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Leonardo Arquimimo de Carvalho

Ensino Policial, DirEito Policial

E MEtoDologias ParticiPativas

Copyright© Tirant lo Blanch Brasil

Editor Responsável: Aline Gostinski

Assistente Editorial: Izabela Eid

Diagramação e Capa: Jéssica Razia

CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO:

EDuarDo FErrEr Mac-grEgor Poisot

Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Investigador do Instituto de Investigações Jurídicas da UNAM - México

JuarEz tavarEs

Catedrático de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Brasil luis lóPEz guErra

Ex Magistrado do Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Catedrático de Direito

Constitucional da Universidade Carlos III de Madrid - Espanha

owEn M. Fiss

Catedrático Emérito de Teoria de Direito da Universidade de Yale - EUA

toMás s. vivEs antón

Catedrático de Direito Penal da Universidade de Valência - Espanha

C325 Carvalho, Leonardo Arquimimo de Ensino policial, direito policial e metodologias participativas [livro eletrônico] / Leonardo Arquimimo de Carvalho. - 1.ed. – São Paulo : Tirant lo Blanch, 2023.

1.678Kb; livro digital

ISBN: 978-65-5908-559-0

1. Ensino. 2. Ensino policial. I. Título.

CDU: 340.1

Bibliotecária Elisabete Cândida da Silva CRB-8/6778

DOI:

É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto às características gráficas e/ou editoriais.A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art.184 e §§, Lei n° 10.695, de 01/07/2003), sujeitando-se à busca e apreensão e indenizações diversas (Lei n°9.610/98).

Todos os direitos desta edição reservados à Tirant lo Blanch.

Fone: 11 2894 7330 / Email: editora@tirant.com / atendimento@tirant.com

tirant.com/br - editorial.tirant.com/br/

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Leonardo Arquimimo de Carvalho

Ensino Policial, DirEito Policial

E MEtoDologias ParticiPativas

suMário lista DE abrEviaturas ................................................ 6 introDução ................................................................ 8 1. Ensino E DEFiciências ForMativas ......................... 12 1.1. Ensino Superior .......................................................... 12 1.2. Ensino Jurídico ........................................................... 15 1.3. Ensino Profissional ...................................................... 18 1.4. Ensino e Ideologia ....................................................... 25 2. sEgurança Pública E Ensino Policial ................... 30 2.1. Segurança Pública ....................................................... 30 2.2. Ciências Policiais ......................................................... 33 2.2.1. O Direito Policial no Brasil ...................................... 37 2.2.1.1. O Direito Policial .................................................. 39 2.2.1.2. O Direito Policial no Brasil ................................... 41 2.2.1.3. O Direito Policial no Ensino Policial ..................... 44 2.3. Ensino Policial ............................................................ 46 3. instruMEntos MEtoDológicos ............................. 53 3.1. Matriz Curricular e Ensino Policial ............................. 53 3.2. Tradições Metodológicas ............................................. 60 3.3. Possibilidades Metodológicas....................................... 63 3.3.1. Clínica de Polícia ..................................................... 67 3.3.2. Diálogo Socrático ..................................................... 71 3.3.3. Método do Caso ...................................................... 75 3.3.4. Police Problem-Based Learning ................................ 78 3.3.5. Role Play .................................................................. 83 consiDEraçõEs Finais ............................................... 89 rEFErências bibliográFicas ....................................... 93

lista DE abrEviaturas

APCGO - Academia de Polícia Civil de Goiás

BMRS - Brigada Militar do Rio Grande do Sul

CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CFOPM - Curso de Formação de Oficiais Policiais Militares

EUA - Estados Unidos da América

IESP - Instituto de Ensino de Segurança do Pará

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação

MCN - Matriz Curricular Nacional

MVCI - Mortes Violentas por Causa Indeterminada

PBL - Problem-Based Learning

PC - Polícia Civil

PM - Polícia Militar

PMBA - Polícia Militar da Bahia

PMERJ - Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

PMMG - Polícia Militar de Minas Gerais

PNSP - Plano Nacional de Segurança Pública

PPBL - Police Problem-Based Learning

RENAESP - Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública

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SDL - Self-Directed Learning

SENASP - Secretaria Nacional de Segurança Pública

SFI - Sistema de Formação Integral

TGDP - Teoria Geral do Direito Policial

UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFF - Universidade Federal Fluminense

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introDução

Um dos desafios docentes mais importantes corresponde ao de ensinar adultos. Quando a tarefa é a de educar para o desempenho de uma atividade profissional, a responsabilidade é ainda mais complexa. Essa dificuldade se agrava quando a instrução policial é o campo do conhecimento em que se atua, onde se apresentam desafios e obstáculos.

