Cinema do IMS Poços, novembro de 2025

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Jogo de cena, de Eduardo Coutinho

destaques de novembro

No Mês da Consciência Negra, o Cinema do IMS apresenta Shaft, suspense policial de Gordon Parks, sucesso de público e um dos marcos do então chamado blaxploitation, seguido por um comentário musical ao vivo do pianista Amaro Freitas, um dos nomes mais inovadores da música contemporânea. Fotógrafo, cineasta, escritor e compositor, Parks foi pioneiro em muitas frentes, chegando a ser a primeira pessoa negra a dirigir um filme num grande estúdio de Hollywood. A programação conta ainda com a sequência O grande golpe de Shaft.

Encerrando a Retrospectiva Adélia Sampaio: se eles apagam, a gente reescreve, serão exibidas uma direção, uma produção e uma referência cinematográfica da cineasta pioneira. Respectivamente: AI-05: o dia que não existiu, documentário sobre um dos períodos mais duros da ditadura militar; a ficção Parceiros da aventura, de José Medeiros, sabotada em seu financiamento por propor um elenco majoritariamente negro; e Chuvas de verão, de Carlos Diegues, que inspiraria um dos filmes de Adelia.

Em paralelo à Ocupação Eduardo Coutinho, serão exibidos alguns dos filmes seminais do cineasta, produzidos na fase final de sua carreira. O fim e o princípio, Jogo de cena e Moscou apontam para a experimentação e depuração de estilo e procedimentos de um dos grandes artistas brasileiros.

Ainda este mês, Tubarão, o clássico de Steven Spielberg, retorna ao cinema em restauração 4K; A queda do céu, de Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha, se debruça sobre as palavras do xamã e líder Yanomami Davi Kopenawa e registra um importante ritual do povo Watorik; Julia Roberts, Ayo Edebiri e Andrew Garfield estrelam Depois da caçada, o mais novo drama de Luca Guadagnino.

[imagem da capa]

Parceiros de aventura, de José Medeiros
Shaft, de Gordon Parks
Tubarão (Jaws), de Steven Spielberg
A queda do céu, de Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha

Em cartaz

A queda do céu

Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha | DCP

Depois da caçada (After the Hunt)

Luca Guadagnino | DCP

O último episódio

Maurilio Martins | DCP

Toque familiar (Familiar Touch)

Sarah Friedland | DCP

Tubarão (Jaws)

Steven Spielberg | DCP, restauração 4K

Especial Novembro Negro

Ocupação Eduardo Coutinho

Shaft

Gordon Parks | DCP, restauração 4K

O grande golpe de Shaft

(Shaft's Big Score!)

Gordon Parks | Arquivo digital

Dona Flor e seus dois maridos

Bruno Barreto | DCP

Jogo de cena

Eduardo Coutinho | Arquivo digital

Moscou

Eduardo Coutinho | Arquivo digital

O fim e o princípio

Eduardo Coutinho | Arquivo digital

Retrospectiva Adelia

Sampaio: se eles apagam, a gente reescreve

DIA D

O padre e a moça

Joaquim Pedro de Andrade | Arquivo digital, cópia restaurada

AI-05: o dia que não existiu

Paulo Markun (direção-geral), Adelia Sampaio (direção artística) | Arquivo digital

Carta Branca a Adelia Sampaio

Parceiros da aventura

José Medeiros | Arquivo digital de baixa resolução

Chuvas de verão

Carlos Diegues | Arquivo digital

O último episódio (112')

19:00 A queda do céu (108')

Tubarão (124')

19:00 Depois da caçada (139')

16:00 Dia D: O padre e a moça (90'), sessão seguida de debate e recital de poesia

16:00 retrospectiva adelia sampaio

AI-05: O dia que não existiu (58')

18:00 Tubarão (124')

16:00 retrospectiva adelia sampaio

Parceiros da aventura (92')

18:00 O último episódio (112')

16:00 ocupação eduardo coutinho

Dona Flor e seus dois maridos (117')

18:30 Toque familiar (91')

16:00 ocupação eduardo coutinho

O fim e o princípio (110') 18:30 Tubarão (124')

19:00 novembro negro

Shaft por Amaro Freitas

Exibição do filme Shaft, de Gordon Parks, seguido de comentário musical ao vivo por Amaro Freitas

19:00 novembro

Shaft (100') sessão regular, sem música ao vivo

16:00 A queda do céu (108')

18:30 retrospectiva adelia  sampaio Chuvas de verão (93')

16:00 ocupação eduardo coutinho

Jogo de cena (103')

18:30 Depois da caçada (139')

16:00 ocupação eduardo coutinho

Moscou (78')

18:30 Depois da caçada (139')

16:00 novembro negro O grande golpe de Shaft (104')

19:00 A queda do céu (108')

16:00 A queda do céu (108') 18:30 Depois da caçada (139')

Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas em ims.com.br.

Novembro Negro

Shaft, uma imagem inútil?

Heitor Augusto

Quem é o detetive pretão

Que dá no couro com todas as gatinhas?

Shaft!

Matou a pau!

Quem é o homem que arrisca o próprio

pescoço

Para proteger seus irmãos?

Shaft!

Pegou a visão?

Quem é o chapa que não se amedronta

Quando o perigo ronda?

Shaft!

Matou a pau!

Isaac Hayes, canção-tema de Shaft (1971).

Tradução livre minha

Composta especialmente para Shaft (1971), a canção-tema que embala as imagens dos créditos de abertura – nas quais vemos o herói do filme, John Shaft, andando pelas ruas e calçadas de Manhattan, Nova York, com o conforto e a segurança típicos de quem é o rei da cocada preta –, sintetiza alguns dos atributos que distinguem, de forma elogiosa ou problemática, o protagonista desse que é o mais icônico dos filmes da então chamada blaxploitation. Seguindo a letra de Isaac Hayes, aprendemos, pela ordem dos versos, que o detetive Shaft: é uma potência sexual; tem consciência de raça; é destemido e não foge da treta quando o perigo se apresenta; e que, pela estrutura dialógica da canção – Isaac canta um verso, o coro responde com um agudo “Shaft!” –, ele é uma figura de trajetória interessante o suficiente para ser partilhada –mais que isso: entoada.

Ainda que o filme tenha uma materialidade e uma fisicalidade evidentes (porradaria e tiros, tempo histórico marcado e identificável, relações de poder indissociáveis dos lugares sociais ocupados por cada um dos personagens), é necessário pontuar que Shaft não é um homem, mas uma entidade da ordem do supra-humano. Uma análise fílmica mais atenta dos créditos permite tal leitura.

A câmera começa passeando numa aérea à procura de um alguém. Ao surgir

das escadarias do metrô, um acorde grave reforça a chegada do personagem – troca-se também o enquadramento (do plano geral para um close, com o rosto do ator Richard Roundtree suavemente entrando à frente do rosto de um branco num outdoor em segundo plano). O que se segue nos próximos quatro minutos da abertura é uma performance de diva da masculinidade: Shaft tem a cidade em suas mãos e descobriremos isso pela maneira em que ela (a cidade) abre passagem para ele – ou melhor, pela maneira em que ele a adentra sem pedir passagem.

Em quatro minutos, John Shaft, um homem negro, anda por entre os carros num dia movimentado, cria uma marca de diferenciação entre ele e um assaltante pé-rapado ao mostrar o distintivo, transborda sedução ao ser enquadrado à frente das luminárias de um cinema, interage com um cego jornaleiro e contorna uma piada potencialmente racista e, finalmente, chega ao seu destino, uma engraxataria, onde interage com um “mais velho”. Se O.J. Simpson só conseguiu passe livre para correr num aeroporto por meio da aprovação simbólica dos brancos, que dizem “Go, O.J., go!”,1 Shaft não precisa, muito menos pede autorização

para parar as ruas de Nova York, porque seu passe para tal liberdade simbólica é ser cool. É o cool que torna Shaft supra-humano.

