Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Vaughn, Ellen
Elisabeth Elliot : usada por Deus : volume 2 / Ellen Vaughn ; coordenação Gisele Lemes ; tradução Vinícius Silva Pimentel. -- São José dos Campos, SP : Editora Fiel, 2024.
Título original: Being Elisabeth Elliot
ISBN 978-65-5723-384-9
1. Elliot, Elisabeth, 1926-2015 2. Missionárias - Biografia 3. Mulheres cristãs - Biografia I. Lemes, Gisele. II. Título.
24-242197 CDD-266.0092
Elaborado po Eliete Marques da Silva - CRB-8/9380
Elisabeth Elliot: Usada por Deus
Traduzido do original em inglês: Being Elisabeth Elliot
Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora Fiel da Missão Evangélica Literária
PROIBIDA A REPRODUÇÃO DESTE LIVRO POR QUAISQUER MEIOS SEM A PERMISSÃO ESCRITA DOS EDITORES, SALVO EM BREVES CITAÇÕES, COM INDICAÇÃO DA FONTE.
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Diretor Executivo: Tiago Santos
Editor-Chefe: Vinicius Musselman
Editor: Renata do Espírito Santo
Coordenação Editorial: Gisele Lemes
Tradução: Vinicius Silva Pimentel
Revisão: Renata do Espírito Santo
Diagramação: Caio Duarte
Capa: Caio Duarte
ISBN impresso: 978-65-5723-384-9
ISBN eBook: 978-65-5723-383-2
Caixa Postal, 1601
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“Se o livro que estamos lendo não nos desperta, como com um punho martelando em nossos crânios, então por que o lemos? Meu Deus, também seríamos felizes se não tivéssemos livros e, se necessário, nós mesmos poderíamos escrever livros que nos fizessem felizes. O que precisamos ter são aqueles livros que vêm sobre nós como má sorte. [...] Um livro deve ser uma picareta para quebrar o mar congelado dentro de nós.”
—Franz Kafka, citado no diário de Elisabeth Elliot, 30 de outubro de 1978
Em memória de e gratidão a Lee Vaughn
29 de março de 1958 – 20 de julho de 2022
“O SENHOR o deu e o SENHOR o tomou; bendito seja o nome do SENHOR!”
Capítulo 27. “Ah! Se ao menos...” ..............................................................................223
Capítulo 28. Faça-se a tua vontade ...........................................................................231
Capítulo 29. A estrada é sempre ladeira acima? .....................................................239
Capítulo 30. Um fio tênue ..........................................................................................247
Capítulo 31. Homens na casa ....................................................................................257
Capítulo 32. Crise de inquilinos ...............................................................................263
Capítulo 33. Passeando com MacDuff ....................................................................277
Capítulo 34. Depressão à espreita.............................................................................281
Capítulo 35. Guarda-me das lágrimas ......................................................................289
Capítulo 36. É demais .................................................................................................299
Capítulo 37. A cerca ....................................................................................................307
PARTE III - CRENDO EM DEUS
Capítulo 38. Quem era ela? ........................................................................................317
Epílogo - A verdade é amor ..............................................................................327 Com gratidão ......................................................................................................329
PREFÁCIO
Não é nenhum segredo que eu adoro Elisabeth Elliot. Depois de um pescoço quebrado quase me matar, seu estilo de vida sem rodeios e sua robusta teologia do sofrimento misericordiosamente me puxaram de volta da beira do desespero. Ela me ensinou a acordar de manhã, sentar-me na minha cadeira de rodas e encarar a vida com coragem. De certas maneiras, nossas histórias são paralelas. Minha tetraplegia me acorrentou à sombria companheira do sofrimento e, como Elisabeth, eu escrevi extensivamente sobre o assunto. Um dos meus primeiros livros incluía uma lista de trinta e cinco boas razões bíblicas pelas quais Deus permite a aflição, e como você pode se beneficiar dela — uma fé refinada, uma vida de oração mais profunda, compaixão pelos outros, para citar apenas três. Pedi a Elisabeth que oferecesse um endosso, e ela o fez. Porém, em sua resposta, ela confessou que, embora o livro fosse muito satisfatório, era um pouco técnico. E ligeiramente mecanicista.
Fiquei arrasada. Lembro-me de ter pensado: Ela tem escrito tanto sobre o sofrimento; como poderia não elogiar seus benefícios? Depois de mais uma década de paralisia, entendi o que ela queria dizer. Passei a sentir uma dor lancinante, de rasgar a mandíbula, e aquilo fez com que minha deficiência parecesse brincadeira de criança. Percebi então que havia muito mais no crescimento cristão do que ter confiança nas razões de Deus para o sofrimento. A vida era mais complexa e misteriosa do que eu pensava.