As dificuldades decorrem da forma como tradicionalmente o ensino policial foi construído e corresponde ao resultado de um processo que tem dificuldades para inovar. O ensino policial no ambiente doméstico encontra como obstáculos imediatos a tradição organizacional militarista e o enfoque na cultura advinda do ambiente jurídico. Apresenta como limitadores mediatos inúmeros aspectos pertinentes à adoção de metodologias tradicionais de ensino, a dificuldade em pensar no perfil profissiográfico que se busca construir além da repulsa em valorizar a produção do conhecimento científico.

De forma mais específica, as dificuldades aparecem também na “educação dos vocacionados”, na ideia do policial com habilidades inatas e no sistema de evolução profissional do policial. O caminho percorrido para a qualificação do profissional geralmente decorre do tempo na atividade e tem pouca relação com as qualidades laborais, com o esforço individual e com os eventuais

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resultados obtidos no exercício de suas funções. Quem retorna para a qualificação educacional já o faz com uma experiência acumulada e pela preconcepção de que o que lhe é apresentado é de seu conhecimento ou a informação não reflete a realidade da sua atividade laboral.

Ainda que se possa afirmar que a experiência, algumas qualidades pessoais e o tempo dedicados a uma instituição policial são elementos indispensáveis para a boa gestão dos interesses e valores corporativos, com o reconhecimento de qualidades individuais, o mérito, que permite a evolução profissional, segue regras desconhecidas, pouco sujeitas ao escrutínio republicano.

A educação policial também se depara com “quem não precisa apreender” ou “não quer apreender” já que “aquilo que a polícia faz” não se apreende nos bancos escolares. Esse ensimesmamento ocorre quando o policial se reconhece como onisciente do seu próprio campo de trabalho. A falta de qualificação ou de conhecimento técnico e científico para enfrentar os temas afeitos à sua responsabilidade são comuns. A visão de mundo de muitos policiais está baseada na crença de que a segurança pública é um tema que integra a sua rotina e, como consequência, ele tem domínio dos instrumentos e do ferramental destinados a resolver o problema da criminalidade.

Por outro lado, com regularidade, surge o discurso da “visão acadêmica” sobre temas de interesse policial. Estes, segundo a narrativa referida, não poderiam ser legitimamente discutidos por pessoas alheias às

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instituições, já que os materiais produzidos corresponderiam a “visões românticas” e “destituídas de vínculo com a realidade”.

Assim, se apresentam dificuldades em se aproximar de projetos mais eficientes para formação de policiais e para alterar a própria realidade do ambiente onde os profissionais atuarão. Na segurança pública, mesmo demonstrando claros sinais de falibilidade, não se observam ideias inovadoras e abordagens centradas em pesquisas, estatísticas, experiências bem-sucedidas ou mesmo destinadas a enfrentar questões mais elementares baseadas na busca por uma gestão mais eficiente.

Da observação das pesquisas acadêmicas do campo, se depreende que a formação profissional do policial é construída sem uma preocupação com a utilidade daquilo que se ensina. Assim, há uma dificuldade em instrumentalizar os trabalhadores policiais para se desincumbirem de suas tarefas permanentes com êxito, enquanto a ciência e as pesquisas são aspectos negligenciados na construção de novas políticas de segurança e na edificação de melhores e mais eficientes práticas.

De qualquer maneira, se imagina que uma parte, mesmo que aparentemente pequena, destas dificuldades podem ser equacionadas de forma criativa e com base em instrumentos que atentem para a realidade daquele que é o destinatário da formação.

O ensino policial tradicional apresenta problemas que podem ser aperfeiçoados pela mudança que transcenda a questão conteudista, assumindo uma visão

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centrada em habilidades, competências e atitudes, além de apostar em metodologias de ensino mais adequados para o ensino profissional.

A emergência de um direito policial parece, também, trazer uma nova possibilidade para o ensino policial. O direito policial tem como escopo o estudo científico e abrangente da polícia com a consolidação da ideia de que a atividade policial, que é seu objeto de estudos, corresponde a um fenômeno universal. Esse fortalecimento disciplinar permite a ideação de novas investigações, inclusive aquelas voltadas ao processo formativo profissional, que tratem da polícia de forma científica.