1. The superstar in rent-a-car! . Campanha televisiva, dez. 1977. Disponível em: youtube.com/watch?v=A4LECXW_MQY.

Parente do que hoje chamamos de dandismo negro, o “cool” – ou “descolado”, numa tradução livre e insuficiente – é, no contexto afro-americano, uma estratégia

de vida que articula visibilidade e opacidade. Ele representa, nas palavras do músico, documentarista e pesquisador Questlove, “um engajamento social que mascara um tipo de desengajamento” e contém “um fiapo de ameaça”, levando à inevitável pergunta: “E se a máscara for levantada e a fúria for

Shaft, de Gordon Parks

liberada?”.2 Ao longo de todo o filme, o detetive Shaft arroxa e afrouxa a mangueira da fúria, e as consequências desse manejo para a América branca difere significativamente em comparação com a negra.

Um blaxploitation de Gordon Parks

Quinto filme de Gordon Parks, fotógrafo cujas primeiras realizações cinematográficas representam uma espécie de extensão política e estética de seu olhar para a fotografia, Shaft foi realizado já no contexto do blaxploitation. Definido por alguns como um movimento,3 trata-se de um conjunto de centenas de filmes realizados entre 1970 e 1975 e que compartilham características estéticas e temáticas, tais como: cinema de gênero (filmes de ação, horror, comédias ou policiais); elencos e histórias negras (o

2. “Questlove’s How Hip-Hop Failed Black America, Part III: What Happens When Black Loses Its Cool?”. Vulture, 06.05.2014. Disponível em: vulture.com/2014/05/questlove-hip-hop-failed-black-america-part-3-black-loses-cool.html. A versão traduzida desse texto está disponível em: ursodelatadotcom1.wordpress.com/2016/12/11/ traducao-questlove-sobre-quando-o-negro-perde-seu-ar-cool-hip-hop/.

3. Uma referência importante para a definição do blaxploitation como movimento é: LAWRENCE, Novotny. Blaxploitation Films of the 1970s: Blackness and Genre. Nova York: Routledge, 2008.

que se reflete na ambientação em espaços urbanos majoritariamente negros e estereótipo reverso para os personagens brancos); abundância de musicalidade soul, tanto diegética e extradiegética; e serem realizados com vistas a atingir massivamente o público afro-americano. No geral, filmes de baixo orçamento, com diretores brancos ou negros comandando histórias de mocinhos negros e negras combatendo vilões brancos – há antagonistas negros, mas, grosso modo, a vilania é branca.

O blaxploitation – que prefiro definir como um “momento”, muito mais que um “movimento” – é resultado de condições históricas que permitiram o surgimento desses filmes que, por outro lado, moldaram uma era, numa via de mão dupla repleta de contradições refletidas em seu próprio nome.4

Por isso mesmo, não cessa de interessar e mobilizar afetos, muitas vezes contraditórios. Encarar os filmes do blaxploitation com

a expectativa da positividade aprisionante e normativa de Medida provisória é o mesmo que ir para uma quadra de basquete esperando pontuar usando um taco de beisebol. Trata-se de representações que tensionam os entendimentos do que seria uma boa imagem – aquela que, nas nossas justificadas ânsias de que finalmente desfrutaremos da nossa humanidade, exibimos para o mundo branco, como que apelando: “Vês? Não sou eu um humano? Então por que me matas?”

4. Blaxploitation é a corruptela de duas palavras em inglês: “Black” (“preto’) e “exploitation” (“exploração”), que também faz referência ao gênero cinematográfico de mesmo nome. O termo surgiu pela primeira vez na imprensa em 17 de dezembro de 1972, num artigo de Julius Griffin, então presidente da Seção Hollywood da NAACP, a Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor, escrito para o The New York Times.

As imagens de Shaft não têm utilidade, a não ser prazer espectatorial. E o que nós, espectadores negros, fazemos com imagens inúteis? Shaft, tal como todos os filmes feitos no contexto do blaxploitation, se apoia em reducionismos e estereotipias, aspecto que, desde o início, gerou oposições e debates intensos na comunidade afro-americana.5 Mas uma espectatorialidade negra ativa não implica justamente a lida com a realidade da contradição, em vez de sua ideia? Ou reduzimos a nossa espectatorialidade a um mero ranqueamento de 5. A mesma edição de domingo que abriu espaço para o artigo de Griffin intitulado “Black Movie Boom: Good or Bad?” [Explosão de filmes negros: positiva ou prejudicial?] viu também a presença de outros articulistas se posicionando a favor do que então passava a se entender como filmes blaxploitation.

representações problemáticas versus representações “fecho”? O prazer entra na nossa equação espectatorial?

Essas são algumas questões interessantes de serem mobilizadas numa sessão de Shaft mais de cinco décadas após o seu lançamento.

Shaft, de Gordon Parks

Eduardo Coutinho aos 90 anos: seus próximos filmes

Em 11 de maio de 2023, Eduardo Coutinho faria 90 anos. Se ele ainda estivesse por aqui, que filmes estaria dirigindo?

Convivi com Coutinho por mais de 20 anos e sobre ele só tinha três certezas: que, marcado um encontro, ele não se atrasaria; que ele chegaria fumando; e que viria com uma bolsa a tiracolo. Qualquer outra previsão seria mais ou menos como apostar nos cavalos (ele gostava das corridas no Jóquei, achava aquilo bonito). Embora tenha sido o produtor de vários filmes dele, só retrospectivamente fui capaz de intuir o fio que unia o documentário seguinte ao anterior. Por que Jogo de cena (2007) depois de O fim e o princípio (2005)? Como, de Moscou (2009), se chega a As canções (2011)?

Tomada ao pé da letra, então, a pergunta do primeiro parágrafo soa retórica – não pode ser respondida. Mas é possível especular, tratando a coisa como um experimento mental.

Começo pelas certezas.

O próximo filme de Coutinho seria ainda um filme de conversa, ou, lembrando uma ideia que lhe era muito, muito cara, um cinema da palavra. “Descobri a palavra pela falta que ela me fazia em tudo o que eu via no cinema”, ele me disse em 2012.

O próximo filme de Coutinho seria um filme com gente que a plateia não reconheceria na [Texto originalmente publicado em maio de 2023 na revista de programação do IMS Paulista por ocasião da mostra Coutinho 90, que celebrava o aniversário de 90 anos do cineasta.]

rua, pessoas anônimas em grande parte, a maioria delas remediada ou pobre. Nenhuma estaria ali como representante de alguma categoria sociológica. Seriam, tão somente, representantes de si mesmas. Nesse próximo filme, nenhum personagem estaria condenado de antemão a caber no figurino esperado. O operário de fábrica poderia ter orgulho da peça que seu trabalho mecânico produz. A empregada doméstica poderia se identificar politicamente com a patroa. A catadora de lixo poderia dizer que só no lixão ganhou autonomia e se deu conta de que era dona de si.

Haveria, portanto (e disso tenho certeza absoluta), personagens capazes de passar uma rasteira nas nossas convicções. O mundo segundo Coutinho era feito de “impurezas” que mereciam ser celebradas. Perigoso era o contrário, a utopia. Para ele, as duas palavras mais obscenas de todo idioma eram “pureza” e “perfeição”.

As pessoas do seu próximo filme falariam não dos grandes temas da história, mas dos acontecimentos do dia a dia, daquilo que às vezes ele descrevia como “os desastres do cotidiano”. Desastres – e isto é fundamental – incapazes de derrotar a pessoa que narra. Apesar das surras da vida, das carências todas, as personagens serão suficientemente inteligentes para inventar razões

que as afastem do desespero. Tornarão a lembrar – e, com isso, de certa forma reviverão – os momentos que trazem um sentido à existência. Poderá ser a solidariedade entre colegas de trabalho, uma amizade, um amor conturbado, uma canção, uma volta por cima, um elogio recebido. Às vezes parecerá pouco para o espectador. Coutinho nos fará ver que é imenso para quem conta; é o quanto basta, muitas vezes, para que a pessoa se diga, se não feliz, ao menos satisfeita e capaz de alegria.

