Entrevista | 51
Maria da Graça Borges “temos de ter muita paciência e esperança... e isto vai melhorar!” texto por
Marta Caeiro
fotos por Inês Borges
Nascida a 6 de dezembro 1925 e tendo habitado a freguesia de Pedraça, concelho de Cabeceiras de Basto, Maria da Graça Borges guarda desta aldeia uma coleção das memórias mais felizes. Recorda com alegria os Natais e Páscoas passados em família e os serões a desfolhar o milho e a tecer linho à luz de uma candeia de petróleo. É a costurar meias de lã que mais gosta de passar os seus dias, um hobbie que, não sendo negócio, “é apenas para entreter”, conforme nos conta. Otimista por natureza, aos 95 anos afirma ter realizado todos os seus sonhos e vem lembrar-nos que o essencial é mesmo “invisível aos olhos” e que, na vida, não há idade limite para sonhar.
Dignus (D): Deixou a sua aldeia de Pedraça aos 85 anos, para vir morar para o Porto. Que memórias guarda desses tempos em Pedraça? Maria da Graça Borges (MGB): Guardo boas recordações desses tempos. Recordo os Natais e Páscoas com os filhos e os netos... Era uma alegria! No domingo de Páscoa o compasso ia lá a casa e depois seguia a visita para as outras casas. Era mesmo uma alegria naquele tempo. Quando era pequena não havia luz, tínhamos que usar um candeeiro a petróleo. Não havia televisões nem rádios. E era assim que se vivia, à luz da candeia. Havia mais miséria do que agora. Nos anos da guerra houve muita fome. Eu nunca tive grandes problemas porque o meu pai esforçava-se sempre por nos arranjar pão. Se calhar não era tanto quanto queríamos, mas arranjava sempre. Lembro-me também de noites com a minha mãe em que tecíamos linho à luz da candeia. Tinha uma irmã que tinha um tear para descer o pano que estávamos a fazer. O linho é uma coisa que dá muito trabalho. E à noite fazíamos serões de tear só com a candeia de petróleo.
“E acho que havia mais alegria do que há agora. Lembro-me que nas desfolhadas do milho nós cantávamos, dançávamos, tocávamos... juntava-se muita gente, era uma alegria que agora não há.”
D: Foi lá que passou a sua infância? Começou a trabalhar ainda nova... MGB: A minha infância foi passada em Atei (Mondim de Basto). Comecei a trabalhar muito nova, ajudava os meus pais no campo. Aos 14 anos fui servir para uma casa e estive lá 3 anos, onde trabalhava
como doméstica, fazia tudo. Ao fim desses anos voltei para a casa dos meus pais. Depois, aos 18 anos, fui trabalhar para outra casa, em Mondim de Basto. Depois trabalhei numa padaria durante 2 anos e saí de lá na altura da guerra. Mais tarde fui trabalhar para outra casa, onde conheci o meu marido, aos 21 anos, e casei com ele aos 22 anos, no dia 2 de setembro de 1947. Depois tive o meu primeiro filho e não trabalhei mais, fiquei em casa. Aos 26 anos já tinha os meus 3 filhos. Nasceram todos em casa. D: Como foram vividos esses anos da guerra? MGB: Havia muita fome nesses anos, mas nunca tive grande dificuldade porque os padeiros tinham pão para nós. Foram tempos mais apertados, não havia tanta fartura como há agora, havia mais necessidades. Mas tirando isso correu sempre tudo bem. D: Sente muita diferença no modo de viver naquela aldeia em comparação com a vida que leva na cidade do Porto? MGB: Aqui no Porto é melhor, tenho mais apoio da minha filha, dos meus netos... E em termos de saúde é muito melhor aqui, temos tudo muito à mão, é uma maravilha.