Talvez fosse isso que Elisabeth queria dizer ao me responder. Ela era a mulher mais velha transmitindo à mais nova que a vida nunca vem embrulhada em papel de presente. Que o sofrimento vai espremer você como um limão, fazendo escorrer o verdadeiro conteúdo do qual você é feita, conteúdo que às vezes surpreende e choca até você. Que a vida é um fluxo de sentimentos, fragilidades e fracassos e que somente ao confessar nosso estado quebrado é que realmente nos envolvemos com nosso Salvador sofredor. Que os santos mais fortes são fracos e necessitados.
Você descobrirá isso quando virar as páginas de Elisabeth Elliot: usada por Deus. Nossa heroína da fé não era uma estátua de bronze, imune a fissuras; nem
era um protótipo irretocável de virtude, incapaz de ser testada por aquilo que contraria e frustra a todas nós. Elisabeth assumia suas deficiências de carne e osso e se irritava sempre que as pessoas insistiam em colocá-la em um pedestal.
Sim, depois de tragédia após tragédia, ela se tornou uma heroína para todas nós. Mas, como qualquer herói que valha seu peso, ela corrigia aquelas que a idolatravam, apontando-as para o único herói que nunca nos decepcionará: Jesus Cristo. Minha querida amiga Ellen Vaughn foi encarregada da tarefa assustadora de nos mostrar esse lado de Elisabeth Elliot. É um lado dolorosamente pungente. Relacionável e acessível. Não há muitos autores habilidosos o suficiente para escrever de forma ao mesmo tempo honesta e graciosa sobre uma estadista cristã tão amada como a notável
Elisabeth Elliot. Mas Ellen leva o prêmio. Esta autora de livros que figuram na lista de mais vendidos do New York Times escreveu várias obras com Chuck Colson; com Greg Laurie, escreveu o livro Jesus Revolution (agora adaptado em filme); ela também publicou uma biografia poderosa de Mama Maggie — a Madre Teresa do Egito que cuida dos pobres nas favelas e lixões do Cairo; assim como muitos outros belíssimos livros.
Valendo-se dos diários particulares de Elisabeth e cartas nunca antes publicadas, Ellen nos leva além da vida da jovem e idealista Elisabeth e abre nossos olhos para a calorosa discípula de Jesus que foi honesta o suficiente para reconhecer o quão pouco ela compreendia.
É por isso que este livro me toca tanto. Tenho vivido mais de meio século com imenso sofrimento e com uma necessidade constante de Jesus, mas, ainda assim, não decifrei o código da vida. Estou sempre sendo testada por coisas que frustram e perseguem a todas nós. Já houve noites que passei em claro, pensando: Senhor, é assim que devo viver, isso está certo? Quanto mais velha fico, mais lido com o reino do desconhecido e, como Elisabeth, mais tenho certeza de apenas algumas coisas: a graça insondável de Deus e o surpreendente deleite de Cristo para com seu povo.
Vire a página e descubra como uma jovem profeta do sofrimento, recém-saída do campo missionário, aprendeu a arte de ser Elisabeth Elliot, esta mulher usada por Deus. Deleite-se com o “mistério impenetrável”, como ela dizia, do complexo e belo enigma que é a vontade de Deus para você e para mim. E se Deus deu a você uma mão desfavorável, jogue suas cartas com coragem. Deus lhe mostrará do que se trata a vida.
Joni Eareckson Tada
Joni and Friends International Disability Center
Março de 2023
PARTE I FUNDAMENTADA
EM DEUS
CAPÍTULO 1
CERTEZA
“O cristão percebe que sua verdadeira identidade é um mistério conhecido somente por Deus, [...] e que qualquer tentativa de definir a si mesmo, neste estágio no caminho do discipulado, está fadada a ser blasfema e a destruir aquela misteriosa obra pela qual Deus está formando Cristo nele pelo poder do Espírito Santo.”
— Elisabeth Elliot
“Sinto-me absolutamente certa de que nunca mais me casarei”, declarou Elisabeth Elliot no início de 1956.
Havia nove dias desde que seu jovem e musculoso marido e seus quatro companheiros missionários foram mortos a lanças por membros de um remoto povo tribal na selva amazônica.
“Sem dúvida, todas as recém viúvas fazem essa declaração”, continuou Elisabeth. “Mas tenho certeza em meu coração”.1
Mas “certezas perfeitas”, mesmo entre os mais disciplinados e celebrados santos de Deus, às vezes mudam diante das surpresas divinas.
Depois que Jim e seus colegas morreram, Elisabeth permaneceu no Equador por mais sete anos. De modo improvável, ela fez a trilha pelos rincões da selva,
1 Não querendo bagunçar o texto, não incluí notas de rodapé para as muitas entradas do diário de Elisabeth Elliot neste livro. Também, rotineiramente, fiz pequenos ajustes gramaticais nesses registros, como escrever por extenso algumas de suas abreviações, para tornar a experiência de leitura mais suave. Além disso, para evitar confusão, chamei minha biografada de “Elisabeth” ao longo deste volume, embora a família e amigos próximos a chamassem de “Betty”. Em público, ela preferia o mais formal “Elisabeth” e, a partir de 1969, frequentemente passou a usá-lo em particular, pois era assim que Addison Leitch se referia a ela.
com sua filha pequena e uma colega, e viveu entre o povo waorani2 que havia matado seu marido e amigos. Muitos dos waorani abraçaram um novo modo de vida. As notícias a chamavam de uma “heroína missionária”, uma viúva corajosa que levava o evangelho para aqueles que nunca o tinham ouvido.