Ninguém no seu próximo filme será sujeito passivo das circunstâncias. Ninguém será apenas vítima. O filme tentará ser digno desses relatos, tentará se pôr à altura do que está em jogo, honrando a importância que esses episódios têm para quem os viveu.

Coutinho não fará o seu próximo filme sobre pessoas iguais a ele. Não será um filme sobre intelectuais, cineastas, diretores de televisão ou jornalistas, sobre quem vive no seu mundo mental e compartilha dos mesmos bens culturais. “O que me interessa é exatamente o fato de eu não ter nada a ver com eles [os personagens]”, repetia. Por isso filmes sobre mulheres, operários, camponeses, crentes, sobre gente pouco letrada e de outra classe social. (É interessante imaginar a recepção desse cinema

caso Coutinho estivesse aparecendo agora, ele, cuja consagração antecedeu o advento das políticas identitárias.)

“Quero conversar com uma mulher porque não sei o que é dar à luz. Quero conversar com um negro porque não sei o que é ser discriminado por causa da cor da minha pele.”

Queria saber, embora tivesse plena consciência dos limites desse desejo. Sabia que a parte que se furta à câmera será sempre maior do que a parte que se revela. O fato de que prevalecerá sempre o que não se pode saber da personagem lhe parecia uma força, não uma fraqueza. Como categoria do pensamento utópico, toda presunção totalizante era para ele uma abominação.

Essas são as minhas certezas. Elas podem até dar a impressão de que o próximo filme de Coutinho seria um outro e mesmo filme, mas não. Coutinho nunca se repetiu, e essa é uma das grandes belezas do seu cinema. Seu trabalho não é uma coleção de filmes pontuais, mas um processo por meio do qual o cinema é pensado. Nesse sentido, ele é um dos poucos cineastas brasileiros dos quais se pode dizer que têm uma obra, entendida aqui como um conjunto mais rico do que as partes.

Cada filme avança uma casa em relação ao anterior, como quem, pé ante pé, frame ante frame, se aproxima sempre mais da

fronteira além da qual o cinema se desfaz. Sua obra permite aferir o mínimo necessário para que um filme seja filme. Basta pensar no que Coutinho vai deixando pelo caminho à medida que avança: argumento, roteiro, narração, trilha sonora, movimento de câmera, as ferramentas básicas da profissão.

Isso acontece sempre aos poucos, filme a filme. Tomo como exemplo os documentários que mencionei no início.

Em O fim e o princípio, Coutinho decide começar a filmagem sem saber o que filmará. A ideia é descobrir o argumento durante a produção. Acaba encontrando uma comunidade de pessoas enraizadas numa riquíssima tradição oral. Convencido – ao menos temporariamente –de que dificilmente conseguiria reunir personagens capazes de narrar tão bem a própria vida, no filme seguinte deixa de lado os relatos originais, base até então de todo o seu cinema, para explorar a verdade emocional de histórias contadas por quem não as viveu. É Jogo de cena, filme que torna problemática toda tentativa de estabelecer um juízo, seja moral, seja epistemológico, a respeito da superioridade do autêntico sobre o encenado ou do encenado sobre o autêntico. O que será mais real? Impossível dizer, ao menos no quadro do seu cinema.

Se em Jogo de cena Coutinho dirigira a

cena, em Moscou ele abdica dessa função, entregando-a ao diretor de teatro Enrique Díaz. Coutinho, cujo método era o contrário da observação, agora se põe no papel de quem principalmente observa. Contudo, como já mostrara Jean Rouch, a observação não é passiva. O observador ali é Eduardo Coutinho, e os atores do Grupo Galpão sabem disso. Enquanto ensaiam As três irmãs, encontram convergências da peça de Tchekhov com suas próprias vidas. Eles têm consciência de que o cinema de Coutinho é feito dessas imbricações entre o pessoal e o universal. É isso que oferecem ao filme, como uma dádiva a Coutinho.

Em Jogo de cena, o fato vivido deflagra o material emocionalmente forte do filme, que é a parte de ficção. Moscou faz o caminho inverso. É a ficção que traz à tona a experiência real dos atores. As canções sintetiza as duas coisas. Algo foi vivido, e o vivido se ligou a uma canção. Anos depois, é ela, a canção – o artefato ficcional –, que traz de volta a intensidade da experiência original. E assim Coutinho avança.

Mas a lógica só emerge quando se olha para trás, o que pode muito bem significar que se trata de um artificialismo, um pouco como encontrar um padrão apenas porque se estava à cata de um. De fato, Coutinho não era um diretor programático e sempre

deixou claro que odiava todo sistema. Nada mais distante dele do que a construção metódica de uma obra recheada de princípios. Preferia a contradição e o impasse à coerência.

Isto eu sei: Coutinho não gostava mesmo era da redundância. “Não se volta para a cena do crime”, dizia. O que permite especular que o filme que viria a seguir tentaria fazer alguma coisa que nenhum dos anteriores havia feito. Vale todo palpite: um filme só de citações (sonho antigo, cujo primeiro esboço foi Um dia na vida, realizado entre Moscou e As canções), um filme em que ele pediria aos atores que insuflassem um texto anódino – receita de cozinha, anúncio de eletrodoméstico, folheto de lançamento imobiliário – com emoção dramática, cômica ou sentimental. Não descarto nem a hipótese meio absurda de uma longa conversa com um computador dotado de inteligência artificial. Sendo esses sistemas máquinas estatísticas que coligem e sintetizam toda experiência humana digitalizada, consigo imaginar o interesse de Coutinho em explorar a natureza dessa síntese para encontrar o fantasma humano que ainda sobrevive na máquina. Dentre todos os filmes possíveis, penso particularmente em um. Ele nasce da observação de que o cinema de Coutinho foi se adaptando às limitações físicas do próprio

Coutinho, à sua fragilidade crescente, ao fato de que as décadas, os cigarros e a má alimentação acabaram por encolher o seu trânsito pelo mundo. Essa sempre me pareceu uma das principais razões pelas quais os filmes progressivamente se imobilizaram, a câmera não andando mais pela cidade, não subindo mais os morros do Rio, não indo mais para o sertão. Em vez disso, o estúdio e a cadeira em que o diretor e sua saúde precária podiam esperar a chegada dos personagens.

Coutinho falava do pensamento como “uma secreção do corpo”. Vale igual para o cinema que inventou. O corpo de Coutinho ditou o rumo de sua obra. Penso nele com seus 90 anos, sem poder se mover, fazendo um filme da cama – cama de casa ou de hospital. Em vez de selecionar personagens, o que exigiria uma energia de que provavelmente não dispunha mais, ele inverteria a equação: que os personagens agora o escolhessem. Que viessem lhe fazer perguntas. Ele, é claro, se interessaria pelas perguntas, não pelas respostas.

O velho documentarista que tanto recebeu de seus personagens trocaria de lugar com eles. Eles seriam Eduardo Coutinho, Eduardo Coutinho seria eles. Uma última e magnífica fusão, revelando, por fim, o sentido amoroso da obra.

A queda do céu

Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha | Brasil | 2024, 108’, DCP (Gullane+)

Baseado nas palavras poderosas do xamã e líder Yanomami Davi Kopenawa, o documentário retrata a comunidade Watoriki durante o importante ritual funerário Reahu, um esforço coletivo para segurar o céu. O filme atua como uma contundente crítica xamânica àqueles que Davi Kopenawa chama de “o povo da mercadoria”, ao garimpo ilegal e à mistura mortal de epidemias trazidas pelos forasteiros, chamadas de xawara. Em primeiro plano, a beleza e a força geopolítica da cosmologia Yanomami e dos espíritos xapiri.

