilities

Accessibility Inequality across Europe: A Comparison of 15-Minute Pedestrian Accessibility in Cities with 100,000 or More Inhabitants (Nature, 2023) © David Vale e André Soares Lopes

4. A Mensagem Final do Orador

Na conclusão, o orador deixa uma mensagem clara para os planeadores urbanos:

“não é a quantidade de destinos que garante qualidade urbana, mas sim a sua diversidade funcional. É essa diversidade, mais do que os números absolutos, que aproxima a investigação da filosofia da Cidade dos 15 Minutos.”

Nesse contexto, Lisboa aparece bem posicionada, demonstrando que uma cidade pode ser policêntrica, oferecer ótimas condições para quem anda a pé e múltiplas oportunidades no espaço de um quarto de hora.

4. The Speaker’s Final Message

In closing, the speaker delivers a clear message to urban planners:

“it is not the quantity of destinations that ensures urban quality, but their functional diversity. This diversity –more than sheer numbers – is what connects the research findings to the philosophy of the 15-Minute City.”

Within this framework, Lisbon stands out, demonstrating that a city can be polycentric, pedestrian-friendly, and offer multiple opportunities within a 15-minute radius.

Variedade de destinos em Lisboa \ Variety of destinations in Lisbon Accessibility Inequality across Europe: A Comparison of 15-Minute Pedestrian Accessibility in Cities with 100,000 or More Inhabitants (Nature, 2023) | © David Vale e André Soares Lopes

Acessibilidade pedonal dentro das cidades: Diversidade de destinos acessíveis a menos de 15 minutos a pé

Pedestrian Accessibility Within Cities: Variety of destination types accessible within a 15-minute walk

Accessibility Inequality across Europe: A Comparison of 15-Minute Pedestrian Accessibility in Cities with 100,000 or More Inhabitants (Nature, 2023) © David Vale e André Soares Lopes

Apostar em Bairros que caminham

Investing in walkable Neighbourhoods

O diagnóstico quantitativo e comparativo apresentado por David Vale encontra continuidade na intervenção de Paula Teles, que traz a escala prática do desenho urbano e da caminhabilidade, mostrando como transformar números e mapas em ruas vividas e inclusivas.

Formada em engenharia civil, recorda que foi “formatada para desenhar cidades para os automóveis” e que, ao longo de trinta anos, teve de fazer uma profunda mudança de paradigma: “Perceber que era preciso inverter todo este pensamento”.

Esta transformação assenta em dois eixos fundamentais:

1. a urgência da descarbonização; 2. a humanização das cidades.

The quantitative and comparative diagnosis presented by David Vale finds continuity in Paula Teles’s intervention, which brings the discussion down to the practical scale of urban design and walkability, showing how to translate data and maps into streets that are lived in and inclusive.

Trained as a civil engineer, she recalled how she had been “trained to design cities for cars” and how, over the past thirty years, she had to undergo a profound paradigm shift: “Realising that the entire mindset had to be reversed”.

This transformation, she explained, rests on two fundamental pillars:

1. The urgency of decarbonisation;

2. The humanisation of cities.

Pela sua frequência e pelo seu impacto, não é possível deixar de ignorar os fenómenos climáticos extremos. A mobilidade é um dos três grandes setores emissores e, por isso, tem um papel determinante na resposta às alterações climáticas. E todos compreenderam a importância de ter espaços públicos de proximidade, sol, ar livre e ruas habitáveis.

Due to the extreme weather events frequency and impact, it is impossible to ignore them. Mobility is one of the three main emitting sectors and therefore plays a decisive role in responding to climate change. At the same time, the pandemic made everyone realise the vital importance of nearby public spaces –sunlight, open air, and streets designed for living.

A urgência da humanização dos territórios

The urgency of humanising urban territories

Ribeira das Naus (Lisboa): fruição do espaço público | © CML \ Ribeira das Naus (Lisbon): enjoyment of public space | © CML

Para isso, “a pirâmide da mobilidade tem de ser invertida”: primeiro, os modos suaves – andar a pé, com atenção especial à mobilidade reduzida –, depois a bicicleta e os transportes públicos. Os automóveis devem deixar de dominar. No entanto, os números mostram resistência à mudança: em 2021, 63% das deslocações em Portugal eram feitas de carro, chegando a 80% em distritos como Leiria. A taxa de motorização cresce há duas décadas, enquanto o transporte público e o caminhar diminuem.

Há também um paradoxo geracional: “Hoje, muitos jovens não sabem andar a pé nem de autocarro – foram habituados a demasiados confortos”. Esta falta de autonomia preocupa-a profundamente, levando-a a dedicar-se à relação entre mobilidade e saúde, autoestima e capacidade de adaptação.

To achieve this, “the mobility pyramid must be inverted”: first come the soft modes – walking, with particular attention to people with reduced mobility – followed by cycling and public transport. Cars must cease to dominate. However, the data reveal a persistent resistance to change: in 2021, 63% of journeys in Portugal were made by car, reaching 80% in districts such as Leiria. The rate of motorisation has been rising for two decades, while public transport use and walking have steadily declined.

There is also a generational paradox: “Today, many young people don’t know how to walk or take the bus – they’ve grown too used to comfort.” This lack of autonomy, she noted, is deeply concerning, prompting her to focus on the relationship between mobility, health, self-esteem, and adaptability.

A Pirâmide da Mobilidade | © Share-North.eu Mobility Pyramid | © Share-North.eu

A transformação começa no espaço urbano.

“Alargar passeios, introduzir ciclovias, estreitar vias e alterar sinalização são medidas essenciais para recuperar espaço ao automóvel.”

Quando estas mudanças acontecem: “o comércio renasce, as esplanadas crescem, as crianças voltam à rua” – tal como se viu durante a pandemia.

A mobilidade está indissociavelmente ligada ao urbanismo, ao planeamento e ao desenho da cidade.

The transformation begins in the urban space.

“Widening pavements, introducing cycle lanes, narrowing roadways and changing signage are essential measures to reclaim space from cars.”

When such changes occur, “local shops revive, terraces expand, and children return to the streets” – as witnessed during the pandemic.

Mobility is inseparable from urbanism, planning, and the design of the city itself.

https://www.thehighline.org/photos/by-photographer/)

The High Line (Nova York) | © Anita NG (Fonte:

Outro eixo fundamental é a mobilidade escolar. Em várias cidades portuguesas – Lisboa, Braga, Guimarães, Mealhada – estão a renascer os “comboios de crianças” que vão a pé para a escola, admitindo, no entanto, que a rua ainda não é, muitas vezes, segura.

“A cidade deve

ser vista pela janela da criança, não apenas pelo vidro do carro dos pais.”

Defende uma mudança de paradigma: “do Código da Estrada ao Código da Rua.”

Paula Teles defende igualmente a adoção de instrumentos inovadores de planeamento, como os Planos de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS), capazes de integrar transportes públicos, mobilidade pedonal, ciclável e logística urbana. Menciona também a criação de zonas de emissões reduzidas (ZBE), a promoção do comércio tradicional, a reabilitação urbana e o reforço da rede de transportes públicos, tendencialmente gratuitos, como medidas estratégicas para reduzir as distâncias e aproximar serviços.

Lisboa é referida como laboratório de novas soluções, nomeadamente com a experiência do primeiro superquarteirão em Campo de Ourique, inspirado em Barcelona. A oradora destaca também o papel do urbanismo tático, com intervenções rápidas e reversíveis que testam soluções de acalmia de tráfego, ampliação de espaço pedonal e arborização.

Another key focus is school mobility. In several Portuguese cities – Lisbon, Braga, Guimarães, and Mealhada – the so-called “walking school buses” are being revived: groups of children walking together to school, though she acknowledged that the street is still not always safe.

“The

city should be seen through the child’s window, not just through the parents’ car windshield.”

She advocated for a true paradigm shift – “from the Highway Code to the Street Code.”

Paula Teles also calls for the adoption of innovative planning tools, such as Sustainable Urban Mobility Plans (SUMP), designed to integrate public transport, pedestrian and cycling mobility, and urban logistics. She further mentions the introduction of Low Emission Zones (LEZs), the promotion of traditional commerce, urban regeneration, and the strengthening of public transport networks – ideally free of charge – as strategic measures to shorten distances and bring essential services closer to people.

Lisbon is highlighted as a laboratory for new solutions, notably through the experience of the first superblock in Campo de Ourique, inspired by Barcelona. The speaker also emphasises the importance of tactical urbanism, using quick, reversible interventions to test measures for traffic calming, expanding pedestrian areas, and increasing tree cover.

Para a oradora, o futuro depende de planeamento integrado, gradual e bem comunicado, capaz de articular os diferentes ritmos técnicos e políticos. “As cidades não se mudam de um dia para o outro, mas aos poucos, com estratégia.”

A convicção final é firme:

“resgatar espaço ao automóvel e devolvê-lo às pessoas é a chave para criar cidades vivas, saudáveis e livres.”

For her, the future depends on integrated, gradual, and well-communicated planning, capable of aligning different technical and political tempos. “Cities don’t change overnight – they evolve step by step, with strategy.”

Her concluding conviction was clear:

“Reclaiming space from cars and giving it back to people is the key to creating cities that are vibrant, healthy, and free.”

Modelo dos superquarteirões (“superilles”) - Plano de Mobilidade Urbana de Barcelona 2013-2018 | © Ajuntament de Barcelona
Superblocks Model (“superilles”) - Urban Mobility of Barcelona 2013-2018 | © Ajuntament de Barcelona

O transporte público e a vida de Bairro Public transport and Neighbourhood life

Da escala pedonal destacada por Paula Teles, a sessão avança naturalmente para a perspetiva de João Vieira. Na sua intervenção, o representante da Carris sublinha a importância do transporte público para responder aos desafios de mobilidade de Lisboa, enquadrando a sua apresentação em três partes:

1. Tendências e desafios da mobilidade urbana, 2. O papel do transporte público e 3. Projetos em curso que procuram dar respostas concretas à escala da cidade e dos bairros.

1. A Carris, operador público de superfície, transporta cerca de 500.000 passageiros por dia e regista níveis de satisfação superiores a 90%, chegando aos 95% em 2023. Esta relação de confiança com os utilizadores é um ponto de orgulho para a empresa e resulta de um serviço capilar, próximo das pessoas e dos bairros.

From the pedestrian-centred scale highlighted by Paula Teles, the session naturally progresses to the perspective of João Vieira. In his presentation, the representative of Carris underscored the vital role of public transport in addressing Lisbon’s mobility challenges, structuring his talk into three key areas:

1. Trends and challenges in urban mobility, 2. The role of public transport, and 3. Ongoing projects designed to deliver concrete results at both the city and neighbourhood scales.

1. Carris, Lisbon’s public surface transport operator, carries around 500,000 passengers daily, achieving satisfaction levels above 90%, and reaching 95% in 2023. This relationship of trust with its users is a point of pride for the company and stems from a dense, neighbourhood-focused service that keeps it close to the people it serves.

Entre as megatendências globais que moldam a mobilidade, destacou-se a urbanização crescente, o envelhecimento populacional, a adoção de estilos de vida mais saudáveis e a centralidade da sustentabilidade. No campo tecnológico, a conetividade permanente, as energias alternativas, os veículos autónomos e a digitalização acelerada estão a transformar a oferta e as expectativas dos utilizadores. A nível económico, a expansão dos modelos “as a service”, a economia da partilha e a gratuitidade em algumas cidades – como Lisboa – estão a redefinir a forma como os transportes são utilizados.

Among the global megatrends shaping mobility, Vieira highlighted growing urbanisation, an ageing population, healthier lifestyles, and the centrality of sustainability. On the technological front, constant connectivity, alternative energy, autonomous vehicles, and rapid digitalisation are transforming both supply and user expectations. Economically, the expansion of “as-a-service” models, the sharing economy, and free transport policies – such as those implemented in Lisbon – are redefining how citizens use and perceive public transport.

MEGATENDÊNCIAS MEGATRENDS

SOCIAIS SOCIAL

• Urbanização Urbanisation

• Envelhecimento Aging

• Estilos de vida Lifestyles

• Sustentabilidade Sustainability

TECNOLÓGICAS TECHNOLOGY NEGÓCIO BUSINESS

• Conetividade Connectivity

• Energias alternativas Alternative energie

• Autónomos Autonomous

• Digital / IA Digital / AI

• As-a-service As-a-service

• Economia da partilha Sharing economy

• Descontos Discounts

• Atração de talento Talent attraction

2. Estes fenómenos traduzem-se em desafios estruturais para a Carris:

• atrair utilizadores do transporte individual;

• contribuir para a descarbonização, renovando a sua própria frota;

• garantir segurança rodoviária total;

• adaptar-se à revolução digital e

• disputar espaço público escasso com outros modos suaves.

A transição modal é particularmente exigente: estima-se que seja necessário transferir cerca de 150.000 deslocações diárias do automóvel para modos sustentáveis – tarefa que exige o contributo articulado de todos os sistemas (Carris, Metro, bicicletas e mobilidade pedonal).

“Lisboa precisa de transferir 150 mil clientes do transporte individual para modos sustentáveis.”

O orador enfatiza os benefícios do transporte público, alinhados com a estrutura da International Association of Public Transport (UITP) – Pessoas, Planeta e Progresso: garante acessibilidade física e económica, promove estilos de vida ativos e saudáveis, reduz emissões e ruído, apoia a inovação e o emprego local e contribui para cidades mais eficientes e menos congestionadas.

2. These trends translate into structural challenges for Carris:

• Attracting users away from private vehicles;

• Contributing to decarbonisation through fleet renewal;

• Ensuring full road safety;

• Adapting to the digital revolution, and

• Competing for limited public space with other sustainable modes.

The modal shift is particularly demanding: it is estimated that around 150,000 daily car trips must be transferred to sustainable transport modes – a task requiring the coordinated contribution of all systems (Carris, Metro, bicycles, and walking).

“Lisbon needs to transfer 150,000 daily car users to sustainable modes.”

