E N T R E V I S TA
DO LADO DO PODER
A jornalista Vera Rosa que completa 40 anos de carreira, 30 deles só no Estadão, conta à revista CÁSPER sobre os bastidores da cobertura política
POR GABA SERPA DAS JORNADAS DE JUNHO de 2013 à vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas últimas eleições, o Brasil passou por inúmeras convulsões. A esquerda foi da Presidência da República ao impeachment de Dilma Rousseff (PT), seguido da prisão de Lula. Já a direita foi da apatia do sofá às ruas e às redes sociais. O ex-deputado Jair Bolsonaro se tornou presidente em um País que rachou entre a operação Lava e Vaza Jato. Parece muito? Pois esse período é apenas um terço de tudo o que Vera Rosa já viveu cobrindo política. Da cobertura de movimentos sindicais no hoje extinto Diário Popular, a jornalista segue a trajetória de Lula desde os anos 1990 e cobriu todas as eleições de 1989 até 2022. Há 30 anos, trabalha no Estadão, onde hoje é coordenadora e assina uma coluna política. Nesta entrevista, realizada no fim de novembro, ela deu dicas de como ser um bom jornalista político. Como chegou à cobertura política? Comecei num jornal que não existe mais: o Diário Popular, em 1983. Fazia cobertura geral. Passei a cobrir sindicalismo em 1986. Ia muito a São Bernardo do Campo (SP) e me aproximei da cobertura do Partido dos Trabalhadores (PT). Fui para a Gazeta Mercantil, em 1990. Passei pelo Jornal do Brasil, numa newsletter
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chamada Informe Sindical, até que cheguei ao Jornal da Tarde (JT) para cobrir política, em 1991. Era um jornal prestigiado em São Paulo. Pertencia ao Grupo Estado. Do JT, fui para o Estadão, em 1993, e segui na política. A passagem da editoria sindical para a de política foi natural, até porque os líderes sindicais se tornaram políticos. Tinha o Lula, óbvio. Mas tinha o Luiz Antônio de Medeiros, o Joaquinzão [Joaquim dos Santos Andrade].
nhã até de noite. Ficar grudado mesmo. Os outros ficam soltos para cobrir bastidores e fazer coisas diferentes. A atividade do “carrapato” é mais intensa, mais hard news. É fundamental passar por essa etapa, porque você conhece não só um candidato, mas o entorno dele. Mas a época em que fiz não tinha cobertura online. Tinha mais tempo para escrever. Não era como hoje que o repórter passa a matéria enquanto a fonte fala. Não é fácil.
Como foi sua ida a Brasília? Fui “carrapato” do Lula nas campanhas presidenciais de 1994, 1998 e 2002. Cobria o PT havia anos. Quando Lula ganhou, o jornal me fez proposta e fui transferida da sede do Estadão para Brasília, em março de 2003. Lá, fazia o dia a dia do Planalto, mas também tentava fazer bastidores do Congresso. Depois de um tempo, você passa a conhecer os mecanismos e dá para fazer ambos. As coisas aqui são muito perto, é só atravessar a rua. Achei que ficaria em Brasília não mais que quatro anos. Mas a cidade vai te cativando. Para quem cobre política é muito interessante.
Como se constrói a relação com políticos, assessores e ministros? Muita gente quer plantar notícias sob o anonimato. Quem fala nem sempre quer se expor. A gente se apresenta, tenta marcar um café, vai aos gabinetes. É importante, mas é preciso ter cuidado. Não dá para acreditar na primeira pessoa com quem falamos. Tem que cruzar informações, mesmo aquelas em off. Se tiver que publicar em off, precisa trazer vários detalhes. Tudo que puder enriquecer a descrição é aconselhável, para não parecer invenção. O contato com as fontes é construído com o tempo. Pode não render matéria, mas conversar te direciona na apuração.
Qual a diferença entre “carrapato” e outros repórteres? O “carrapato” cobre o dia a dia de um candidato. Tem que cobrir desde de ma-
Quem ajuda mais o jornalista numa apuração: assessores, advogados, aliados ou opositores?