Caderno de experiências : pesquisa em foco

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Pesquisa em Foco

PLATÃO E FILOSÓFICO

O

Camila do Espírito Santo Prado de Oliveira Professor /UFCA camiladoespiritosanto@yaho o.com.br

DIÁLOGO

1 Introdução

pensamento de Platão, acontece em meio a muitas outras falas (centradas em outras questões) e que, assim, eventualmente, vazam rumores de lado a lado que “contaminam” o desenrolar das histórias. O que está em jogo em uma conversa não é nunca só o que é enunciado pelos interlocutores como questão. Isto parece ser assim na conversa que forma a tradição interpretativa, bem como nos encontros entre discursos que acontecem na obra platônica; ou ainda – e talvez seja para isto que Platão aponta nos seus diálogos – em qualquer conversa. Trazer à fala o que realmente está em questão é a tarefa da interpretação. Mas não partimos da assunção de que toda interpretação é também partícipe de uma conversa? Que confusão! Retomemos o fio da meada: pretendemos entrar em uma conversa cujo tema é “o pensamento de Platão”. Foi dito, no entanto, que talvez esta não seja a única questão, ou ainda, não seja propriamente o que está em questão. Como descobrir o que está propriamente em questão? Se, como se pode suspeitar, os diálogos de Platão nos convidam a experimentar a passagem dos problemas enunciados ao que está em questão sem vir à fala, então “cair na conversa” de Platão pode ser uma boa maneira de aprendermos a ouvir o que está propriamente em questão no diálogo sobre o pensamento de Platão. Prossigamos: de que modo está posta a questão pelo que se denominou “pensamento de Platão”? Este é o ponto para o qual converge toda esta conversa sobre conversa. Há muitos modos de perguntar pelo pensamento de Platão, ou ainda, há muitos modos de percorrer a obra platônica em busca de seu pensamento. Estes muitos métodos, que, talvez, rigorosamente, sejam tão inumeráveis quanto são inúmeras as vozes que conversam, precisaram ser agrupados por semelhanças para permitir, a quem chega depois, uma localização inicial na conversa. Quando nos aproximamos, já ouvimos alguns participantes, que chegaram antes, falarem em correntes interpretativas ou estilos de leitura1, fornecendo, assim, um guia geral dos muitos modos pelos quais se tem perguntado pelo pensamento de Platão. Aplicando o método da divisão (diaíresis) aos estilos de leitura elencados por Gill (2005), com o intuito de nos localizarmos, teríamos o seguinte mapa:

O Núcleo de Estudos do Pensamento Antigo e Medieval (NEPAM) é um Grupo de Pesquisa que promove atividades de formação (grupos de estudo, orientações, minicursos) e projetos de pesquisa em temas ligados ao pensamento clássico grego e medieval. Este artigo é resultado de um trabalho de pesquisa sobre a obra platônica e a constituição da filosofia como diálogo. Seu objetivo é apresentar reflexões e decisões metodológicas sobre como ler Platão e algumas hipóteses interpretativas sobre seu pensamento. 2 Fundamentação teórica Propor uma pesquisa sobre o pensamento de Platão envolve a pretensão de entrar em uma prosa que começou há muitos e muitos anos, em um reino muito distante, e que é composta por inúmeras vozes. Recorrer à fórmula utilizada para iniciar os contos de fada serve, aqui, para chamar a atenção para o caráter extraordinário desse movimento – a tradição interpretativa – que atravessa séculos, unindo mortos e vivos de todo o mundo em torno à obra de um homem. Participar de uma conversa em andamento depende de alguns procedimentos. O primeiro é inteirarmo-nos sobre qual é o teor da discussão. O segundo é compreender de que modo a questão está posta e como ela vem se desenvolvendo. O terceiro procedimento, caso haja algo a dizer, é elaborar a contribuição e enunciá-la. A pauta desta confabulação foi dita acima numa formulação bastante abrangente para comportar a grande diversidade do que aparece como questão: o pensamento de Platão. Esta determinação pode parecer, além de vaga, artificial. Talvez haja vozes que participam desta conversa e que não se reconheçam interessadas no “pensamento de Platão”. Pode-se ir à obra platônica, por exemplo, buscando testemunhos de uma posição que já se considera como sendo o legado do filósofo: o idealismo, o realismo, a metafísica ocidental, por exemplo. Nestes casos, por vezes importa mais apontar as consequências (historicamente construídas) de certas teses atribuídas a Platão do que tentar esclarecer como se constitui seu pensamento. Admite-se, diante disso, o artifício. Consideremos que o “nosso” diálogo, sobre o 293


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