The speaker highlights the benefits of public transport, following the framework of the International Association of Public Transport (UITP) –People, Planet, and Progress. Public transport ensures physical and economic accessibility, promotes active and healthy lifestyles, reduces emissions and noise, supports innovation and local employment, and contributes to more efficient, less congested cities.

Atrair utilizadores do transporte individual Attracting users from private transport

Revolução digital

Digital revolution

Competição pelo espaço Competing for urban space

Zero mortes

Zero road deaths

3. Na terceira parte, foram apresentados projetos concretos:

Carreiras de bairro desenvolvidas em estreita colaboração com as juntas de freguesia, contam com 28 linhas focadas na mobilidade local, mais de 800 serviços diários e cerca de 300.000 passageiros por mês, muitos dos quais idosos.

Amarelo: Mobilidade escolar em parceria com a Câmara Municipal, para garantir segurança, pontualidade e ligação à comunidade local, criando hábitos sustentáveis desde cedo. Está em curso a expansão do projeto a mais escolas, mas também é necessário estudar e avaliar outras medidas de promoção da mobilidade escolar sustentável.

Revisão da rede Carris

A revisão da Rede Carris começou recentemente para adaptar o serviço às transformações da cidade e à expansão do Metro. A rede, desenhada em 2005-2006, será repensada com foco nas necessidades dos clientes, através de sessões participativas, para melhorar frequências, trajetos e atratividade do transporte público.

3. In the third part, specific projects were presented:

Neighbourhood Routes

Developed in close collaboration with parish councils, these routes comprise 28 lines focused on local mobility, operating over 800 daily services and carrying around 300,000 passengers per month, many of whom are elderly residents.

Yellow: School Mobility

In partnership with the City Council, the programme aims to ensure safety, punctuality, and connection with the local community, fostering sustainable habits from an early age. The project is currently being expanded to more schools, alongside efforts to study and assess additional measures to promote sustainable school mobility.

Carris Network Revision

The Carris Network Revision began recently to adapt the service to the city’s ongoing transformations and the expansion of the Metro. Originally designed in 2005–2006, the network is now being rethought with a customer-centred focus, through participatory sessions, aiming to improve service frequency, routes, and the overall attractiveness of public transport.

Carreira de Bairro | © CML, Ana Sofia Serra Neighbourhood Bus Route | © CML, Ana Sofia Serra
”AMARELO” Projeto de Mobilidade Escolar - EB Padre José Rocha e Melo “AMARELO” (Yellow) School Mobility Project – Padre José Rocha e Melo Primary School | © CML, Américo Simas

Outros projetos

Outros projetos incluem a digitalização da bilhética, prioridade semafórica e fiscalização de corredores bus, além de iniciativas de acessibilidade universal, estudo do impacto das novas tarifas e investimento em autocarros elétricos e tecnologias de descarbonização.

João Vieira conclui, sublinhando que:

“Enfrentar estes desafios implica inovação, investimento e uma forte articulação com parceiros locais e internacionais, sempre com foco na melhoria do serviço para os cidadãos de Lisboa.”

Other Projects

Other ongoing projects include the digitalisation of ticketing systems, traffic light prioritisation and bus lane monitoring, as well as initiatives promoting universal accessibility, the assessment of new fare structures, and continued investment in electric buses and decarbonisation technologies.

João Vieira concludes by emphasising that:

“Tackling these challenges requires innovation, investment, and strong coordination with local and international partners – always with a focus on improving the service for the citizens of Lisbon.”

Vale de Alcântara (Lisboa) | © CML, Carlos Morais Silva

Cuidar do espaço público e dos espaços verdes do Bairro

Caring for public space and Neighbourhood green areas

06 de junho de 2024 06 June 2024

Moderador Moderator

Helena Palma

Departamento de Espaço Público, CML

Department of Public Space, CML

Oradores Speakers

Sofia Pires Bento

IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes

IMT - Institute for Mobility and Transport

Catarina Freitas

Direção Municipal do Ambiente, Estrutura

Verde, Clima e Energia, CML

Director of Environment, Green Infrastructure and Energy, CML

Catarina Assis Pacheco e Filipa Cardoso Menezes

Atelier FC Arquitectura Paisagista

Jardim da Praça de Espanha (Lisboa) | © CML, Nuno Correia

A intervenção no espaço público: uma

oportunidade

para a melhoria da qualidade de vida

Intervening in public space: an opportunity to improve quality of life

Helena Palma evidencia a importância da articulação entre estratégias nacionais e locais, que constituem o quadro de referência para o desenvolvimento de ações concretas nos territórios.

No caso da cidade de Lisboa, destacam-se, entre outros, a Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC), o Plano de Ação Climática de Lisboa e o compromisso assumido no âmbito do Pacto de Autarcas para o Clima e Energia, instrumentos que orientam as políticas públicas para a descarbonização, a promoção da mobilidade sustentável, o aumento do conforto térmico urbano, a gestão eficiente da água e a renaturalização da cidade.

Estes princípios devem traduzir-se em intervenções concretas no espaço público, não se limitando apenas a dimensões formais ou funcionais, mas integrando ações que visem a sustentabilidade ambiental, a coesão social e a valorização da qualidade de vida urbana.

Helena Palma emphasises the importance of aligning national and local strategies, which provide the framework for developing concrete actions in specific territories.

In the case of Lisbon, notable examples include the Municipal Climate Change Adaptation Strategy (EMAAC), the Lisbon Climate Action Plan, and the city’s commitments under the Covenant of Mayors for Climate and Energy. These instruments guide public policies towards decarbonisation, the promotion of sustainable mobility, enhanced urban thermal comfort, efficient water management, and the renaturalisation of the city.

These principles must be translated into tangible interventions in public space, going beyond formal or functional dimensions to incorporate actions that promote environmental sustainability, social cohesion, and improved urban quality of life.

Contudo, a transformação da cidade não se faz apenas a partir das instituições, sendo essencial promover a participação pública, garantindo que os cidadãos se sintam parte integrante na génese destes projetos, que utilizem os espaços por eles gerados e que, no quotidiano, contribuam para o seu cuidado e preservação.

Neste processo, a Câmara Municipal e as Juntas de Freguesia assumem um papel fundamental, enquanto entidades de proximidade, com responsabilidade direta na gestão e manutenção dos espaços verdes e dos espaços públicos de bairro, fortalecendo a ligação entre cidadãos e território e assegurando que a cidade se constrói e se mantém de forma partilhada e inclusiva.

However, urban transformation cannot be driven by institutions alone. Public participation is essential, ensuring that citizens feel they are an integral part of the creation of these projects, that they use the spaces generated by them, and that they contribute, in their daily lives, to their care and preservation.

In this process, the City Council and Parish Councils play a crucial role as local authorities with direct responsibility for managing and maintaining neighbourhood green areas and public spaces. They help to strengthen the connection between citizens and territory, ensuring that the city is built and sustained in a shared and inclusive way.

Avenida Almirante Reis (Lisboa) - Situação atual e resultado final | © CML, Departamento de Espaço Público
Avenida Almirante Reis (Lisboa) - Current situation and final result | © CML, Department of Public Space

Espaço público para a mobilidade ativa

Public

space for active mobility

Na sua intervenção, Sofia Pires Bento, em representação do Grupo de Projeto para a Mobilidade Ativa do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes, traz para o Encontro de Urbanismo 2024 a urgência de recentrar as políticas públicas no peão e nos modos suaves de deslocação. O enquadramento começa na escala global, lembrando os compromissos internacionais que moldam as políticas nacionais: o Acordo de Paris (2016) e o Acordo de Glasgow (2021), que exigem a neutralidade carbónica até 2050. Para Portugal, isso significa uma redução de emissões superior a 85% face a 2005 e quase 98% no setor dos transportes.

“Somos todos peões. É esta a condição universal a partir da qual devemos pensar a cidade.”

A oradora sublinha que a Lei de Bases do Clima (Lei n.0 98/2021) consagra o direito ao equilíbrio climático e responsabiliza o Estado por ações ou omissões que causem danos ambientais. Esta lei estabelece também a obrigação de promover os modos ativos de deslocação – andar a pé e de bicicleta – não como complemento, mas como eixo central da mobilidade sustentável.

In her intervention, Sofia Pires Bento, representing the Active Mobility Project Group of IMT – Institute for Mobility and Transport, brings to the 2024 Urban Planning Meeting an urgent call to refocus public policies on pedestrians and soft mobility modes. Her presentation begins on a global scale, recalling the international commitments that shape national policies: the Paris Agreement (2016) and the Glasgow Agreement (2021), which require carbon neutrality by 2050. For Portugal, this translates into an emissions reduction of more than 85% compared to 2005, and almost 98% in the transport sector.

“We are all pedestrians. This is the universal condition from which we must think about the city.”

She emphasises that the Climate Framework Law (Law no. 98/2021) enshrines the right to climate balance and holds the State accountable for actions or omissions that cause environmental damage. This law also establishes the obligation to promote active mobility – walking and cycling – not as a complement but as a central pillar of sustainable mobility.

Referindo o Novo Quadro Europeu para a Mobilidade Urbana (2021), Sofia Pires Bento destaca a exigência de uma transição para sistemas de mobilidade “seguros, acessíveis, inclusivos, inteligentes e amigos do ambiente”. Para tal, será necessária uma conjugação de esforços entre autoridades nacionais, municípios e comunidades locais.

Referring to the New European Urban Mobility Framework (2021), Sofia Pires Bento highlights the need for a transition towards mobility systems that are “safe, accessible, inclusive, intelligent and environmentally friendly.” Achieving this will require a concerted effort between national authorities, municipalities and local communities.

Mobilidade suave nas cidades, Parque Ribeirinho (Lisboa) | © CML, Armindo Ribeiro Soft mobility, Riverside Park (Lisbon) | © CML, Armindo Ribeiro

Ao descer do plano internacional para o quotidiano dos bairros, a oradora traz exemplos concretos de programas já implementados em Portugal: o PéPedal, que promove a mobilidade escolar ativa; o Cicloexpresso, uma espécie de “comboio de bicicletas” em que grupos de crianças se deslocam em segurança para a escola; ou a Rua Escolar Ativa, que transforma temporariamente ruas junto às escolas em espaços dedicados ao brincar e à convivência, livres de automóveis.

Estes projetos, desenvolvidos em articulação com municípios, escolas e associações, mostram como é possível criar hábitos desde cedo, fazendo da bicicleta e da caminhada opções naturais. A mobilidade ativa deixa de ser vista como exceção para se tornar regra, com benefícios diretos na saúde, no ambiente e na vivência comunitária.

Moving from the international framework to the everyday reality of neighbourhoods, the speaker presents concrete examples of programmes already implemented in Portugal: PéPedal, which promotes active school travel; Cicloexpresso, a kind of “bicycle train” in which groups of children travel safely to school; and Rua Escolar Ativa (Active School Street), which temporarily transforms streets next to schools into car-free spaces dedicated to play and social interaction.

These projects, developed in partnership with municipalities, schools and associations, demonstrate how it is possible to build habits from an early age, making cycling and walking natural choices. Active mobility ceases to be the exception and becomes the norm, bringing direct benefits to health, the environment and community life.

Conquistar espaço e segurança para os peões (Manila, Filipinas) | © Paulo Alcazaren & Arvin Estrada of PGAA Creative Design Conquering space and safety for pedestrians (Manila, Philipines) | © Paulo Alcazaren & Arvin Estrada of PGAA Creative Design

“Educar para a mobilidade é também educar para a cidadania.”
“To educate for mobility is also to educate for citizenship.”
Programa Municipal de Comboios de Bicicletas, Parque do Vale do Silêncio, Olivais (Lisboa) | © CML, Ana Sofia Serra Municipal “Bicycle Trains” Programme, Vale do Silêncio Park, Olivais (Lisbon) | © CML, Ana Sofia Serra

Sofia Pires Bento insiste ainda na importância de integrar soluções baseadas na natureza no planeamento urbano: aumentar a permeabilidade dos solos, reforçar a presença de árvores, criar sombra e espaços verdes contínuos. Estes elementos são determinantes para enfrentar fenómenos como as ilhas de calor urbano e, simultaneamente, para tornar os percursos pedonais e cicláveis mais confortáveis e seguros.

As resoluções do Conselho de Ministros n.0 131/2019 e n.0 67/2023, bem como a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa, são referidas como marcos que enquadram juridicamente e operacionalizam a visão defendida.

Sofia Pires Bento also stresses the importance of integrating nature-based solutions into urban planning: increasing soil permeability, reinforcing tree cover, creating shade and establishing continuous green spaces. These elements are crucial to tackling phenomena such as urban heat islands, while at the same time making walking and cycling routes more comfortable and safer.

The Council of Ministers’ Resolutions no. 131/2019 and no. 67/2023, together with the National Active Mobility Strategy, are mentioned as key legal and operational milestones supporting this vision.

Educar para uma nova cultura de mobilidade | © Margarit Stamm \ Educating for a new mobility culture | © Margarit Stamm

No final, a mensagem é inequívoca: sem devolver espaço público às pessoas e sem colocar o peão no centro das políticas de mobilidade, será impossível cumprir os objetivos de neutralidade carbónica. A transformação não é apenas tecnológica, é sobretudo cultural e urbana.

“O espaço público deve ser pensado a partir do mais vulnerável. E o mais vulnerável, na cidade, é o peão.”

In conclusion, her message is unequivocal: without giving public space back to people and placing pedestrians at the heart of mobility policies, it will be impossible to meet carbon neutrality goals. The transformation is not only technological – it is above all cultural and urban.

“Public space must be designed starting from the most vulnerable. And the most vulnerable, in the city, is the pedestrian.”

Praça da Figueira | © CML, Ana Sofia Serra \ Praça da Figueira square (Lisbon) | © CML, Ana Sofia Serra

Estratégia climática Climate strategy

A defesa da mobilidade ativa apresentada por Sofia Pires Bento encontra prolongamento na intervenção de Catarina Freitas, que amplia a escala da reflexão para a estratégia climática e para o papel da estrutura verde como condição essencial do conforto térmico nos bairros.

A sua intervenção apresenta uma visão clara sobre a necessidade de tornar os bairros de Lisboa mais resilientes face às alterações climáticas. A pergunta simples, mas decisiva: “Que bairros e que espaços públicos queremos em Lisboa?”

