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título: 50 Imagens
autor: José Manuel Morão
edição: Edições Vírgula ® (Chancela Sítio do Livro)
fotografia de capa: Victor Rafael (Meditazione por Francesco Fabi-Altini da Fabriano, 1874
Basilica di Santa Maria degli Angeli e dei Martiri, Roma, 2025)
capa: Ângela Espinha
paginação: Paulo Resende
1.ª edição
Lisboa, outubro 2025
isbn: 978‑989 9284 05 0 depósito legal: 552764/25
© José Manuel Morão
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RETÁBULO DE CAPELA
No fundo de madeira encosta-se a imagem do Divino Espírito Santo, de pesada pedra.
À volta, ergue-se o retábulo de talha, duas colunas e dois arcos geminados, com os pâmpanos.
Ao centro, lida no tabuado escuro onde se recosta a imagem, a nossa vida.
COM EXATIDÃO
Na porta da casa, eram três os degraus de pedra. E outras escadas subiam na luz da pequena janela derramada no soalho.
A muda tentou evocar-me algum encanto deste nosso mundo. Escutei-a quanto pude. Desci as escadas. Noutras alturas encontrava-a em casa de minha avó, que com ela se entendia com íntima exatidão.
MUNDO FECHADO
No ar da taberna, a cantilena nasalada e lamurienta de mulher ressoa de um xaile preto. Entro. A cantilena quase cessa como o rio que encontra um remanso de remoinhos. Diz «ó meu filho, entra, entra».
Peço-lhe a promessa de um bem, peço-lhe um banco comprido, sem tábuas de morte. Para sempre pertencia a este mundo.
UMA LUZ INACESSÍVEL
Via aqueles velhinhos dentro do calor sem mácula do tempo. Perto, sentíamos os corpos quentes dos cavalos, que escarvavam o chão, e o rosa esmaecido da casa murchava diante de nós.
Era setembro e, ao centro, sibilava o alambique.
Naquele exíguo pátio ficava ciente de algo mais: era esta a vida que nos fora prometida, envolta por uma luz inacessível.
NO CAMINHO DE EMAÚS
Entrava o padre e benzia-nos, enquanto anunciava o Ressuscitado. Aproximávamo-nos para beijar a face ou os goivos do crucifixo, e o sol estigmatizava as vidraças com sinais que só nós entendíamos. Mas pelas janelas estreitava-se a luz velha das casas. Deslocada a pedra, aspergidos no silêncio do nosso sangue, encontrámo-nos aqui, no nosso caminho de Emaús.
A PORTA DE NINGUÉM
No fundo daquela loja, de cada lado, havia uma porta fechada. Detrás da porta da esquerda, o escarvar e o quente relinchar: cavalos. Posto isto, ignorámos a porta da direita, onde o taberneiro guardou garrafas vazias. Assustados, subimos a terra tumescente, encostámos a porta de ninguém. Selámos o tempo.
RELÂMPAGO
A insuspeitada porta dava para um lanço de escadas, que subiam na penumbra. Chegados ao cimo, o relâmpago: as imagens sacras com os seus gestos longevos e meditados. Mais tarde falaríamos daquela visão, que cada um guardou dentro de si. Passada a soleira da porta da rua, lembrávamos quem éramos.
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