A queda do céu estreou na Quinzaine de Cinéastes, mostra paralela do Festival de Cannes 2024. Desde então, circulou por uma série de festivais e reuniu prêmios, como os de Melhor Longa-Metragem Documentário Internacional no 27º Festival Internacional de Cinema de Guanajuato, no México, Prêmio Especial do Júri no DMZ Docs, na Coreia do Sul, e Prêmio de Melhor Som e Melhor Direção de Documentário no Festival do Rio, todos em 2024.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Depois da caçada

After the Hunt

Luca Guadagnino | EUA | 2025, 139’, DCP (Sony Pictures)

Com um elenco que inclui Julia Roberts, Ayo Edebiri e Andrew Garfield, o Cinema do IMS Poços apresenta o mais recente filme do cineasta Luca Guadagnino (diretor de Me chame pelo seu nome, Queer, Rivais).

No filme, Alma Olsson, professora de filosofia na Universidade Yale, se vê no centro de uma crise ética e pessoal quando sua aluna Maggie acusa outro professor, seu amigo de longa data, de agressão sexual. À medida que os conflitos no câmpus se intensificam, segredos obscuros do passado de Alma ameaçam vir à tona, desafiando os limites entre lealdade, justiça e convicção.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

O último episódio

Maurilio Martins | Brasil | 2025, 112’, DCP (Malute e Embaúba Filmes)

Erik, um garoto de 13 anos, alimenta uma paixão platônica por Sheilla e, para se aproximar dela, diz ter em casa uma fita com o lendário último episódio do desenho Caverna do dragão. Com a ajuda de seus melhores amigos, ele precisa criar uma solução para a enrascada em que se meteu.

O último episódio é o mais novo lançamento da produtora mineira Filmes de Plástico. Em depoimento disponível no material de imprensa do filme, o diretor Maurílio Martins (No coração do mundo) conta: “Há muitos traços biográficos, ainda que não seja a minha história, ainda que aquilo nunca tenha acontecido comigo. O filme se passa em 1991, e eu tinha 13 anos em 1991. Eu não necessariamente morei na casa onde o personagem mora, mas ela fica em frente à minha casa. Por coincidência, é uma casa que, desde a primeira versão do roteiro, eu sempre quis que fosse ali onde o filme fosse filmado.”

“Eu acho que, mais do que a cidade de Contagem, eu tenho me aprofundado ainda mais no lugar onde eu nasci, cresci e vivi minha vida inteira, que é o Laguna. Quase como se fosse uma cidade dentro da cidade. Em parte, porque a gente sempre viveu um pouco isolado, tanto da região mais central de Contagem quanto da região central de Belo Horizonte.”

“E tem uma coisa que é muito importante de se dizer. Eu acho que esse filme cumpre um papel que, de certo modo, os nossos filmes vêm cumprindo, mas é a primeira vez que a gente faz um filme de época, a primeira vez que a gente precisa recriar um espaço. E aí entra um traço que é muito triste, no sentido da preservação. Na periferia, existe algo que funciona como um sinal de obtenção de uma vida melhor. Um indicativo muito forte de que sua vida está melhorando é quando você consegue reformar a sua casa, derrubar e construir outra, trocar o muro, trocar o passeio. Essa reforma, essa mudança, é muito constante na periferia. Por isso, você não tem quase nada preservado. A ideia de preservação caminha para outros lados.”

“Então, no filme, a gente tenta, inclusive se valendo de efeitos especiais, reconstrução em 3D, apagamento de algumas coisas, reconstruir ao máximo, dentro do que é possível, essa Contagem dos anos 1980. Esse bairro Laguna dos anos 1980, início dos 1990 – mais especificamente os anos 1990, porque o filme se passa em 1991. Acho que as fotos utilizadas ali e aquele vídeo conectam ainda mais a gente com esse espaço. E, claro, também nos valemos das poucas construções que ainda foram preservadas, que ainda

se mantiveram. Tivemos um trabalho de arte belíssimo, magnífico, especialmente na reconstrução da mercearia, dos ambientes internos. Isso provoca algo muito forte e te coloca muito próximo do que era, mesmo depois de tudo o que já passou.”

“Dentro do que a gente podia, cinematograficamente falando, acho que fomos muito fiéis a esse espaço. E isso me dá um orgulho muito grande.”

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Toque familiar

Familiar Touch

Sarah Friedland | EUA | 2024, 91’, DCP (Imovision)

Uma mulher de 80 anos está na transição para uma vida assistida. Enquanto lida com a adaptação na casa de repouso, ela começa a criar conflitos consigo mesma e com seus cuidadores, em meio às mudanças de sua memória, sua identidade e seus desejos.

A estreia de Sarah Friedland no longa-metragem foi amplamente aclamada na edição de 2024 do Festival de Veneza, onde Toque familiar conquistou os prêmios Leão do Futuro (Melhor Filme de Estreia); Melhor Direção, na seção Orizzonti; e Melhor Atriz, para Kathleen Chalfant. A cineasta, que vinha de uma carreira focada em filmes coreográficos, desenvolveu o filme como um roteiro de movimentos, inspirado nas vivências com sua avó, que desenvolveu demência e se tornou não verbal, e também no trabalho como cuidadora de idosos. Parte da proposta residia em disputar a imagem da velhice e da demência unicamente como uma

narrativa de declínio ou de sofrimento do ponto de vista do entorno familiar.

“A ideia que fundamentou a linguagem visual para nós foi a de querer captar não apenas as percepções sensoriais de Ruth, mas, literalmente, a forma como ela constrói sentido para o mundo e para si mesma através do corpo”, declara a cineasta em entrevista a Nicolas Rapold para a Filmmaker Magazine. “Uma das características do tipo de filme [que retrata velhice e perda de memória] que você descreveu, sem citar nomes, é que a narrativa da decadência se baseia em pensar a pessoa unicamente a partir do seu eu cognitivo. Quando as faculdades cognitivas mudam ou declinam, conclui-se que a pessoa já não é mais ela mesma. E acho que parte da minha formação coreográfica me leva a me interessar justamente por personagens e pela noção de identidade que surge da corporificação e de outros sentidos. Algo que muitas pessoas não sabem sobre as experiências de perda de memória é que, para muitos, outros sentidos se intensificam mesmo quando as faculdades cognitivas declinam – o tato, o paladar, o olfato, as experiências de linguagem corporal e postura ficam mais aguçados. Portanto, queríamos criar a perspectiva de Ruth não pelo olhar ocular dela – existem apenas dois planos de ponto de vista literal no filme –, mas pela sua perspectiva incorporada, e elaborar uma linguagem visual que captasse Ruth através do toque, dos gestos, das experiências sonoras.”

“Uma das coisas que descobri como cuidadora foi que algo universal entre nós é o desejo de expressar nossa agência e autonomia de diferentes maneiras. Mesmo quando meus clientes

precisavam de cuidados para existir no mundo social e enfrentar o dia, eu me comovia profundamente com as pequenas formas pelas quais ainda expressavam sua autonomia e independência. Por exemplo, para uma mulher com quem trabalhei, escolher sua roupa todos os dias era incrivelmente importante. Essa escolha era onde ela encontrava agência. Para outra artista com quem trabalhei, fazer sua própria lista de compras e escolher cada vegetal pessoalmente era muito importante. Há ecos de todas essas pessoas em Ruth. Eu queria retratar a continuidade desses adultos, e não apenas seu declínio. E, em uma nota pessoal, as duas avós que tive são mulheres autoritárias, mandonas, afiadas! Acho que a forma como atribuímos essa ‘fofura’ às mulheres mais velhas é extremamente sexista e infantilizante. Eu queria mostrar a continuidade do poder e da autoexpressão de Ruth, porque é isso que eu conheci como verdade nas mulheres mais velhas que me são próximas.”