A resposta baseia-se na ideia de que a cidade deve oferecer qualidade de vida, identidade cultural e territorial, e oportunidades de bem-estar social. Para isso, os espaços públicos precisam ser qualificados, atrativos, adaptados às novas exigências climáticas e promotores de sociabilidade. Nas palavras da oradora:

“O espaço público é o símbolo espacial da democracia e da igualdade.”

The case made for active mobility by Sofia Pires Bento is taken further in the intervention of Catarina Freitas, who broadens the discussion to the climate strategy and the role of green infrastructure as a key factor in ensuring thermal comfort in neighbourhoods.

Her contribution presents a clear vision of the need to make Lisbon’s neighbourhoods more resilient to climate change. The question is simple but decisive: “What kind of neighbourhoods and public spaces do we want in Lisbon?”

The answer is rooted in the idea that the city must offer quality of life, cultural and territorial identity, and opportunities for social well-being. To achieve this, public spaces need to be well designed, attractive, adapted to new climate demands, and foster sociability. In her own words:

“Public space is the spatial symbol of democracy and equality.”

O enquadramento climático é rigoroso. As projeções para o século XXI indicam um aumento da temperatura média anual entre +1 0C e +4 0C, bem como um acréscimo significativo do número de dias com temperaturas superiores a 35 0C e de noites tropicais. Prevê-se também a amplificação do efeito de ilha de calor urbano: no cenário mais gravoso, Lisboa poderá ter até seis vezes mais dias de onda de calor no final do século, em comparação com o clima atual. Paralelamente, espera-se uma diminuição da precipitação anual e um agravamento das secas, bem como subida do nível médio do mar que poderá atingir 1,1 metros em 2.100 em cenários extremos.

The climate context is rigorously presented. Projections for the 21st century indicate an increase in average annual temperature of between +1 °C and +4 °C, as well as a significant rise in the number of days with temperatures above 35 °C and in tropical nights. An intensification of the urban heat island effect is also expected: in the most severe scenario, Lisbon could experience up to six times more heatwave days by the end of the century compared with the current climate. At the same time, a decrease in annual rainfall and a worsening of droughts are anticipated, along with sea level rise that could reach 1.1 metres by 2,100 under extreme scenarios.

a inundações

Muito elevada elevada moderada

Suscetibilidade a inundações, extrato do Plano Diretor Municipal de Lisboa, 2012 | © CML

Susceptibility to flooding, Municipal Masterplan, 2012 | © CML

Vulnerabilidade
Onda de Calor - Entardecer
Ilhas de Calor Urbano, 2020 | © IGOT, CML Urban Heat Islands | © IGOT, CML

Face a estes riscos, a ação climática em Lisboa assenta na valorização da estrutura verde como instrumento de mitigação e adaptação. A cidade conta atualmente com 4.432 hectares de áreas verdes, cerca de 310.000 árvores em florestas, parques e jardins e mais de 60.000 árvores de alinhamento. Estes números não são apenas estatísticas: representam uma infraestrutura viva que regula a temperatura, melhora a qualidade do ar, retém águas pluviais, suporta biodiversidade e contribui para a saúde pública.

“Aumentar as áreas verdes e permeáveis é criar corredores de ventilação natural que arrefecem a cidade e regulam o clima.”

In response to these risks, Lisbon’s climate action is based on valuing green infrastructure as a tool for both mitigation and adaptation. The city currently has 4,432 hectares of green areas, around 310,000 trees in forests, parks and gardens, and more than 60,000 street trees. These figures are more than mere statistics: they represent a living infrastructure that regulates temperature, improves air quality, retains rainwater, supports biodiversity and contributes to public health.

“Expanding green and permeable areas means creating natural ventilation corridors that cool the city and regulate the climate.”

10.000 ha área total

4.432 ha área verdes

60.000 árvores de alinhamento

310.000 árvores em florestas, parques e jardins + Infraestrutura Verde | © CML \ Green Infrastructure | © CML

Catarina Freitas apresenta projetos em curso que traduzem esta estratégia. O Programa Arrefecer a Cidade, por exemplo, atua à microescala para reduzir os efeitos da ilha de calor urbano, através de mais sombra, elementos de água e solos permeáveis. O projeto europeu UP2030 – Urban Planning and design for 2030, já em implementação, visa criar um bairro neutro em carbono, com medidas que vão desde a arborização intensiva até à reconversão de telhados em coberturas verdes ou brancas.

Catarina Freitas presentes several ongoing projects that put this strategy into practice. The “Cooling the City” Programme, for example, operates at the microscale to reduce the effects of the urban heat island, through increased shade, water features and permeable soils. The European project UP2030 –Urban Planning and Design for 2030, already under way, aims to create a carbon-neutral neighbourhood, with measures ranging from intensive tree planting to the conversion of rooftops into green or white roofs.

Soluções de arrefecimento de cidade (Lisboa) | © CML City cooling solutions (Lisbon) | © CML

Exemplos concretos de intervenção são partilhados: a requalificação da Rua Carlos Mardel, entre a Alameda D. Afonso Henriques e a Rua Augusto Machado, com soluções reversíveis de arborização e ensombramento; ou a criação do Corredor Verde Oriental, que ligará o Parque José Gomes Ferreira ao Parque da Bela Vista através de um eco-viaduto arborizado sobre a Avenida Almirante Gago Coutinho.

Concrete examples of interventions are shared: the redevelopment of Rua Carlos Mardel, between Alameda D. Afonso Henriques and Rua Augusto Machado, featuring reversible tree planting and shading solutions; and the creation of the Eastern Green Corridor, which will connect Parque José Gomes Ferreira to Parque da Bela Vista via a tree-lined eco-viaduct over Avenida Almirante Gago Coutinho.

Arborização de arruamentos existentes em Lisboa: Rua Carlos Mardel - Situação anterior e simulação do resultado final | © CML Tree planting in existing streets in Lisbon: Rua Carlos Mardel - Current situation and final result | © CML

Lisboa define ainda metas ambiciosas no Contrato Climático Cidade de Lisboa 2030: reduzir em 80% as emissões de gases com efeito de estufa até 2030 e alcançar a neutralidade climática nesse mesmo ano. Paralelamente, pretende garantir que esta transição é justa e inclusiva, combatendo desigualdades e a pobreza energética.

“Adaptar a cidade às alterações climáticas é também uma questão de justiça social.”

A intervenção de Catarina Freitas deixa claro:

“a transformação da cidade não depende apenas de grandes obras, mas também da multiplicação de soluções à escala do bairro: árvores plantadas em ruas, logradouros renaturalizados, refúgios climáticos em zonas críticas.”

É nesta dimensão de proximidade que os cidadãos sentem, todos os dias, o impacto das políticas de resiliência.

Lisbon has also set ambitious targets in its Lisbon City Climate Contract 2030: to reduce greenhouse gas emissions by 80% by 2030 and to achieve climate neutrality in the same year. At the same time, the city aims to ensure that this transition is fair and inclusive, tackling inequalities and energy poverty.

“Adapting the city to climate change is also a matter of social justice.”

Catarina Freitas’ intervention makes it clear:

“Urban transformation does not depend solely on major projects, but also on multiplying solutions at the neighbourhood scale: trees planted along streets, renaturalised courtyards, climate shelters in critical areas.”

It is at this local, proximity-based scale that citizens feel the impact of resilience policies in their everyday lives.

O desenho do espaço público The design of public space

A sessão abre em tom próximo e entusiasta: a equipa da FC Arquitectura Paisagista – Catarina Assis

Pacheco e Filipa Cardoso Menezes – estabelece a ponte entre a visão estratégica de Catarina Freitas e, agora, os exemplos concretos.

E inicia-se precisamente por um espaço central que irradia efeitos de bairro em bairro: o Martim Moniz. Antes, porém, uma viagem por três obras que mostram como o desenho do espaço público se faz em diálogo com a cidade real, com as suas limitações e oportunidades.

The session opened in a warm and enthusiastic tone: the team from FC Landscape Architecture – Catarina Assis Pacheco and Filipa Cardoso Menezes – built a bridge between Catarina Freitas’ strategic vision and a series of concrete examples.

And it begins precisely with a central space whose influence radiates from neighbourhood to neighbourhood: Martim Moniz. Before that, however, there was a brief journey through three projects that illustrate how the design of public space is shaped through dialogue with the real city, with all its limitations and opportunities.

Vista da futura Praça da Capela de Nossa Senhora da Saúde, Martim Moniz (Lisboa) | © FC Arquitectura Paisagista
View of the future Praça da Capela de Nossa Senhora da Saúde, Martim Moniz (Lisbon) | © FC Arquitectura Paisagista

No Aterro da Boavista, projeto nascido de um plano de pormenor iniciado em 2006, a intervenção articula duas frentes: arruamentos de coexistência – onde o peão tem prioridade e o automóvel circula em regime condicionado – e logradouros de quarteirão 100% permeáveis. A ideia de base foi desde cedo assumida pela Câmara: infiltrar água, devolver solo vivo e abrir percursos de atravessamento norte–sul e nascente–poente. Entre árvores disputadas centímetro a centímetro com lugares de estacionamento e calibrações entre larguras de passeio e caldeiras, o projeto exigiu concertação entre departamentos municipais. Quase vinte anos depois, a obra avança faseadamente. Nem tudo correu como idealizado: uma saída de emergência e ventilação do Metropolitano foi “plantada” no meio do jardim, contrariando a integração arquitetónica prevista.

“Ainda assim, prevalece o ganho urbano raro em tecido consolidado: criar novos jardins onde antes só cabiam floreiras.”

do

Boavista Poente Land Subdivision, aerial view of the intervention area, Santos

At Aterro da Boavista, a project that originated from a detailed development plan launched in 2006, the intervention combines two key elements: shared streets – where pedestrians have priority and cars circulate under restricted conditions – and courtyard blocks that are 100% permeable. From the outset, the City Council embraced a clear idea: to infiltrate rainwater, restore living soil, and open up north–south and east–west pedestrian connections. Between trees negotiated centimetre by centimetre against parking spaces, and careful calibrations between pavement widths and tree pits, the project required close coordination between municipal departments. Nearly twenty years later, the works are progressing in phases. Not everything went exactly as planned: an emergency exit and ventilation shaft for the Metro was “planted” in the middle of the garden, undermining the intended architectural integration.

“Even so, what prevails is a rare urban achievement in consolidated urban fabric: creating new gardens where previously only planters could fit.”

Loteamento do Aterro da Boavista Poente, plano geral de intervenção, Santos (Lisboa) | © FC Arquitectura Paisagista Boavista Poente Land Subdivision, general intervention plan, Santos (Lisbon) | © FC Arquitectura Paisagista

Loteamento
Aterro da Boavista Poente, vista aérea da área de intervenção, Santos (Lisboa) | © Google
(Lisbon) | © Google

Segue-se um jardim de bairro entre a Rua Jorge Barradas, a Calçada do Tojal e a Rua Cláudio Nunes. O lugar era um vazio de traseiras com forte desnível. O programa municipal estabelecia como objetivos: transformar o espaço em uso público e garantir uma ligação pedonal acessível entre cotas. A meio do processo, metade da área foi cedida a um equipamento, comprimindo o desenho. A resposta traduziu a limitação em forma: um percurso acessível sinuoso estrutura o jardim, ao qual se soma uma “linha rápida” em escada para evitar atalhos destrutivos. A modelação do terreno cria bolsas de estadia – um pequeno anfiteatro natural – e duas zonas de equipamento infantil. Materiais robustos protegem a vegetação no período de instalação; hoje, com as plantas já a ganhar corpo, o espaço mostra-se versátil e vivido.

Next comes a neighbourhood garden located between Rua Jorge Barradas, Calçada do Tojal and Rua Cláudio Nunes. The site had previously been a backyard void with a steep gradient. The municipal programme set two key objectives: to transform the space into a public amenity and to ensure an accessible pedestrian connection between different levels. Midway through the process, half of the area was allocated to a public facility, compressing the original design. The response was to translate this constraint into form: a winding accessible path structures the garden, complemented by a “fast line” staircase to prevent the creation of damaging informal shortcuts. The terrain modelling creates seating pockets – including a small natural amphitheatre – and two children’s play areas. Robust materials were used to protect the vegetation during the establishment phase; today, as the planting has matured, the space has become versatile and well-used.

Jardim Carlos Consiglieri, Benfica (Lisboa) - lougradouro antes e após a obra concluída | © FC Arquitectura Paisagista
Carlos Consiglieri Garden, Benfica (Lisbon) – interior courtyard of a large urban block, before and after completion | © FC Arquitectura Paisagista

No Parque Ribeirinho Oriente (fase 1, em Marvila), requalificou-se uma antiga frente industrial por onde passavam linhas de comboio e operavam pontões de descarga. O desenho apoia-se num grande passeio junto ao Tejo e num “corpo verde” modelado em peças abrigadas, tirando partido do desnível entre a cota do novo edificado e a muralha ribeirinha. A estratégia de solos foi determinante: recusou-se material de enchimento inadequado, optando por areias e terras compatíveis, e estudou-se a vegetação potencial com base em sondagens, para reduzir manutenção e renaturalizar. O parque tornou-se um sucesso de usos – de pescadores a famílias – e aguarda a continuação para evitar a sensação de “fim abrupto”.

At Parque Ribeirinho Oriente (Phase 1, in Marvila), an old industrial riverfront – once crossed by railway tracks and used for unloading piers – has been redeveloped. The design is structured around a wide riverside promenade along the Tagus and a “green spine” shaped into sheltered sections, making use of the level difference between the new buildings and the river wall. Soil strategy played a decisive role: unsuitable fill material was rejected in favour of compatible sands and soils, and potential vegetation was studied through soil surveys, aiming to reduce maintenance needs and promote renaturalisation. The park has become a popular and well-used space, attracting everyone from local fishermen to families, and is now awaiting its continuation to avoid the current sense of an “abrupt ending.”

