Ano 5 • Número 212
Uma visão popular do Brasil e do mundo
R$ 2,00
São Paulo • De 22 a 28 de março de 2007
www.brasildefato.com.br João Zinclar
Entre os dias 12 e 16, foi montado em Brasília um acampamento contra a transposição do rio São Francisco: “foi nossa penúltima tentativa, a última será lá na própria Bacia do rio”, garante o documento final
Bancada ruralista se articula para manter fazendas improdutivas Latifundiários ameaçam boicotar o PAC caso o governo atualize índice que já está defasado há mais de 30 anos
A
bancada ruralista tem uma nova meta: impedir a correção dos índices que determinam se uma propriedade rural é ou não produtiva. Contando com 200 deputados, os ruralistas adotaram uma tática
de apresentar variados projetos de lei sobre o tema. Além disso, ameaçam boicotar o Programa de Aceleração do Crescimento se o governo atualizar o índice, o qual não é corrigido desde 1976. “Os ruralistas dizem que
a agricultura se modernizou, que agora tem tecnologia. Nós estamos com índices do tempo dos militares. Isso é vergonhoso”, protesta o deputado Adão Pretto (PT). Pág. 3
EDITORIAL
Fisiologismo ministerial Imigrantes são vitais para a economia européia Fórum sobre imigração realizado em Lisboa, Portugal, apontou que o fluxo de trabalhadores de países da periferia é fundamental para compensar o enve-
lhecimento da população européia. Mesmo assim, ainda é forte na região o debate sobre leis mais restritas para os imigrantes. Pág. 7
Donos de escolas Projeto de Hélio armam ofensiva Costa favorece contra alunos setor estatal Alunos que atrasarem o pagamento das mensalidades correm o risco de perder suas vagas na universidade. Na Câmara dos Deputados, tramita projeto de lei que prevê a expulsão dos estudantes após atraso de 60 dias no pagamento. De acordo com pesquisas, a inadimplência cresceu 15%, em 2005, ano em que a taxa de evasão no ensino superior foi de 22%. Pág. 4
Após impor o padrão japonês de TV Digital aos brasileiros, o ministro das comunicações, Hélio Costa, tem um novo objetivo para sua gestão na pasta: criar a Rede Nacional de Televisão Pública. Apesar do nome, na verdade, o projeto privilegia o sistema estatal, afirma o professor Laurindo Leal Filho, da USP, em entrevista ao Brasil de Fato. Pág. 5
Guerra é negação da vida, afirma Casaldáliga Pág. 6
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U
ma linha marcante na reforma ministerial realizada até o momento pelo presidente Lula foi a de atender aos interesses do PMDB, ampliando sua participação no governo. A negociação desta maior participação peemedebista no governo, feita por Lula com o deputado Michel Temer (SP), parlamentar que teve influente participação no governo de Fernando Henrique Cardoso, não se pautou por critérios programáticos, mas fundamentalmente por uma visão fisiológica, no sentido de se construir base parlamentar para aprovação de projetos do interesse do governo. Deixou-se de lado nesta reforma ministerial, até o momento, os grandes temas nacionais como balizadores centrais dos critérios para definir as pessoas a serem indicadas ou convidadas. Por exemplo: um dos temas nacionais de grande impacto, a criação de 10 milhões de empregos – uma promessa da campanha eleitoral de 2002 –, foi posto de lado. A nomeação do deputado federal baiano Geddel de Lima para o Ministério da Integração Nacional, que tem a incumbência de realizar as obras para a transposição das águas do Rio São Francisco, faz temer pela comunidade que vive do rio, pela biodiversidade e pelo futu-
ro desse manancial da natureza. O novo ministro tem uma larga história de pragmatismo político e de enriquecimento vertiginosamente rápido, e toda a sua disputa com a oligarquia carlista na Bahia não se inscreve num embate por questões éticas, mas por uma briga pelo comando dos podres poderes. O novo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, assume de modo rigorosamente convencional, sem que a grande tragédia da saúde do povo brasileiro tenha sido o motivo para uma mudança ministerial, a partir da qual o governo enfrentasse esse desafio, com uma verdadeira revolução nas políticas públicas de saúde, com decisão para nacionalizar a indústria farmacêutica, hoje um setor controlado completamente pelos laboratórios transnacionais. Vale registrar, como tema de preocupação, declarações emitidas pelo deputado peemedebista Eliseu Padilha, ex-ministro de FHC, de que pretende nomear a direção da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), órgão detentor de polpuda verba orçamentária, com grande capacidade de interferência nas eleições municipais de 2008. Também chama a atenção a forma como a ex-prefeita Marta Suplicy foi indicada para uma variedade de ministérios até aceitar, finalmente, o do Turis-
mo. Ou seja, pouco valeu critério técnico ou mesmo a vocação política para assumir uma outra pasta, o fator discutido foi apenas o de dar visibilidade para o PT ter um candidato para as eleições seguintes. Com os condicionantes já lançados pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que reservou recursos para a transposição do Rio São Francisco, para a construção civil, para a implantação da TV digital, sem que coerentemente tivessem sido definidas políticas para uma reforma agrária, uma reforma urbana, ou mesmo a valorização da tecnologia nacional de TV digital já praticamente pronta, esta reforma ministerial muito provavelmente não representará nada mais do que uma maior pressão de interesses fisiológicos de caciques do PMDB. Cabe aos movimentos populares e sociais, aos sindicatos que ainda não se prostraram diante desse pragmatismo insensível aos clamores do povo, relançar constantemente a defesa de um projeto popular para o desenvolvimento do país, fechando a hemorragia de riquezas minerais e financeira que continuam sendo subtraídas, em tenebrosas transações, enquanto a dança das posições políticas revela, irresponsavelmente, total desprezo pela tragédia social da nossa gente.