O Refúgio Secreto

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1. A festa do centenário

N

aquela manhã, pulei da cama com uma pergunta em mente: sol ou bruma? Em janeiro, na Holanda, normalmente é nublado, úmido, frio e cinzento. Eventualmente, num dia raro e mágico, desponta um sol claro de inverno. Debrucei-me o máximo que pude na única janela do meu quarto; sempre era difícil ver o céu do Beje. Paredes brancas de tijolos me fitavam: os fundos de outros prédios antigos nesse confuso centro da velha Haarlem. Mas, lá em cima, onde meu pescoço se esticava para alcançar, acima dos telhados malucos com chaminés tortas, havia uma moldura quadrada de céu pálido e perolado. Teríamos um dia ensolarado para a festa! Ensaiei um pouco de valsa enquanto tirava meu novo vestido do velho e oscilante guarda-roupa encostado na parede. O quarto de papai ficava exatamente abaixo do meu, mas aos 77 anos de idade, ele dormia profundamente. Essa era uma das vantagens de envelhecer, pensei enquanto colocava os braços nas mangas e olhava no espelho para conferir o efeito. Embora em 1937, algumas mulheres holandesas estivessem usando saias na altura dos joelhos, as minhas se mantinham em cautelosos dez centímetros acima dos sapatos. 17 JR771_t_RefugioSecreto-2021.indd 17

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