Parque Ribeirinho Oriente, Marvila (Lisboa) - área de intervenção antes e pós-obra do parque | © FC Arquitectura Paisagista
Oriente Riverside Park, Marvila (Lisbon) – intervention area before and after park construction | © FC Arquitectura Paisagista

Por fim, o Martim Moniz: “revelar a história e resgatar o vale fértil.”

Entre duas colinas e atravessado pela Cerca Fernandina, o lugar deixou de ser uma “ilha de asfalto” para se redesenhar como Praça-Jardim, com a Rua da Palma requalificada, a ermida valorizada e uma grande peça verde apoiada em contenções que criam solo sobre a laje do estacionamento. Prevê-se recolha de águas pluviais em cisterna, ligações acessíveis (incluindo escadas rolantes) e uma paleta botânica que cruza espécies nativas e referências às origens diversas dos utilizadores. A mensagem final foi clara:

“sem manutenção eficiente e participação ativa de moradores e associações, nenhum grande investimento em espaço público perdura. A cidade para as pessoas constrói-se, também, com as pessoas.”

Finally, the Martim Moniz project: “revealing history and reclaiming the fertile valley.”

Situated between two hills and crossed by the Cerca Fernandina wall, this site has been transformed from an “asphalt island” into a garden square, with the Rua da Palma upgraded, the chapel enhanced, and a large green structure built on retaining walls that create soil above the underground car park slab. The design includes rainwater harvesting in a cistern, accessible connections (including escalators), and a planting palette that blends native species with references to the diverse origins of its users. The closing message was clear:

“Without efficient maintenance and the active participation of residents and associations, no major investment in public space endures. A city for people is built, above all, with people.”

Excerto da Planta da Freguesia de Nossa Senhora do Socorro, 1770 (Lisboa) | © Arquivo Nacional da Torre do Tombo, ANTT,PT/TT/CF/153, J. Monteiro de Carvalho

Excerpt from the Map of the Parish of Nossa Senhora do Socorro, 1770 (Lisbon) | © Portuguese National Archives – Torre do Tombo, ANTT, PT/TT/CF/153, J. Monteiro de Carvalho

da futura Rua da Palma, Martim Moniz (Lisboa) | © FC Arquitectura Paisagista View of the future Rua

Vista
da Palma, Martim Moniz (Lisbon) | © FC Arquitectura Paisagista

A importância do comércio e dos equipamentos de Bairro

The importance of local commerce and Neighbourhood facilities

06 de junho de 2024 06 June 2024

Moderador Moderator

Paulo Pardelha

Departamento de Planeamento Urbano, CML

Urban Planning Department, CML

Oradores Speakers

Ana Morais de Sá

Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa

Sofia Ferreira de Almeida

NHood

Esplanadas de rua, Intendente (Lisboa) | © CML, Armindo Ribeiro
Outdoor café terraces, Intendente (Lisbon) | © CML, Armindo Ribeiro

Da Praça do Comércio ao comércio de Bairro From Praça do Comércio to local commerce

As cidades nascem do encontro. Desde os primeiros aglomerados humanos, a proximidade permitiu a troca de bens, ideias e culturas, dando origem ao que hoje entendemos como economia e sociedade urbana. Lisboa não é exceção: cresceu junto ao Tejo, rio que serviu como via privilegiada de comunicação, facilitando não só o comércio local, mas também a conexão com o mundo. Desde cedo, a cidade foi um espaço de troca – próximo e global ao mesmo tempo.

Ao longo dos séculos, a evolução urbana trouxe consigo a consciência da necessidade de provir outras funções que ultrapassassem a mera sobrevivência. Se inicialmente o foco estava no comércio e nos serviços de administração, a cidade moderna passou a integrar espaços dedicados à cultura, ao desporto, à educação, ao lazer e à saúde.

Cities are born from encounters. Since the earliest human settlements, proximity has enabled the exchange of goods, ideas and cultures, giving rise to what we now understand as the urban economy and society. Lisbon is no exception: it developed along the Tagus River, which served as a privileged communication route, facilitating not only local trade but also connections with the wider world. From early on, the city was a space of exchange – both local and global at the same time.

Over the centuries, urban evolution has brought with it the awareness of the need to provide functions that go beyond mere survival. While the early focus was on commerce and administrative services, the modern city began to integrate spaces dedicated to culture, sport, education, leisure and health.

Esta mudança reflete uma visão mais ampla do bem-estar coletivo, materializada em conceitos como “A Cidade Equipada”, “A Cidade Educadora” ou “A Cidade da Cultura”, para dar alguns exemplos.

This shift reflects a broader vision of collective wellbeing, embodied in concepts such as “The Equipped City”, “The Educating City” or “The Cultural City”, to name just a few.

IV Congresso Internacional de Turismo, dia da Inauguração, 1911 Baixa (Lisboa) | © Arquivo Municipal de Lisboa, JBN000419, Joshua Benoliel “4th International Tourism Congress, Opening Day, 1911”, Baixa (Lisbon) | © Lisbon Municipal Archive, JBN000419, Joshua Benoliel

Neste percurso, a praça pública emerge como um símbolo dessa multifuncionalidade. Espaço historicamente dedicado ao comércio, às declarações políticas, às celebrações e até aos conflitos, a praça também concentrava funções cívicas, religiosas e económicas. O comércio, esse, espalhou-se pela rua em volta da praça, e esta, hoje, mantém-se como um espaço público/equipamento central na vida de um bairro, palco de feiras, festivais e manifestações, reforçando o seu papel na construção social da cidade.

No entanto, as últimas décadas assistiram a transformações profundas. A proliferação de centros comerciais periféricos esvaziou parte do comércio tradicional, levando ao desenvolvimento de estratégias de urbanismo comercial que procuram revitalizar os tecidos locais. Paralelamente, a Internet e a micrologística permitem que hoje qualquer produto chegue à nossa porta, vindo da loja da esquina ou do outro lado do mundo. Esta facilidade coloca novos desafios ao comércio de proximidade, exigindo uma reinvenção da sua função social e económica.

Perante este contexto, ganha força a noção de bairro como unidade fundamental para uma cidade mais humana e sustentável. Conceitos como a Cidade dos 15 Minutos, a economia circular ou “produzir local, consumir local” orientam hoje as políticas urbanas. Trata-se de promover bairros coesos, solidários, com emprego, comércio vivo, equipamentos de qualidade, escolas, teatros e espaço público acessível e convidativo.

Neste sentido, o programa “Há Vida no Meu Bairro” representa um passo importante no aprofundamento da escala humana em Lisboa.

Along this trajectory, the public square has emerged as a symbol of this multifunctionality. Historically a space for commerce, political declarations, celebrations and even conflicts, the square also concentrated civic, religious and economic functions. Commerce gradually spread along the streets surrounding the square, and today the square remains a central public space and neighbourhood facility, hosting fairs, festivals and demonstrations, and reinforcing its role in the social construction of the city.

In recent decades, however, profound transformations have taken place. The proliferation of out-of-town shopping centres has drained much of the vitality from traditional commerce, leading to the development of commercial urbanism strategies aimed at revitalising local urban fabrics. At the same time, the Internet and micrologistics now make it possible for almost any product to reach our doorstep – whether from the corner shop or from the other side of the world. This ease of access presents new challenges for local commerce, demanding a reinvention of its social and economic role.

In this context, the notion of the neighbourhood as a fundamental unit for a more human and sustainable city is gaining strength. Concepts such as the 15-Minute City, the circular economy, or “produce locally, consume locally” are increasingly shaping urban policies. The aim is to promote cohesive and supportive neighbourhoods, with local employment, vibrant commerce, quality facilities, schools, theatres, and accessible, welcoming public spaces.

In this regard, the “Há Vida no Meu Bairro” (There is Life in My Neighbourhood) programme represents an important step towards deepening the human scale in Lisbon.

“Ao valorizar o comércio local, os equipamentos de proximidade e os espaços públicos, está-se a construir uma cidade mais resiliente, inclusiva e preparada para o futuro. Uma cidade que, sem perder a sua história, se consolida e inova a partir dos seus bairros – porque é neles que a vida realmente acontece.”

“By valuing local commerce, neighbourhood facilities and public spaces, we are building a city that is more resilient, inclusive and prepared for the future. A city that, without losing its history, grows stronger and innovates from its neighbourhoods – because that is where life truly happens.”

Departamento de Planeamento Urbano, CML

O renovado Campo das Cebolas (Lisboa) | © CML, Américo Simas \ The renovated Campo das Cebolas Square (Lisbon) | © CML, Américo Simas

Os equipamentos locais

na Cidade dos 15 Minutos

The importance of local facilities in the 15-Minute City

Ana Morais de Sá abre a sessão com uma reflexão sobre o papel dos equipamentos coletivos enquanto infraestrutura social da cidade. Sublinha que escolas, centros de saúde, bibliotecas e mercados não são apenas edifícios funcionais: são lugares de encontro, pertença e cidadania. A oradora defende que a rede de equipamentos deve ser pensada à escala de bairro, garantindo equidade territorial e acesso universal.

“Os equipamentos coletivos são os pilares invisíveis da coesão urbana.”

Ana Morais de Sá opens the session with a reflection on the role of collective facilities as the city’s social infrastructure. She stresses that schools, health centres, libraries and markets are not merely functional buildings: they are places of encounter, belonging and citizenship. The speaker argues that the network of facilities must be planned at neighbourhood scale, ensuring territorial equity and universal access.

“Collective facilities are the invisible pillars of urban cohesion.”

Vale a pena revisitar o conceito. A Direção-Geral de Ordenamento do Território descreve equipamentos como edificações onde se prestam serviços de interesse público, imprescindíveis à qualidade de vida. Costa Lobo alargou a definição: não são apenas edifícios, mas instalações físicas onde a população acorre para satisfazer necessidades fundamentais. A American Planning Association acrescenta a dimensão sistémica: edifício, infraestruturas e propriedade articulados para garantir um serviço público. Em comum, a ideia de um bem acessível a todos, independentemente do rendimento, que responde a necessidades universalmente reconhecidas.

Este quadro conceptual é decisivo num tempo em que o Estado social deu lugar, em parte, a um Estado regulador. Reconhecemos o papel dos privados, em articulação com a administração, mas também que há setores – saúde, educação, segurança, cultura – onde o Estado está constitucionalmente vinculado a proteger serviços. O solo urbano, escasso e disputado, não se organiza sozinho; sem regulação planeada, o mercado produz assimetrias e espaços excelentes para poucos. Cabe ao planeamento prever, dimensionar e localizar equipamentos com justiça espacial, em quantidade suficiente e em tempo útil.

Com os seus alunos, Ana Morais de Sá discute o exemplo de um “território educativo”: pode não haver falta de salas, mas há falta de proximidade. Se a escola básica não estiver a quinze minutos a pé, e se um corredor rodoviário hostil cortar o caminho, a equidade falha.

It is worth revisiting the concept. The DirectorateGeneral for Spatial Planning defines facilities as buildings where public-interest services are provided, essential to quality of life. Costa Lobo broadened this definition: facilities are not just buildings, but physical infrastructures where people go to meet fundamental needs. The American Planning Association adds a systemic dimension: building, infrastructure and land ownership working together to guarantee a public service. What all these perspectives share is the idea of a good accessible to everyone, regardless of income, responding to universally recognised needs.

This conceptual framework is crucial at a time when the welfare state has partly given way to a regulatory state. We acknowledge the role of private actors in coordination with public administration, but also recognise that there are sectors – health, education, security, culture – where the State is constitutionally bound to protect services. Urban land, scarce and contested, does not organise itself; without planned regulation, the market generates asymmetries and excellent spaces for the few. It is up to urban planning to anticipate, size and locate facilities with spatial justice, in sufficient quantity and in a timely manner.

Ana Morais de Sá highlights the concept of “educational territory”: there may be no shortage of classrooms, but there is a lack of proximity. If a primary school is not within a fifteen-minute walk, and if a hostile road corridor cuts through the route, equity fails.

O Bairro de Alvalade continua a ser lição viva. Nas grandes células, a escola do 1.0 ciclo está no centro; os 2.0 e 3.0 ciclos alinham-se nos eixos principais; a hierarquia viária estrutura comércio e serviços; o espaço público é generoso. É assim que os equipamentos de bairro animam a vida quotidiana, atraem agentes económicos e dão coerência à cidade. Na cidade de Lisboa, o problema real surge onde “o bairro” não existe: há casas, mas pouco espaço público qualificado, quase nenhum equipamento e transporte insuficiente.

The Alvalade neighbourhood remains a living lesson. Within its large urban cells, primary schools are located at the centre; lower and upper secondary schools are positioned along the main axes; the road hierarchy structures commerce and services; and public space is generous. This is how neighbourhood facilities animate everyday life, attract economic activity and give the city coherence. In Lisbon, the real challenge emerges where “the neighbourhood” does not exist: where there are houses but little qualified public space, almost no facilities, and insufficient transport provision.

Plano de Urbanização da Zona a Sul da Avenida Alferes Malheiro, 1945, Alvalade (Lisboa) | © CML, Faria da Costa Urban Development Plan for the Area South of Avenida Alferes Malheiro, 1945, Alvalade (Lisbon) | © CML, Faria da Costa

A oradora mostra ainda como os equipamentos coletivos são polos de animação urbana e geradores de fluxos, fundamentais para estruturar bairros equilibrados. Exemplos como as escolas de proximidade, bibliotecas ou centros culturais ilustram o impacto que estas infraestruturas têm na vida quotidiana. Enquanto referências internacionais, destaca a Biblioteca Central de Helsínquia que, não sendo de proximidade, é um condensador cívico exemplar: espaço não comercial, aberto a todos, com teatro, estúdios, fablab, salas de costura e uma cozinha partilhada. Serve necessidades diversas e cria pertença.

The speaker also demonstrates how collective facilities act as hubs of urban activity and generators of flows, playing a fundamental role in shaping balanced neighbourhoods. Examples such as local schools, libraries and cultural centres illustrate the impact these infrastructures have on daily life. As an international reference, she highlighted the Helsinki Central Library, which, while not a local facility, stands as an exemplary civic condenser: a non-commercial space, open to all, featuring a theatre, studios, a fab lab, sewing rooms and a shared kitchen. It meets diverse needs and fosters a sense of belonging.

