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Macaé (RJ), domingo, 27 e segunda-feira, 28 de dezembro de 2015, Ano XXXIX, Nº 8901 Fundador/Diretor: Oscar Pires
CADERNO DOIS O DEBATE DIÁRIO DE MACAÉ
Síndrome Látex Alimentos: a desinformação pode matar A alergia ao látex é um perigo que está por todos os lados. O grupo de alérgicos só aumenta e a alergia é adquirida, então qualquer pessoa pode vir a desenvolver Isis Maria Borges Gomes isismaria@odebateon.com.br
E
mbora pouco conhecida, a Síndrome Látex Alimentos - SLA não é rara, e a cada dia mais pessoas vêm sendo diagnosticadas com este mal. Na verdade, para quem tem esta Síndrome Látex Alimentos, o perigo está por todos os lados. O látex está em muitos objetos do dia a dia, desde os botões, fraldas, controle remoto, travesseiros, até os alimentos e luvas cirúrgicas. E uma das piores tem sido a moda dos balões. Por todos os lugares, lojas, supermercados, farmácias, eventos, os balões são a tônica. O grupo de alérgicos ao látex só aumenta e a alergia é adquirida, então qualquer pessoa pode vir a desenvolver. Daisy Fortes, de Farroupilha (RS), é portadora da síndrome e criou o grupo nacional; e Claudia Rosolen, de Macaé, tem uma filha portadora, que está formando um movimento para a criação de uma ONG, alertando o risco de morte que os partadores correm se forem parar num hospital da cidade. O nitrilo é o material mais adequado para as luvas que vão estar em contacto com gêneros alimentícios que contenham gorduras e óleos, mesmo em pequenas concentrações. O QUE É SÍNDROME LÁTEX ALIMENTOS?
A alergia ao látex é um tipo de alergia importante e que pode causar diversas reações alérgicas em indivíduos sensibilizados, principalmente porque a substância está presente em diversos objetos, incluindo brinquedos, fraldas, frascos de produtos. Atualmente, o látex extraído da seringueira (Hevea Brasiliensis) é a principal matéria prima para a produção de borracha natural. Porém o extrato que é extraído para a confecção das borrachas contém componentes com alta capacidade alergênica, fazendo com que pessoas que tenham contato direto e contínuo com a pele constituam um grupo de risco para a sensibilização ao látex.
EXPERIÊNCIA DE UMA PORTADORA
Residindo em Macaé há algum tempo, Claudia Rosolen, conta que a filha Pietra Rosolen Marinho, hoje com 8 anos, nasceu prematura de 30 semanas. Ficou internada na UTI por 30 dias e nesse período foi muito exposta ao látex. Já na UTI neonatal faziam chupeta de luva de látex para estimular sua sucção. Quando saiu da UTI seus problemas se agravaram: ela vomitava muitas vezes ao dia, chorava muito para ser alimentada, até que começou a se recusar a comer. Então suas internações começaram a ser muito frequentes e, em todas as internações, colocavam sondas nasointerais de látex para que ela pudesse se alimentar, e as fonoaudiólogas estimulavam sua sucção com luvas de latex. “Enfim eu desconhecia completamente que o látex era um grande vilão e que causava alergias, e por isso nunca sequer questionei o seu uso em minha filha. Se eu pudesse imaginar as consequências disso jamais alguém teria encostado na minha filha com essas luvas”, declara Cláudia. Foram dois anos de muita luta e muitas internações e Pietra sempre muito estimulada com as luvas de látex em sua boca para que pudesse se dessensibilizar, como diziam as fonaudiólogas. Nesse período ela passou por duas cirurgias também. “Aos 3 anos de idade, ela finalmente foi à escola, até então, apesar de muitas tosses noturnas, eu jamais desconfiei de que ela tivesse qualquer tipo de alergia, até que durante uma festinha da escola a professora desceu com ela completamente inchada com a respiração difícil, e corremos para o hospital. Ela foi medicada com adrenalina. Eu fiquei apavorada, nunca havia visto um quadro daqueles e até então não sabia nada sobre alergias, visto que não sou alérgica a nada. Imaginei que ela tivesse alergia a algum corante, jamais imaginei que um inofensivo balão fosse capaz de provocar uma reação tão horrivel na minha filha que poderia inclusive tê-la matado se não fosse prontamente atendida”,
contou a mãe de Pietra. Cláudia prossegue relatando que procurou um médico alergologista e encontrou a Dra. Martha Moretti, que a acompanha até hoje e, já na primeira consulta, na anamnese, ela desconfiou da alergia ao látex. Para mim foi um choque, porque jamais pude supor que o látex que foi tão utilizado por profissionais da área de saúde pudesse causar um estrago tão grande na qualidade de vida da minha filha”, disse. LUTA CONTÍNUA E DIÁRIA