Porém, essa viúva corajosa teve dificuldades. Muitas. Conflitos dolorosos de personalidade com sua colega missionária a obrigaram a deixar os waorani. Ela trabalhou entre o povo quíchua por um tempo, morando na casa que seu falecido marido havia construído em uma estação missionária chamada Shandia. Seus dias avançavam como uma série de fotos em uma tela.
Contudo, em meados de 1963, o cenário dessas imagens mudou. A selva verdejante do leste do Equador foi trocada pelas Montanhas Brancas de New Hampshire. A pequena Valerie Elliot já não brincava nua no rio com seus amigos waorani; agora ela usava suéteres xadrez e ia de ônibus escolar amarelo para a escola primária, todos os dias. A cabana de palha na selva e a casa de madeira mofada que Jim construíra em Shandia deram lugar à casa que Elisabeth projetou, uma estrutura retilínea com uma enorme janela panorâmica com vista para o Monte Lafayette. Os dias de traduzir o Novo Testamento para o quíchua ou de ficar deitada em uma rede de tecido com mulheres waorani — intrigando-se com seu idioma indecifrável e espantando moscas — foram substituídos por uma vida debruçada sobre uma máquina de escrever, lidando com interrupções e lutando para colocar palavras em inglês no papel para cumprir o prazo de alguma editora. A missionária que havia escrito alguns livros, agora, se propunha a ser uma escritora “séria” que antes costumava ser uma missionária. Era trabalho duro.
O ritual de beber chicha de uma cabaça comum e oca, em volta da fogueira com as pessoas da tribo, já não existia. Agora, a tribo de Elisabeth era o lacônico trabalhador da Nova Inglaterra que limpava seu campo e cavava seu poço, o vizinho vestido de lã que a ensinava a esquiar e a multidão erudita bebendo gimlets nos coquetéis de Nova York. A pequena fogueira na selva, com seu barulho de pássaros equatoriais ao fundo, foi trocada por uma chama crepitante em sua própria lareira de pedra, os hectares de floresta além de sua janela envoltos em uma mortalha silenciosa de neve. Em vez de correr pela selva à noite, a parteira leiga
2 Assim como no primeiro volume, Elisabeth Elliot: moldada por Deus, escolhi chamar a tribo de “waorani” ao longo deste livro, tanto em meus próprios escritos quanto em minhas citações das palavras de outras pessoas daquele período em que o insulto “auca” era rotineiramente — e inocentemente — usado por muitos.
chamada para atender crises de parto, agora Elisabeth voava em jatos Boeing para palestras em convenções e seminários, uma figura pública disputada.
Mais cedo ou mais tarde, a solidão de uma mulher apaixonada que sonhava na selva com seu amante perdido, Jim, foi substituída pela surpresa de um novo amor que a arrebatou. A “certeza” que ela antes tinha sobre casar de novo se derreteu. Uma mulher de meia-idade, escritora e palestrante financeiramente independente, Elisabeth Elliot agora tremia ao toque de Addison Leitch, o professor universitário, teólogo e escritor por quem ela se apaixonara perdidamente. Eles se casaram no primeiro dia de janeiro de 1969.
Mas a história, assim como a vida conjugal de Elisabeth com Jim Elliot, não terminaria com essa nota feliz.
A morte de um ente querido pode vir rápida ou lentamente. A perda repentina é devastadora, uma queda livre pelo espaço na qual a mente não consegue alcançar a realidade física da morte. Com a perda gradual, talvez a mente tenha tempo para “se acostumar” à ideia da partida do ente querido antes que ela ocorra. O problema é: nós nunca nos acostumamos ao roubo cruel da morte de quem amamos, seja um furto repentino, por assim dizer, ou um desfalque longo e lento.
Antes atordoada pela alegria de um novo amor, agora ela estava viúva novamente. Outra morte. Mas sua viuvez não a definiria, principalmente porque ela se casaria pela terceira vez em 1979. Sua vida continuou, década após década, até sua própria morte em 2015.
Seus primeiros anos, relatados em Elisabeth Elliot: moldada por Deus, traçaram a transição de uma jovem moça que lidava com “certezas” para a mulher mais velha que lidava, muitas vezes, com o reino das incertezas e do desconhecido. Agora, ser Elisabeth Elliot cada vez mais significava entender o quanto ela não entendia. Ela tinha certeza de pouquíssimas coisas — o caráter bom e santo de Deus, seu amor redentor e sua fidelidade misericordiosa. Ela buscava seu ponto de referência além de suas próprias experiências, sempre ponderando o que ela chamava de o “mistério impenetrável” da interação entre a vontade de Deus e as escolhas humanas.
Foi esse estranho mistério que moldou a próxima parte de sua surpreendente história de vida.