Biblioteca Central de Helsínquia | © Kuvio / oodihelsinki.fi \ Helsinki Central Library Oodi | © Kuvio / oodihelsinki.fi

Em Berlim, um equipamento híbrido – cowork, auditório, biblioteca – ancorado por uma grande loja de artes gráficas, que reativou uma praça difícil. Não se trata de centros comerciais camuflados, mas de ecossistemas públicos que podem atrair investimento privado compatível.

In Berlin, a hybrid facility – combining coworking spaces, an auditorium and a library – anchored by a large graphic arts shop, successfully reinvigorated a challenging square. These are not disguised shopping centres, but public ecosystems capable of attracting compatible private investment.

Aufbau Haus, Moritzplatz (Berlim) | © aufbauhaus.de

Planeamento é a arte dos compromissos e da construção de consensos. Entre o racional técnico e a ambição política, o objetivo mantém-se: equipamentos que reforcem a produtividade do território, a coesão social e a vida quotidiana. Se queremos “cidade para as pessoas”, então os equipamentos têm de ser, também, feitos com as pessoas. E, sobretudo, cuidados na sua manutenção, para perdurarem vivos, úteis e justos, sempre.

Planning is the art of compromise and consensusbuilding. Between technical reasoning and political ambition, the objective remains the same: to create facilities that strengthen territorial productivity, social cohesion and everyday life. If we want a “city for people”, then facilities must also be shaped with people. And above all, they must be properly maintained, so that they remain alive, useful and fair – always.

Escola Básica e Jardim de Infância Arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles | © Lisboa SRU, João Peleteiro Primary School and Nursery Arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles | © Lisboa SRU, João Peleteiro

Regeneração urbana e

comércio de proximidade Urban regeneration and local commerce

Catarina Lopes, fundadora da Urban Fabric, apresenta a sua experiência em processos de regeneração urbana, sublinhando o papel do comércio de proximidade e da cooperação público-privada na vitalidade dos bairros. O seu percurso profissional está ligado a projetos emblemáticos em Lisboa, como a requalificação do Príncipe Real, e mais recentemente as iniciativas de revitalização no centro histórico de Cascais.

A oradora estrutura a reflexão em quatro pontos:

1. Os desafios atuais do comércio de bairro

2. O caso do Príncipe Real

3. Cascais, o laboratório atual – sempre com o município como aliado

4. Que papel podem ter os municípios?

Catarina Lopes, founder of Urban Fabric, shares her experience in urban regeneration processes, emphasising the role of local commerce and public–private cooperation in sustaining neighbourhood vitality. Her professional background is linked to emblematic projects in Lisbon, such as the redevelopment of Príncipe Real, and more recently to revitalisation initiatives in Cascais’ historic centre.

The speaker structured her reflection around four key points:

1. The current challenges of local commerce

2. The case of Príncipe Real

3. Cascais – the current laboratory, always with the municipality as an ally

4. The role municipalities can play

1. O contexto mudou. Durante décadas o comércio cumpriu sobretudo uma função de abastecimento. Hoje enfrenta a concorrência da internet, que esvazia a compra de proximidade. Para tirar as pessoas de casa, há duas chaves que um carrinho online não oferece: utilidade presencial (clínicas, ginásios, serviços) e, sobretudo, experiências esteticamente apelativas com oportunidades de socialização. Sem isto, a rua esvazia-se, a segurança degrada-se e a economia local perde dinâmica.

“Um bairro com comércio vivo é um bairro com identidade, segurança e sentido de pertença.”

1. The context has changed. For decades, commerce mainly served a supply function. Today, it faces the competition of online shopping, which undermines local purchasing. To encourage people to leave their homes, two elements are crucial – things that an online shopping cart cannot offer: on-site utility (such as clinics, gyms and services) and, above all, aesthetically appealing experiences with opportunities for social interaction. Without these, streets empty, security deteriorates, and local economies lose vitality.

“A neighbourhood with vibrant commerce is a neighbourhood with identity, safety and a sense of belonging.”
A Mariazinha, Alvalade (Lisboa): Loja histórica especializada na venda de chás e cafés | © CML, Ana Luísa Alvim
A Mariazinha, Alvalade (Lisbon): Historic shop specializing in the sale of teas and coffees | © CML, Ana Luísa Alvim

2. Na revitalização do Príncipe Real, a oradora começa por destacar como, no início dos anos 2000, o Príncipe Real enfrentava sinais claros de degradação: lojas encerradas, espaços abandonados e um tecido social fragilizado.

Foi um processo faseado, começando-se por testar ideias com baixo risco, corrigindo rápido, e só depois se escalou o que funcionava. A existência de um investidor com visão de longo prazo e com escala permitiu uma curadoria de mix comercial. O facto de Catarina viver no Bairro ajudou: falar todos os dias com moradores, lojistas, polícia e equipas de limpeza originou um feedback contínuo. Percebeu-se cedo outra regra: garantir utilizadores diurnos (escritórios e serviços) para que o comércio respire também fora do horário de jantar. Fatores externos somaram-se: Lisboa tornou-se destino recorrente, o jardim foi requalificado e iluminado, a perceção de segurança melhorou e a crise do subprime libertou energia empreendedora – novas marcas, novos projetos. O reconhecimento internacional (como o destaque da Time Out em 2015) foi o culminar deste processo.

“A aposta em estratégias de regeneração urbana baseadas no retalho, na cultura e na diversificação de usos contribuiu para transformar a zona numa das áreas mais dinâmicas da cidade.”

2. In the revitalisation of Príncipe Real, the speaker begins by highlighting how, in the early 2000s, Príncipe Real was showing clear signs of decline: closed shops, abandoned spaces and a weakened social fabric.

The process was phased: it started by testing low-risk ideas, making quick adjustments, and only then scaling up what worked. The presence of an investor with long-term vision and sufficient scale allowed for careful curation of the commercial mix. Catarina’s decision to live in the neighbourhood also helped: daily conversations with residents, shopkeepers, police and cleaning teams generated continuous feedback. Another key rule was identified early on: ensuring daytime users (offices and services) so that commercial life would not depend solely on evening activity. External factors played a role too: Lisbon became a regular tourist destination, the garden was refurbished and illuminated, the perception of safety improved, and the subprime crisis unleashed entrepreneurial energy, bringing new brands and projects. International recognition – such as Time Out’s highlight in 2015 – marked the culmination of this process.

“The focus on urban regeneration strategies based on retail, culture and the diversification of uses helped transform the area into one of the most dynamic in the city.”

3. O exemplo de Cascais. Cascais é o laboratório atual, com diferenças relevantes. Aqui o problema não é o “adormecimento”, é a descaracterização. O tecido é menos compacto, faltam escritórios modernos e o financiamento é mais exigente (concessões exigem garantias que os bancos nem sempre aceitam). Do lado positivo, há turismo, residentes com poder de compra e uma autarquia próxima, com licenças céleres e diálogo direto. A concessão reuniu seis edifícios municipais, aos quais se somou um sétimo adquirido anteriormente – pouca escala, mas suficiente para começar. Catarina explica os usos que estão a ser instalados, que criam vida diária e identidade: uma clínica (movimento ao longo do dia); o Café Joyeux com equipa inclusiva (pessoas com deficiência); um restaurante contemporâneo; uma “mini-embaixada” (comparando com a Embaixada do Príncipe Real) de marcas portuguesas em slow retail; a Brave Generation Academy (jovens no centro todos os dias); e a Manufatura – espaço de laboração aberta ao público, onde o fazer e o vender convivem. Seguir-se-á um projeto pedagógico e/ou recreativo.

3. The example of Cascais. Cascais is the current laboratory, with some significant differences. Here, the issue is not “falling asleep” but loss of character. The urban fabric is less compact, there is a shortage of modern office spaces, and financing is more demanding (concessions require guarantees that banks do not always accept). On the positive side, there is tourism, residents with purchasing power, and a proactive local authority, known for swift licensing and direct dialogue. The concession included 6 municipal buildings, with another one having been acquired earlier - a relatively small universe, but enough to get the project going. Catarina explained the mix of uses now being introduced, which create daily activity and identity: a clinic, ensuring movement throughout the day; Café Joyeux, employing people with disabilities; a contemporary restaurant; a “mini-embassy” of Portuguese brands in a slow retail model (drawing a parallel with the Príncipe Real Embaixada); Brave Generation Academy, bringing young people into the centre every day; and Manufatura, an open workshop where making and selling coexist. An educational/recreational project will follow.

Jardim do Princípe Real (Lisboa) | © EastBanc, João Peleteiro

4. E, o que podem fazer os municípios?

Três frentes:

• Ativar património com concursos de concessão que avaliem não só a renda, mas o conceito e o impacto urbano – premiando quem garante usos diurnos, mistura de programas e identidade local.

• Regular o espaço público (mobiliário, esplanadas, comunicação visual): qualidade visível eleva o conjunto e cria confiança.

• Manter a “porta aberta”: convocar privados antes dos concursos, trocar ideias, alinhar expectativas e evitar procedimentos sem candidatos, assegurando que a visão é partilhada.

Em suma:

“revitalizar o comércio é desenhar bons motivos para sair de casa – úteis, belos e humanos – e fazê-lo em parceria. Quando o ecossistema certo se instala, a cidade responde.”

4. And what can municipalities do?

Three key fronts:

• Activate public assets through concession tenders that assess not only rent, but also concept and urban impact – rewarding those who guarantee daytime uses, programme diversity, and local identity.

• Regulate public space (street furniture, terraces, visual communication): visible quality elevates the whole and builds trust.

• Keep the “door open”: involve private actors before launching tenders, exchange ideas, align expectations, and avoid deserted procedures, ensuring that the vision is shared.

In short:

“Revitalising commerce means designing good reasons to leave the house – useful, beautiful and human – and doing so in partnership. When the right ecosystem takes root, the city responds.”

Vista área do Jardim do Príncipe Real (Lisboa) | © EastBanc, João Peleteiro \ Aerial view of the Príncipe Real Garden (Lisbon) | © EastBanc, João Peleteiro
Fachada principal do espaço “O Relógio” (Cascais) | © Danille Lemos \ Main façade of “O Relógio” space, (Cascais) | © Danille Lemos

Ouvir habitantes, envolver o comércio

Listen to residents, engage local commerce

Da escala local do comércio trabalhada por Catarina Lopes, a sessão prossegue com a visão internacional de Sofia Ferreira de Almeida, que analisa como o comércio de proximidade se cruza com o modelo da Cidade dos 15 Minutos.

Sofia começa por destacar o essencial: ouvir e cocriar.

Em qualquer projeto urbano, o resultado melhora quando recolhemos os contributos de todos os que vivem, trabalham ou simplesmente atravessam o bairro. O método estrutura-se em: participação, debate informado e síntese clara, para transformar expectativas difusas em soluções concretas.

“Transformar metros quadrados em lugares com vida é o desafio central da regeneração urbana.”

From the local scale of commerce explored by Catarina Lopes, the session moves on to the international perspective of Sofia Ferreira de Almeida, who examines how local commerce intersects with the 15-Minute City model.

Sofia begins by emphasising the essentials: listening and co-creating.

In any urban project, the outcome improves when we gather contributions from everyone who lives, works or simply passes through the neighbourhood. The method is structured around participation, informed debate and clear synthesis, transforming diffuse expectations into concrete solutions.

“Transforming square metres into lively places is the central challenge of urban regeneration.”

“A proximidade é sinónimo de qualidade de vida. Os bairros têm de oferecer respostas concretas às necessidades diárias dos seus habitantes.”

“Proximity is synonymous with quality of life. Neighbourhoods must offer concrete responses to the daily needs of their residents.”

Jardim da Parada, Campo de Ourique (Lisboa) | © CML, Ana Luísa Alvim
Jardim da Parada Square in Campo de Ourique (Lisbon) | © CML, Ana Luísa Alvim

Da sua experiência na Nhood, inspirada no conceito da Cidade dos 15 Minutos, Sofia Ferreira de Almeida apresenta algumas experiências internacionais que mostram como alinhar mobilidade, usos mistos e identidade local para criar bairros vivos.

1. Vialia, uma marca comercial criada pela ADIF (Administrador de Infraestructuras Ferroviarias, entidade pública espanhola) para designar um modelo de estações ferroviárias de nova geração, que combinam transporte e comércio. Partindo de linhas de alta velocidade e interfaces rodoviários, constrói-se um nó urbano que deixa de ser apenas passagem para se tornar destino. O segredo está no desenho poroso e programável: retalho de proximidade, restauração, cultura e serviços públicos que dão vida ao longo do dia. Aqui, o comércio não é fim em si mesmo; é “cola social”. De manhã serve quem chega com cafés e mercearias; ao almoço ativa esplanadas; ao fim da tarde acolhe eventos e pequenas programações culturais.

2. Em Milão, o Merlata Bloom aprofunda essa lógica de uso misto com escala: cerca de 70.000 m2, dos quais 10.000 m2 dedicados ao lazer, e uma fatia robusta de restauração. A componente experimental é decisiva. Integrado no universo AFM (Association Familiale Mulliez) – que agrega marcas como Auchan, Decathlon e Leroy Merlin –, o projeto incorpora uma “grande loja” como laboratório vivo: experimentar desportos, testar equipamentos, promover clínicas e oficinas. Entre o marketplace, os espaços de estar e percursos cobertos, cria-se um lugar onde consumo, aprendizagem e convívio se misturam, respondendo a diferentes públicos ao longo do dia e das estações.

Drawing on her experience at Nhood, and inspired by the 15-Minute City concept, Sofia Ferreira de Almeida presents several international case studies that demonstrate how to align mobility, mixed uses and local identity to create vibrant neighbourhoods.