[Íntegra da entrevista, em inglês: tinyurl.com/ familiarsf]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Tubarão Jaws

Steven Spielberg | EUA | 1975, 125’, DCP (Universal Pictures do Brasil), restauração 4K

Um terrível ataque a banhistas é o sinal de que a praia da pequena cidade de Amity, virou refeitório de um gigantesco tubarão-branco, que começa a se alimentar dos turistas. Embora o prefeito queira esconder os fatos da mídia, o xerife local pede ajuda a um ictiologista e a um pescador veterano para caçar o animal, mas a missão vai ser mais complicada do que eles imaginavam.

Lançado em junho de 1975 nos Estados Unidos e chegando em dezembro do mesmo ano no Brasil, Tubarão redefiniu a indústria audiovisual. Foi o primeiro filme da história a ultrapassar 100 milhões de dólares em bilheteria, cunhando o termo blockbuster, amplamente utilizado hoje em dia. O longa também foi responsável por transfor-

mar o calendário de lançamentos de Hollywood, já que o mês de junho era visto como uma “estação fraca” para o cinema. Contudo, após a estreia, o período passou a ser o mais aguardado do ano para os grandes lançamentos cinematográficos.

Também sucesso de crítica, o filme recebeu quatro indicações ao Oscar, das quais venceu nas categorias Melhor Montagem, Melhor Som e Melhor Trilha Sonora. A icônica música de John Williams é, até hoje, considerada uma das composições mais reconhecíveis e influentes da história do cinema.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Gordon Parks foi um artista multifacetado, fotógrafo, escritor, músico e cineasta, cuja obra abordou as desigualdades raciais e sociais nos Estados Unidos. Nascido em meio à segregação racial norte-americana, iniciou sua carreira na revista Life, onde se destacou pelo olhar sensível às vivências cotidianas das comunidades afro-americanas. Pioneiro em muitas frentes, foi o primeiro fotógrafo negro contratado pela revista e também o primeiro cineasta negro a dirigir filmes em um grande estúdio de Hollywood, com o filme de ficção semiautobiográfico Com o terror na alma (The Learning Tree).

Mais tarde, com o suspense policial Shaft, Parks foi um dos responsáveis por abrir as portas para o conjunto de filmes então chamado blaxploitation Sucesso de bilheteria, Shaft recebeu o Oscar de Melhor Canção Original, em 1972, para a música-tema de Isaac Hayes.

Neste mês da Consciência Negra, o legado de Parks será revisitado com as exibições de Shaft e da sequência O grande golpe de Shaft. A primeira exibição de Shaft será seguida por um comentário musical de Amaro Freitas.

Shaft por Amaro Freitas

Exibição do filme Shaft, de Gordon Parks, seguido de comentário musical por Amaro Freitas

Shaft

Gordon Parks | EUA | 1971, 100’, DCP (Park Circus), restauração 4K

Marco do cinema então chamado blaxploitation e da cultura negra nos EUA, Shaft ganha uma sessão especial que une cinema e música ao vivo. Após a exibição do longa, o pianista e compositor Amaro Freitas faz uma apresentação inédita, inspirada pela estética, narrativa e sonoridade do filme. Na trama, o detetive John Shaft é contratado por um chefe do crime de Nova York para encontrar sua filha sequestrada. O roteiro, baseado em romance de Ernest Tidyman, foi transformado por Parks em um símbolo cultural que subverteu o papel historicamente submisso de personagens negros em Hollywood. Além disso, influenciou gerações com a trilha sonora composta por Isaac Hayes, cuja música tema recebeu o Oscar de Melhor Canção Original em 1972.

Com sua linguagem inventiva e profundamente enraizada na música afro-brasileira, Amaro propõe um diálogo entre o legado de Shaft e as pulsões contemporâneas do jazz e da música negra global, reverberando ainda a própria trajetória de Parks, que também era fotógrafo e pianista.

Ingressos

Dia 27/11: Exibição do filme seguida de comentário musical: Entrada gratuita. Distribuição de senhas 60 minutos antes da exibição. Limite de uma senha por pessoa. Sujeito à lotação da sala.

Dia 28/11: Apenas exibição do filme: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Amaro Freitas

Nascido no Recife em 1991, Amaro Freitas é uma das vozes mais inovadoras da música contemporânea. Filho de um líder de banda evangélica, começou sua formação musical aos 12 anos e rapidamente se destacou na cena jazzística do Brasil e do mundo. Com um estilo próprio, marcado pela improvisação, ancestralidade afro-brasileira e desconstrução das formas tradicionais do piano, Amaro já se apresentou em festivais como Montreux Jazz (Suíça), Ronnie Scott’s (Londres), além de colaborações com artistas como Milton Nascimento, Dom Salvador, Criolo e Lenine. Com álbuns aclamados, como Sangue negro (2016), Rasif (2018), Sankofa (2021) e o mais recente Y’Y (2024), lançado pelo selo norte-americano Psychic Hotline, o pianista vem sendo celebrado por veículos como DownBeat, Pitchfork e All About Jazz. Em 2025, recebeu o Prêmio da Música Brasileira de Melhor Álbum de Música Instrumental por Y’Y

O grande golpe de Shaft

Shaft’s Big Score!

Gordon Parks | EUA | 1972, 105’, Arquivo digital (Park Circus)

No segundo filme da série Shaft, o detetive John Shaft sai em busca dos assassinos de um velho amigo, mas acaba no meio de uma guerra entre gangues. O filme teve um orçamento significativamente maior do que o primeiro, o que possibilitou cenas de ação mais impressionantes. A trilha foi composta pelo próprio Parks, que na época já era um compositor reconhecido, e várias das canções originais foram escritas por ele também (incluindo a música tema, “Blowin’ Your Mind”). Embora não tenha voltado a trabalhar na sequência, o compositor da trilha do filme original, Isaac Hayes, contribuiu com a música “Type Thang”.

O sucesso de Shaft rendeu ainda diversas outras sequências. Em todas elas, Richard Roundtree interpreta John Shaft: Shaft na África (1973), de John Guillermin, a série de TV Shaft (1973-1974), da CBS, além de Shaft (2000), de John Singleton, e Shaft (2019), dirigido por Tim Story. Os dois últimos foram protagonizados por Samuel L. Jackson, no papel de familiar do Shaft original.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Retrospectiva Adelia Sampaio: se eles apagam, a gente reescreve

Celebrar Adelia Sampaio é reconhecer uma trajetória de mais de cinco décadas marcada por coragem e invenção no cinema brasileiro. Primeira mulher negra a dirigir um longa no país, com Amor maldito (1984), uma das primeiras obras da América Latina a tratar a lesbofobia de forma direta, Adelia abriu caminho em uma indústria marcada por exclusões. Autodidata, iniciou na Difilm e construiu sua própria produtora, assinando curtas, como Denúncia vazia, e documentários, como AI-05: o dia que não existiu, além de produzir filmes fundamentais, como O segredo da rosa, de Vanja Orico, e Parceiros da aventura, de José Medeiros.

Esta retrospectiva integra a programação do Cinema IMS dedicada às mulheres pioneiras na direção, que já incluiu Ida Lupino, e homenagens a cineastas que marcaram a história, como Jorge Bodanzky e Billy Woodberry. Ao trazer para o centro a obra de Adelia Sampaio, o IMS reafirma a urgência de reconhecer e difundir a contribuição de uma cineasta cuja trajetória tensiona silenciamentos históricos e inscreve novas possibilidades de leitura do cinema brasileiro. Seu legado, que constitui memória, segue inaugurando caminhos que fazem de Adelia Sampaio pioneira do cinema negro feminino no país.

