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mulheres atrás das câmeras

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Mulheres atrás das câmeras: Como a igualdade de gênero ainda está longe de chegar

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SEJA NA FRENTE OU ATRÁS DAS CÂMERAS, é fato que a mulher é minoria em ambos, seja na representação, seja na direção, as mulheres estão em fase de retomada de seus postos de destaque no cinema. Essa desigualdade é vista principalmente em grandes premiações, onde vemos que em 91 edições, apenas 5 mulheres foram indicadas a um dos maiores prêmios da noite, o de melhor direção. E dessas 5 apenas 1 mulher ganhou a estatueta da academia, Kathryn Bigelow com o filme “Guerra ao Terror”. Esse número é preocupante, e mais ainda quando vamos em qualquer cinema e prestamos atenção nos filmes em cartaz, quase não tem (ou não tem mesmo) filmes feitos por diretoras mulheres, a maioria tem como diretor homens. Não existe um único fator que seja o motivo das mulheres terem menos projetos de direção do que os homens, mas o machismo que existe na sociedade e os orçamentos que são disponibilizados pelas indústrias são os principais. Podemos dizer que a chave para a mudança está no público, seja prestando atenção e pedindo por mais mulheres na direção de grandes filmes, ou seja apoiando o trabalho de diretoras consumindo o seu trabalho e divulgando. O estudo Gender Bias Without Borders, realizado pelo Instituto da atriz Geena Davis aponta que há mais chances de uma mulher ser protagonista de um filme se a pessoa por trás das câmeras for uma mulher, isso quer dizer que na maioria das vezes os filmes que têm mulheres em destaque tem uma diretora por trás, não é uma regra, mais é uma afirmação. Esse cenário ganhou mais forma e discussão nos últimos anos com o surgimento de movimentos como o #metoo e o Time’s Up que mostraram como a igualdade entre homens e mulheres no cinema é gigante.

Porque elas não ganham destaque?

É importante salientar que as mulheres sempre estiveram atrás das câmeras, segundo o documentário “Mulheres em Hollywood — é hora da mudança” elas eram maioria enquanto o cinema era mudo, e esse cenário mudou após o descobrimento do som e imagens em conjunto onde os maiores orçamentos eram entregues para os homens, pois eram de maior “confiança”, cenário esse que se estende até os dias atuais, onde mulheres cineastas recebem orçamentos menores e produções menores e os diretores

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esbanjam com filmes de produção milionárias, como sinaliza Luísa Pécora do site Mulher no Ci-nema: “Quanto mais dinheiro entra, mais as mulheres saem, então você tem essa questão de “ah não da pra dar esse orçamento tão grande, é muito arriscado” Essa ideia de risco que Hollywood vê em colocar um filme na mão de uma mulher” Atualmente vemos mulheres ganhando destaque na direção de peças como documentários e romances, pois o primeiro gênero é mais barato de se fazer e o segundo a indústria hollywoodiana acredita que seja mais o perfil das cineastas, sobre isso Luisa complementa “Esse tipo de ideia ainda é muito resistente e acaba atrapalhando muito por exemplo no caso desses filmes que estão na lista de ‘100 filmes de maior bilheteria’, o que mais tem? Os filmes de maior bilheteria são todos esses de ação , de quadrinhos, de ficção científica que são justamente o que eles — indústria cinematográfica — afirmam que as mulheres não sabem fazer”. “Você faz jornalismo, e você sabe que é um meio que tem bastante mulher, mais quem manda ainda são os homens, porém quantidade não é qualidade. A gente vê sim que tem muita mulher trabalhando com o cinema, se você levantar o relatório da ANCINE cerca de 17% dos filmes são dirigidos por mulheres” diz Flávia Guerra, jornalista, documentarista e roteirista sobre a realidade do audiovisual brasileiro, ela ainda complementa mostrando algumas das funções que as mulheres ficam atrás das câmeras: “A grande maioria das mulheres tem funções como direção de arte, tem maioria mulher na produção que organiza a casa e são importantíssimas essas posições, mas as decisões criativas ainda são tomadas por homens, quero dizer, a maioria é homem, ainda que tenha bastante mulher roteirista e dirigindo documentários de não ficção”. Para Sheila Souza, diretora iniciante de cinema, esse assunto de mulheres diretora é uma “novidade”, pois ela está despertando para esse pensamento, se sentindo até mesmo um pouco culpada pois dentro do seu top 5 diretores favoritos, só tem homens: “Faz um ano que eu também estou pesquisando sobre