1. Vialia, a commercial brand created by ADIF (Administrador de Infraestructuras Ferroviarias, a Spanish public rail infrastructure entity) to designate a model of next-generation railway stations that combine transport and retail. Starting from high-speed rail lines and road interfaces, an urban hub is built that ceases to be merely a point of transit and becomes a destination in its own right. The key lies in porous and flexible design: local retail, restaurants, cultural spaces and public services that bring the area to life throughout the day. Here, commerce is not an end in itself; it acts as a “social glue.” In the morning, cafés and grocers serve commuters; at lunchtime, terraces are activated; and in the late afternoon, the space hosts events and small cultural programmes.

2. In Milan, Merlata Bloom takes this mixed-use logic further and at scale: around 70,000 m2, of which 10,000 m2 are dedicated to leisure, alongside a substantial share of restaurants. The experimental component is key. Integrated into the AFM (Association Familiale Mulliez) ecosystem – which brings together brands such as Auchan, Decathlon and Leroy Merlin – the project incorporates a “flagship store” as a living lab: a place to try out sports, test equipment, and host clinics and workshops. Between the marketplace, social spaces and covered walkways, the result is a place where consumption, learning and social interaction blend together, responding to different audiences throughout the day and across the seasons.

3. No Norte de França, La Maillerie (Lille) mostra como reconverter uma antiga área têxtil sem perder identidade. O projeto articula habitação, escola, residência sénior, trabalho e comércio num tecido pedonal generoso, onde os nomes dos espaços preservam a memória industrial. O objetivo é simples e claro: que a maioria das necessidades quotidianas se resolva a pé. Não é um “centro comercial a céu aberto”; é cidade compacta e mista, com espaços públicos de estada, programas para diferentes idades e uma curadoria de marcas locais que reforça o sentido de pertença.

46% Novos espaços verdes · 16.000 m2 Escritórios

700 Novos apartamentos · 10.000 m2 Lojas e serviços

1 Hotel · 2 Residências para séniores · 1 Escola

3. In northern France, La Maillerie (Lille) demonstrates how to redevelop a former textile district without losing its identity. The project integrates housing, a school, senior residences, workplaces and commerce within a generous pedestrian fabric, where the names of streets and spaces preserve the site’s industrial memory. The goal is simple and clear: most daily needs should be met on foot. This is not an “open-air shopping centre”; it is a compact, mixed-use urban district, with public spaces for socialising, programmes for different age groups, and a curation of local brands that strengthens the sense of belonging.

46% new green spaces · 16,000 m2 of office space

700 new apartments · 10,000 m2 of shops and services · 1 hotel · 2 senior residences · 1 school

Les Halles de La Maillerie, Villeneuve-d’Ascq (França) | © Les Halles de La Maillerie

4. Ainda em Milão, o Loreto Square (Piazzale Loreto) ilustra o papel da liderança pública. Num projeto de regeneração urbana público, sustentável e inclusivo, duas artérias congestionadas estão a transformarse numa grande praça: cerca de 10.000 m2 para a nova ágora e 14.000 m2 de espaço público no total, com mais árvores, coberturas verdes e soluções energéticas limpas. O programa inclui comércio e restauração, mas subordinados à função cívica: criar um lugar seguro para atravessar, ficar e encontrar-se. Quando o desenho privilegia o peão e a permanência, o investimento privado alinha com objetivos públicos e o bairro ganha qualidade ambiental e social.

10.000 m2 Nova praça · 14.000 m2 Espaços públicos 500 Novas árvores · 4.700 m2 Painéis fotovoltaicos 1.100 m2 Superfície ciclável · 1.300 m2 Coberturas verdes

4. Also in Milan, Loreto Square (Piazzale Loreto) illustrates the importance of public leadership. In this public, sustainable and inclusive urban regeneration project, two congested arteries are being transformed into a large civic square: around 10,000 m2 for the new agora and 14,000 m2 of public space in total, with more trees, green roofs and clean energy solutions. The programme includes retail and restaurants, but these are subordinate to the civic function: to create a safe place to cross, stay and meet. When urban design prioritises pedestrians and lingering, private investment aligns with public objectives, and the neighbourhood gains environmental and social quality.

10,000 m2 new square · 14,000 m2 public spaces

500 new trees · 4,700 m2 photovoltaic panels 1,100 m2 cycling infrastructure · 1,300 m2 green roofs

Piazzale Loreto (Milão) | © Comune di Milano

Destas experiências, Sofia Ferreira de Almeida evidencia os seguintes princípios claros:

• Primeiro, o retalho como infraestrutura social: lojas e cafetarias adaptáveis que acolhem debates, exposições e serviços efémeros.

• Segundo, os “local heroes” que dão identidade e combatem a homogeneização.

• Terceiro, sustentabilidade integral – pessoas, planeta e viabilidade económica –, porque projetos sem equilíbrio não perduram.

• Por fim, atenção ao teletrabalho: pode revitalizar zonas residenciais, mas precisa de contrapesos presenciais para manter a rua viva.

“É assim, ouvindo e testando, que

traduzimos visões em lugares concretos. As cidades mudam quando articulamos usos, tempos e comunidades – e quando cada novo projeto se torna, de facto, um bom vizinho.”

From these experiences, Sofia Ferreira de Almeida highlights several clear principles:

• First, retail as social infrastructure: shops and cafés designed to be adaptable, hosting debates, exhibitions and temporary services.

• Second, the importance of “local heroes”, who give places identity and counteract homogenisation.

• Third, holistic sustainability – people, planet and economic viability – because projects without balance do not endure.

• Finally, attention to remote working: it can revitalise residential areas, but it needs in-person counterweights to keep streets lively.

“This is how, by listening and experimenting, we translate visions into real places. Cities change when we bring together uses, rhythms and communities – and when each new project truly becomes a good neighbour.”

O que é uma cidade saudável? E um Bairro saudável?

What is a healthy city? And a healthy Neighbourhood?

27 de junho de 2024 27 June 2024

Moderador Moderator Paulo Diogo

Direção Municipal de Urbanismo, CML Director of Urban Planning, CML

Oradores Speakers

Joana Almeida

Vereadora de Urbanismo, CML

Councillour for Urban Planning, CML

Alexandra Gomes

LSE Cities, London School of Economics and Political Science

Ângela Freitas

Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território, Universidade de Coimbra

Centre of Studies in Geography and Spatial Planning, University of Coimbra

Campo de Basket, por Pitanga, São Domingos de Benfica (Lisboa) | © CML, Américo Simas Basketball court by Pitanga, São Domingos de Benfica (Lisbon) | © CML, Américo Simas

Lisboa, uma cidade saudável

Lisbon, a healthy city

O conceito de cidades saudáveis tem vindo a ganhar destaque nas políticas urbanas contemporâneas. Uma cidade saudável é aquela que promove o bem-estar físico, mental e social dos seus habitantes, através de um planeamento urbano equilibrado, sustentável e inclusivo. Lisboa, tem assumido e reforçado o seu papel neste movimento, procurando implementar estratégias que visam uma cidade mais ecológica, próxima, participativa e segura.

A ecologia urbana é um pilar central desta visão. Lisboa tem investido na criação e valorização de espaços verdes que não só melhoram a qualidade do ar e reduzem as ilhas de calor, como também oferecem locais de lazer e convivência essenciais para a saúde física e emocional dos cidadãos. Além disso, o incentivo à mobilidade sustentável, com a expansão da rede ciclável e a promoção da utilização dos transportes públicos, reduz as emissões de carbono e promove modos de vida mais saudáveis.

The concept of healthy cities has been gaining increasing prominence in contemporary urban policies. A healthy city is one that promotes the physical, mental, and social well-being of its inhabitants through balanced, sustainable, and inclusive urban planning. Lisbon has embraced and strengthened its role within this movement, implementing strategies that aim to make the city greener, closer, more participatory, and safer.

Urban ecology stands as a central pillar of this vision. Lisbon has invested in the creation and enhancement of green spaces that not only improve air quality and reduce urban heat islands, but also provide essential places for leisure and social interaction, contributing to the physical and emotional health of its citizens. In addition, the promotion of sustainable mobility –through the expansion of the cycling network and encouragement of public transport use – helps to reduce carbon emissions and fosters healthier lifestyles.

Praça do Comércio (Lisboa) | © CML, Américo Simas

A proximidade é outro elemento-chave: Lisboa procura ser uma cidade onde se pode viver, trabalhar e aceder a funções de proximidade, alinhando-se com o conceito da “Cidade dos 15 Minutos”. Esta abordagem reforça o comércio local, estimula as relações comunitárias e diminui a necessidade de deslocações longas, contribuindo para uma vida urbana mais equilibrada e sustentável.

A participação dos cidadãos tem sido também uma prioridade. O Conselho de Cidadãos e a realização de diversas sessões públicas incentivam o diálogo entre população e autarquia. Deste modo, os lisboetas são ouvidos sobre as soluções para a cidade e respetivos investimentos municipais, fortalecendo, assim, o sentimento de pertença e a responsabilidade coletiva.

A Cidade Saudável é a cidade cujo edificado está reabilitado, com o espaço público qualificado e que garante equilíbrio entre modernidade e preservação do património cultural, valorizando os bairros, numa mistura saudável entre habitação, cultura, comércio e lazer.

Proximity is another key element: Lisbon aims to be a city where people can live, work, and access everyday services within a short distance, aligning itself with the concept of the “15-Minute City.” This approach strengthens local commerce, fosters community relationships, and reduces the need for long commutes, contributing to a more balanced and sustainable urban life.

Citizen participation has also been a priority. The Citizens’ Council and a range of public sessions encourage dialogue between residents and the municipality. Through these initiatives, Lisbon’s inhabitants are actively involved in shaping urban solutions and guiding municipal investments, thereby reinforcing both their sense of belonging and their shared civic responsibility.

A Healthy City is one where the built environment is rehabilitated, the public space is of high quality, and there is a balance between modernity and the preservation of cultural heritage – a city that values its neighbourhoods through a harmonious mix of housing, culture, commerce, and leisure.

Sessão pública de apresentação do projeto de requalificação do Martim Moniz | © CML, Ana Sofia Serra
Public presentation session of the Martim Moniz redevelopment project | © CML, Ana Sofia Serra

Cidades e Bairros saudáveis:

Práticas

em Lisboa Healthy cities and Neighbourhoods: Practices in Lisbon

Joana Almeida, vereadora do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa, abre a sessão com uma reflexão sobre o que significa construir uma cidade saudável e um bairro saudável. A sua intervenção recupera as lições da pandemia e enquadrou-as no Programa “Há Vida no Meu Bairro”.

Recorda que, durante a pandemia, Lisboa revelou-se de outra forma. As ruas antes cheias de carros ficaram vazias e o ruído urbano transformou-se em silêncio e som dos pássaros. No Tejo, os golfinhos regressaram e lembraram-nos que Cidade também é Natureza. O isolamento forçou cada pessoa a olhar para a cidade com novos olhos. O teletrabalho trouxe vantagens, mas também expôs a fragilidade das relações sociais. Trouxe solidão. E foi na rua, nas esplanadas improvisadas, nos passeios a Monsanto, que se redescobriu a importância do espaço público e da vivência de Bairro.

Joana Almeida, councillor for Urban Planning at Lisbon City Council, opens the session with a reflection on what it means to build a healthy city and a healthy neighbourhood. Her address revisits the lessons of the pandemic and framed them within the “Há Vida no Meu Bairro” (There is Life in My Neighbourhood) programme.

She recalls how, during the pandemic, Lisbon revealed itself in a different light. Streets once filled with cars fell silent, and the familiar urban noise was replaced by quiet and birdsong. In the Tagus, dolphins returned, reminding everyone that the city is also part of nature. Isolation forced people to see their city through new eyes. Teleworking brought advantages, but also exposed the fragility of social ties. It brought loneliness. And it was out in the streets – on improvised terraces and in walks through Monsanto Park – that residents rediscovered the importance of public space and neighbourhood life.

Para muitos, a pandemia foi um tempo de reflexão. Surgiu uma nova consciência sobre o Planeta, sobre o papel da Cidade na Qualidade de Vida. Lisboa revelou as suas fragilidades, mas também as suas potencialidades: os bairros próximos, as funções essenciais a poucos minutos de casa, o valor das mercearias e farmácias de esquina, a entreajuda dos vizinhos, a importância do espaço verde e do comércio de proximidade.

For many, the pandemic became a moment of introspection. A new awareness of the planet emerged, along with a clearer sense of the city’s role in shaping quality of life. Lisbon’s vulnerabilities became evident, but so did its strengths: compact neighbourhoods, essential functions within walking distance, the value of corner shops and pharmacies, neighbourly solidarity, and the vital role of green spaces and local commerce.

Regresso da vida ao rio Tejo, Pandemia Covid 19 | © CML Life returning to the Tagus River during the Covid 19 Pandemic | © CML

Destas lições da Pandemia nasceu uma visão: A Cidade Saudável. Uma cidade de proximidade, ativa e segura, onde a mobilidade suave ganha centralidade e a qualidade do ar deixa de ser apenas um dado técnico para se tornar numa experiência sensível, vivida. Lisboa percebeu que uma cidade saudável se constrói tanto com infraestruturas como com relações humanas.

“O que é uma Cidade Saudável? É a Cidade que garante qualidade de vida para todos os seus habitantes, através do acesso equitativo a serviços, espaços verdes, habitação digna, mobilidade sustentável e um ambiente seguro e limpo.”

Em Lisboa, esta visão traduz-se em políticas de reabilitação urbana nas zonas esquecidas e degradadas, como o Programa “Cinco Vales” – Chelas, Santo António, Almirante Reis, Alcântara e Ajuda –, onde o município está a investir para melhorar o espaço público e as condições de vida e a criar mais habitação. O Programa “Melhor Cidade” segue a mesma lógica: intervir onde a cidade mais precisa. Incluem-se intervenções nas Áreas Urbanas de Génese Ilegal (AUGIs), Quinta do Ferro, Casal do Pinto, entre outras.

“Reabilitar o espaço urbano é também cuidar da saúde das pessoas que nele

vivem.”

From the lessons of the Pandemic, a new vision emerged – the Healthy City: a city of proximity, activity, and safety, where active mobility takes centre stage and air quality ceases to be a mere technical indicator, becoming instead a sensory, lived experience. Lisbon realised that a healthy city is built as much through human relationships as through infrastructure.