Segundo Cláudia, o pior estava por vir, pois ela não imaginava que essa alergia provocava alergias cruzadas com tantos alimentos tidos como super saudáveis, porque a proteína do látex é muito semelhante a de muitas frutas, verduras, castanhas, grãos e uma vez sensibilizado ao látex, as chances de reações cruzadas são muito grandes. E o pior, a alergia ao látex é uma alergia adquirida 100% por exposição, mas 0% curável, sendo que a cada exposição essa alergia vai aumentando, podendo chegar a situações assustadoras como de algumas pessoas que sequer suportam partículas de látex no ar e não podem ingerir quase nenhum alimento, como é o caso da Daisy Fortes, que criou a página no Facebook, “SLA- Síndro-
me Látex Alimentos”, que está batalhando pela criação de uma associação para que essa alergia possa ser divulgada para que as pessoas se conscientizem que o látex adoece as pessoas e para que futuramente possamos aboli-lo dos hospitais, consultórios dentários, manipulação de alimentos, festinhas infantis (balões), etc. CUIDADOS INTENSOS E DIÁRIOS
Claudia Rosolen revela que tem muito cuidado com sua filha Pietra, porque além do látex ela já tem reação cruzada com banana, manga, coco e maracujá, sendo que com o maracujá ela já teve uma reação alergica gravíssima, tendo inclusive que utilizar adrenalina. Na escola que ela estuda, todos estão cientes de sua alergia. Deixo com a coordenação e com a professora um laudo médico atestando sua alergia e a necessidade de ser medicada em caso de reação, inclusive deixo os medicamentos necessários na escola. “Minha filha faz basquete, mas as bolas são de látex, então tive que comprar uma bola de couro para que ela pudesse praticar com segurança o esporte que tanto ama. Os cuidados são diários, porque o látex está presente em mais de 40 mil produtos, então tenho que es-
tar em alerta constante, verificando sempre se as roupas tem elásticos, o material escolar, os brinquedos, os locais onde vamos comer, tenho que verificar o tipo de luva que é utilizado no restaurante, porque muitos estão usando as luvas de látex na preparação de alimentos, o que é extremamente perigoso porque o látex entra no alimento podendo matar uma pessoa dependendo do grau de sensibilização dela. Tenho que verificar se os supermercados, hortifrutis e açougues estão utilizando as luvas, enfim é uma loucura total”, contou. DESPREPARO HOSPITALAR
Ela prossegue ressaltando que o seu grande medo é quando tem que levá-la ao hospital, porque infelizmente é o local menos seguro para ela. “O látex está no ar. A cada retirada de luva de látex, suas partículas ficam suspensas por até 3 dias no ar e embora ela não esteja sensibilizada ao ponto de reagir ao látex no ar, a cada exposição a sensibilização vai aumentando”, afirmou. Cláudia frisa ainda que aqui em Macaé os hospitais não possuem salas latex-free, e os profissionais em geral desconhecem a existência dessa alergia. Quando eu comunico, não dão muita importância e sequer existem luvas de vinil
ou nitrílica para que ela possa ser atendida com segurança. “Então tenho sempre que levar luvas e garrotes apropriados para que ela possa ser atendida com um mínimo de segurança. Mas o desconhecimento é tanto que muitas vezes quando impeço de tocarem nela com luvas de látex, o profissional tira na hora na frente da minha filha as luvas de látex e isso já provoca alergia nela”, revela. E continua: “Uma vez ela foi internada na Unimed, e embora eu tenha direito a um quarto individual, ela teve que dividir com outro paciente e foi muito difícil porque as pessoas já entravam com as luvas no quarto, até que consegui um quarto para ela e fixei um cartaz na porta informando sua alergia, mas mesmo assim as faxineiras entravam no quarto com luvas de látex, a pessoa que entregava comida também, enfim, enquanto a existência e gravidade dessa alergia não chegarem ao conhecimento público muitas pessoas continuarão adoecendo com o látex e quem já adquiriu vai piorar”, concluiu. EM VIAGEM
Cláudia informa que é uma alergia muito difícil de conviver, porque é desconhecida por quem deveria conhecer, que são os médicos. Ela fica apavorada quando viaja com medo de algum acidente na estrada por causa do socorro. “Tenho pavor de estar inconsciente e de alguém tocar na minha filha com luvas e equipamentos de látex, então em todas as viagens ela utiliza um broche identificando sua alergia ao látex, e no meu carro sempre tem luvas, garrote e laudo médico identificando sua alergia, e um procedimento do hospital Albert Einsten informando como proceder com um paciente em centro cirúrgico alérgico ao látex. Mas mesmo assim me sinto muito angustiada, por saber que se ela precisar de uma cirurgia de emergência para ela pode ser fatal por não haver sala latex free em nenhum hospital de Macaé e pouquíssimas salas latex free no Brasil. Na minha bolsa sempre tenho adrenalina, corticóide e antihistamínico”, conta.