“Hollywood tem muito preconceito com mulheres, principalmente para atrizes que vão pra essa camada de direção.”

as mulheres e tentando ver mais trabalhos, mas assim eu sempre fui fã de certos diretores e eu percebi que meu top não tem uma mulher, porque eu tive menos chances de assistir elas, então agora eu também to indo nessa vibe de tentar procurar uma coisa mais feminina ou olhar mais feminino sobre os filmes.” A fala de Sheila mostra como é importante que esse tipo de assunto é necessário estar nos debates e não cair no esquecimento. Como diretora iniciante, Sheila concorreu ao 6º Festival Curta de Campos do Jordão na categoria Curta experimental chamado “Através dos meus olhos” que através do voto popular ficou em terceiro lugar na premiação, segundo ela Hollywood ainda tem muito preconceito com atrizes que se aventuram nessa atmosfera de direção “Hollywood tem muito preconceito com mulheres, principalmente para atrizes que vão pra essa camada de direção, Angelina Jolie sofreu com isso, a Olivia Wilde ta sofrendo com isso agora e são mulheres que tem um olhar diferente [...] Quando as pessoas olham para ela — Angelina Jolie — você vê uma mulher sexualizada a mulher dos sonhos e ela vai e faz um filme sobre guerra e você se questiona, se elas que são do meio tem dificuldade porque eu não vou passar?!” Segundo Luísa, essa discussão de igualdade de gênero está sendo uma conversa maior pois tem muita gente interessada: “Acho que essa questão da conversa sobre o assunto, disso ter se tornado um assunto que como eu disse, acompanha todos os festivais, acompanha todas as indicações, isso virou uma preocupação maior, tanto na imprensa, quanto nas redes sociais, quanto no público, quanto nos produtores de conteúdos e tal [...] Acho que essa questão da conversa sobre o assunto melhorou, agora se melhorou a presença da mulher isso já é uma questão mais difícil da gente analisar.” Luísa continua falando que o existe um movimento promissor mas que depende muito do público para manter o assunto vivo e cobrar mais mulheres em destaque atrás e na frente das câmeras!”.

E o futuro?

“Eu acho que seria ideal pra mim, que eu falaria Ok então agora nem precisa nem existir