“What is a Healthy City? It is one that guarantees quality of life for all its residents, through equitable access to services, green spaces, decent housing, sustainable mobility, and a safe, clean environment.”

In Lisbon, this vision takes shape through urban rehabilitation policies targeting neglected or degraded areas, such as the “Five Valleys” Programme – Chelas, Santo António, Almirante Reis, Alcântara, and Ajuda – where the municipality is investing to improve public spaces, living conditions, and housing supply. The “Better City” Programme follows the same logic: to intervene where the city needs it most, including actions in Informal Urban Areas (AUGIs), Quinta do Ferro, and Casal do Pinto, among others.

“Rehabilitating the urban space is also about caring for the health of those who live within it.”

A cidade saudável é também uma cidade de proximidade, equipada com comércio, educação, cultura, desporto e saúde. É verde e descarbonizada, segura face a riscos naturais e humanos, e energeticamente eficiente. Em Lisboa, o Plano de Ação Climática reforça esta dimensão, promovendo medidas como a eficiência energética, a mobilidade sustentável, a produção de energia local, o aumento da estrutura verde e a gestão integrada da água e das inundações.

A healthy city is also a city of proximity – well equipped with local commerce, education, culture, sports, and healthcare. It is green and decarbonised, safe in the face of natural and human risks, and energy-efficient. In Lisbon, the Climate Action Plan reinforces this vision, promoting measures such as energy efficiency, sustainable mobility, local energy production, the expansion of the green structure, and integrated water and flood management.

Quinta do Ferro (Lisboa) - Situação atual e simulação 3 D | © CML/Lisboa SRU, Bernardo Faria
Quinta do Ferro (Lisbon) - Current situation and final result | © CML/Lisboa SRU, Bernardo Faria

Se a cidade saudável é a visão, o bairro saudável é a escala da ação. É nele que se concretiza o ideal da Cidade dos 15 Minutos: garantir que cada pessoa possa aceder a pé ou em mobilidade suave às funções essenciais – comércio, ensino, saúde, cultura, desporto e espaços verdes. O programa Há Vida no Meu Bairro coloca essa visão em prática.

As metodologias do trabalho à escala da Cidade (escala macro) e dos projetos de intervenção no espaço público (escala micro) foram apresentadas na 1a sessão deste Ciclo de Conferências. Agora, nesta fase, já temos resultados interessantes.

Da avaliação da oferta das funções essenciais e da qualidade pedonal, criando ferramentas de decisão e priorização de investimento (escala macro), constatou-se boas coberturas em alguns serviços. Mas também lacunas em áreas como Marvila ou Santa Clara, apontando caminhos concretos de melhoria.

If the healthy city is the vision, then the healthy neighbourhood is the scale of action. It is at this level that the ideal of the 15-Minute City becomes tangible –ensuring that everyone can reach, on foot or by active mobility, the essential functions of daily life: commerce, education, healthcare, culture, sports, and green spaces. The “Há Vida no Meu Bairro” (There is Life in My Neighbourhood) programme brings this vision to life.

The methodologies developed at the city scale (macro) and the public-space intervention projects (micro) were introduced in the first session of this conference cycle. Now, this work is already producing concrete results.

From the territorial assessment of service coverage and the quality of the pedestrian network – tools that guide decision-making and investment prioritisation – the macro-level analysis reveals strong coverage in some services, but also gaps in areas such as Marvila and Santa Clara, pointing towards clear paths for improvement.

Avaliação das condições de acessibilidade pedonal de Lisboa - exemplo de ficha do diagnóstico de acesso pedonal às funções de proximidade na freguesia de Santa Clara | David Vale - Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa / CML

Assessment of pedestrian accessibility conditions in Lisbon – examples of diagnostic sheets on pedestrian access to proximity functions in the parish of Santa Clara | David Vale – Faculty of Architecture, University of Lisbon / CML

A partir do desenho de projetos de espaço público, a intervenção urbana melhora o conforto, a segurança e a convivência. Já temos obras em curso na Av. Santos Dummont, Rua Dom José de Bragança, Quinta do Ferro, Rua Almada Negreiros e outros em projeto de execução. Estes projetos mostram que um bairro saudável é aquele que promove identidade, diversidade de usos, mistura social e espaços de encontro, onde escolas, jardins e praças funcionam também como lugares de cultura e convivência.

At the micro scale, public-space design and urban intervention enhance comfort, safety, and social interaction. Ongoing works such as Avenida Santos Dummont, Rua Dom José de Bragança, Quinta do Ferro, and Rua Almada Negreiros, as well as several projects under execution, demonstrate that a healthy neighbourhood is one that fosters identity, mixed uses, social diversity, and spaces for encounter, where schools, gardens, and squares also function as places of culture and community life.

Rua Almada Negreiros, Olivais (Lisboa) - Situação atual e simulação 3D | © CML / Lisboa SRU, Bernardo Faria
Rua Almada Negreiros, Olivais (Lisbon) - Current situation and final result | © CML / Lisboa SRU, Bernardo Faria

Construir cidades e bairros saudáveis é, antes de tudo, um compromisso humano. Exige pensar a cidade como um organismo vivo, onde ambiente, mobilidade, habitação e relações sociais estão interligados. As lições da pandemia lembram-nos que a saúde urbana começa na escala do bairro e se consolida com políticas integradas e sustentáveis.

Lisboa tem dado passos firmes nesse caminho – mais verde, mais próxima, mais consciente. Porque uma cidade saudável é, no fundo, uma cidade onde há vida em cada bairro.

Rua Dom José de Bragança, Beato (Lisboa) - Situação atual e simulação 3D | © CML / Lisboa SRU
Rua Dom José de Bragança, Beato (Lisbon) - Current situation and final result | © CML / Lisboa SRU

Building healthy cities and neighbourhoods is, above all, a human commitment. It requires viewing the city as a living organism, where environment, mobility, housing, and social relations are deeply interconnected. The pandemic’s lessons remind us that urban health begins at the neighbourhood scale and is strengthened through integrated and sustainable policies.

Lisbon has been taking steady steps in that direction – greener, closer, and more self-aware. Because, ultimately, a healthy city is one where there is life in every neighbourhood.

Avenida Santos Dumont, Avenidas Novas (Lisboa) - Situação atual e simulação 3D | © CML / Lisboa SRU
Avenida Santos Dumont, Avenidas Novas (Lisbon) - Current situation and final result | © CML / Lisboa SRU

Compreender, Decidir

Desenhar a cidade saudável Understanding, Deciding, Designing the healthy city

Alexandra Gomes traz para o debate os determinantes urbanos da saúde e as desigualdades territoriais que atravessam Lisboa e outras cidades europeias.

Começa por evidenciar a importância dos dados para compreender e decidir. Cidades saudáveis exigem informação. Só com dados é possível compreender as dinâmicas urbanas e orientar decisões públicas. Em Lisboa, os picos de densidade populacional atingem valores próximos de Londres ou Milão – cerca de 17.700 habitantes por km2 – mas o uso do automóvel continua excessivo (48%). Esta contradição revela o potencial de transformação: cidades mais densas permitem deslocações curtas e sustentáveis, mas exigem políticas metropolitanas integradas.

Lisboa, com um crescimento populacional lento e 23% de população idosa, tem a oportunidade de repensar a cidade existente – reabilitando, reconectando e promovendo estilos de vida mais ativos e saudáveis.

Alexandra Gomes brings to the debate the urban determinants of health and the territorial inequalities that shape Lisbon and other European cities.

She begins by emphasising the importance of data for understanding and decision-making. Healthy cities require information – only with data can we grasp urban dynamics and guide public policy effectively. In Lisbon, population peak densities reach levels comparable to London or Milan – around 17,700 inhabitants per km2 – yet car use remains excessive (48%). This contradiction highlights the city’s transformative potential: denser cities allow for short and sustainable trips, but they demand integrated metropolitan policies to fully realise that potential.

With slow population growth and 23% of residents over 65, Lisbon has a unique opportunity to rethink its existing urban fabric – by rehabilitating, reconnecting, and promoting more active and healthy lifestyles.

O modo como habitamos e nos deslocamos reflete-se diretamente na saúde coletiva. Em Portugal, 45% da população tem baixa atividade física, e os lisboetas passam, em média, 76 minutos diários em viagens casa-trabalho. Estes valores, juntamente com a dependência do automóvel ajudam a contribuir para a poluição, o sedentarismo e as emissões de carbono – 70% das quais têm origem em áreas urbanas. Paralelamente, Lisboa enfrenta desafios sociais: 15% das habitações estão vagas, 12% da Área Metropolitana vive em condições de sobrelotação e as rendas acima dos 650 euros aumentaram 64% desde 2011. Estas dinâmicas afetam o equilíbrio entre saúde, habitação e mobilidade, e impõem uma reflexão sobre papel do planeamento e o desenho como instrumentos de equidade.

The way we live and move directly impacts collective health. In Portugal, 45% of the population engages in low physical activity, and Lisbon residents spend an average of 76 minutes per day commuting between home and work. These values, together with private car dependence contribute to pollution, sedentary lifestyles, and carbon emissions – 70% of which originate in urban areas. At the same time, Lisbon faces significant social challenges: 15% of dwellings are vacant, 12% of the Metropolitan Area’s population lives in overcrowded conditions, and rents above €650 have risen by 64% since 2011. These dynamics disrupt the balance between health, housing, and mobility, underscoring the role of planning and urban design as tools for equity.

A urbanização acelerada, as alterações climáticas, o envelhecimento populacional e as desigualdades sociais são desafios universais. As cidades concentram oportunidades, mas também riscos – da poluição atmosférica às doenças crónicas e à perda de biodiversidade. A saúde urbana surge como disciplina capaz de articular estas dimensões: compreende a cidade como um ecossistema interligado, onde as condições ambientais, sociais e económicas se refletem mutuamente. O modelo de Barton & Grant ajuda a visualizar essa complexidade – lembrando que intervir no urbanismo é, inevitavelmente, intervir na saúde.

Accelerated urbanisation, climate change, ageing populations, and social inequalities are universal challenges. Cities concentrate opportunities but also risks – from air pollution to chronic diseases and the loss of biodiversity. Urban health emerges as a discipline capable of bridging these dimensions: it understands the city as an interconnected ecosystem, where environmental, social, and economic conditions constantly interact and influence one another. The Barton & Grant model helps visualise this complexity –reminding us that to intervene in urbanism is, inevitably, to intervene in health.

Modelo de saúde urbana, Barton and Grant (2006) Urban Health Model,

Barton and Grant (2006)

O modelo ecossistémico dos determinantes de saúde.

Ajuda a compreender as interações entre diferentes aspetos da sociedade e do ambiente.

Modelo holístico da relação entre as pessoas, a sua qualidade de vida, o seu ambiente local e global.

The ecosystem model of health determinants.

Helps to understand the interactions between different aspects of society and the environment.

A holistic model of the relationship between people, their quality of life, and their local and global environments.

Mapa da saúde: Barton e Grant, 2006, elaborado a partir de um conceito de Dahlgren e Whitehead, 1991 | © wellbeingforlife.org.uk

Health map: Barton and Grant, 2006, based on a concept by Dahlgren and Whitehead, 1991 | © wellbeingforlife.org.uk

A saúde urbana não é apenas ausência de doença, mas qualidade de vida ao longo do tempo. Como refere a Marmot Review, o “gradiente social” da saúde mostra que quanto menor a posição socioeconómica, pior é o bem-estar. Assim, as políticas locais têm um papel crucial na redução das desigualdades: proteger os grupos vulneráveis, promover o acesso a habitação digna, criar espaços públicos inclusivos e incentivar a participação cidadã. Construir uma “sociedade justa, com vidas saudáveis” é responsabilidade coletiva e começa na escala local.

Sociedade justa,

Vidas saudáveis,

Urban health is not merely the absence of disease, but the quality of life over time. Marmot Review, highlights that the social gradient of health shows that the lower the socioeconomic position, the poorer the well-being. Thus, local policies play a crucial role in reducing inequalities: protecting vulnerable groups, promoting access to decent housing, creating inclusive public spaces, and encouraging citizen participation. As stated in the building a “fair society with healthy lives” is a collective responsibility – and it begins at the local scale.

Marmot Review (2010) Fair Society, Healthy Lives, Marmot Review (2010)

Estrutura conceptual | © parliament.uk \ Conceptual framework | © parliament.uk

As cidades saudáveis são compactas, conectadas e coordenadas. Combatem a “trificação” –gentrificação, turistificação e segregação – e valorizam os bairros esquecidos. Jogam bem o “tetris urbano”: equilibram carros, bicicletas, peões e mobiliário; conciliam estética e funcionalidade; respeitam os sentidos e o conforto. Limitam o espaço do automóvel, investem em modos suaves e transportes públicos, criam espaços verdes e de lazer, e asseguram o direito à brincadeira e ao encontro. Promovem o voluntariado, o comércio local e a diversidade de usos.

Healthy cities are compact, connected, and coordinated. They combat “trification” –gentrification, touristification, and segregation – and value neglected neighbourhoods. They play the urban Tetris well: balancing cars, bicycles, pedestrians, and street furniture; reconciling aesthetics and functionality; respecting the senses and comfort. They limit car space, invest in active mobility and public transport, create green and leisure areas, and ensure the right to play and to meet. They promote volunteering, local commerce, and diversity of uses.

Tendas montadas sob uma arcada de um prédio em Lisboa | © Alexandra Gomes \ Tents set up under an arcade of a building in Lisbon | © Alexandra Gomes
“Trificação” em Lisboa: gentrificação, turistificação, e segregação © Alexandra Gomes
Lisbon “Trification”: gentrification, touristification, and segregation © Alexandra Gomes
“Tetris Urbano”: o equilíbrio entre diversidade, conforto, funcionalidade e vida urbana | © Alexandra Gomes
“Urban Tetris”: the balance between diversity, comfort, functionality, and urban life | © Alexandra Gomes

A cidade saudável é caracterizada por três eixos fundamentais:

• Estabilidade (na habitação, no trabalho e no apoio social);

• Segurança (face ao clima, poluição e criminalidade);

• Equidade (no acesso a políticas, recursos e oportunidades).