Em síntese, o presente texto pretende problematizar a questão do ensino profissional policial a partir das similitudes e dos contatos entre o ensino tradicional e o perfil de formação policial, apontando para a existência de deficiências formativas. Ainda, pretende apresentar a ideia de que informações científicas e pesquisas acadêmicas não são um parâmetro considerado quando da reflexão sobre o que seria necessário para equacionar problemas da educação policial e da segurança pública.

Na sequência, se objetiva compreender como a edificação da ideia de uma ciência do direito policial pode trazer inovações para o campo da segurança pública. Por fim, a partir das ideias apresentadas serão sugeridas ferramentas que podem colaborar para uma melhor qualidade na formação policial, apresentando instrumentos metodológicos participativos para auxiliar na formação profissional.

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1. Ensino E DEFiciências ForMativas

1.1. Ensino suPErior

No ensino fundamental e no ensino médio já se encontra bem sedimentada a ideia de que a construção dos processos pedagógicos precisa passar por inovações. Os inúmeros instrumentos e os meios de aferição da qualidade do aprendizado, incluindo os internacionais, colocam o Brasil entre um dos países onde a educação é ineficiente do ponto de vista do que se apreende e da qualidade do que se ensina. As causas arroladas para esse rendimento escolar insuficiente são inúmeras e profundamente discutidas por pesquisadores da área. Eles demonstram, em síntese, a falta de clareza sobre a importância da educação para o desenvolvimento nacional.

Considerar que a formação no ensino superior é de qualidade duvidosa não parece ser, também, novidade. Ocorre que neste caso, os instrumentos de avaliação utilizados são mais tangíveis no mercado de trabalho, na baixa capacidade de inovação trazida pelos novos formados ao ambiente negocial, na dificuldade para se apresentarem como qualificados para determinados perfis profissiográficos exigidos, na inexistência de profissionais que se adaptem às habilidades, competências e atitudes contemporâneas, além de tantas outras dificuldades.

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Certamente que a baixa qualidade do ensino fundamental e do ensino médio está diretamente refletida no ensino superior. O perfil dos alunos formados e o instrumental apreendido naquele momento anterior acabam carreando ao ensino superior alunos com deficiências significativas. Esta relação é determinante, já que as condições de oferta no ensino superior são enormes e o único obstáculo possível para cursá-lo se aproxima da questão financeira, que também é passível de solução em razão da existência de incentivos públicos e privados. Assim, a qualidade relativa do ensino não é um obstáculo para o ingresso no ensino superior, mas antes, um amplificador das deficiências não equacionadas.

Paraskevas e Wickens apontam (2003, p. 4-5), a partir de inúmeros pesquisadores, que é bem difundida a ideia de que na maioria dos sistemas acadêmicos, currículos e docentes são o cerne do processo de aprendizagem, enquanto os discentes são vistos como elementos secundários. Ainda, que a ideia de “aprendizagem” não corresponde à compreensão de teorias e conceitos, mas sim, corresponde à adaptação aos requisitos exigidos pelos instrutores.

Não é sem razão que pesquisadores passaram a propor mudanças no paradigma da educação de adultos para que o processo de ensino-aprendizagem estivesse centrado no aluno. Logo, a educação de adultos exige que: i) os discentes estejam envolvidos no planejamento e avaliação de suas instruções; ii) a experiência e os erros forneçam a base para as atividades de apren-

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dizado; iii) haja um vínculo com assuntos que têm relevância imediata para o desempenho de suas funções; iv) a educação esteja centrada no problema ou no processo e não no conteúdo. (PARASKEVAS; WICKENS, 2003, p. 5).

Assim, estratégias de envolvimento ativo como estudos de caso, dramatização, simulações, discussões e autoavaliação são consideradas mais úteis para formação profissional (BASÍLIO, 2007, p. 131). Paraskevas e Wickens (2003, p. 5-6), dialogando com inúmeros especialistas em educação para adultos, apontam que o ensino deve estar fortemente ligado ao modelo de aprendizagem ativa.

