Ano 4 • Número 168
R$ 2,00 São Paulo • De 18 a 24 de maio de 2006
Os arquitetos do caos em São Paulo Fotos: Divulgação
Violência do PCC é resultado do descaso dos governos com políticas sociais e com investimentos em segurança
A
s 115 mortes nos 251 ataques à polícia, atribuídos ao Primeiro Comando da Capital (PCC), entre os dias 12 e 16, podem ser debitadas em grande parte na conta dos 12 anos de administração tucana no Estado de São Paulo. Durante esse período, os governos do PSDB em princípio negaram a existência do grupo criminoso e depois foram coniventes com ações da facção. Além disso, segundo o advogado Ariel Alves, integrante do Movimento Nacional de Direitos Humanos, a partir de 2000 o governo passou a negociar diretamente como os presos, contribuindo para o surgimento e para o fortalecimento de lideranças. A falta de políticas públicas voltadas para a área social, a inexistência de uma política nacional de segurança, a manutenção de um sistema penitenciário deficiente, as más condições de trabalho da polícia e a conseqüente corrupção policial também são citados por especialistas como causas da violência. Pág. 3
O ex-governador tucano, Geraldo Alckmin, protegido pela mídia...
EDITORIAL
A gritaria das elites
N
inguém pode deixar de se revoltar contra a violência dos bandidos que assassinaram policiais e civis, incendiaram ônibus e metralharam prédios públicos e residências, em dezenas de cidades do Estado de São Paulo. Mas não se pode tirar proveito do sentimento de horror da população para cultivar o sensacionalismo e a propaganda da truculência do Estado contra os bandidos, como estão fazendo alguns radialistas, comentaristas de televisão, deputados e senadores. Na verdade, o que essas pessoas querem não é acabar com a violência criminal, mas criar um clima para justificar a repressão, principalmente contra os movimentos sociais. O senador Romeu Tuma já procurou associar o levante dos presos ao terrorismo, numa evidente intenção de dar conotações políticas ao episódio. O senador Antônio Carlos Magalhães cometeu a irresponsabilidade de dizer que, em 15 dias, o Parlamento votará leis penais mais rigorosas! Políticos da direita e profissionais da mídia capitalista, que vivem da miséria humana, atacaram as Pastorais de Direitos Humanos e as Pastorais Carcerárias, insinuando que essas entidades fomentam a violência dos presos. Essa mesma elite reacionária e leviana chegou ao cúmulo de tentar associar a luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que organiza os pobres do campo por reforma agrária, à violência e ao crime organizado. Esse comportamento das elites não é novidade. Os poderosos não perdem a oportunidade de criminalizar e desqualificar as organizações de luta do povo. Mas toda essa gritaria tem um objetivo claro. Tenta evitar o debate das verdadeiras causas da violência que impera em nossas cidades e em nosso campo: a extrema desigualdade social do país; o abandono das populações condenadas a viver em favelas e nas periferias desoladas das grandes cidades; o descaso pela educação e pelo lazer da juventude. Os privilegiados consideram que mexer nesses assuntos é
muito perigoso, pois exige o corte de alguns de seus privilégios. Quem estiver, de fato, interessado em reduzir a violência, não tem que falar em mais armas para a polícia, penas mais duras para os criminosos, cadeias mais rigorosas para os presos; e sim em reforma agrária, reforma urbana, habitação popular, educação, lazer sadio para os jovens. Contudo, diante de um surto de violência, é preciso tomar providências imediatas. A primeira delas é trazer às claras questões como: de que forma os celulares e as armas de fogo entram nas cadeias? Se esses que falam tanto em rigor quiserem responder a essa pergunta, a primeira providência é instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o aparelho repressivo do Estado. Isso, sim, é necessário, para verificar até onde vai a corrupção. É preciso também substituir as penas de prisão por penas alternativas para crimes menos graves, separar presos de maior periculosidade dos demais, respeitar limites de lotação das cadeias, oferecer oportunidades de trabalho ao preso, promover a reabilitação dos criminosos com apoio de profissionais especializados - todas medidas humanas e eficazes no trato com pessoas que se desviaram das condutas socialmente aceitáveis. Uma política de segurança pública civilizada pode reduzir sensivelmente os índices de violência - embora não seja possível eliminá-la enquanto permanecer a injustiça social. Uma política de maior truculência do Estado não terá outro efeito que o aumento da truculência dos bandidos. Quando se trata o ser humano como bicho, ele reage como tal. Não podemos nos atemorizar com a gritaria dos porta-vozes das classes dominantes e abrir mão das normas civilizadas no combate ao crime.
Violações são rotina na capital paulista Um relatório sobre as violações de direitos humanos no centro da cidade de São Paulo denuncia a negligência do poder público em relação às populações de baixa renda. Elaborado pelo Fórum Centro Vivo, e obtido com exclusividade pelo Brasil de Fato, o documento relata o descumprimento das leis vigentes. Além de apontar a criminalização da pobreza, dos movimentos sociais e dos defensores de direitos humanos que defendem uma política urbana. Pág. 4
...o atual governador pefelista, Cláudio Lembo, ...
Resistência indígena ao neoliberalismo
... e o ex-prefeito de São Paulo, José Serra: juntos no desmonte do Estado
Os caminhos de ferro da privatização Pág. 4 Já está no ar o novo formato da Agência Brasil de Fato na internet. No endereço ( w w w. b ra s i l d e fa t o. c o m . b r ) , você poderá encontrar nossa produção diária de conteúdo exclusivo, entre reportagens, entrevistas e análises, além das edições anteriores do jornal impresso. Em breve, os assinantes terão uma seção específica para acessar a edição da semana. Vamos colocar no ar também um link para rádios comunitárias de todo o país baixarem documentos em áudio e poderem retransmitir para seus públicos locais.
Alvo de perseguição política por parte do Vaticano, o teólogo indígena mexicano Eleazar López Hernández defende o diálogo com os movimentos sociais das Américas como forma de fortalecer o processo de autonomia religiosa indígena. Em entrevista ao Brasil de Fato, ele fala da importância do movimento zapatista na construção de novos caminhos para a participação política dos povos indígenas e de alternativa ao projeto neoliberal no México. Pág. 5
Corporações européias no banco dos réus As transnacionais européias divulgam imagens de justiça e apoio ao desenvolvimento de comunidades pobres. No entanto, são suspeitas dos piores crimes na América Latina, especialmente no Brasil. Formam quadrilhas paramilitares. Devastam regiões inteiras. Des-
respeitam direitos trabalhistas. Contaminam fontes de água. Na Áustria, entre os dias 10 e 13, essas empresas foram julgadas por um tribunal popular, que pretende investigar as denúncias. O veredicto, ao que tudo indica: culpadas. Pág. 7