A programação teve início em setembro e se encerra este mês no Cinema do IMS Poços.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Parceiros da aventura

José Medeiros | Brasil | 1979, 92’, Arquivo digital de baixa resolução (Acervo da diretora)

O miserável trio formado pelo bandido Vaselina, sua amante Ana Maria e o amigo Fumaça buscam formas de ganhar qualquer quantidade de dinheiro possível com a venda de drogas fornecidas por um traficante barra pesada. Vaselina, com o auxílio de Benedito, resolve roubar um carro para ajudar nos negócios; o problema é que, junto com o carro, eles acabam sequestrando uma menina que dormia no banco de trás do veículo.

“Eu e meu grande amigo dileto: José Medeiros, que nutria o sonho de dirigir um longa-metragem, me falou a respeito de dirigir um filme, então eu disse pra ele: ‘Se você vai dirigir, eu vou ser a produtora, vamos fazer um filme, com você dirigindo, nem que seja o último, o primeiro e único filme seu, Zé Medeiros’, que era considerado na época o grande fotógrafo de cinema, o mais premiado”, relata Adelia Sampaio em seu canal de YouTube. “Começamos a pensar numa história, é quando nós ganhamos uma sinopse de um historiador que

era incrível, João Felício dos Santos, que foi o historiador de Chica da Silva. Ele nos entregou uma sinopse chamada Parceiros da aventura, em que se discutia as dificuldades intrínsecas da classe baixa do Brasil.”

“Só que aí, quando a gente conseguiu pensar em viabilizar o filme, João Felício morreu, então nós fomos atrás do José Louzeiro, que era nosso amigo pessoal e o Louzeiro se propôs a desenvolver o roteiro. E eu e o Zé tínhamos uma proposta muito séria, que era fazer um filme que tivesse intrinsecamente pelo menos 70% de atores negros. Conversamos com os atores e demos entrada na Embrafilme, e a Embrafilme nos respondeu dizendo que era um absurdo querer fazer um filme com negros, até porque negro não vendia. Eu arrumei uma confusão com isso, o Zé também, acabamos indo pro jornal, demos uma nota a respeito de protesto, e eles recuaram dentro da Embrafilme, e o filme prosseguiu no projeto [de financiamento], que na época acho que anunciaram 40 ou 60 filmes que seriam agraciados.”

“Quando saiu a relação dos filmes, o menor orçamento era o nosso, e aí a gente entendeu que não ia adiantar, que aquilo era uma maneira de tirar nosso tapete, porque tinha umas coisas rebuscadas do roteiro, tinha cenas aéreas, era um filme com requintes. E com isso eu tenho sempre que saudar a minha irmã Eliana Cobbett, que era a produtora-executiva e disse: ‘Nem que eu tenha que pagar um jantar pra qualquer pessoa com helicóptero, mas nós vamos ter o helicóptero para fazer o filme’, e a gente acabou fazendo o filme.”

“O filme foi pra Gramado, ele ganhou prêmios e se pagou, porque ‘preto não vende’. Porque se vendesse…”

“Anos se passaram, um dia estou numa reunião sobre a questão da cor, aí uma jovem ligada ao cinema negro afirma, categoricamente, que não existe filmes com mais de 30% de atores negros. Eu disse pra ela: ‘Então você não conhece Parceiros da aventura’. Resultado, a gente deixou isso como registro de marca, e tem pessoas incríveis no filme; tem o Paulo Moura, que é um músico internacionalmente conhecido, fazendo um personagem como ator e como músico na vida real; tem Isabel Ribeiro, que é a branca, a gente falava que era a branca do filme, uma das atrizes mais premiadas que o cinema já teve; e o resultado do trabalho do Milton Gonçalves, que é uma coisa de doer a alma.”

“Conseguimos com isso fazer o filme, e o filme tá aí, é preciso a gente acreditar que um filme com 70% de atores negros vende. E tá provado, Parceiros da aventura tá aí.”

[Depoimento extraído de tinyurl.com/parceirosas]

AI-05: o dia que não existiu

Paulo Markun (direção-geral), Adelia Sampaio (direção artística) | Brasil | 2001, 57’, Arquivo digital (Acervo da diretora)

Documentário sobre o período da ditadura militar e os fatos que culminaram com a instituição do Ato Institucional n. 5.

Em entrevista a Vitória Felipe e Paula Azenha para a edição online do Santos Film Fest, em 2021, Adelia Sampaio conta sobre as origens do projeto: “Eu recebi um convite de Paulo Markun, que é jornalista aí de São Paulo. Ele viu esse material e disse: ‘Olha, Adelia, será que dá? Vamos fazer.’ ‘Não sei, vamos primeiro procurar pra ver se tem material.’ Aí eu conheci uma mulher mineira que foi a última taquígrafa da sessão do AI-5. Essa mulher é de Minas, se aposentou e foi embora pra Minas. E, num trânsito de rodoviária, eu descubro a conversa da mulher, inclusive o filme abre com ela contando essa história. Ela diz: ‘Eu tenho todas as cartas taquigráficas, porque, depois da sessão, eu passei um dia em Brasília e tava no lixo. Eu fiquei tão revoltada que peguei tudo e levei pra casa,

e disse só vou mostrar isso quando não tiver mais nenhum ditador no poder.’ Aí eu pedi pra ver, e eram realmente coisas incríveis. Então selecionamos os políticos de mais ênfase, e fui procurar, porque naquela época não era VT, era película 16 mm. Existia a agência nacional que fazia isso. Aí eu descubro que tudo que era da sessão do AI-5 eles tinham queimado, não tinha imagem. Então eu digo pro Paulo: ’Só tem um jeito, eu vou tentar desenvolver essa história fazendo a reconstituição da cena com atores’.”

Aí começamos a organizar e, pasmem vocês, a pessoa que viabilizou a Câmara, porque eu precisava filmar lá dentro, por incrível que pareça, foi Michel Temer. Tanto é que ele tá no filme dizendo isso. Aí a TV Cultura de SP entrou com parte, e a gente conseguiu realizar o filme em 22 dias, pegando uma reconstituição e pegando filigranas de filmes que ainda existiam, trechos pequenos.”

“Eu fiz esse filme com uma força dobrada. Porque, primeiro, em 1974, eu perdi um filho pra uma borrachada da polícia. Depois eu tive o pai dos meus filhos preso por um ano e meio até ser absolvido. E eu corri atrás esse um ano e meio com duas crianças pequenas, minha filha tinha um ano na época. Eu digo: é um dever meu fazer esse registro do AI-5 pra que as pessoas tenham conhecimento, porque esse país não tem memória nenhuma. [...] Pra que isso fique aí como legado. O filme AI-5 tem uma importância política, mas tem uma importância de eu descobrir que vivi pra mostrar.”

[Íntegra da entrevista em: tinyurl.com/aicincoas]

Carta branca a Adelia Sampaio

Convidada a apontar para três referências cinematográficas, Adelia Sampaio mira em Xica da Silva, de Cacá Diegues, o trabalho autoral de Zezé Motta e a fotografia de José Medeiros. Sobre Rio, Zona Norte, destaca a conexão entre Nelson Pereira dos Santos e Grande Otelo; para ela, o filme é “a cara do Nelson, ninguém filmou melhor que ele”. Também de Carlos Diegues, destaca Chuvas de verão, sobretudo pela representação de dois personagens idosos, cada um em sua varanda, que se apaixonam e pelos trabalhos de Miriam Pires e Jofre Soares. Adelia chegou a convidar Jofre para atuar em seu primeiro filme, Denúncia vazia, mas ele teria recusado e indicado que ela fizesse o convite a Rodolfo Arena, que foi quem efetivamente levou o papel.

Os filmes escolhidos por Adelia serão exibidos mês a mês no Cinema do IMS Poços.