Escolas inovadoras têm ofertado no mercado educacional, em sentido amplo, um perfil de formação que, exemplificativamente: elimina a questão do conteúdo estanque e prioriza uma forma mais próxima da transversalidade, elege eixos temáticos, edifica uma educação para cidadania global e valoriza a localidade, forma alunos críticos, instrui para uma sociedade mais ética e pacífica, educa com base em princípios, ensina a mediar conflitos, estabelece a responsabilidade ambiental, ensina sobre o uso de ferramentas que estimulam o trabalho coletivo e a construção de soluções para os problemas sociais, trabalha para a ideia de um mundo sem fronteiras, sem barreiras e sem preconceitos, trabalha o apreender com base no fazer, educa com base na experiência do autodesenvolvimento, além de tantos outros lineamentos inovadores.

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Assim, se o produto da educação superior é um profissional que apresenta deficiências, então é adequado afirmar que o processo pedagógico, que tem a responsabilidade de mediar a aprendizagem, também falha. Ocorre que essa relação nem sempre é mensurável de forma precisa. Ou seja, apesar de se afirmar que o processo pedagógico é insuficiente para formação de profissionais adequados ao mercado de trabalho ou ao desempenho de atividades profissionais, a possibilidade de precisamente encontrar onde essa deficiência reside é complexa. Como consequência, a construção da ideia de que existem deficiências decorre de como o mercado de trabalho recepciona os profissionais.

Também, não é possível isentar o processo pedagógico e o seu instrumental, somente superficialmente aplicado, como responsável por aquilo que é apresentado como resultado no ensino superior. A capacidade limitada de reformar o processo educacional e a dificuldade de moldar profissionais que encontrem um nicho profissional para atuação e que estejam sensibilizados pelos perfis profissiográficos necessários, para garantir acesso ao mercado de trabalho, também são fatores relevantes para a observação do fenômeno.

1.2. Ensino JuríDico

Nos anos de 1980 e nos anos de 1990 a neutralidade jurídica e a falta de vínculo com a realidade eram referidas como decorrentes de um ensino jurídico acrítico e alienante. Uma parte importante das faculdades

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de direito oferecia uma formação meramente descritiva, dogmática e codificada. Esses defeitos eram considerados responsáveis por diversos fenômenos importantes, notadamente, a dificuldade de inserção no mercado de trabalho.

A criação dos cursos jurídicos no Brasil buscava sistematizar a ideologia política do liberalismo além de formar a burocracia encarregada de operacionalizar esta ideologia. Apropriando-se do positivismo jurídico, conseguiu implementar seus objetivos desvinculando o direito de qualquer realidade metanormativa, acrescendo a esta uma neutralidade e objetividade científica, decisivas na alienação dos juristas formados nas faculdades. (RODRIGUES, 1993, p. 13)

Nos Estados Unidos da América (EUA) a crítica que surgiu esteve pautada por questões metodológicas. Lembra Grossman (1973, p. 162-193) que o apprenticeship, período de estágio ou de aprendizagem, nas escolas de direito, era o método predominante para o treinamento de estudantes. Somente a partir no final do século XIX é que se aceitaram alternativas ao modelo e a partir de meados dos anos de 1960 é que a abordagem prática passou a ser um caminho exclusivo nas escolas de direito dos EUA.

Afirma Grossman que a grande mudança ocorreu no ano de 1870, quando a Harvard Law School, sob a liderança de Dean Langdell, adotou o Método do Caso. A maioria das faculdades ensinava a lei com a ajuda de tratados sistemáticos que estabeleciam decla-

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rações abrangentes do direito substantivo, como parte de uma ciência social abstrata, ou ensinavam a lei como uma arte liberal que não pretendia preparar os alunos para aprendizagem com base na prática.

Goldfarb (2012, p. 280-281), a partir da visão estadunidense, afirma que as profissões jurídicas passam por grandes mudanças. Neste aspecto, mudanças nas forças sociais, econômicas e culturais, como a internacionalização dos mercados, o advento da tecnologia e as crises econômicas globais, bem como a quantidade e a qualidade das mudanças indicadas, impediriam os profissionais de rapidamente se adaptarem ao cenário em transformação. Como exemplos, lembra dos relatos absolutamente ordinários de empresas relevantes que acabaram ignorando a necessidade de adaptação as tecnologias e a realidade e que se tornaram anacrônicas.