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o site mulheres no cinema, seria quanto as mulheres tivessem as mesmas oportunidades que os homens de fazer qualquer filme que elas queiram fazer” diz Luísa Pécora sobre o futuro ideal da igualdade de gênero entre diretores de cinema, isso mostra que por mais que estejamos no caminho para alcançar essa igualdade, ainda falta um longo caminho a ser percorrido, onde as indústrias cinematográficas vejam que as mulheres podem ter grandes orçamentos as diretoras e cabe aos espectadores mostrar que os filmes dirigidos por uma ótima feminina são tão interessantes quanto os outros. Grandes premiações estão buscando a inclusão, como por exemplo o Oscar que desenvolveu novas regras que serão válidas somente para a categoria de melhor filme a partir de 2022, as que citam a mulher são “Os cargos de liderança ou chefe de departamento (diretor de elenco, cineasta, compositor, figurinista, diretor, maquiador, supervisor de efeitos visuais, escritor, cenografista, editor de dom, produtor e designer de produção) precisam ter ao menos dois representantes dos grupos: mulheres, grupos raciais ou étnico, LGBTQI+, pessoas com deficiências cognitivas e físicas” e “ao menos 30% da equipe toda da produção deve ser composta pelos grupos: mulheres, grupos racial e étnico, LGBTQI+, pessoas com deficiências cognitivas ou físicas”, isso significa um grande avanço para as premiações e um exemplo a ser observado pelas demais, pois o Oscar é a maior festa do cinema mundial. Aqui no Brasil, os festivais de cinema estão buscando se adaptar a essa igualdade, Flávia faz parte do coletivo Elviras — mulheres criticas de cinema — que tem o nome inspirado por a Elvira Gama, primeira mulher no país a escrever sobre imagem e movimento para o Jornal Brasil entre 1894 e 1895 — que mapeou críticas do país inteiro pois estavam cansadas de questionar os organizadores desses festivais o motivo de não ter mulheres mediando painéis, que eles não conhecia muitas críticas: “E ai a gente falou ‘não conhece ? Perai que a gente lista’ e as Elviras tem mais de 100 mulheres fazendo criticas no Brasil todo, tem mulher do Acre até o Rio Grande do Sul”, ela também salienta como a internet tem ajudado as mulheres a se organizarem e fazerem reuniões sobre esse tema “A gente tem grupo o WhatsApp, tem grupo no Facebook, tem o Instagram das Elviras também [...] e ai a gente vai se articulando online para combinar, mas temos feito coisas sempre”.

Como podemos ajudar?

Flávia diz a chave da mudança está com o público com eles “Eu acho que o público tem que ficar atento né? Quais são os filmes dirigidos por mulheres, quem são essas mulheres que estão dirigindo, acessar sites como o mulheres no cinema, mas procurar, porque o público em geral ele não procura saber quem é o diretor, quanto mais a diretora” e complementa salientando que essa questão de falta de procura é um problema da sociedade em geral, não somente no Brasil “O mundo é machista, as estruturas são machistas e não sou só eu que estou dizendo isso, tenho amigas que são professoras universitárias que falam que desde sempre as alu-

Grandes premiações estão buscando a inclusão, como por exemplo o Oscar que desenvolveu novas regras que serão válidas somente para a categoria de melhor filme

nas, sem querer querendo, quando vão fazer trabalhos em grupos são colocadas como produtoras, assistente de direção, assistente de produção e os meninos vão assumir a direção do projeto” Já Luísa cita um ditado americano sobre como o consumo pode influenciar diretamente no tipo de produção que elas vão aplicar o dinheiro: “Aqui nos Estados Unidos é mais comum que eles falaram que o espectador vota com o dinheiro, então onde você coloca seu dinheiro tem uma repercussão né, por exemplo, se um filme como Mulher Maravilha fosse mais ou menos o que hollywood ia pensar?! Que não deu certo né, que as pessoas não querem ver filme de quadrinho sobre mulher” ela ainda dá a seguinte dica para quem pergunta como ajudar “Eu sempre falava pras pessoas fazerem, por exemplo, tem um filme nacional dirigido por uma mulher, sobre uma mulher que tá em cartaz na sua cidade né. Se você vai ver esse filme principalmente na primeira e na segunda semana já ajuda a esse filme a ficar mais tempo em cartaz, você vai lá coloca seu dinheiro naquele filme também vai nas suas redes sociais fala para os seus seguidores que o filme é demais, chama eles para assistirem, já ajuda aquele filme”.

4 cineastas que você não pode deixar de prestigiar

Anna Muylaert

Diretora brasileira do filme “Que horas ela volta?” nos festivais de Sundance e Berlim.

Greta Gerwig

Única diretora mulher indicada ao Oscar de melhor direção na 90ª Edição da premiação.

Katheryn Bigelow

Primeira e única diretora mulher a ganhar o Oscar na categoria de Melhor Filme

Adélia Sampaio

Primeira diretora negra a dirigir um longa no Brasil, “Amor Maldito”, de 1984.

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