Uma visão popular do Brasil e do mundo
Ano 4 • Número 200
São Paulo • De 28 de dezembro de 2006 a 3 de janeiro de 2007
R$ 2,00 www.brasildefato.com.br
Bolsa Família é solução para pobres? T
erminado seu primeiro governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixa como principal realização o programa Bolsa Família. É pouco para aqueles que dedicaram 20 anos de militância para eleger um governo transformador. Por outro lado, é muito para as 11,1 milhões de famílias que, pela primeira vez na história do Brasil, passaram a ser assistidas pelo Poder Público. Analisar o Bolsa Família é uma questão de perspectiva. Sendo assim, alguns setores da esquerda preferem exaltar seu papel na redução da pobreza e da desigualdade, enquanto outros alertam para os efeitos colaterais, como o aumento da dependência em relação ao Estado e o amortecimento dos conflitos sociais. VENEZUELA – Em seu novo mandato, as tarefas de Hugo Chávez não serão fáceis. Para seguir “rumo ao socialismo”, o presidente já anunciou algumas mudanças, como as reformas constitucional e ministerial, além da criação de um partido socialista único. Sobre essa nova fase, o Brasil de Fato buscou a avaliação de representantes de dois grupos fundamentais para a sustentação de seu governo: organizações sociais e Força Armada. Págs. 3 e 5
Enquanto Lula aposta no aperfeiçoamento de seu Bolsa Família...
... seu colega Chávez, na Venezuela, aprofunda a reforma agrária
A urgência de formar novas vanguardas
EDITORIAL
Segue a luta de classes Encerra-se 2006. É de praxe nesse período fazermos os balanços das atividades do ano. Todos os movimentos sociais, forças políticas, correntes e partidos políticos devem estar fazendo suas análises e balanços políticos. Assim, modestamente, o Brasil de Fato, que pretende estar cada vez mais colado aos movimentos sociais, quer também dar sua opinião. O ano de 2006 se inseriu em um contexto histórico mais prolongado, em que a sociedade brasileira continua dominada pela hegemonia do capital financeiro e internacional, popularizado pela expressão de modelo neoliberal. Nele, as 200 maiores corporações financeiras, brasileiras e transnacionais, associadas entre si, estão ganhando muito dinheiro. Acumulando muita riqueza e crescendo a 7,2% ao ano (nos últimos quinze anos). Recebem do Estado brasileiro as mais altas taxas de juros do mundo, e obtêm taxas de lucro impressionantes. Do outro lado, uma imensa multidão de 82 milhões de brasileiros adultos que vivem do trabalho, cada vez mais mal pago, mais escasso e que exige mais sacrifício das famílias para sobreviver. Entre eles há ainda 18 milhões de desempregados, a maioria jovens. Somase a isso, resultado também dessa hegemonia, a continuidade do refluxo do movimento de massas e de uma crise po-
lítico-ideológica profunda das esquerdas brasileiras. No meio disso, tivemos uma eleição presidencial. Um primeiro turno chocho. Parte da classe dominante apoiou Lula. E a parte mais reacionária e mais comprometida com o imperialismo resolveu derrubá-lo. Conseguiu assustar no primeiro turno. Porém, no segundo turno, todas as forças sociais progressistas e o povão em geral manteve apoio a Lula, e o obrigou a adotar um discurso mais contudente. Mas as circunstâncias da luta de classes, ainda adversas para a classe trabalhadora, não possibilitaram que tivéssemos nas eleições um debate de projetos para o país. Assim, resultou da eleição a derrota da fração mais reacionária da classe dominante brasileira e seus meios de comunicação (Globo, Veja, Folha e Estadão etc.), mas ao mesmo tempo, a vitória eleitoral não alterou os rumos do governo. Seguiremos tendo um governo de composição de classe e de posições políticas formadas pela direita, centro e esquerda. De tudo isso, resultam muitas lições para a classe trabalhadora e todas suas formas de organização. Estamos ainda em tempo de plantar. Precisamos colocar nossas energias para retomar o trabalho de base, que eleve o nível de consciência das massas. Formar mais e melhores militantes.
Marcelo Garcia
Ricardo Stuckert/PR
Principal programa social do governo beneficia milhões, mas não atinge estrutura que gera a desigualdade
Estimular todo tipo de luta social, como única forma capaz de obter conquistas de melhoria de vida, e fazer disputa na sociedade. Seguir construindo nossos meios de comunicação, em todos os níveis. Rádios comunitárias, TVs comunitárias, jornais e revistas de todo tipo. Promover, cada vez mais, debates em torno da necessidade de um novo projeto de desenvolvimento para o país, que priorize a solução dos problemas do povo. Tudo isso deve culminar com um novo processo de reascenso do movimentos de massas no Brasil, única força capaz de alterar a atual situação hegemonizada pelo neoliberalismo. Mas há sinais positivos no final do túnel. Há em curso vários processos unitários dos movimentos sociais, das pastorais, em torno da Coordenação de Movimentos Sociais, da construção da Assembléia Popular, e a consolidação de um calendário de lutas comum entre todas as forças, que pode iniciar um novo tempo, neste 2007. Oxalá, possamos avançar com muitas lutas unitárias e conquistas neste ano que começa.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o filósofo italiano Domenico Losurdo aponta para a necessidade de se formar vanguardas revolucionárias, um dos elementos para impedir o avanço
do imperialismo estadunidense. No entanto, segundo ele, tal vanguarda não seria uma elite, e sim um grupo sem hierarquia, para pontencializar a democracia. Pág. 6
Oaxaca: diversidade e unidade
Arquibancadas gritam por justiça social
A Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca, do México, composta inicialmente por professores, abrange organizações sociais das mais diferentes orientações. Nela, indígenas e marxistas tomam decisões coletivas para resistir e derrotar a estrutura coronelista do governo. Pág. 7
Torcidas organizadas brasileiras realizam diversas ações sociais nas periferias, atuando nas comunidades, além de apoiar a luta dos movimentos populares. Torcedores mostram como a arquibancada pode se transformar em espaço de formação política e de luta por justiça social. Pág. 4