Apesar destas mudanças acarretarem alterações na educação jurídica, os efeitos parecem ser superficiais. Aponta Goldfarb (2012, p. 281-282) que por mais irritante que a tarefa de repensar o ensino seja, algumas perguntas precisariam de respostas: i) como a educação jurídica pode sobreviver às alterações na realidade? ii) como ela pode ter sucesso no futuro? iii) como ela pode se esforçar para contribuir para o desenvolvimento nas décadas vindouras?

Estes apontamentos, ideológicos ou metodológicos em torno da educação jurídica, são fortemente comentadas e discutidas no que, há muitos anos, é nomeado como uma “crise”, que em tese exigiria a propo-

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situra de novos paradigmas educacionais. Este aspecto da educação jurídica tem ligação com o ensino profissional já que a tradição jurídica e o viés militarizado estão comumente associadas à formação dos profissionais da segurança pública.

1.3. Ensino ProFissional

A educação profissional é entendida, para os fins deste trabalho, como aquela que prepara alguém para o exercício de uma atividade laboral específica. Ou seja, corresponde àquela instrumentalização do conhecimento que busca habilitar uma pessoa para o exercício de uma atividade profissional.

A educação policial corresponde justamente ao treinamento a que uma pessoa será submetida para que possa exercer uma atividade profissional pertinente às tarefas previamente estabelecidas para os agentes responsáveis pela aplicação da lei. Ela também diz respeito a formação continuada e ao acesso a treinamentos mais complexos e mais especializados a partir dos diferentes perfis de conhecimento e informações necessárias para o desempenho da atividade profissional.

No ambiente das escolas policiais o ensino profissional corresponde, geralmente, a um agregado de disciplinas, com um aparente aprofundamento e com alguma interdisciplinaridade, normalmente ministrada por um docente titulado, mais experiente ou com sólidos conhecidos técnicos. Este docente irá reiterar suas impressões de mundo, a partir de manuais e textos ex-

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ternos ao ambiente endógeno, quando não, construído a partir de uma visão particular que edificou observando filigranas interpretativas de cunho corporativo.

A matriz pedagógica dos cursos jurídicos é fonte relevante da formação profissional para policiais (MOURA, 2021, p. 91). O modelo de educação utilizado no ensino jurídico acaba, como consequência, influenciando a formação no âmbito profissional de policiais. Aquilo que se observa como problemático na formação dos juristas, acaba por influenciar diretamente a sistemática de educação vista nas escolas policiais. Assim, os erros e acertos daquele modelo são repetidos e naturalizados na formação profissional policial.

O outro viés, que influencia a educação profissional dos policiais, é o da educação militar. Esta, com mais frequência, aparece na educação das polícias ostensivas, mas também aparece na formação das polícias judiciárias e tende a produzir impacto na formação das forças uniformizadas civis, como as guardas municipais.

A educação policial brasileira, afirma Santos (2017, p. 53), apresenta uma série de problemas do campo do controle social. Neste particular, questiona o pesquisador, como a formação integrada, com a participação de diversas instituições policiais, poderia auxiliar na superação das disputas por atribuições entre as forças. Indaga ainda, como a educação policial poderia auxiliar na eliminação da tradição organizacional militarista nas polícias militares, como poderia equacionar a questão da formação nas guardas municipais, como a

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educação poderia mudar a ênfase na cultura burocrática e juridicista presente na polícia civil, além de questionar como a formação policial poderia auxiliar no aumento da eficiência do desempenho policial e da gestão da segurança pública.

Ainda, são apontados, segundo Santos (2017, p. 54-56), como importantes, as experiências na direção de um aperfeiçoamento da educação profissional de policiais, as escolas integradas de polícia, os convênios com universidades para oferta de formação profissional e técnica, os cursos de especialização para policiais orientados por uma pedagogia inovadora, a implementação da Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública (RENAESP) e o desdobramento da sua atuação, o próprio trabalho desempenhado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) na inovação da formação de policiais, as mudanças nos currículos nacionais e nos processos de ensino-aprendizagem, dentre outras ideias.

A formação do policial militar, em nível superior, segundo Souza (2003, p. 97), não conseguiu criar uma cultura pedagógica, baseada em um currículo voltado para uma realidade de ensino que privilegie o ambiente sociocultural em que o policial é formado para assumir atitudes críticas com consciência de seu papel.

Como se sabe, a adequação e a preparação das pessoas para o desempenho das atividades laborais são imprescindíveis ao sistema de produção que estrutura a organização social. A educação, nesta ótica, apresenta

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