Chuvas de verão

Carlos Diegues | Brasil | 1978, 93’, Arquivo digital (Luz Mágica Produções)

Ao se aposentar, Afonso decide viver com tranquilidade no subúrbio onde mora. Em sua primeira semana de ócio, em um tórrido verão, Afonso se envolve com os problemas de sua filha, de seus amigos e de sua vizinhança, aprendendo com eles a viver novamente. Até sua convivência com Isaura, vizinha de tantos anos, se modifica. Os dois iniciam uma relação de amizade, amor e respeito.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Ocupação Eduardo Coutinho

A exposição Ocupação Eduardo Coutinho, com curadoria de Carlos Alberto Mattos e da equipe Itaú Cultural, apresenta a trajetória de Eduardo Coutinho, sua obra e seu processo de criação. Um rico material audiovisual, somado a documentos, objetos e fotografias de seu acervo pessoal e de amigos e colegas de profissão, ajuda a conhecer e relembrar o cineasta. Concebida e apresentada pelo Itaú Cultural em São Paulo, a mostra esteve em cartaz no IMS Rio, e agora chega a Poços de Caldas, onde ganha uma nova expografia e uma programação de atividades paralelas.

Durante todo o período da exposição, o Cinema do IMS apresenta uma seleção de filmes do diretor, junto a textos críticos e outras atividades, em uma programação realizada em parceria com a VideoFilmes.

Dona Flor e seus dois maridos

Bruno Barreto | Brasil | 1976, 117’, DCP (Cinecolor) Roteiro de Eduardo Coutinho, Bruno Barreto e Leopoldo Serran

Durante o carnaval de 1943 na Bahia, Vadinho (José Wilker), um mulherengo e jogador inveterado, morre repentinamente. Sua mulher, Dona Flor (Sônia Braga), fica inconsolável, pois, apesar de ter vários defeitos, ele era um excelente amante. Após algum tempo, ela se casa com Teodoro Madureira (Mauro Mendonça), um farmacêutico que é exatamente o oposto do primeiro marido. Ela passa a ter uma vida estável e tranquila, mas tediosa, e, de tanto “chamar” por Vadinho, um dia ele aparece nu na sua cama. Um pai de santo se prontifica a afastar o espírito de Vadinho, mas existe um problema: no fundo, Flor quer que ele fique, pois ela tem um forte desejo que precisa ser saciado.

No livro Sete faces de Eduardo Coutinho, o crítico e pesquisador Carlos Alberto Mattos comenta: “O percurso de Coutinho é marcado ainda por várias curiosidades. Quando estudante de cinema em Paris, dirigiu uma peça de teatro

(sua única vez na direção teatral), Pluft, o fantasminha, de Maria Clara Machado. Atuou no filme Os mendigos, de Flávio Migliaccio, em 1963, quando reunia material para filmar Cabra. Seu primeiro longa-metragem foi uma comédia política, O homem que comprou o mundo (1967), em que também colaborou no argumento, fez o roteiro final e uma figuração. E foi corroteirista de vários filmes de ficção, entre eles Dona Flor e seus dois maridos (1976), antes de se embrenhar de vez no gênero em que ficou conhecido e respeitado como um dos maiores do mundo.”

Dona Flor e seus dois maridos tem o roteiro adaptado por Eduardo Coutinho, Bruno Barreto e Leopoldo Serran e é baseado no romance homônimo de Jorge Amado. Tendo levado mais de 10 milhões de espectadores aos cinemas, Dona Flor foi, por 34 anos, a maior bilheteria do cinema nacional, superado por Tropa de elite 2. Ainda hoje, o filme figura na lista das 10 maiores bilheterias brasileiras.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

O fim e o princípio

Eduardo Coutinho | Brasil | 2006, 110’, Arquivo digital (VideoFilmes)

Um filme nascido do zero. Sem pesquisa prévia, sem personagens, locações nem temas definidos. Uma equipe de cinema chega ao sertão da Paraíba em busca de pessoas que tenham histórias pra contar. No município de São João do Rio do Peixe, descobre-se Sítio Araçás, uma comunidade rural onde vivem 86 famílias, a maioria delas ligadas por laços de parentesco. Graças à mediação de uma jovem de Araçás, os moradores, na maioria idosos, contam suas vidas.

Em uma entrevista originalmente publicada no jornal O Globo, em 21 de novembro de 2005, Coutinho comenta a origem do projeto: “Em 2003, eu estava montando Peões, e o João Moreira Salles me perguntou: ‘Que filme você quer fazer agora?’. Eu pensei, em primeiro lugar, que queria fazer um filme em ambiente rural, pois todos os filmes que eu tenho feito desde Santo forte são filmes de metrópole, e eu estava de saco cheio de filmar nelas. Segundo, queria fazer um filme sem

nenhuma pesquisa prévia. E por que o sertão da Paraíba? Poderia ter feito este filme em Minas Gerais, onde esse rural rebuscado, com riqueza oral, também existe. Mas como as primeiras filmagens do Cabra foram na Paraíba, tenho simpatia por lá. E há a visão mítica de que ali foi uma terra de grandes poetas populares.”

“Em 2004, ao sair para filmar, a primeira coisa que fiz foi comprar um Guia Quatro Rodas qualquer da vida. Só que ali há poucas referências a cidades pequenas. Daí, comprei um mapa, onde tinha Cajazeiras, uma cidade de 50 mil habitantes que está a cerca de 500 km de João Pessoa. Mas, por acaso, o hotel aonde fomos não ficava em Cajazeiras, mas na região, em um local chamado São João do Rio do Peixe, a 30 km de Cajazeiras, o que significava duas horas para ir, três para voltar. Resolvemos ficar ali. Foi quando encontramos a Rosa, da Pastoral da Criança, e a encontramos como se fosse uma assistente de produção, uma guia. Tinha ilusões de que filmaria sem mediador, que chegaria numa casa e filmaria de longe, com toda uma técnica de aproximação. Mas essa ideia romântica acabou. E nos concentramos na comunidade dela. [...] Ela escreveu, em um caderno, as 86 casas do sítio, com os nomes das pessoas que moravam. Fez o roteiro do filme naquele papel. A confiança que ela inspirava fez com que as pessoas falassem.”

[Trecho extraído do volume dedicado a Eduardo Coutinho da série de livros Encontros, da editora Azougue. A organização é de Felipe Bragança.]

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Jogo de cena

Eduardo Coutinho | Brasil | 2007, 103’, Arquivo digital (VideoFilmes)

Atendendo a um anúncio de jornal, 83 mulheres contaram suas histórias de vida em um estúdio. Em junho de 2006, 23 delas foram selecionadas e filmadas no Teatro Glauce Rocha, no Rio de Janeiro. Em setembro do mesmo ano, atrizes interpretaram, a seu modo, as histórias contadas pelas personagens escolhidas.

Até Jogo de cena, o cinema de Eduardo Coutinho ia até suas personagens, nos seus apartamentos em um edifício de Copacabana, em suas casas no morro Santa Marta ou Babilônia ou no sertão paraibano. Neste filme, no entanto, as personagens são convidadas a dar seus depoimentos em um teatro. Em janeiro de 2008, em uma longa entrevista concedida ao cineasta Felipe Bragança, Coutinho comenta essa escolha:

“É o próprio lugar de tudo, não é? Porque é o lugar onde todos os lugares documentados estão, de certa forma: o teatro, a plateia. Você explicita que, na verdade, em cada filme, quando a gente fala, a fala é um lugar de encenação… Algo que eu sentia que nem todos entendiam nos meus outros filmes e eu resolvi deixar claro. Tem gente que não entende isso, especialmente fora do Brasil, como se o filme fosse só o assunto, e não a cena mesma da palavra, sabe?”

