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Por que e para quê esta consulta?

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As crianças

As crianças

P., M., L. y J. (Cartagena)

Apresentação

Por que e para quê esta consulta?

“Não, aqui não há discriminação. Aqui não, mas é possível que haja na escola vizinha”. Assim começaram várias das conversas realizadas durante esse exercício de consulta às comunidades educativas em torno da primeira infância em escolas públicas do Peru, Colômbia e Brasil. Alguns minutos de diálogo depois, quase sempre surgiam depoimentos vivos e presentes, revelando lógicas discriminatórias que haviam ocorrido dentro do mesmo ambiente educativo. Essas situações evidenciavam o desafio proposto com este estudo.

O combate a todas as formas de discriminação, para todas e todos e em todo o mundo é uma tônica das normas e dos instrumentos de direitos humanos. Entretanto, a sua superação ainda é uma dívida na América Latina e no Caribe. De forma ainda mais grave, prevalece uma tendência à invisibilidade e à negação do racismo, do sexismo e das múltiplas formas de discriminação, assim como de suas consequências, o que aprofunda a desigualdade e as violações aos direitos fundamentais, econômicos, sociais e culturais. Para a CLADE, dar visibilidade a essas discriminações é um passo fundamental para sua superação, e por essa razão a Campanha vem, há alguns anos, empreendendo ações sobre o tema, que ocupa um lugar privilegiado em sua agenda política.

Se as distintas formas de discriminação estão presentes nos diversos aspectos do cotidiano, estão presentes também na vida escolar em todas as suas etapas, e a educação infantil não está imune. Na primeira etapa de ensino já se evidenciam alguns processos excludentes, o que esse estudo confirma de diversas maneiras. Se a discriminação pela pouca idade é algo comum, esse fator se acirra quando cruzado com outras formas de discriminação, como por questões étnico-raciais, de gênero ou qualquer outra característica que não siga o chamado padrão, o “normal”.

O fenômeno acontece no âmbito legal e normativo, nas políticas públicas, no cotidiano escolar e no interior das salas de aula. É com o objetivo de averiguar como tem ocorrido a discriminação, especificamente nos contextos educativos de crianças pequenas, que a CLADE decide realizar esta Consulta sobre Discriminação na Educação na Primeira Infância, que se desenvolveu durante 2011 e 2012, no Brasil, Colômbia e Peru. Em cada um dos três países, a consulta foi realizada numa cidade grande e em outro município considerado pequeno, quando comparado à média nacional.

Na Colômbia, participaram Bogotá e Cartagena. No Peru, as cidades foram Lima e Urubamba. No Brasil, trabalhou-se em Fortaleza (Ceará) e Baixa Grande (Bahia). No total, participaram 12 escolas, quatro em cada país. Buscava-se, de maneira exploratória, apreender em que medida e de que forma a discriminação é percebida nas instituições educativas do ponto de vista dos sujeitos que dela participam, investigando de que maneira as práticas discriminatórias afetam as crianças. Por outro lado, esta consulta também tinha o propósito de saber se a instituição analisada tem combatido a discriminação e que estratégias são adotadas para sua superação. Para efeitos metodológicos, priorizou-se a faixa de idade entre 4 e 8 anos.

E quem se consultou? Uma característica central da pesquisa foi seu caráter participativo, ou seja, ela partiu das percepções dos sujeitos da comunidade educativa – professores/as, diretores/ as, trabalhadores/as da escola, mães e pais e, em especial, as próprias crianças pequenas.

Desse modo, o estudo se soma às pesquisas recentes que, de forma inovadora, tomas as crianças pequenas como sujeitos, não para avaliá-los e definir suas peculiaridades, mas sim para conhecer o que pensam e sentem sobre os temas relacionados às suas vidas.

As crianças têm uma maneira própria de perceber e sentir suas diversas experiências. É importante recordar que, pouco a pouco, consolida-se o reconhecimento de que elas são competentes para expressar seus próprios sentimentos e percepções, abandonando-se a prática comum de recorrer às pessoas adultas com as quais as crianças têm mais contato para obter informações sobre elas.

Na definição contemporânea, inclui-se o direito assegurado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças (1989), cujo artigo 12 afirma que todas as crianças têm “o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem, sendo devidamente tomadas em consideração as opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade”.

Além disso, esse exercício de escuta é fundamental para uma melhor tomada de decisões, por parte das pessoas adultas responsáveis. Nessa publicação, compartilhamos não somente nossos achados, mas também narramos o processo metodológico e o caminho percorrido. A “introdução” traz um pouco das reflexões das quais partimos. Perguntamos “que educação e para que sociedade?”, e em seguida posicionamos os debates sobre a educação na primeira infância: “O que está em jogo hoje em dia?”. Depois, apresentamos uma breve revisão histórica sobre as discriminações na infância, para então traçar um panorama sobre a discriminação na educação infantil atualmente, assim como seus desafios e características na América Latina e no Caribe.

Na seção “Metodologia”, descrevemos as ferramentas utilizadas para a escuta da comunidade educativa ao longo do processo. Nossa pesquisa se caracteriza pela utilização de uma variedade de estratégias com o objetivo de apreender a perspectiva dos sujeitos nela envolvidos, e em particular destacando estratégias para a escuta de crianças pequenas. Aqui elas estão disponíveis para que sejam usadas e adaptadas aos diferentes contextos e realidades.

Em “Nossos achados”, compartilhamos efetivamente o que encontramos em campo. Apresentamos o que disseram as crianças, o que disseram as pessoas adultas e, finalmente, destacamos 10 grandes achados de nossa Consulta. Fazemos isso a partir de uma diversidade de pontos de vista, já que esse informe resulta de reuniões e debates entre consultores/as, pesquisadores/as e os fóruns nacionais articulados à CLADE. Além disso, a Consulta exprime um esforço adicional posterior, de retornar às comunidades educativas para compartilhar os dados sistematizados e indagar suas opiniões sobre eles.

Finalmente, em “Recomendações”, a CLADE expressa alguns pontos que considera fundamentais para a realização do direito à educação para todas e todos na primeira infância, sem discriminações.

Destacamos nosso mais sincero agradecimento às diversas organizações aliadas, pesquisadores/as, colaboradores/as que participaram de cada etapa desse processo.

Agradecemos especialmente às escolas, que abriram suas portas a este processo de pesquisa, mostrando-se dispostas a conversar sobre um tema de grande sensibilidade. Esperamos poder gerar debates e reflexões, inspirar outras pesquisas com novas perguntas e, sobretudo, oferecer informações e recomendações para as políticas e práticas que queiram fazer da escola um espaço de vivência e dignidade para a vida.

E. (Lima)

D. (Lima)

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