Para isso, é indispensável investir em informação, educação e comunicação – do cidadão à liderança política. Iniciativas como o Healthy Urbanism de Helen Pineo ou o programa Healthy Streets de Londres mostram que é possível integrar saúde, urbanismo e sustentabilidade, ao nível local.

Ruas saudáveis

A healthy city is characterized by three fundamental pillars:

• Stability – in housing, employment, and social support;

• Safety – regarding climate, pollution, and crime;

• Equity – in access to policies, resources, and opportunities.

To achieve this, it is essential to invest in information, education, and communication – from citizens to political leadership. Initiatives such as Helen Pineo’s Healthy Urbanism or London’s Healthy Streets programme show that it is possible to integrate health, urbanism, and sustainability, at the local level.

“Crescer é inevitável; crescer bem é uma escolha.”

“Growth is inevitable; growing well is a choice.”

Excertos do filme “Ruas Saudáveis” | Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=CFcTwgx2oDs

Excerpts from the film “Healthy Streets” | Source: https://www.youtube.com/watch?v=CFcTwgx2oDs

Promover o município saudável

Promoting the healthy municipality

Da análise académica de Alexandra Gomes, a sessão seguiu para a perspetiva de Ângela Freitas, que apresentou o Atlas dos Municípios Saudáveis como instrumento de apoio à decisão política e de promoção da equidade territorial. Apelou a uma reflexão sobre o papel das autarquias na promoção da saúde e sobre a necessidade de políticas públicas intersectoriais para reduzir desigualdades territoriais.

A saúde é muito mais do que ausência de doença. É o resultado direto do ambiente onde vivemos, estudamos e envelhecemos. Como recordou a oradora, esta ligação entre cidade e saúde não é nova: desde a Carta de Ottawa de 1986, a Organização Mundial de Saúde reconhece a importância do meio urbano na promoção da saúde, e desde 1988 existe uma Rede Europeia de Cidades Saudáveis, que inspira o trabalho das autarquias em toda a Europa.

Portugal tem acompanhado este movimento através da Rede Portuguesa de Municípios Saudáveis, criada em 1997 e hoje composta por 69 municípios. Lisboa faz parte da rede há muitos anos – e, curiosamente, foi a Amadora um dos municípios fundadores.

From Alexandra Gomes’s academic analysis, the session moved to the perspective of Ângela Freitas, who presented the Atlas of Healthy Municipalities as a tool to support political decision-making and promote territorial equity. She called for reflection on the role of local governments in promoting health and on the need for intersectoral public policies to reduce territorial inequalities.

Health is much more than the absence of disease; it is the direct result of the environment in which we live, study, and grow old. As the speaker recalled, the link between city and health is not new: since the Ottawa Charter (1986), the World Health Organization has recognised the importance of the urban environment in promoting health, and since 1988, the European Healthy Cities Network has inspired the work of municipalities across Europe.

Portugal has followed this movement through the Portuguese Network of Healthy Municipalities, created in 1997 and now composed of 69 municipalities. Lisbon has been a member for many years – and, interestingly, Amadora was one of the founding municipalities.

É neste enquadramento que nasce o Atlas dos Municípios Saudáveis, projeto desenvolvido pela Universidade de Coimbra em parceria com a Rede Portuguesa de Municípios Saudáveis e com a Organização Mundial de Saúde. O objetivo é criar uma plataforma interativa que reúna informação detalhada sobre as múltiplas dimensões da saúde urbana: desde os resultados em saúde até aos determinantes sociais, ambientais e económicos.

O Atlas integra 94 indicadores, dos quais cerca de 80% são determinantes – ou seja, fatores que influenciam a saúde, como o nível de escolaridade, as condições habitacionais, o rendimento, o ambiente físico e o acesso a espaços verdes. Atualmente cobre cerca de 70 municípios (2024), e envolve mais de 200 técnicos e decisores locais.

Além dos dados estatísticos, foi realizado um inquérito à população entre 2021 e 2022, permitindo recolher informação sobre perceções de segurança, hábitos de exercício, condições de residência e estilos de vida. Estes dados, muitas vezes indisponíveis à escala local, ajudam a compreender melhor as desigualdades entre territórios.

It is within this framework that the Atlas of Healthy Municipalities was created – a project developed by the University of Coimbra in partnership with the Portuguese Network of Healthy Municipalities and the World Health Organization. Its goal is to build an interactive platform that gathers detailed information on the multiple dimensions of urban health – from health outcomes to social, environmental, and economic determinants.

The Atlas includes 94 indicators, about 80% of which are determinants – that is, factors influencing health, such as education level, housing conditions, income, physical environment, and access to green spaces. It currently covers around 70 municipalities (2024) and involves over 200 local technicians and decisionmakers.

In addition to statistical data, a population survey was conducted between 2021 and 2022, collecting information on perceptions of safety, exercise habits, housing conditions, and lifestyles. These data –often unavailable at the local scale – help to better understand territorial inequalities and the diverse realities of Portuguese municipalities.

Os resultados confirmam que a saúde não é igual em todo o lado. Mesmo dentro das cidades, existem diferenças marcantes.

Em Lisboa, por exemplo, um estudo anterior realizado pela equipa da Universidade de Coimbra revelou uma diferença de seis anos de esperança de vida em apenas oito quilómetros, entre freguesias centrais e periféricas.

Um dos indicadores apresentados no Atlas é o da acessibilidade pedonal a espaços verdes urbanos – um elemento essencial para o bem-estar físico e mental. A análise mostra que alguns municípios têm parques e jardins a menos de cinco minutos a pé das habitações, enquanto outros exigem caminhadas de meia hora ou mais. Estes contrastes refletem desigualdades no acesso a oportunidades de saúde e lazer.

The results confirm that health is not the same everywhere – even within cities, significant disparities exist.

In Lisbon, for example, a previous study conducted by the University of Coimbra team revealed a sixyear difference in life expectancy within just eight kilometres, between central and peripheral parishes.

One of the indicators featured in the Atlas is pedestrian accessibility to urban green spaces, an essential factor for both physical and mental well-being. The analysis shows that some municipalities have parks and gardens within a five-minute walk from homes, while others require walks of half an hour or more. These contrasts reflect inequalities in access to health and leisure opportunities, highlighting the importance of spatial justice in urban planning.

Esperança de vida à nascença ao longo da linha de metro Azul, Lisboa (2017)

Life expectancy at birth along the Blue metro line, Lisbon (2017)

Fonte \ Source: Santana P, Freitas A (2017). Urban environment and health in Lisbon. Video: https://www.youtube.com/watch?v=uVfDQkbkrjE

% resident population with higher education

Para além da caracterização estatística, o Atlas inclui uma base de mais de 700 projetos municipais, ligados a diferentes dimensões de saúde. A plataforma permite cruzar dados: por exemplo, identificar iniciativas que promovem atividade física nas zonas onde há maior prevalência de doenças associadas ao sedentarismo, como a diabetes ou a obesidade.

Lisboa é um dos municípios que mais tem contribuído com exemplos concretos: requalificação de parques urbanos, percursos pedonais seguros, mobilidade escolar sustentável e hortas urbanas comunitárias são algumas das ações que ligam urbanismo, participação cidadã e saúde pública.

In addition to the statistical characterization, the Atlas includes a database of more than 700 municipal projects related to different dimensions of health. The platform allows data cross-referencing – for example, identifying initiatives that promote physical activity in areas with higher prevalence of diseases associated with sedentary lifestyles, such as diabetes or obesity.

Lisbon is one of the municipalities contributing the most with concrete examples: the redevelopment of urban parks, safe pedestrian routes, sustainable school mobility, and community urban gardens are some of the actions that connect urban planning, citizen participation, and public health.

Abordagem multidimensional e geográfica das desigualdades em saúde a nível local - caso de estudo de Lisboa no Projeto EURO-HEALTHY Multidimensional and geographical approach to inequalities in health at the local level - Lisbon case-study in Project EURO - HEALTHY

Fonte \ Source: Freitas Â, Rodrigues T, Santana P. (2020). Assessing urban health inequities through a multidimensional and participatory framework: Evidence from the EURO-HEALTHY project, Journal of Urban Health, 97(6):857-875, https://doi.org/10.1007/s11524-020-00471-5

Estratégia multisectorial

Multisectoral Strategy

Visão estratégica da promoção da saúde Strategic Vision for Health Promotion

Mobilidade Sustentável e Espaço Público Sustainable Mobility and Public Space

Habitação Segura e Adequada Safe and Adequate Housing

Cuidados de Saúde de Proximidade Proximity Health Care

Coesão Social e Participação Ativa Social Cohesion and Active Participation

Educação e Literacia para a Saúde Health Education and Literacy

Liderança Colaborativa e Intersectorial Collaborative and Intersectoral Leadership

A promoção intersectorial da saúde sob uma perspetiva estratégica – o exemplo da Estratégia Municipal de Saúde de Coimbra 2021-2025.

Intersectoral health promotion from a strategic perspective – the example of the Coimbra Municipal Health Strategy 2021-2025 Fontes \ Sources: Freitas Â, Santana P. (2022). Putting Health at the Heart of Local Planning Through an Integrated Municipal Health Strategy, Urban Planning, Special Issue “Healthy Cities: Effective Urban Planning Approaches to a Changing World, 7(4): 42-60, https://doi.org/10.17645/ up.v7i4.5829

Universidade de Coimbra e Câmara Municipal de Coimbra (2021). Estratégia Municipal de Saúde de Coimbra 2021-2025.

Como sublinha a oradora, os municípios sempre tiveram competências na área da saúde, ainda que de forma indireta – através da educação, da habitação, da mobilidade, da ação social e do espaço público. Hoje essa responsabilidade é reconhecida de forma mais explícita, (no âmbito do quadro de transferência de competências, no domínio da saúde, para os municípios), com a exigência de elaborar estratégias municipais de saúde e de promover a governação partilhada entre diferentes setores e escalas territoriais.

O Atlas dos Municípios Saudáveis nasce dessa visão integrada:

“transformar dados em informação útil, e informação em políticas

públicas

que façam a diferença no quotidiano das pessoas.”

A ideia final é simples, mas poderosa:

“uma cidade saudável é uma cidade inclusiva, próxima e desenhada à escala humana.”

O Atlas ajuda a tornar visível o que antes era difuso – mostrando, com base em evidência, que urbanismo e saúde caminham juntos. E Lisboa, ao integrar e aplicar este trabalho, afirma-se como exemplo de como o conhecimento pode orientar políticas que cuidam verdadeiramente dos cidadãos.

As the speaker emphasises, municipalities have always held responsibilities in the field of health, even if indirectly – through education, housing, mobility, social action, and public space. Today, this responsibility is more explicitly recognized, (within the framework of the transfer of competences in the field of health to municipalities), with the requirement to develop municipal health strategies and to promote shared governance across different sectors and territorial scales.

The Atlas of Healthy Municipalities stems from this integrated vision:

“to transform data into useful information, and information into public policies that make a real difference in people’s daily lives.”

The concluding idea is simple yet powerful:

“a healthy city is an inclusive, close-knit city, designed at a human scale.”

The Atlas helps make visible what was once diffuse – demonstrating, with evidence, that urban planning and health go hand in hand. And by integrating and applying this work, Lisbon stands out as an example of how knowledge can guide policies that truly care for citizens.

O futuro começa no Bairro The future begins in the Neighbourhood

O ciclo de conferências “Lisboa, Há Vida no Meu Bairro” constitui um marco na reflexão sobre a cidade à escala humana. As temáticas associadas à Cidade dos 15 Minutos, à Cidade saudável e ao programa “Há Vida no Meu Bairro” foram debatidas e amadurecidas através de seis sessões que reuniram académicos, técnicos, decisores e cidadãos em torno de um mesmo objetivo: melhorar a qualidade de vida nos bairros de Lisboa.

As discussões demonstraram que a proximidade é mais do que uma métrica espacial – é uma forma de governar, de planear e de viver a cidade. Falou-se da importância de integrar políticas e escalas, da necessidade de garantir diversidade social e funcional, e da urgência de equilibrar mobilidade, habitação, espaço público e comércio local.

The conference cycle “Lisbon, There is Life in My Neighbourhood” marks a milestone in the reflection on the city at a human scale. The themes associated with the 15-Minute City, the Healthy City, and the municipal programme “Há Vida no Meu Bairro” were explored and deepened through six sessions that brought together academics, professionals, decision-makers, and citizens around a common goal: improving the quality of life in Lisbon’s neighbourhoods.

The discussions showed that proximity is more than a spatial metric – it is a way of governing, planning, and living the city. They highlighted the importance of integrating policies and scales, ensuring social and functional diversity, and balancing mobility, housing, public space, and local commerce.

Os contributos recolhidos apontam agora um caminho claro: transformar o conhecimento partilhado em ação concreta. Isso implica consolidar a base de dados de funções de proximidade, desenvolver instrumentos de monitorização contínua, reforçar a articulação entre departamentos e acelerar os projetos-piloto que demonstram, no terreno, como a proximidade se traduz em bem-estar. Implica também aprofundar a escuta das comunidades, promover uma cultura de colaboração entre município, freguesias e cidadãos, e avaliar sistematicamente o impacto das políticas.

O futuro de Lisboa desenha-se a partir dos seus bairros – nas ruas que se requalificam, nas escolas que se abrem à comunidade, nos espaços verdes que aproximam as pessoas – e na convicção de que a cidade saudável e próxima é, acima de tudo, uma cidade com vida.

The insights gathered now point towards a clear path: transforming shared knowledge into concrete action. This means consolidating the database of proximity functions, developing tools for continuous monitoring, strengthening coordination between departments, and accelerating pilot projects that demonstrate, on the ground, how proximity translates into well-being. It also requires deepening community engagement, promoting a culture of collaboration between the municipality, parishes, and citizens, and systematically evaluating the impact of policies.

Lisbon’s future is being shaped from its neighbourhoods – in the streets being renewed, in schools opening to their communities, in the green spaces bringing people together – and in the conviction that a healthy, close-knit city is, above all, a city full of life.

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.