[Trecho extraído do volume dedicado a Eduardo Coutinho da série de livros Encontros, da editora Azougue. A organização é de Felipe Bragança.]

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Moscou

Eduardo Coutinho | Brasil | 2009, 78’, Arquivo digital (VideoFilmes)

Fragmentos de improvisações, oficinas e ensaios de uma peça que não teve e nem teria estreia. O documentarista Eduardo Coutinho convida a companhia teatral Grupo Galpão, de Belo Horizonte, sob direção de Enrique Diaz, a ensaiar a peça As três irmãs, de Anton Tchékhov, por um período de três semanas. Os atores só saberiam qual seria o texto no primeiro dia de filmagem: “A gente vai tentar montar fragmentos ao menos dessa peça, que é enorme, e coisas citadas que não são dessa peça”, explica Coutinho ao apresentar a proposta e o texto aos atores. “O objetivo é o seguinte: o inacabado, o fragmento – que, aliás, é Tchékhov –, é maravilhoso. A gente não quer fazer o completo.”

Sobre o aspecto fragmentário da obra de Tchékhov, Coutinho comenta em entrevista de julho de 2009 a Marília Martins para O Globo: “São peças sem trama e sem final... Foi isso que me interessou na peça. E no meu cinema também é assim: quero falar do pequeno, do anônimo, do resto, da sobra, daquilo que foi jogado fora, do lixo… O lixo me interessa muito… Meu cinema é feito de fragmentos! A verdade do cinema é a verdade da cena… Nos meus filmes é assim… Em Edifício Master, a única verdade é que um cineasta esteve por ali conversando com aqueles moradores. Todo o resto é duvidoso: será que aquelas paixões ou aquelas dores são verdadeiras? Não sei. Não me interessa. Quero que os espectadores digam: acredito nisto e não naquilo… Quando os atores falam de Moscou, eles estão falando de Minas Gerais…”

As três irmãs conta a história de Olga, Macha e Irina, que, sem perspectivas com a vida levada na província, sonham em voltar para Moscou.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Neste ano, o Dia D, que celebra o aniversário do poeta Carlos Drummond de Andrade, acontece em Poços de Caldas. A programação inclui a exibição do filme O padre e a moça, do diretor Joaquim Pedro de Andrade, inspirado em poema de Drummond, seguida de mesa de debates. Na sequência, no auditório, um recital de piano e leitura de poemas, com o músico Rafael Macedo e o poeta Eucanaã Ferraz.

Ingressos: Entrada gratuita. Distribuição de senhas 60 minutos antes da exibição. Limite de uma senha por pessoa. Sujeito à lotação da sala.

O padre e a moça

Joaquim Pedro de Andrade | Brasil | 1965, 90’, DCP (Acervo da família Andrade)

Em seu livro Versiprosa, Carlos Drummond de Andrade escreve, sob o título “Em preto e branco”: “O padre e a moça no cinema./ Emoção mais funda quem há de/ sentir ante este filme-poema?/ Salve, Joaquim Pedro de Andrade!”

Livremente inspirado no poema “O padre, a moça”, de Drummond, o primeiro longa-metragem de ficção de Joaquim Pedro de Andrade se passa em uma pequena cidade em Minas Gerais, na qual Mariana (Helena Ignez) se apaixona por um padre (Paulo José) recém-chegado em missão sacerdotal. No entanto, Honorato, homem mais rico da cidade, tenta proibir a relação e se casar com a moça.

Nas palavras do diretor, “O padre e a moça é um filme de crise. Fui ficando cada vez mais sensível, ou atraído, por uma espécie de verdade nuclear na linguagem do cinema, nos assuntos tratados. Não queria perfumaria, nem falsas verdades, nem efeitos fáceis, nem nada disso. Fui chutando isso

tudo pra corner. Então fiz O padre e a moça, um filme sobre a inibição, um filme amarrado, de negação; um filme todo criado por negação. Os planos são todos estáticos; o padre é um personagem quase mudo. O fato mesmo de eu ter escolhido um padre vem do manto de inibição que cobria aquele padre, que o impedia de transar com a vida de uma mulher mais aberta. E tudo isso integra o filme, está na base. É um filme em que não aparecem crianças, todo mundo é meio feio, muito torto. É um filme sobre o negativo.”

Em 1966, o filme recebeu os prêmios de Melhor Direção, no Festival de Teresópolis, Melhor Fotografia, no Festival de Brasília, e o Prêmio de Qualidade do Instituto Nacional do Cinema. No mesmo ano, a estreia do filme foi marcada por um extenso embate com a censura, após reação de “autoridades eclesiásticas e de membros da tradicional família mineira”, como aponta pesquisa de Leonor Souza Pinto.

[Os textos podem ser encontrados na edição em DVD do filme, lançada pela Bretz Filmes]

Cinema do IMS

Coordenador | Curador

Kleber Mendonça Filho

Supervisora de curadoria e programação

Marcia Vaz

Programador adjunto

Thiago Gallego

Assistente de programação

Lucas Gonçalves de Souza

Projeção

Fagner Andrades e Gilmar Tavares

Revista do Cinema do IMS

Produção de textos e edição

Thiago Gallego e Marcia Vaz

Diagramação

Marcela Souza e Taiane Brito

Revisão

Flávio Cintra do Amaral

A programação do mês tem apoio do Itaú Cultural, da Fundação Gordon Parks, da produtora Luz Mágica Produções, das distribuidoras Cinecolor, Embaúba Filmes, Gullane+, Imovision, Malute, Park Circus, Sony Pictures Entertainment, Universal Pictures do Brasil e VideoFilmes.

Agradecemos a Adelia Sampaio, Amaro Freitas, Ana Claudia Gonçalves

Fonseca, Camila Leal Ferreira, Claudia Ferreira, Clélia Monção, Danielle

Amorim, Edileuza Penha de Souza, Giulia Aguiar, Guilherme Terra Silva, Heitor Augusto, James Jordan, João Moreira Salles, Juliana Martins, Juliano

Gentile, Maria Carlota Fernandes Bruno, Mark Truesdale, Michal Raz-Russo, Rayane Priscilla Santos Pereira, Safia Hamid, Sandra Escribano Orpez e Teresa Souza.

Venda de ingressos

Ingressos à venda pelo site ingresso.com e na bilheteria do centro cultural, para sessões do mesmo dia. No ingresso.com, a venda é mensal, e os ingressos são liberados no primeiro dia do mês. Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala. Capacidade da sala: 85 lugares.

Meia-entrada

Ocupação Eduardo Coutinho

Curadoria da exposição: Carlos Alberto Mattos e equipe Itaú Cultural

Realização e curadoria da mostra de filmes: Cinema do IMS

Parceria:

Dia D

Concepção: Bruno Cosentino e Eucanaã Ferraz (Coordenadoria de Literatura do IMS)

Sessão Shaft por Amaro Freitas

Piano: Amaro Freitas

Programação e produção de exibição: Cinema do IMS

Curadoria musical: Juliano Gentile Engenheiro de som: Vinicius Aquino

Luz: Fagner Andrades

Produção IMS: Marcelo Leme

Parceria:

Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública e privada, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem, maiores de 60 anos e titulares do cartão Itaú (crédito ou débito).

Devolução de ingressos

Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas no site ims.com.br e no Instagram @imoreirasalles. Confira as classificações indicativas no site do IMS.

Instituto Moreira Salles
Depois da caçada, de Luca Guadagnino

Visitação: terça a sexta, das 13h às 19h. Sábados e domingos, das 9h às 19h.

Entrada gratuita.

Sessões de cinema: Quinta a domingo. Rua Teresópolis, 90 CEP 37701-058

Cristiano OsórioPoços de Caldas ims.pc@ims.com.br

ims.com.br

/institutomoreirasalles @imoreirasalles @imoreirasalles /imoreirasalles /institutomoreirasalles

Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha

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