BDF_205

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Ano 5 • Número 205

Uma visão popular do Brasil e do mundo

Sem mudar a economia, PAC não funciona

www.brasildefato.com.br

DizzyMay01

São Paulo • De 1º a 7 de fevereiro de 2007

R$ 2,00

Programa de Aceleração do Crescimento esbarra nos limites da macroeconomia; juros da dívida consomem o dobro da previsão de investimentos

O

presidente Lula realizou um grande ato político para lançar o que pode ser o diferencial de seu segundo mandato: o investimento público como indutor de desenvolvimento. Essa é a principal novidade do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado em 22 de janeiro. Os novos investimentos ainda são bastante tímidos, cerca de R$ 14,1 bilhões ao ano. Porém, economistas do campo da esquerda receberam

com otimismo a iniciativa. Esperam que inicie uma ruptura com o modelo neoliberal, marcado pela retirada do Estado da economia e pela queda do crescimento e dos índices sociais. Isso dependerá de mudanças nos rumos da macroeconomia, como a queda da taxa de juros e do superavit primário. Mas, em 2006, o serviço da dívida pública consumiu R$ 275 bilhões – mais da metade do que o PAC deverá investir em quatro anos. Pág. 3

Trabalhadores alagoanos em greve por reajuste Há mais de quinze dias em greve, servidores da saúde, educação e segurança de Alagoas reivindicam a revogação do decreto do governador Teotonio Vilela Filho (PSDB) que suspende reajustes salariais, conce-

didos pela gestão anterior. Para os grevistas, o chamado “choque de gestão”, implementado pelo atual governo, penaliza os trabalhadores e reduz os investimentos nas áreas públicas. Pág. 5

Em frente ao Capitólio, sede do Congresso dos Estados Unidos, em Washington, manifestantes pedem o impeachment de seu presidente com uma rima que em português significa: “Bush mentiu, milhares morreram”

EDITORIAL

Retomar a luta contra a guerra

E

Dolarização leva a perda da soberania

Mais violência e impunidade no campo

A dolarização da economia adotada em 2000 pelo Equador ou o regime similar estabelecido na Argentina em 1991 podem até acabar com a hiperinflação e garantir credibilidade. Mas os custos são muito altos. Além do desequilíbrio das contas externas devido à sobrevalorização da moeda local, os países perdem a soberania em dois importantes instrumentos da política econômica: as políticas monetárias e as cambiais. “A experiência internacional mostra que muitos países em desenvolvimento conseguem ter inflações baixas com moeda própria”, explica o economista Paulo Nogueira Batista Jr.. Pág. 6

A lentidão da reforma agrária e a impunidade são as principais causas da violência no campo, apontam especialistas. Somente no primeiro mês do ano, trabalhadores rurais e defensores da luta pela terra foram vítimas de agressões no Acre, Ceará, Goiás, Paraná e São Paulo. Também em janeiro, completam-se três anos da chacina dos auditores fiscais em Unaí (MG). Ninguém foi preso pelo crime. Pág. 4

m 19 de março, a invasão do Iraque, orquestrada principalmente pelos governos estadunidense e inglês, completa quatro anos. O saldo: mais de 60 mil civis mortos – 34,4 mil só em 2006 – e uma situação de terror e medo generalizado para a população, de acordo com a Anistia Internacional. O desespero das famílias iraquianas já seria motivo suficiente para mobilizações globais contra a guerra, nessa data. Mas não é o único: Bush está politicamente enfraquecido e abre-se assim uma oportunidade para os movimentos pacifistas mudarem os rumos da invasão do Iraque. Em 15 de fevereiro de 2003, antes mesmo de o presidente dos EUA, George W. Bush, anunciar o envio de tropas ao Iraque, organizações sociais de todo o mundo promoveram protestos contra a guerra, reunindo 12 milhões de pessoas, em 850 mobilizações em 63 países. As mobilizações, as maiores de toda a história, e a oposição veemente de vários governos e da ONU à guerra justificavam dizer que Bush não só atacava o povo iraquiano, mas pessoas e entidades de todo o mundo. Apesar dos protestos, o governo estadunidense manteve a política de guerra – contando com o apoio de muitas forças políticas internas e até de significativa parcela da opinião pública. A decisão foi um primeiro baque para os pacifistas. No entanto, esses conseguiram organizar novas mobilizações. Mas seguiram-se duas novas derrotas políticas dos opositores da guerra: a reeleição de Bush (2004) e a nomeação do ideólogo da intervenção, Paul

Wolfowitz, para presidir o Banco Mundial (2005). Diante desse cenário, as mobilizações em solidariedade ao povo iraquiano, sobretudo na Europa Ocidental e Américas, tiveram cada vez menos participação. Em São Paulo (SP), por exemplo, 40 mil pessoas marcharam contra a guerra em fevereiro de 2003; três anos depois, apenas 2 mil foram às ruas. O cenário de progressiva desmobilização pode estar chegando a seu fim. As manifestações contra a invasão do Iraque em 2007, marcadas para 19 de março, de acordo com calendário tirado no último Fórum Social Mundial, vão se dar em um novo contexto. A resistência iraquiana, inicialmente menosprezada por Bush, desestabilizou as forças estadunidenses – foram 3.081 soldados mortos, desde o início da invasão – e abalou a legitimidade do governo dos EUA. A economista mexicana Ana Esther Ceceña, no artigo “O modo americano de pensar”, veiculado em 29 de janeiro, resume a situação no Iraque: é uma guerra que Bush não perdeu, mas não tem como ganhar. Esse “não ganhar” – resultado dos incessantes ataques às tropas pela resistência dos iraquianos – desgastam o governo estadunidense, obrigando Washington a investir mais recursos e a enviar mais soldados para o país invadido. Bush anunciou um novo plano para o Iraque, afirmando que pretende enviar outros 20 mil militares ao país. A medida, que outrora o presidente estadunidense faria passar sem grandes dificuldades, pode vir a ser barrada pelo Legislativo. Nas últimas eleições para o Congresso, em novembro

de 2006, a maioria das cadeiras foi conquistada pela oposição a Bush, o Partido Democrata, cuja principal bandeira era a oposição à permanência das tropas dos EUA no Iraque. Vários deputados e senadores defendem que a proposta do Executivo deve ser discutida e votada no Legislativo. Bush concentra superpoderes, desde os atentados de 11 de setembro de 2001 contra as Torres Gêmeas em Nova York, e seu novo plano para o Iraque não precisa necessariamente passar por votação parlamentar, onde possivelmente seria derrubado. O presidente dos EUA, entretanto, não pode facilmente descartar a participação do Legislativo, pois seria uma decisão impopular aos olhos da opinião pública, e desgastaria ainda mais seu já enfraquecido governo. Bush está em uma sinuca de bico. Além disso, os Estados Unidos também enfrentam uma situação política internacional bem diferente de 2003: vários aliados na invasão do Iraque retiraram suas tropas e, progressivamente, governantes começam a desafiar sua política intervencionista. E essa é uma oportunidade para reforçar os movimentos que lutam pelo fim da invasão do Iraque. Em 27 de janeiro, pelo menos 100 mil pessoas marcharam em Washington, para pressionar os democratas a exigir a votação do novo plano do governo. A mobilização deu novo ânimo aos pacifistas, que aproveitaram o espaço na mídia para discutir os projetos dos parlamentares democratas Dennis Kucinich e Lynn Woolsey para a retirada das tropas e o fim da invasão. Enfim, a paz toma novo fôlego.


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